29 de fevereiro de 2024

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO XV

Do amor do Eterno Pai dando-nos o seu Filho

1. “Assim Deus amou o mundo que lhe deu seu Filho unigênito” (Jo 3,16). Três coisas devemos considerar nesta dádiva: quem é quem dá, que coisa e com que o amor no-la dá. É sabido que, quanto mais nobre o doador, tanto mais apreciável a dádiva; se alguém recebe uma flor de um monarca, estimará essa flor mais que um tesouro. Quanto, pois, devemos estimar este dom que nos vem das mãos de Deus? E que foi o que nos deu? Seu próprio Filho. Não se contentou o amor desse nosso Deus com dar-nos tantos bens nesta terra, mas chegou a dar-se todo inteiro a nós na pessoa do Verbo encarnado. S.
João Crisóstomo diz: Deu-nos não um servo, nem um anjo, mas seu próprio Filho (In Jo. Hom. 26). Por isso exclama a Igreja, cheia de júbilo: “Ó maravilhosa condescendência de vossa ternura! Ó inapreciável rasgo de caridade! Para resgatar o escravo, sacrificastes o Filho!” Ó Deus infinito, como pudestes usar para conosco de tão admirável piedade? Quem jamais poderá compreender um excesso tão grande, que, para resgatar o escravo, quisésseis sacrificar vosso único Filho? ah, meu benigníssimo Senhor, desde que me destes o que de melhor possuíeis, é justo que eu vos dê o mais que me for possível. Vós quereis o meu amor e eu nada mais de vós desejo que o vosso amor. Aqui tendes o meu mísero coração que eu consagro inteirinho a vos amar. Criaturas todas, saí do meu coração e dai lugar ao meu Deus, que o merece e quer possuí-lo todo e sem partilha. Amo-vos, ó Deus de amor, amo-vos sobre todas as coisas e só a vós quero amar, meu Criador, meu tesouro, meu tudo.

2. Deus nos deu seu Filho e por quê? Só por amor. Pilatos, por temos humano, entregou Jesus aos judeus (Lc 23,25). O Eterno Pai entrega-nos seu Filho, mas pelo amor que nos consagra (Rm 8,32). S. Tomás afirma que numa dádiva o amor vem em primeiro lugar (I q. 38. a. 2). Quando nos fazem um presente, o primeiro dom que recebemos é o amor que o doador nos oferece na dádiva que faz, porque a única razão de um dom gratuito é o amor: quando se dá com outro fim, que não seja o puro afeto, o dom perde a razão de verdadeiro dom. A dádiva que nos fez de seu Filho o Padre Eterno, foi um verdadeiro dom todo gratuito e sem mérito algum da nossa parte. É por isso que se diz que a Encarnação do Verbo foi obra do Espírito Santo, isto é, efetuada por puro amor, como afirma o mesmo santo doutor: “Que o Filho de Deus se revestiu de carne proveio do mais acendrado amor de Deus” (III q. 32, a. 1). Mas Deus não somente nos deu seu Filho por puro amor, mas no-lo deu igualmente com amor imenso. Foi justamente o que quis Jesus significar, dizendo: “Assim amou Deus o mundo”. A palavra assim denota a grandeza do amor, diz S. João Crisóstomo, com que Deus nos fez essa grande dádiva (In Jo. Hom. 26). E que maior amor poderia um Deus demonstrar-nos do que condenar à morte seu próprio Filho, inocente, para nos salvar a nós, míseros pecadores? “Não poupou a seu próprio Filho, mas entregou-o por nós todos” (Rm 8,32). Se o Padre Eterno pudesse padecer, que dor não sentiria ao ver-se obrigado por sua justiça a condenar o Filho, que amava como a si mesmo, a uma morte tão cruel e cheia de ignomínias? Quis que morresse consumido pelos tormentos e pelas dores, diz Isaías (53,10). Imaginai que estais vendo o Padre eterno com Jesus morto nos braços, dizendo-vos: Ó homens, é este o meu Filho muito amado, em que eu encontrei todas as minhas complacências. Vede como eu o quis ver maltratado pelas vossas iniqüidades (Is 53,8). Ei-lo condenado à morte nessa cruz, aflito, abandonado até de mim, que tanto o amo. E tudo isto eu o fiz para que vós me ameis. Ó bondade infinita! Ó misericórdia infinita! Ó Deus de minha alma, já que por minha causa quisestes a morte do objeto mais caro ao vosso coração, ofereço-vos por mim o grande sacrifício que vos fez de si mesmo este vosso Filho, e por seus merecimentos vos peço o perdão de meus pecados, o vosso amor, o vosso paraíso. São grandes estes favores que eu vos peço, mas é ainda mais valiosa a oferta que vos apresento. Perdoai-me e salvai-me, ó meu Pai, pelo amor de Jesus Cristo. Se vos ofendi pelo passado, arrependo-me disso mais
que de todo o mal e agora eu vos estimo e vos amo mais que todos os bens.

3. Quem, a não ser um Deus de infinito amor, poderia nos amar a tal ponto? S. Paulo escreve: “Mas Deus, que é rico em misericórdia, pela excessiva caridade com que nos amou, nos vivificou em Cristo quando estávamos mortos pelo pecado” (Ef 2,4). Chama o Apóstolo amor excessivo esse amor que Deus nos demonstrou, dando aos homens, por meio da morte de seu Filho, a vida da graça que haviam perdido por seus pecados. Para Deus, porém, não foi excessivo esse amor, pois que Deus é o mesmo amor: “Deus é amor” (1Jo 4,16). Diz S. João que nisso quis Deus fazer-nos ver até aonde chegava a grandeza do amor de um Deus para conosco, enviando seu Filho ao mundo para obter-nos com sua morte o perdão e a vida eterna (1Jo 4,9). Estávamos mortos à graça pelo pecado, e Jesus com sua morte os restituiu a vida. Estávamos na miséria disformes e abomináveis, mas Deus, por meio de Jesus Cristo, tornou-nos belos e caros aos seus olhos divinos. Escreve o Apóstolo: “Ele nos fez agradáveis a si no seu amado Filho” (Ef 1,6). O texto grego diz: fez-nos graciosos. Por isso S. João Crisóstomo ajunta que, se houvesse um pobre leproso todo dilacerado e disforme, e alguém o curasse da lepra e o tornasse belo e rico, qual não seria a sua obrigação para com esse benfeitor? ora, imensamente maior é a nossa dívida para com Deus, pois sendo nossas almas disformes digno as de ódio pelas culpas cometidas, ele por meio de Jesus Cristo não só as livrou dos pecados como também as tornou mais belas e amáveis. “Abençoou-nos com toda a bênção espiritual em bens celestes, em Cristo” (Ef 1,3). Cornélio a Lápide comenta esta passagem: “Gratificou-nos com todos os bens espirituais”. A bênção de Deus é gratificar ou fazer bem e o Padre eterno, dando-nos Jesus Cristo, cumulou-nos de todos os bens, não terrenos para o corpo, mas espirituais para a alma. Em bens celestes, “dando-nos com seu Filho uma vida celeste neste mundo, e no outro uma glória celeste”. Abençoai-me, pois, fazei-me bem, ó Deus amantíssimo, e que esse benefício seja atrair-me inteiramente ao vosso amor: “Atraí-me pelos laços de vosso amor”. Fazei que o amor que me consagrastes me arrebate em amor pela vossa bondade. Vós mereceis um amor infinito: eu vos amo com o amor de que sou capaz, amo-vos sobre todas as coisas, amo-vos mais do que a mim mesmo. Consagro-vos toda a minha vontade e esta é a graça que vos peço: fazei que de hoje em diante eu viva e faça tudo segundo a vossa vontade, visto que nada mais quereis que o meu bem e minha salvação eterna.

4. “Introduziu-me em sua adega e ordenou em mim a caridade” (Ct 2,4). O meu Senhor, diz a esposa sagrada, conduziu-me à adega, isto é, pôs-me diante dos olhos todos os benefícios que me fez para induzir-me a amá-lo: Ordenou em mim a caridade. Diz um autor que Deus, para conquistar nosso amor, enviou, por assim dizer, contra nós um exército de graças de amor. “Dispôs contra mim a caridade como um exército” (Casp. Sánchez). Segundo o Cardeal Hugo, o dom de si mesmo a nós, que Jesus nos fez, foi a seta reservada predita por Isaías: “Pôs-se como uma seta reservada: escondeu-me na sua aljava” (Is 49,2). Como o caçador reserva a melhor seta para o último tiro que deve abater a fera, assim Deus entre todos os seus benefícios reservou Jesus, até chegar o tempo da graça, e então o enviou como último golpe para ferir de amor os corações dos homens. Ferido por esta seta, dizia S. Pedro a seu Mestre: Senhor, vós bem sabeis que eu vos amo (Jo 21,15). Ah, meu Deus, vejo-me circundado de todas as partes pelas finezas de vosso amor. Eu também vos amo e se eu vos amo sei que também vós me amais. E quem poderá privar-me de vosso amor? Só o pecado. Mas deste monstro do inferno, vós, pela vossa misericórdia, me haveis de livrar. Prefiro todos os males, a morte mais cruel, mesmo a destruição de meu ser, a ofender-vos com um pecado mortal. Vós, porém, já conheceis minhas quedas passadas, conheceis minha fraqueza, ajudai-me, meu Deus, pelo amor de Jesus Cristo. “Não desprezeis a obra de vossas mãos” (Sl 137,8). Sou a obra de vossas mãos, vós me criastes; não me desprezeis. Se por minhas culpas mereço ser abandonado, mereço não menos que tenhais misericórdia de mim por amor de Jesus Cristo, que vos sacrificou sua vida por minha salvação. Eu vos ofereço os seus merecimentos, que são todos meus, e por eles eu vos peço e espero de vós a santa perseverança com uma boa morte e, entretanto, a graça de viver o resto de minha vida todo consagrado à vossa glória. Basta quanto vos ofendi: eu me arrependo de todo o coração e quero amar-vos quanto posso. Não quero mais resistir ao vosso amor: entrego-me inteiramente a vós. Dai-me a vossa graça e o vosso amor e fazei de mim o que quiserdes. Meu Deus, eu vos amo e quero e peço-vos sempre o vosso amor: Atendei-me pelos merecimentos de Jesus Cristo. Maria, minha Mãe, rogai a Deus por mim. Amém.

