5 de janeiro de 2010

Sétima ingratidão dos homens para com Jesus Sacramentado

Desprezo daqueles que não acompanham Jesus Sacramentado quando sai aos enfermos.

Se é verdade o que afirmou Sêneca, que receber um benefício é vender a liberdade: Beneficium accipere est libertatem vendere, quantas vezes se teriam vendido os homens a Jesus, de Quem recebem, no Augustíssimo Sacramento, uma dádiva que, sendo Ele infinitamente rico e poderoso, esgotou com ela todos os Seus tesouros; nem tinha nais que dar-lhe Sua Onipotência. Sem dúvida, por esse título só são os Católicos mil vezes escravos do Redentor. Mas, sendo-o, que razão haverá para que, quando Ele sai pelas ruas, tenha tão poucos que O acompanhem? Eu O vi em cidades muito populosas, tão só e abandonado, que apenas ia o Sacerdote que levava, e duas ou três pessoas, que O assistiam, e então me confundi, lembrando-me daquele sobreaviso fausto, daquelas grandiosas comitivas, daquele número sem número de guardas, e daquelas custosas carroças cobertas e guarnecidas de ouro, com que saem de seus palácios os príncipes da terra. O Rei dos reis, o Deus de infinita Majestade, no mundo, é apenas tão desprezado... Ele, com passos de Gigante, corre desde o Céu à terra, rodeado de Coros Angélicos, que invisivelmente O acompanham, por chuvas e por neves passeia pelas cidades e vilas, não estranha entrar numa pobre casa e em uma humilde choça. Mas como correspondem os homens a esses excessos de amor e de cortesia?
Passa por suas portas o Amantíssimo Jesus, e os chama com aquelas piedosas vozes: Sequere me. Porém, eles, não como aquele venturoso arrendador, Mateus, ficam sentados no telônio, atentos ao tráfego e engolfados no interesse. À primeira vista do Redentor, ao primeiro soar de um venite post me, deixaram os Discípulos, para acompanhá-l'O, os barcos e as redes. As turbas, em número de cinco e seis mil pessoas, seguiam-n'O dias inteiros, famintas pelo jejum e cansadas do caminho. Flores e pedras há na terra, que seguem todos os passos do sol e o movimento da lua. Do helitrópio e da silenite o referem os naturais.
Também de brutos irracionais temos maravilhosos exemplos do grande ardor e diligência com que acompanhavam Jesus Sacramentado. Na cidade de Lisboa, tinha um pobre oficial um cachorro que, todas as vezes que o sino fazia sinal para sair o Santíssimo Sacramento, corria com extraordinária pressa à porta da Igreja, e, dali, sem nunca se apartar, por muitas experiências que fizeram, até matá-lo com paus, seguia-O até a casa dos enfermos. E, o que é mais, ao primeiro toque que, de noite, se ouvia, levantava-se como um leão, e, achando-se fechadas as portas, ladrava e se enfurecia tanto que era preciso abri-las, e uma vez sucedeu arrojar-se pelas janelas, para tributar seu costumeiro obséquio a seu Criador Sacramentado.
Todas as felicidades da Casa da Áustria trazem sua origem de um piedoso cortejo tributado a Este Augustíssimo Sacramento, quando Rodolfo, Conde de Auspruch, encontrando num despovoado o Pároco, que O levava, desmontando o cavalo e fazendo subir nele o Sacerdote, conduziu-o pelas rédeas, descoberta a cabeça, até a casa do enfermo. Não ficou sem remuneração seu obséquio, porque, em breve tempo, teve o despótico domínio de um Império. Eu poderia alegar outros exemplos de reis e príncipes da Espanha, ainda nos tempos presentes, que, com edificação e consolo da Corte, seguiram o exemplo de Rodolfo. Rei coroado e mais poderoso era Davi, e, com a harpa nas mãos, dançava e saltava, acompanhando a Arca do Senhor, que não continha mais do que uma sombra e figura d'Este Sacramento. Ó se os príncipes e todos entendessem com quantas prosperidades felicitaria Deus suas casas, se praticassem semelhantes atos de piedade e religião com Seu Santíssimo Filho Sacramentado.

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