28 de fevereiro de 2024

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO XIV

Da esperança que devemos ter na morte de Jesus

1. Jesus é a única esperança de nossa salvação; fora dele não há salvação, em nenhum outro (At 4,12). Eu sou a única porta, disse ele, e quem entrar por mim encontrará certamente a vida eterna (Jo 10,9). Que pecador poderia esperar perdão se Jesus não tivesse satisfeito por nós a justiça divina com seu sangue e com sua morte? “Ele carregou com suas iniqüidades” (Is 53,11). Por isso, o Apóstolo nos anima, dizendo: “Se o sangue dos bodes e dos touros santifica os imundos para a purificação da carne, quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito Santo se ofereceu a si mesmo a Deus como vítima imaculada, purificará a nossa consciência das obras mortas para servir o Deus vivo?” (Hb 9,13-14). Se o sangue dos bodes e dos touros sacrificados tirava nos hebreus as manchas exteriores do corpo, para que pudessem ser admitidos aos sacros misteres, quando mais o sangue de Jesus Cristo, o qual por amor se ofereceu a pagar por nós, tirará os pecados de nossas almas para podermos servir o nosso sumo Deus. Nosso amoroso Redentor, tendo vindo a este mundo somente para salvar os pecadores e vendo já escrita contra nós a sentença de condenação por causa de nossas culpas, que faz? Ele com sua morte pagou o castigo que nos era devido e, cancelando com seu sangue a escritura da condenação, afixou-a na própria cruz em que morre, para que a justiça divina não exigisse de nós a satisfação devida (Cl 2,14). “Cristo entrou uma só vez no santuário, havendo-nos adquirido uma redenção eterna” (Hb 9,12). Ah, meu Jesus, se não tivésseis encontrado esse modo de obter-me perdão, quem o poderia alcançar? Tinha razão Davi para exclamar: “Publicarei as suas maravilhas” (Sl 9,12). Publicai, ó bem-aventurados, os esforços amorosos que fez nosso Deus para salvar-nos. Visto, pois, ó meu doce Salvador, que me dedicaste tão grande amor, não deixeis de usar de piedade para comigo. Vós me resgatastes das garras de Lúcifer por meio de vossa morte: eu entrego minha alma nas vossas mãos, tendes de salvá-la. “Nas vossas mãos encomendo o meu espírito: vós me remistes, Senhor Deus de verdade” (Sl 30,6).

2. “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Mas, se alguém pecar, temos um advogado junto do Pai, Jesus Cristo, o justo, e ele é a propiciação pelos nossos pecados” (1Jo 2,1). Jesus Cristo não cessou com sua morte de interceder por nós junto de seu Pai, e mesmo agora é nosso advogado e parece, como escreve S. Paulo, que no céu não tem outra ocupação que mover seu Pai a usar de misericórdia para conosco. “Vive sempre a rogar por nós” (Hb 7,25). E ele ajunta que para isso subiu ao céu o Salvador: “Para se apresentar agora perante a face de Deus por nós outros” (Hb 9,24). Assim como são expulsos da face dos reis os rebeldes, nós, pecadores, não seríamos mais dignos de ser admitidos na presença de Deus nem mesmo para pedir-lhe perdão. Jesus, porém, como nosso Redentor, apresenta-se por nós perante Deus e por seus merecimentos nos obtêm a graça perdida: “Vós vos chegastes ao mediador do Novo Testamento, Jesus, e à aspersão do sangue mais eloqüente que o de Abel” (Hb 12,24). Oh! quanto melhor por nós implora misericórdia o sangue do Redentor, do que o sangue de Abel exigia castigo contra Caim! A minha justiça, disse Deus a S. Maria Madalena de Pazzi, se transformou em clemência com a vingança exercida sobre a carne inocente de Jesus Cristo. O sangue de meu Filho não exige de mim vingança, como o sangue de Abel, mas pede somente misericórdia e compaixão, e minha justiça não pode deixar de ficar aplacada com essas voz. Esse sangue lhe amarra as mãos de tal maneira que não as pode mover, por assim dizer, para tomar aquela vingança, que deveria, dos pecados.

3. “Não te esqueças da graça que te fez teu fiador” (Eclo 29,20). Ah, meu Jesus, eu era incapaz, depois de meus pecados, de satisfazer a divina justiça, mas vós quisestes com a vossa morte satisfazer por mim. Oh! quão grande seria a minha ingratidão se eu me esquecesse dessa tão grande misericórdia. Não, meu Redentor, não quero esquecer-me mais; quero agradecer-vos sempre e mostrar-me grato, amando-vos e fazendo quanto puder para vos contentar. Socorrei-me com as graças que me merecestes com tantos sofrimentos. Amo-vos, ó meu amor, minha esperança. “Minha pomba nas fendas do rochedo” (Ct 2,13). Oh! que refúgio seguro encontraremos sempre nessas fendas sagradas da pedra, que não as chagas de Jesus Cristo. “As fendas da pedra são as chagas do Redentor, diz S. Pedro Damião; nelas a alma fiel põe a sua esperança” (De S. Mat. serm. 3). Ah, aí nos veremos livres da desconfiança causada pela vista de nossos pecados, aí encontraremos as armas para nos defendermos quando formos tentados a pecar novamente. “Confiai, eu venci o mundo” (Jo 16,33). Se não tendes forças bastantes, exorta-nos o Salvador, para resistir aos assaltos que o mundo vos oferece com seus prazeres, confiai em mim, porque eu o venci e agora vós também o vencereis. Pedi para que meu eterno Pai vos conceda, por meus merecimentos, a força e eu vos prometo que tudo que lhe perdirdes em meu nome, ele vos dará Jo 16,23). E em outro lugar nos reafirma a promessa, dizendo que qualquer graça que pedirmos a Deus por seu amor, ele mesmo, que é uma só coisa com o Pai, no-la dará: “Tudo que pedirdes a meu pai em meu nome, eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho” (Jo 14,13). Ah! eterno Pai, confiado nos merecimentos e nessas promessas de Jesus Cristo, não vos peço bens da terra, mas somente a vossa graça. É verdade que eu, pelas injúrias que vos fiz, não mereceria nem o perdão nem graças. Mas se eu não o mereço, mereceu-mas vosso Filho, oferecendo seu sangue e sua vida por mim. Perdoai-me, pois, por amor desse vosso Filho. Dai-me uma grande dor de meus pecados e um grande amor a vós. Alumiai-me para que conheça quanto é amável a vossa bondade e quão grande é o amor que me tendes tido desde toda a eternidade. Fazei-me compreender a vossa vontade e dai-me a força para executá-la perfeitamente. Senhor, eu vos amo, e quero fazer tudo o que de mim exigis.

4. Que grande esperança de salvação nos dá a morte de Jesus Cristo. “Quem é que nos há de condenar? Jesus Cristo, que morreu por nós e que também intercede por nós” (Rm 8,34). Quem será que nos condenará, pergunta o Apóstolo: é aquele mesmo Redentor que, para não nos condenar à morte eterna, condenou-se a si mesmo a morrer cruelmente numa cruz. Isso anima S. Tomás de Vilanova a dizer: “Que temes, ó pecador, se pretendes deixar o pecado? Como há de te condenar aquele Senhor que morrer para te não condenar? Como te há de expulsar, quando voltares a seus pés, aquele que desceu do céu a tua procura, quando fugias dele?” Mas ainda maior coragem nos incute o Salvador mesmo, dizendo por Isaías: “Eis que eu te gravei nas minhas mãos; tuas muralhas estão sempre diante de meus olhos” (Is 49,16). Não percas a confiança, ovelha minha, vê quanto me custaste, eu tenho-te escrita nas minhas mãos, nestas chagas que eu sofri por ti: elas sempre me recordam que devo ajudar-te e defender-te contra teus inimigos: ama-me e confia. Sim, meu Jesus, eu vos amo e em vós confio. O resgatar-me vos custou tanto, mas o salvar-me nada vos custa. A vossa vontade é que todos se salvem e que ninguém se perca. Se meu pecados me espantam, anima-me a vossa bondade que mais deseja fazer-me bem que eu recebê-lo. Ah, meu amado Redentor, vos direi com Jó. “Mesmo que ele me mate esperarei nele... E ele será meu salvador” (Jó 13,15). Ainda que me expulseis de vossa face, ó meu amor, não deixarei de esperar em vós, que sois meu Salvador. Essas vossas chagas e esse vosso sangue me dão suficiente confiança para esperar todos os bens de vós. Eu vos amo, caro Jesus, eu vos amo e em vós espero. A glorioso S. Bernardo, achando-se enfermo, viu-se uma vez transportado diante do tribunal de Deus, onde o demônio o acusava de seus pecados e afirmava que ele não merecia o paraíso. O santo respondeu: É verdade que eu não mereço o paraíso, mas Jesus tem duplo direito a esse reino: um por ser Filho natural de Deus, outro por havê-lo conquistado com sua morte; ele se contenta com o primeiro e cede-me o segundo, por isso eu peço e espero o paraíso. O mesmo podemos nós dizer, pois S. Paulo escreve que Jesus Cristo quis morrer consumido de dores para obter o paraíso a todos os pecadores arrependidos e resolvidos a emendar-se. “E, sacrificado, foi feito o autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem” (Hb 5,9). E o Apóstolo ajunta: “Corramos ao combate que nos está proposto, olhando para o autor e consumador da fé, Jesus, que, sendo-lhe proposto o gozo, suportou a cruz, desprezando a ignomínia” (Hb 12,1-2). Combatamos com coragem os nossos inimigos, olhando para Jesus Cristo que, com os merecimentos de sua paixão, nos oferece a vitória e a coroa.

5. Ele disse que subia aos céus para preparar-nos um lugar: “Não se turbe o vosso coração... porque eu vou preparar-vos um lugar” (Jo 14,1). Ele disse e continua a dizer a seu Pai que, visto o Pai nos ter dado a ele, nos quer ter consigo no paraíso: “Pai, quero que aqueles que me destes estejam comigo onde eu estou” (Jo 17,24). Que maior misericórdia poderíamos esperar do Senhor, diz S. Anselmo, que o Padre Eterno dizer a um pecador já condenado ao inferno por seus crimes e que não tinha meios de livrar-se do castigo: “Toma o meu Filho e oferece-o por ti” e o Filho acrescentar: “Toma-me e livra-te do inferno” (Cur Deus homo l. 2, c. 20). Ah, meu Pai amoroso, agradeço-vos haver-me dado vosso Filho por meu Salvador, ofereço-vos sua morte e por seus merecimentos vos suplico compaixão. Agradeço-vos sempre, ó meu Redentor, por haverdes dado vosso sangue e vossa vida para livrar-me da morte eterna. Socorrei-nos, pois, a nós, servos rebeldes, os quais com tanto custo remistes. Ó meu Jesus, única esperança minha, vós me amais e porque sois onipotente, fazei-me santo. Se eu sou fraco, dai-me fortaleza, se estou enfermo pelas culpas cometidas, aplicai à minha alma uma gota de vosso sangue e sarai-me. Dai-me o vosso amor e a perseverança final e fazei que eu morra na vossa graça. Dai-me o paraíso. Eu vos amo, ó Deus amabilíssimo, com toda a minha alma, e espero amar-vos sempre: ajudai a um mísero pecador que vos quer amar.

6. “Tendo nós o grande pontífice que penetrou nos céus, Jesus, Filho de Deus, conservemos a nossa confissão. Não temos um pontífice que não possa compadecer-se de nossas enfermidades, tendo experimentado todas as tentações, exceto o pecado” (Hb 4,14). já que temos um Salvador que nos abriu o paraíso, que por um certo tempo nos estava fechado pelo pecado, diz o Apóstolo, confiemos sempre nos seus merecimentos, pois ele sabe se compadecer de nós, tendo querido na sua bondade padecer as nossas misérias. “Vamos, pois cheios de confiança, ao trono da graça, para que consigamos misericórdia e encontremos a graça para sermos socorridos oportunamente” (Hb 4,16). Dirijamo-nos, pois, com confiança ao trono da misericórdia, ao qual temos acesso por meio de Jesus Cristo, para que aí encontremos todas as graças de que necessitamos. E como poderemos duvidar, ajunta S. Paulo, que Deus, tendo-nos dado seu Filho, nos tenha dado com ele todos os bens? “Entregou-o por nós todos: como não nos deu com ele todas as coisas?” (Rm 8,32). O cardeal Hugo comenta este passo: Não nos negará o menos, que é a glória eterna, aquele Senhor que chegou a dar-nos o mais, que é o seu próprio Filho. Ó meu sumo bem, que vos darei por um tal dom que me fizestes de vosso Filho? Dir-vos-ei com Davi: O Senhor retribuirá por mim (Sl 137,8). Senhor, não tenho com que retribuir-vos, vosso próprio Filho é o único que vos poderá agradecer dignamente: ele vos agradece por mim. Pai piedosíssimo, pelas chagas de Jesus, peço-vos que me salveis. Amo-vos, bondade infinita, e, porque vos amo, arrependo-me de vos haver ofendido. Meu Deus, meu Deus, eu quero ser todo vosso; aceitai-me por amor de Jesus Cristo. Ah, meu doce Criador, será possível que, havendo-me dado o vosso Filho, me negueis os vossos bens, a vossa graça, o vosso amor, o vosso paraíso?

7. Assevera S. Leão que foram maiores os bens que nos trouxe a morte de Jesus Cristo, do que os danos a nós causados pelo demônio com o pecado de Adão (Serm. 1, de Asc.). É o que afirma claramente o Apóstolo quando escreve aos Romanos: “Não se deu com o pecado como com o dom. Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5,20). Explica o Cardeal Hugo: A graça de Cristo é de maior eficácia do que o pecado. “Não há comparação entre o pecado do homem e o dom que Deus fez dando-nos Jesus Cristo; foi grande o delito de Adão, mas muito maior a graça que Jesus Cristo nos mereceu com sua paixão. “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Eu vim ao mundo, atestou o Salvador, para que os homens, mortos pelo pecado, não só recebam por mim a vida da graça, mas uma vida mais abundante do que a que perderam pela culpa. Motivo esse que levou a santa Igreja a chamar feliz a culpa que nos mereceu ter um tal Redentor. “Eis o Deus meu Salvador: agirei com confiança e não recearei” (Is 12,2). Se vós sois um Deus onipotente, ó meu Jesus, e sois também meu Salvador, que receios poderei ter de condenar-me? Se no passado vos ofendi, arrependo-me disso de todo o coração: no futuro quero servir-vos, obedecer-vos e amar-vos: espero firmemente que vós, meu Redentor, que tanto fizestes e padecestes por minha salvação, não me negareis graça alguma necessária para salvar-me (S. Boaventura). “Tirareis águas com alegria das fontes do Salvador e direis nesse dia: Louvai o Senhor e invocai o seu nome” (Is 12,3). As chagas de Jesus Cristo são essas benditas fontes das quais podemos receber todas as graças se com fé lhas pedirmos. “E sairá da casa do Senhor uma fonte, que regará a torrente dos espinhos” (Joel 3,18). A morte de Jesus é essa fonte prometida que irrigou as nossas almas com as águas da graça e transformou em flores e frutos da vida eterna por seus merecimentos os espinhos do pecado. Como diz S. Paulo, nosso amante Redentor fez-se pobre neste mundo para que nós pelo merecimento de sua pobreza nos tornássemos ricos (2Cor 8,9). Pelo pecado nos fizemos ignorantes, injustos, iníquos, escravos do inferno; Jesus Cristo morrendo e satisfazendo por nós, fez-se por Deus nossa sabedoria, nossa santificação e nossa redenção, diz o Apóstolo (1Cor 1,20). Fez-se nossa sabedoria, instruindo-nos; nossa justiça, perdoando-nos; nossa santidade, com seu exemplo; nosso resgate, com sua paixão, livrando-nos das garras de Lúcifer. Em suma, diz S. Paulo, os merecimentos de Jesus Cristo nos enriqueceram de todos os bens, de maneira que nada mais nos falta para receber todas as graças (1Cor 1,5). Ó meu Jesus, meu Jesus, que belas esperanças me incute vossa paixão. Quanto vos devo, meu amado Senhor. Ah, não vos tivesse eu ofendido. Perdoai-me todas as injúrias que vos fiz: inflamai-me para sempre. E como posso temer não ser perdoado e receber a salvação de todas as graças de um Deus onipotente que me deu todo o seu sangue? Ah, meu Jesus, minha esperança, para não me condenardes, quisestes perder a vossa vida: não quero perder-vos mais, bem infinito. Se vos perdi no passado, eu me arrependo e no futuro não quero perder-vos mais, vós me ajudareis para que eu não vos perca mais. Senhor, eu vos amo e quero amar-vos sempre. Maria, depois de Jesus sois a minha esperança; dizei a vosso Filho que vós me protegereis e serei salvo. Amém.

365 dias com Padre Pio - frases para cada dia do ano

Dia 28/2 - No momento das provas pronuncie sempre o nome de Jesus.

27 de fevereiro de 2024

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO XIII

Das últimas palavras de Jesus na cruz e de sua morte
 
1. Diz S. Lourenço Justiniano que a morte de Jesus foi a mais amarga e dolorosa dentre todas as mortes dos homens, porque o Redentor morreu na cruz sem o mínimo alívio. Nas pessoas que sofrem, a pena é sempre mitigada por qualquer pensamento ao menos de consolação; mas a dor e a tristeza de Jesus foram inteiramente puras, sem mistura de consolo, como diz o Angélico (III q. 46 a 6). Por isso S. Bernardo, contemplando Jesus agonizando na cruz, exclama: Meu caro Jesus, contemplando-vos sobre esse madeiro, dos pés até à cabeça não vejo senão dor e tristeza. Ó meu doce Redentor, ó amor de minha alma, por que quisestes derramar todo o vosso sangue, por que sacrificar a vossa vida divina por um verme ingrato como eu? Ó meu Jesus, quando será que eu me ligarei tão estreitamente a vós que não possa mais separar-me e deixar de vos amar? Ah, Senhor, enquanto vivo neste mundo, estou em perigo de negar-vos o meu amor e perder a vossa amizade, como tenho feito no passado. Ah, meu caríssimo Salvador, se, continuando a viver, terei de passar por esse grande mal, suplico-vos por vossa paixão, dai-me a morte agora que eu espero estar em vossa graça. Eu vos amo e quero amar-vos sempre.

2. Lamentava-se Jesus pela boca do Profeta que, quando agonizava na cruz, procurava quem o consolasse e não o encontrava (Sl 68,21). Os judeus e os romanos, mesmo quando ele estava para expirar, o maldiziam e blasfemavam. Maria Santíssima, sim, estava aos pés da cruz para dar-lhe algum alívio, se pudesse; mas essa mãe aflita e amorosa, com a dor que suportava pelos sofrimentos de Jesus, mais afligia a esse Filho que tanto a amava. Diz S. Bernardo que os sofrimentos de Maria contribuíram mais para atormentar o coração de Jesus. Quando o Redentor olhava para Maria assim atormentada, sentia sua alma transpassada mais pelas dores da Mãe que pelas suas próprias, como a mesma Santíssima Virgem revelou a S. Brígida: “Ele, vendo-me, mais se doía de mim que de si mesmo”. Do que conclui S. Bernardo: Ó bom Jesus, vós sofreis grandes dores no corpo, mas sofreis ainda mais no coração por compaixão com vossa Mãe.

3. Que sofrimentos, pois, não experimentaram esses corações amorosíssimos de Jesus e Maria, quando chegou o momento em que o Filho, antes de expirar, teve de se despedir de sua Mãe. Eis as últimas palavras com que Jesus se despediu neste mundo de sua Mãe: “Mulher, eis aí teu filho” (Jo 19,26), indicando-lhe João que lhe deixava por filho em seu lugar. Ó Rainha das dores, as recordações de um filho amado que morre são muito caras e não saem mais da memória de uma mãe. Recordai-vos que vosso Filho, que tanto vos amou, vos deixou a mim, pecador, por filho, na pessoa de João. Pelo amor que tendes a Jesus, tende piedade de mim. Eu não vos peço os bens da terra: vejo vosso Filho que morre em tantos tormentos por mim; vejo-vos a vós, minha Mãe inocente, sofrendo tantas dores por mim e vejo que eu, miserável réu do inferno, nada padeci pelos meus pecados por vosso amor. Quero sofrer alguma coisa por vós antes de morrer. Esta é a graça que vos peço e vos digo com S. Boaventura que, se vos ofendi, é de justiça que eu padeça por castigo, e seu eu vos servi, é justo que eu sofra por recompensa. Impetrai-me, ó Maria, uma grande devoção e uma recordação contínua da paixão de vosso Filho. E por aquele tormento que sofrestes, vendo-o expirar na cruz, obtende-me uma boa morte; assisti-me, minha Rainha, naquele último momento e fazei que eu morra amando e proferindo os santíssimos nomes de Jesus e Maria.

4. Vendo Jesus que não encontrava quem o consolasse neste mundo, levantou os olhos e o coração para seu Pai, para pedir-lhe alívio. Mas o eterno Pai, vendo seu Filho coberto com as vestes de pecador: Não, Filho, disse-lhe, não te posso consolar, já que estás satisfazendo a minha justiça pelos pecados de todos os homens; convém que agora eu te abandone aos teus sofrimentos e te deixe morrer sem conforto. E foi então que o nosso Salvador, elevando a voz, disse: “Deus meu, por que me abandonais”? (Mt 27,46). Explicando esta passagem, o Beato Dionísio Cartusiano diz que Jesus proferiu essas palavras com grande brado, para fazer todos compreenderem a grande dor e tristeza em que morria. E quis nosso amantíssimo Redentor morrer privado de toda consolação, acrescenta S. Cipriano, para nos demonstrar seu amor e atrair para si todo o nosso amor. Ah, meu amado Jesus, queixai-vos injustamente, dizendo: Meu Deus, por que me abandonastes? Perguntas por quê? E eu pergunto-vos: por que quisestes vos encarregar de pagar por nós? Não sabíeis que só pelos nossos pecados merecíamos ser abandonados por Deus? Com razão, pois, vos abandonou o vosso Pai e vos deixou morrer num mar de dores e de tristezas. Ah, meu Redentor, o vosso abandono me aflige e me consola: aflige-me, porque vos vejo morrer com tantos sofrimentos, mas consola-me dando-me confiança de que, pelos vossos merecimentos, não serei abandonado pela misericórdia divina, como eu merecia por vos ter abandonado tantas vezes para seguir os meus caprichos. Fazei-me compreender que, se para vós foi tão cruel o ser privado por breve tempo da presença sensível de Deus, qual seria o meu tormento se tivesse de ficar privado de Deus para todo o sempre. Por esse vosso abandono, suportado com tanta dor, não me abandoneis, ó meu Jesus, especialmente na hora de minha morte. Nesse momento em que todos me abandonarão, não me abandoneis, vós, meu Salvador. Sede então vós, meu Senhor desolado, o meu conforto nas minhas desolações. Bem sei que se vos amasse sem consolação, contentaria o vosso coração; conheceis, porém, a minha fraqueza, ajudai-me com a vossa graça. infundindo-me então perseverança, paciência e resignação.

5. Aproximando-se Jesus da morte, disse: :”Tenho sede”. Dizei-me, Senhor, de que tendes sede? pergunta Leão de Óstia. Vós não vos queixais dos imensos tormentos que sofrestes na cruze vos lamentais exclusivamente da sede? “Minha sede é a vossa salvação”, lhe faz dizer S. Agostinho (In ps. 33).Ó almas, diz Jesus, esta minha sede não é outra coisa que o desejo que tenho de vossa salvação. O Redentor amorosíssimo tem um ardente desejo de nossas almas e por isso ardia em se dar todo a nós por meio de sua morte. Foi essa a sua sede, escreve S. Lourenço Justiniano. E S. Basílio de Seleucia diz que Jesus Cristo afirma sentir sede, para dar-nos a entender que, pelo amor que nos tinha, morria com o desejo de padecer por nós mais ainda do que tinha padecido. Ó Deus amabilíssimo, porque nos amais, desejais que nós suspiremos por vós. “Deus tem sede de que tenhamos sede dele”, diz S. Gregório Nazianzeno (Tetr. Sent. 34). Ah, meu Senhor, tendes sede de mim, vilíssimo verme, e eu não sentirei sede de vós, meu Deus infinito? Pelos merecimentos dessa sede suportada na cruz, dai-me uma grande sede de vos amar e de comprazer-vos em tudo. Prometestes que nos atenderíeis em tudo o que vos pedíssemos: Pedi e recebereis. Eu vos peço este dom de vosso amor. Eu não o mereço, mas será essa a glória de vosso sangue, fazer vosso grande amigo um coração que durante tanto tempo vos desprezou; fazer todo chamas de caridade um pecador todo cheio de lama e de pecados. Fizestes muito mais do que isto, morrendo por mim. Ó Senhor infinitamente bom, eu desejaria amar-vos tanto quanto vós o mereceis. Regozijo-me do amor que vos têm tantas almas abrasadas e mais ainda do amor que tendes por vós mesmo, ao qual uno o meu, embora fraquíssimo. Amo-vos, ó Deus eterno, amo-vos, ó amabilidade infinita. Fazei que eu cresça cada vez mais no vosso amor, repetindo sem cessar atos de amor e esforçando-se par vos agradar em todas as coisas sem intermitência e sem reserva. Fazei que, apesar de miserável e pequenino como sou, seja pelo menos todo vosso.

6. Nosso Jesus, já estando para expirar, disse com voz moribunda: “Tudo está consumado”. Enquanto profere essa palavra, rememora em sua mente todo o decorrer de sua vida: viu todas as fadigas que experimentara, a pobreza, as dores, as ignomínias suportadas, oferecendo-as todas novamente a seu eterno Pai pela salvação do mundo. Depois, voltando-se para nós, repetiu: “Tudo está consumado”, como se dissesse: Ó homens, tudo está consumado tudo está completo: concluída a vossa redenção, satisfeita a divina justiça, aberto o paraíso. “Eis o teu tempo, e o tempo dos amantes” (Ez 16,8). É tempo, finalmente, ó homens, de começardes a amar-me. Amai-me, pois, amai-me porque nada mais me resta fazer para ser amado por vós. Vede o que fiz para conquistar o vosso amor: por vós levei uma vida tão cheia de tribulações; no fim de meus dias, antes de morrer, consentiem que me tirassem todo o meu sangue, me escarrassem no rosto, lacerassem as carnes, coroassem de espinhos, chegando até aos horrores da agonia neste lenho, como estais vendo. Que falta ainda? Só falta que eu morra por vós; pois bem: quero morrer: Vem, ó morte, dou-te licença de tirar-me a vida pela salvação de minhas ovelhas. E vós, ovelhas minhas, amai-me, porque nada mais posso fazer para me fazer amar. Tudo está consumado, diz Tauler, tudo o que a justiça exigia, o que requeria a caridade, tudo o que se podia fazer para patentear o amor (De vita et pass. Salv. c. 49). Pudesse dizer também eu ao morrer, meu amado Jesus: Senhor, realizei tudo, fiz tudo que me impusestes, levei com paciência a minha cruz, tudo vos satisfiz. Ah, meu Deus, se tivesse de morrer agora, morreria descontente, porque não poderia repetir nenhuma dessas coisas de verdade. Mas hei de viver sempre assim, ingrato ao vosso amor? Dai-me a graça de contentar-vos nos anos que me restam, para que, quando chegar a morte, possa dizer-vos que ao menos desta data em diante executei a vossa vontade. Se vos ofendi pelo passado, a vossa morte é minha esperança. Para o futuro não quero mais atraiçoar-vos, mas é de vós que espero a minha perseverança. Por vossos merecimentos, ó meu Senhor Jesus Cristo, eu volo peço e espero.

7. Eis Jesus expirando na cruz. Contempla-o, minha alma, nas dores da agonia, a exalar o último suspiro. Contempla esses lhos moribundos, a face pálida, o coração que com lânguido movimento apenas palpita, o corpo que já se entrega à morte e esse bela alma que em breve deixará o corpo dilacerado. Já o céu se escurece, treme a terra, abrem-se os sepulcros. Que significam esses terríveis sinais? a morte do Criador do universo.

8. Por último, nosso Redentor, depois de haver recomendado sua bendita alma a seu eterno Pai, tendo primeiramente dado um grande suspiro partido de seu aflito coração, inclina a cabeça em sinal de obediência, oferece sua morte pela salvação dos homens e expira pela violência de dor, entregando seu espírito nas mãos de seu querido Pai. “E clamando com grande brado, Jesus diz: ‘Pai, em vossas mãos encomendo o meu espírito’. E dizendo isto, expirou” (Lc 23,46). Chega-te, minha alma, aos pés deste santo altar, no qual morreu sacrificado para te salvar o Cordeiro de Deus. Chega-te e pensa que ele morreu pelo amor que te consagrou. Pede quanto desejares ao teu Senhor morto e espera tudo. Ó Salvador do mundo, ó meu Jesus, eis a que estado vos reduziu o amor pelos homens; agradeço-vos o terdes querido perder a vida para que se não perdessem as nossas almas: agradeço-vos por todos, mas particularmente por mim mesmo. Quem mais do que eu se aproveitou do fruto de vossa morte? Eu, por vossos merecimentos, sem nem sequer o saber, tornei-me filho da S. Igreja pelo batismo: por vosso amor fui tantas vezes perdoado e recebi tantas graças especiais; por vós tenho a esperança de morrer na graça de Deus e de chegar a amar-vos no paraíso. Meu amado Redentor, quanto vos devo! Entrego minha pobre alma às vossas mãos traspassadas. Fazei que eu compreenda bem quão grande foi o amor que levou um Deus a morrer por mim. Desejaria morrer também por vós, Senhor, mas que compensação pode dar a morte de um escravo perverso à de seu Senhor e Deus? desejaria ao menos amar-vos quanto estivesse em mim, mas sem o vosso auxílio, ó meu Jesus, eu nada posso. Ajudai-me e pelos merecimentos de vossa morte fazei que eu morra a todos os amores da terra para que eu ame somente a vós, que mereceis todo o meu amor. Eu vos amo, bondade infinita, eu vos amo, meu sumo bem, e vos suplico com S. Francisco: “Morra eu, Senhor, pelo amor de teu amor, que te dignaste morrer pelo amor de meu amor”. Morra eu a tudo, ao menos por gratidão ao grande amor que me mostrastes, dignando-vos morrer por meu amor e para ser amado por mim. Maria, minha Mãe, intercedei por mim. Amém.

365 dias com Padre Pio - frases para cada dia do ano

Dia 28/2 - No momento das provas pronuncie sempre o nome de Jesus.

26 de fevereiro de 2024

Programação de Missas no Apostolado do IBP Curitiba

Na Casa do Padre: Olavo Bilac, 76
⛪️ 2ª feira, 26/02
07h30, Missa Rezada

⛪️ 3ª feira, 27/02
07h30, Missa Rezada

⛪️ 4ª feira, 28/02
07h30, Missa Rezada

18h00, exposição do Santíssimo
19h00, Conferência da quaresma
——————————————————
Na Capela, Rua Lamenha Lins, 2115, Rebouças
⛪️ 5ª feira, 29/02
18h30, Exposição do Santíssimo
19h30, Missa Rezada

⛪️ 6ª feira, 01/03
Primeira sexta-feira do mês
18h30, Hora Santa Reparadora
19h30, Missa Rezada

⛪️ Sábado, 02/03
08h30, confissões
09h00, Missa Rezada

⛪️ Domingo, 03/02
III Domingo da Quaresma

08h00, Confissões
08h30, Missa Rezada

09h30, Confissões
10h00, Missa Cantada

18h30, Confissões
19h00, Missa Rezada

365 dias com Padre Pio - frases para cada dia do ano

Dia 26/2 - Nunca desista diante das dificuldades.

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO XII

Da crucifixão de Jesus

1. Eis-nos chegados à crucificação, ao último tormento que deu a morte a Jesus Cristo, eis-nos no Calvário, feito teatro do amor divino, onde um Deus deixa a vida num mar de dores. “E depois de chegados ao lugar chamado Calvário, aí o crucificaram” (Lc 23,33). Tendo o Senhor chegado com grande dificuldade, mas ainda vivo ao monte, arrancaram-lhe pela terceira vez com violência suas vestes pegadas às chagas de sua carne dilacerada e o estenderam sobre a cruz. O cordeiro divino deita-se sobre esse leito de tormentos, apresenta aos carnífices suas mãos e seus pés para serem pregados e, levantando os olhos ao céu, oferece ao seu eterno Pai o grande sacrifício de sua vida pela salvação dos homens. Cravada uma mão, contraem-se os nervos, sendo por isso necessário que à força e com cordas se puxassem a outra mão e os pés ao lugar dos cravos, como foi revelado a S. Brígida, o que ocasionou a contorção e rompimento com dores horríveis dos nervos e das veias (Liv. 1, c. 10), de tal maneira que se podiam contar todos os ossos, como já predissera Davi: Atravessaram minhas mãos e meus pés e contaram todos os meus ossos (Sl 21,17). Ah, meu Jesus, por quem foram cravados vossas mãos e vossos pés sobre esse madeiro senão pelo amor que tínheis aos homens? Vós quisestes com a dor de vossas mãos traspassadas pagar todos os pecados que os homens cometeram pelo tato e com a dor dos pés quisestes pagar todos os passos que demos para vos ofender. Ó meu amor crucificado, abençoai-me com essas mãos traspassadas. Cravai aos vossos pés este meu coração ingrato, para que eu não me separe mais de vós e fique sempre minha vontade obrigada a amar-vos, já que tantas vezes se revelou contra vós. Fazei que nada me mova além de vosso amor e do desejo de dar-vos gosto. Ainda que vos veja suspenso nesse patíbulo, eu vos reconheço por senhor do mundo, pelo Filho verdadeiro de Deus e Salvador dos homens. Por piedade, ó meu Jesus, não me abandoneis mais no resto de minha vida e especialmente na hora de minha morte: nessa última agonia e combate com o inferno assisti-me e confortai-me para morrer no vosso amor. Eu vos amo, amor crucificado, eu vos amo de todo o meu coração.

2. Diz S. Agostinho não haver morte mais acerba que a morte da cruz (Tract. 36 in Jo), pois, como nota S. Tomás (P. III q. 46, a. 6), os crucificados têm os pés e as mãos transpassados, partes essas que sendo compostas de nervos, músculos e veias, são extremamente sensíveis à dor: e o só peso do corpo pendido faz que a dor seja contínua e se aumente sempre mais até à morte. Mas as dores de Jesus ultrapassavam todas as outras dores, pois, como diz o Angélico, o corpo de Jesus Cristo, sendo de delicadíssima compleição, era mais sensível e sujeito às dores: corpo que foi expressamente preparado pelo Espírito Santo para sofrer como ele predissera e conforme o atesta o Apóstolo: “Vós me preparastes um corpo” (Hb 10,5). Além disso, S. Tomás diz que Jesus Cristo suportou uma dor tamanha que só ela seria suficiente para satisfazer a pena que mereciam temporalmente os pecados de todos os homens. Afirma Tiepoli que na crucifixão deram vinte e oito marteladas sobre suas mãos e trinta e seis sobre seus pés. Minha alma, contempla o teu Senhor, contempla tua vida que pende desse madeiro: “E será tua vida quase pendente diante de ti” (Dt 28,66). Vê como naquele patíbulo doloroso, suspenso desses cravos cruéis, não encontra posição nem repouso. Ora se apóia sobre as mãos, ora sobre os pés, mas onde se firma aumenta a dor. Ora volve a dolorosa cabeça para uma parte, ora para outra, se a deixa cair sobre o peito, as mãos e os pés rasgam-se mais com o peso, se a deita sobre os ombros, estes ficam feridos pelos espinhos; se a apóia sobre a cruz, enterram-se os espinhos ainda mais na sua cabeça. Ah, meu Jesus, que morte horrível é a que sofreis. Meu Redentor crucificado, eu vos adoro nesse trono de ignomínia e de dores. Leio que está escrito nessa cruz que sois rei: “Jesus Nazareno, Rei dos judeus”. Mas afora este título de escárnio, qual outro sinal de vossa realeza? Ah, essas mãos cravadas, essa cabeça coroada de espinhos, esse trono de dores, essas carnes dilaceradas vos fazem conhecer por rei, mas rei de amor. Aproximo-me, pois, humilhado e contrito, para beijar vossos pés sagrados trespassados por meu amor; abraço essa cruz, na qual, vítima de amor, quisestes sacrificar-vos à justiça divina por mim, “feito obediente até à morte de cruz”. Ó feliz obediência, que nos obtém o perdão dos pecados. E que seria de mim, ó meu Salvador, se vós não tivésseis pago por mim? Agradeço-vos, meu amor, e pelos merecimentos dessa sublime obediência vos peço que me concedais a graça de obedecer em tudo à vossa divina vontade. Desejo o paraíso unicamente para sempre vos amar e com todas as minhas forças.
 
3. Eis que o rei do céu, suspenso naquele patíbulo, começa a expirar. Perguntemos-lhe com o profeta: “Que são essas chagas no meio de tuas mãos?” (Zc 13,6). Responde por Jesus o Abade Roberto: São sinais do grande amor que vos tenho, são o preço pelo qual eu vos livro das mãos dois inimigos e da morte. Ama, pois, ó alma fiel, ama a teu Deus que tanto te amou, e, se ainda duvidas de seu amor, olha, diz S. Tomás de Vilanova, olha para aquela cruz, para aquelas dores e aquela morte acerba que ele sofreu por ti e essas provas te farão conhecer claramente quanto te ama o teu Redentor (Conc. 3 dom. 17 p. Pent.). S. Bernardo ajunta que a cruz clama, clama cada chaga de Jesus que ele vos ama com verdadeiro amor. Ó meu Jesus, como vos vejo cheio de dores e triste! Tendes muita razão em pensar que vós tanto sofrestes, chegando até a morrer de dores nessa madeiro e que afinal tão poucas alas vos amarão. Ó Deus, ainda agora, quantos corações, apesar de a vós consagrados, não vos amam ou vos amam muito pouco. Ah, belas chamas de amor, vós que consumistes a vida de um Deus sobre a cruz, consumi-me também, consumi todos os afetos desordenados que vivem no seu coração e fazei que eu viva ardendo e suspirando exclusivamente por esse meu amado Senhor, que quer acabar a vida consumido pelos tormentos, por meu amor, num patíbulo infame. Meu amado Jesus, quero amar-vos sempre, e quero amar unicamente a vós, meu amor, meu Deus, meu tudo. tudo.

4. “Teus olhos verão o teu preceptor” (Is 30,20). Foi prometido aos homens poderem ver com os próprios olhos seu divino Mestre. A vida inteira de Jesus foi contínuo exemplo e escola de perfeição, mas sem nenhuma parte nos ensinou melhor suas mais belas virtudes do que sobre a cátedra da cruz. Como daí nos ensinou bem a paciência, especialmente no tempo das doenças, já que na cruz Jesus sofreu corajosamente com suma paciência as dores de sua atrocíssima morte. Aí, com seu exemplo nos ensinou uma estrita obediência aos divinos preceitos, uma perfeita resignação com a vontade de Deus e sobretudo ensinou-nos como se deve amar. O P. Paulo Segneri, o moço, escreve a uma penitente sua que escrevesse aos pés do Crucifixo: “Eis aqui como se ama”. Eis aqui como se ama, é o que parece dizer a todos o próprio Redentor do alto da cruz, quando nós, para não sofrer qualquer desgosto, abandonamos as obras de seu agrado e por vezes chegamos a renunciar até à sua graça e ao amor. Ele nos amou até à morte e não desce da cruz senão depois de ter deixado de viver. Ah, meu Jesus, vós me amastes até à morte: até à morte vos quero amar. No passado eu vos ofendi e traí muitas vezes. Senhor, vingai-vos de mim, mas com vingança de compaixão e amor: dai-me uma tal dor de meus pecados, que me faça viver sempre contrito e aflito por vos haver ofendido. Eu protesto preferir sofrer todos os males no futuro e vos desgostar. E que maior desgraça poderia suceder-me que vos desgostar a vós, meu Deus, meu Redentor, minha esperança, meu tesouro, meu tudo.

5. “E eu, quando for exaltado da terra, atrairei tudo a mim. Ora, isso ele dizia para indicar de que morte havia de morrer” (Jo 12,32). Jesus Cristo afirmou que, quando fosse levantado na cruz, ele com seus merecimentos, com seu exemplo e com a força de seu amor, haveria de atrair para si os afetos de todas as almas, segundo o comentário de Cornélio a Lápide. O mesmo escreve S. Pedro Damião: “O Senhor apenas foi suspenso na cruz e já atraiu todos a si pelo desejo de seu amor” (De inv. cruc.). E quem deixará de amar a Jesus que morre por nós na cruz, pergunta o mesmo Cornélio. Vede, ó almas remidas, assim nos exorta a S. Igreja, vede o vosso Redentor pregado naquela cruz, onde toda a sua figura respira amor e convida a amá-lo: a cabeça inclinada, para nos dar o ósculo de paz, os braços estendidos para abraçar-nos, o coração aberto para nos amar. Ah, meu amado Jesus, como minha alma podia ser tão cara aos vossos olhos, conhecendo vós as injúrias que de mim haveis de receber? Vós, para cativar o meu afeto, quisestes dar-me as provas extremas de amor. Vinde, ó flagelos, espinhos, cravos e cruz, que atormentastes as sagradas carnes de meu Senhor, vinde e feri meu coração. Recordai-me sempre que todo o bem que eu recebi e que eu espero, tudo me vem dos merecimentos de sua paixão. Ó mestre de amor, os outros ensinam com a voz, ao passo que vós, nesse leito de morte, ensinais com o sofrimento; os outros ensinam por interesse, vós por afeto, não buscando outra recompensa que a minha salvação. Salvai-me, amor meu, e que minha salvação seja a graça de sempre vos amar e agradar. Amar-vos é a minha salvação.

6. Enquanto Jesus agonizava sobre a cruz, os homens não cessavam de atormentá-lo com impropérios e zombarias. Uns lhe diziam: “Salvou os outros e não pode se salvar a si mesmo”. Outros: “Se é o rei de Israel, desça da cruz”. E que faz Jesus na cruz, enquanto o injuriam? Talvez pede a seu Pai que os castigue? Não, ele pede que lhes dê o perdão: “Pai, perdoai-lhes; não sabem o que fazem” (Lc 23,32). Para demonstrar seu imenso amor pelos homens, diz S. Tomás (p. III q. 47, a. 4), o Redentor pediu a Deus perdão para seus perseguidores. Pediu-o, pois eles depois de o verem morto se arrependeram de seus pecados: “Voltavam batendo no peito”. Ah! meu caro Salvador, eis-me aos vossos pés: eu fui um dos vossos mais ingratos perseguidores: pedi a vosso Pai para que ele me perdoe também a mim. É verdade que os judeus e os algozes não sabiam, ao crucificar-vos, o que faziam; eu, porém, muito bem sabia que, pecando, ofendia a um Deus crucificado e morto por mim. Mas o vosso sangue e a vossa morte me mereceram também a mim a divina misericórdia. Eu não posso duvidar de ser perdoado vendo-vos morrer para me obter o perdão. Ah, meu doce Redentor, lançai sobre mim um daqueles olhares amorosos que me dirigistes ao morrer por mim na cruz: olhai-me e perdoai-me todas as ingratidões com que tratei o vosso amor. Arrependo-me, ó meu Jesus, de vos ter desprezado. Amo-vos de todo o meu coração e, à vista de vosso exemplo, porque vos amo, amo também todos aqueles que me ofenderam. Desejo-lhes todo o bem e proponho servi-los e socorrê-los quanto me for possível por amor de vós, meu Senhor, que quisestes morrer por mim que tanto vos ofendi.

7. “Lembrai-vos de mim”, vos disse, ó meu Jesus, o bom ladrão, e foi consolado com vossa resposta: “Hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23,43). Lembrai-vos de mim, digo-vos também eu; recordai-vos, Senhor, que eu sou uma daquelas ovelhas pelas quais vós destes a vida. Consolai-me, fazendo-me sentir que me perdoastes, dando-me uma grande dor de meus pecados. Ó grande sacerdote, que vos sacrificastes a vós mesmo por amor das vossas criaturas, tende compaixão de mim. Sacrifico-vos de agora em diante a minha vontade, os meus sentidos, as minhas satisfações e todos os meus desejos. Eu creio que vós, meu Deus, morrestes pregado na cruz por mim. Caia sobre mim, vos suplico, o vosso sangue divino: ele me lave de todos os meus pecados; ele me abrase em vosso santo amor e me faça todo vosso. Eu vos amo, ó meu Jesus, e desejo morrer crucificado por vós que morrestes crucificado por mim. Eterno Pai, eu vos ofendi, mas eis vosso Filho que, preso a esse madeiro, vos satisfaz por mim oferecendo-vos o sacrifício de sua vida divina. Eu vos ofereço seus merecimentos que são todos meus, visto que ele mos deu; por amor deste Filho vos peço tenhais piedade de mim. A maior compaixão que vos suplico é que me concedais a vossa graça, que eu infelizmente tantas vezes desprezei de livre vontade. Arrependo-me de vos haver ultrajado e vos amo, meu Deus, meu tudo, e para vos satisfazer estou pronto a suportar toda espécie de opróbrios, de dores, de miséria e de morte.

25 de fevereiro de 2024

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO XI

Da condenação de Jesus Cristo e sua ida ao Calvário

1. Continuava Pilatos a escusar-se perante os judeus que não podia condenar à morte aquele inocente. Estes, porém, o atemorizaram, dizendo: “Se soltares a este, não és amigo de César” (Jo 19,12). Cego pelo temor de perder as graças de César, esse juiz desgraçado, depois de ter reconhecido e declarado Jesus Cristo tantas vezes inocente, o condenou finalmente à morte da cruz: “Então ele lhes entregou Jesus para que fosse crucificado”. Ó meu amado Redentor, suspira S. Bernardo, que delito cometestes para ser condenado à morte e morte de cruz? Mas eu bem compreendo, replica o santo, o motivo de vossa morte; sei que pecado cometestes: “O vosso pecado é o vosso amor”. O vosso delito é muito amor que consagrastes aos homens; é ele e não Pilatos que vos condenou à morte. Não, eu não vejo justo motivo de vossa morte, acrescenta S. Boaventura, senão o afeto excessivo que nos tendes (Stim. div. am. p. 1 c. 2). Ah, um tal excesso de amor muito nos constrange, ó Senhor amabilíssimo, a consagrar-vos todos os afetos de nossos corações, diz S. Bernardo (In CT serm. 20). Ó meu caro Salvador, só o conhecimento de que vós me amais deveria fazer-me esquecido de todas as coisas para procurar exclusivamente amar-vos e contentar-vos em tudo. “Forte como a morte é o amor”. Se o amor é forte como a morte, pelos vossos merecimentos, ó meu Senhor, dai-me um tão grande amor para convosco que me faça detestar todas as afeições terrenas. Fazei-me compreender bem que toda a minha felicidade consiste em agradar a vós, Deus todo bondade e todo amor. Maldigo aquele tempo em que não vos amei; agradeço-vos porque me dais ainda tempo para vos amar. Amo-vos, Jesus meu, infinitamente amável e infinitamente amante; amo-vos com todo o meu ser e prometo-vos querer antes mil vezes morrer, que deixar de vos amar.

2. Lê-se a iníqua sentença de morte ao condenado Jesus: ele a ouve e humildemente a aceita. Não se queixa da injustiça do juiz, não apela para César, como fez S. Paulo; mas, inteiramente manso e resignado, se submete ao decreto do Pai Eterno, que por nossos pecados o condena à cruz. “Humilhou-se a si mesmo, feito obediente até à morte e morte de cruz” (Fl 2,8). E pelo amor que dedica aos homens contenta-se com morrer por nós. “Amou-nos e entregou-se a si mesmo por nós” (Ef 5,2). Ó meu compassivo Salvador, quanto vos agradeço! quanto vos sou obrigado! Desejo, ó meu Jesus, morrer por vós, pois que vós com tão grande amor aceitastes a morte por mim. Mas se não me é dado derramar o meu sangue por vós e sacrificar-vos a minha vida pelas mãos do carrasco, como o fizeram os mártires, aceito ao menos com resignação a morte que me está reservada, e aceito-a no modo e tempo que vos aprouver. Desde já eu vo-la ofereço em honra de vossa majestade e em desconto de meus pecados, e peço-vos pelos merecimentos de vossa morte que me concedais a dita de morrer amando-vos e na vossa graça.

3. Pilatos entrega o inocente cordeiro às mãos daqueles lobos para que com ele façam o que quiserem: “Entregou Jesus à sua vontade” (Lc 23,25).Os algozes agarraram-no com fúria, arrancam-lhe dos ombros o farrapo de púrpura, como lhes insinuaram os judeus, e restituem-lhe suas vestes (Mt 27,31). Isso fizeram, diz S. Ambrósio, para que Jesus fosse reconhecido ao menos pelas vestes, visto estar seu belo rosto tão deformado pelo sangue e pelas feridas, que sem as suas vestes dificilmente poderia ser reconhecido. Tomam, entretanto, dois toscos pedaços de madeira, formam com eles às pressas uma cruz de quinze pés (como afirmam S. Boaventura e S. Anselmo) e colocam-na sobre os ombros do Redentor. Mas, segundo S. Tomás de Vilanova, Jesus não esperou que a cruz lhe fosse imposta pelos algozes: ele mesmo a tomou avidamente com suas mãos e a pôs sobre os ombros chagados (Conc. 3 de uno M.). Vem, disse então, vem, cruz querida! Há trinta e três anos por ti suspiro e te busco; eu te abraço, te aperto ao meu coração, já que és o altar em que desejo sacrificar a minha vida por amor de minhas ovelhas. Ah! meu Senhor, como pudestes fazer tanto bem a quem vos fez tantos males? Ó Deus, quando eu penso que fostes obrigado a morrer pela veemência dos tormentos para me obter a amizade divina e que eu a perdi tantas vezes voluntariamente por minha culpa, quereria morrer de dor. Quantas vezes me haveis perdoado e eu tornei a vos ofender. Como poderei esperar perdão se não soubesse que morrestes para perdoar-me? Por essa vossa morte, pois, eu espero o perdão e a perseverança no vosso amor. Arrependo-me, meu Redentor, de vos haver ofendido; perdoai-me por vossos merecimentos, que eu vos prometo não vos dar mais desgosto. Eu estimo e amo a vossa amizade mais do que todos os bens do mundo. Por isso não permitais que eu venha a perdê-la de novo; dai-me, Senhor, qualquer castigo afora esse. Jesus meu, não quero mais perder-vos, prefiro perder a vida, quero amar-vos sempre.

4. A justiça sai com os condenados e entre eles caminha para a morte o rei do céu, o Unigênito de Deus, carregado com a cruz: “Levando sua cruz às costas, saiu para aquele lugar que se chama Calvário” (Jo 19,17). Saí também do céu, ó bem-aventurados Serafins, e vinde acompanhar o vosso Senhor que sobe ao Calvário, para aí ser justiçado em um patíbulo infame juntamente com os malfeitores. Ó espetáculo horrendo! um Deus supliciado! Este é o Messias que poucos dias antes foi aclamado Salvador do mundo e recebido pelo povo com aplausos e bênçãos, exclamando todos: “Hosana ao Filho de Davi, bendito o que vem em nome do Senhor” (Mt 21,9). Ei-lo agora preso, escarnecido e amaldiçoado por todos, com uma cruz às costas para morrer como um malfeitor. Ó excesso de amor divino! Um Deus supliciado pelos homens. Encontrar-se-á ainda um homem que não ame este Deus! Ó meu amoroso Jesus, tarde comecei a amar-vos, fazei que no restante de minha vida compense o tempo perdido. Já sei que tudo o que eu fizer é pouco em comparação do amor que vós me tendes tido, mas ao menos quero amar-vos com todo o meu coração. Grande injúria eu vos faria se, depois de tantas finezas, eu dividisse o meu coração e o repartisse com qualquer objeto além de vós. Eu vos consagro de hoje em diante toda a minha vida, a minha vontade, a minha liberdade. Disponde de mim como vos agradar. Peço-vos o paraíso, para lá amar-vos com todas as minhas forças. Muito quero amar-vos nesta vida, para muito vos amar na eternidade. Socorrei-me com a vossa graça; peço-vos e o espero pelos vossos merecimentos.

5. Imagina, minha alma, que vês passar Jesus nesse doloroso caminho. Assim como um cordeiro é levado ao matadouro, o amantíssimo Redentor é conduzido à morte (Is 53,7). Ele está tão esgotado e enfraquecido pelos tormentos, que apenas pode ter-se em pé. Ei-lo todo dilacerado pelas feridas, com a coroa de espinhos sobre a cabeça, com o pesado madeiro sobre os ombros e com um algoz que o puxa por uma corda. Caminha com o corpo curvado, com os joelhos trêmulos, gotejando sangue; anda com tanta dificuldade, que parece que a cada passo vai exalar a vida. Pergunta-lhe: Ó cordeiro divino, não estais ainda farto de dores? se com isso pretendeis conquistar o meu amor, deixai de sofrer que eu quero amar-vos como desejais. Não, responde-te, ainda não estou satisfeito: só então estarei contente quanto estiver morto por teu amor. E agora aonde ides, meu Jesus? Vou morrer por ti, não mo impeças; uma só coisa eu peço e recomendo: quando me vires morto sobre a cruz por ti recorda-te do amor que te dediquei; lembra-te disso e ama-me. Ó meu aflito Senhor, quanto vos custou o fazer-me compreender o amor que me consagrastes. Que vantagem vos poderia trazer meu amor, que para conquistá-lo quisestes sacrificar vosso sangue e a vida? E como pude eu, objeto de tão grande amor, viver tanto tempo sem vos amar, esquecido de vosso afeto? Agradeço-vos a luz que me dais agora e que faz conhecer o quanto me tendes amado. Eu vos amo, bondade infinita sobre todas as coisas; desejaria, se pudesse, sacrificar-vos mil vidas, que quisestes sacrificar a vossa vida divina por mim. Concedei-me aqueles auxílios que me haveis merecido com tantas penas para vos amar de todo o coração. Dai-me aquele santo fogo que viestes acender na terra, morrendo por nós. Recordai-me sempre da vossa morte, para que nunca mais me esqueça de vos amar.

6. “Foi posto o principado sobre o seu ombro” (Is 9,6). Diz Tertuliano que a cruz foi o nobre instrumento com que Jesus Cristo se adquiriu tantas almas, porque, morrendo nela, pagou a pena de nossos pecados e assim as resgatou ao inferno, fazendo-as suas. “O qual levou os nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro” (1Pd 2,24). Portanto, ó meu Jesus, se Deus vos carregou com os pecados de todos os homens: “Deus colocou nele a iniqüidade de todos nós” (Is 53,6), eu com os meus pecados vos tornei mais pesada a cruz que levastes ao Calvário. Ah, meu dulcíssimo Salvador, já então vistes todas as injúrias que eu vos faria e apesar disso não deixastes de me amar e de preparar-me tantas misericórdias que usastes para comigo. Se, pois, vos fui tão caro, apesar de vilíssimo e ingrato pecador que tanto vos ofendi, é justíssimo que vós também me sejais caro, vós, meu Deus, beleza e bondade infinitas, que tanto me tendes amado. Ah, se nunca vos tivesse desgostado! Conheço agora, ó meu Jesus, o mal que vos fiz. Malditos pecados, que fizestes? Fizeste-me contristar o coração amoroso de meu Redentor, coração que tanto me amou. Ó meu Jesus, perdoai-me que eu me arrependo de vos haver desprezado. Para o futuro sereis o único objeto de meu amor. Amo-vos, ó amabilidade infinita, como todo o meu coração, e estou resolvido a não amar a ninguém mais fora de vós. Senhor, perdoai-me e dai-me o vosso amor e nada mais vos peço. Digo-vos com S. Inácio: “Dai-me unicamente o vosso amor coma vossa graça e estou bastante rico”.

7. “Se alguém quiser vir após mim, abnegue-se a si mesmo e tome sua cruz e siga-me”(Mt 16,24). Visto que vós, inocente, meu amado Redentor, me precedeis com a vossa cruz e me convidais a seguir-vos com a minha, ide adiante que eu não quero deixar-vos só. Se no passado vos abandonei, confesso que procedi mal. Dai-me agora a cruz que vos aprouver, que eu a abraço, seja qual for, e com ela quero acompanhar-vos até à morte: “Saiamos fora dos arraiais, levando o seu impropério” (Hb 13,13). E como é possível, Senhor, que não amemos por vosso amor as dores e os opróbrios, se vós tanto os amastes por nossa salvação? Já que nos convidais a seguir-vos, queremos, sim, seguir-vos e morrer convosco, mas dai-nos, força para executá-lo: essa força vos pedimos por vossos merecimentos e a esperamos. Amo-vos, meu Jesus amabilíssimo, amo-vos com toda a minha alma e não quero mais deixar-vos. Basta-me o tempo em que andei longe de vós; ligai-me agora à vossa cruz. Se eu desprezei o vosso amor, disso me arrependo de todo o coração e agora vos estimo mais que todos os bens.

8. Ah, meu Jesus, quem sou eu que me quereis para vosso discípulo e me ordenais que vos ame e me ameaçais com o inferno se não quiser vos amar? E de que serve, dir-vos-eis com S. Agostinho, ameaçar-me com as penas eternas? Pois que maior desgraça me poderá assaltar do que não vos amar, Deus amabilíssimo, meu Criador, meu Redentor, meu paraíso, meu tudo? Vejo que por um justo castigo das ofensas que vos fiz mereceria estar condenado a não poder mais vos amar; mas vós, porque ainda me amais, continuai a mandar que eu vos ame, repetindo-me sempre ao coração: “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente”. Agradeço-vos, ó meu amor, este doce preceito e para obedecer-vos eu vos amo com todo o meu coração, com toda a minha alma, com toda a minha mente. Arrependo-me de não vos haver amado pelo passado e no presente prefiro toda pena à de viver sem vos amar, e proponho sempre procurar o vosso amor. Ajudai-me, ó meu Jesus, a fazer sempre atos de amor e a sair desta vida com um ato de amor, para que eu chegue a amar-vos face a face no paraíso, onde vos amarei sem imperfeição e sem intervalo, com todas as minhas forças por toda a eternidade. Ó Mãe de Deus, rogai por mim. Amém.

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A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO X

Do Ecce Homo

1. Pilatos, vendo o Redentor reduzido a um estado tão digno de toda a compaixão, pensou que a sua só vista comoveria os judeus e por isso, conduziu-o a uma varanda, levantou o farrapo de púrpura e, mostrando ao povo o corpo de Jesus coberto de chagas e dilacerado, disse-lhe: “Eis aqui o homem” (Jo 19,4). Ecce homo, como se quisesse dizer: Eis o homem que acusastes perante mim como se pretendesse fazer-se rei; eu, para vos agradar, condenei-o aos flagelos, ainda que inocente. “Eis o homem, não ilustre pelo império, mas repleto de opróbrio” (St. Ag. Trac. 11 in Jo 6). Ei-lo reduzido a tal estado que parece um homem esfolado ao qual restam poucos instantes de vida. Se, apesar de tudo, pretendeis que eu o condene à morte, afirmo-vos que não posso fazê-lo, porque não encontro motivo para o condenar. Mas os judeus, à vista de Jesus assim maltratado, mais se enfurecem: “Ao verem-no, os pontífices e ministros clamavam, dizendo: ‘Crucifica-o, crucifica-o’. Vendo Pilatos que não se acalmavam, lavou as mãos à vista do povo, dizendo: ‘Sou inocente do sangue deste justo: vós lá vos avinde’. E eles responderam: ‘Seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos” (Mt 27,23-26). Ó meu amado Salvador, vós sois o maior de todos os reis, mas agora eu vos vejo como o homem mais desprezado, dentre todos: se esse povo ingrato não vos conhece, eu vos conheço e vos adoro por meu verdadeiro rei e Senhor. Agradeço-vos, ó meu Redentor, por tantos ultrajes por mim recebidos e suplico-vos me deis amor aos desprezos e aos sofrimentos, já que vós os abraçastes com tanto afeto. Envergonho-me de haver no passado amado tanto as honras e os prazeres, chegando por sua causa a renunciar tantas vezes à vossa graça e ao vosso amor; arrependo-me disso mais que de todas as coisas. Abraço, Senhor, todas as dores e ignomínias que vossas mãos me enviarem; dai-me aquela resignação de que necessito. Amo-vos, meu Jesus, meu amor, meu tudo.

2. Assim como Pilatos daquela varanda mostrou Jesus ao povo, do mesmo modo e ao mesmo tempo o Eterno Pai nos apresentava do alto do céu o seu Filho dileto, dizendo-nos igualmente: Ecce homo. Eis aqui esse homem que é meu Filho muito amado, em quem me comprazi (Mt 3,17). Eis aqui o homem, vosso Salvador, por mim prometido e por vós há tanto desejado. Eis aqui o homem, o mais nobre dentre todos os homens, tornado o homem das dores. Ei-lo, vede a que estado de compaixão o reduziu o amor que vos consagra, e ama-o ao menos por compaixão. Contemplai-o e amai-o, ao menos vos movam essas dores e ignomínias que sofre por vós. Ah, meu Deus e Pai de meu Redentor, eu amo vosso Filho, que padece por meu amor, e eu vos amo a vós que com tão grande amor o entregastes a tantos tormentos por mim. Não vos recordeis de meus pecados com os quais tantas vezes vos ofendi e a vosso Filho: “Olhai para a face de vosso Cristo”, contemplai o vosso Unigênito coberto de chagas e de opróbrios para pagar os meus delitos e por seus merecimentos perdoai-me e não permitais que vos ofenda jamais. “Seu sangue caia sobre nós”. O sangue desse homem, que vos é tão caro, que por nós vos roga e suplica compaixão, que desça sobre as nossas almas e lhes obtenha a vossa graça. Odeio e amaldiçôo, ó Senhor, todos os desgostos que vos dei e amo-vos, bondade infinita, mais do que a mim mesmo. Por amor desse Filho, dai-me o vosso amor, que me faça vencer todas as paixões e sofrer todas as penas que vos agradar.

3. “Saí e vede, filhas de Sião, o rei Salomão com o diadema com que o coroou sua mãe no dia de suas bodas e no dia da alegria de seu coração” (Ct 3,11). Saí e vede o vosso rei com a coroa da pobreza, com a coroa da miséria”, diz S. Bernardo (Serm. 2 de Epip.). Oh, o mais belo de todos os homens, o maior de todos os monarcas, o mais amável de todos os esposos, a que estado está reduzido, todo coberto de chagas e de desprezos! Vós sois esposo, mas esposo de sangue (Êx 4,25), pois, por meio de vosso sangue e de vossa morte, quisestes esposar as nossas almas. Vós sois rei, mas rei de dores e rei de amor, pois a força de tormentos quisestes atrair os nossos afetos. Ó amantíssimo esposo de minha alma, oh! se eu me recordasse sempre do quanto padecestes por mim, não cessaria mais de vos amar e agradar. Tende piedade de mim que tanto vos custei! Em paga de tantas penas sofridas por mim, vos contentais com meu amor; por isso eu vos amo, ó Senhor infinitamente amável, eu vos amo sobre todas as coisas, mas eu vos amo pouco. Meu amado Jesus, dai-me mais amor, se quereis ser mais amado de mim. Desejo amar-vos muito; eu, mísero pecador, deveria arder no inferno desde o primeiro instante em que vos ofendi gravemente; vós, porém, me aturastes desde então, porque não quereis que eu arda nesse fogo desgraçado, mas no fogo bem-aventurado do vosso amor. Este pensamento, ó Deus de minha alma, me abrasa todo no desejo de fazer quanto em mim estiver para vos agradar. Ajudai-me, ó meu Jesus, e já que fizestes tanto, completai a vossa obra, fazei-me todo vosso.

4. Continuando os judeus a insultar o governador, gritando: “Tirai-o, tirai-o, crucificai-o”, disse-lhes Pilatos: “Então hei de crucificar o vosso rei?” E eles responderam: “Nos não temos outro rei senão César” (Jo 19,15). Os mundanos, que amam as riquezas, as honras e os prazeres da terra, renegam a Jesus Cristo por seu rei porque Jesus neste terra não foi rei senão de pobreza, de ignomínia e de dores. Se eles vos rejeitam, ó meu Jesus, nós vos elegemos por nosso único rei e vos protestamos: Não temos outro rei senão Jesus. Sim, amável Salvador, “vós sois meu rei”, sois e sereis sempre o meu único Senhor. De fato sois vós o verdadeiro rei de nossas almas, pois as criastes e as remistes da escravidão de Lúcifer. “Venha a nós o vosso reino”. Dominai, reinai, pois, sempre nos nossos pobres corações; que eles vos sirvam sempre e vos obedeçam. Que outros sirvam aos monarcas deste mundo com a esperança dos bens desta terra; nós queremos servir somente a vós, nosso rei aflito e desprezado, com a única esperança de vos agradar sem consolações terrenas. De hoje em diante nos serão caras as dores e as injúrias, que quisestes sofrer tantas por nosso amor. Dai-nos a graça de vos permanecer fiéis e para isso dai-nos o grande dom de vosso amor. Se vos amarmos, amaremos também os desprezos e as penas que tanto amastes e nada mais vos pediremos além do que vos suplica vosso fiel e devoto servo S. João da Cruz: “Senhor, sofrer e ser desprezado por vós. Senhor, padecer e ser desprezado por vós”. Minha mãe Maria, intercedei por nós. Amém.

23 de fevereiro de 2024

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A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO IX

Da coroação de espinhos

1. Continuando os soldados a flagelar cruelmente o inocente Cordeiro, conta-se que se adiantou um dos presentes e corajosamente disse-lhes: vós não tendes ordem de matar este homem, como o pretendeis. E assim dizendo cortou as cordas com que estava ligado o Senhor. Isto foi revelado a S. Brígida (Lib. 1 Rev., c. 10). Mas, apenas terminada a flagelação, aqueles bárbaros, instigados e corrompidos com o dinheiro dos judeus, como assegura S. João Crisóstomo, fazem o Redentor sofrer um novo gênero de tormentos: “Então os soldados do governador conduziram Jesus ao pretório e reuniram ao redor dele toda a corte; despiram-no e revestiram com uma clâmide vermelha e, tecendo uma coroa de espinhos, a puseram sobre sua cabeça e na sua mão direita uma cana (Mt 27,27-29). Os soldados, pois, o despiram novamente e, tratando-o como rei de comédia, lhe impuseram um manto carmesim, que outra coisa não era senão um pedaço de um velho manto de soldado romano, chamado clâmide; deram-lhe na mão uma cana em sinal de cetro e um feixe de espinhos na cabeça em sinal de coroa. Mas, ó meu Jesus, não sois vós o verdadeiro rei do universo? e como vos tornastes rei de dores e de opróbrios? Eis até onde vos levou o amor. Ó meu amabilíssimo Senhor, quando virá o dia em que eu me una tão intimamente a vós que nenhuma coisa possa separar-me de vós e não possa mais deixar de vos amar? Ó Senhor, enquanto vivo nesta terra, estou sempre em perigo de voltar-vos as costas e negar-vos o meu amor, como infelizmente o fiz no passado. Ah, meu Jesus, se virdes que eu, continuando a viver, hei de chegar a essa suma desgraça, fazei-me morrer agora que espero estar em vossa graça. Rogo-vos por vossa paixão não permitais que me suceda tão grande desgraça. Eu a mereci pelos meus pecados, mas vós não o merecestes. Escolhei para mim qualquer outro castigo, mas não esse. Ó Jesus, não quero ver-me outra vez separado de vós.

2. “E, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-lhe sobre a cabeça”. Bem reflete o devoto Landspérgio que este tomento de espinhos foi excessivamente doloroso, porque traspassaram toda a sagrada cabeça do Senhor, , parte sensibilíssima, já que da cabeça partem todos os nervos e sensações do corpo. Além disso, foi o tormento mais prolongado da paixão, pois Jesus suportou até à morte esses espinhos, tendo-os enterrados em sua cabeça. Todas as vezes que lhe tocavam nos espinhos ou na cabeça, se renovavam todas as dores. Segundo o sentir comum dos escritos, com S. Vicente Ferrer, a coroa foi entrelaçada de vários ramos de espinhos em forma de capacete ou chapéu, de modo que envolvia toda a cabeça e descia até ao meio da testa conforme foi revelado a S. Brígida (Lib. 4 Rev. c. 70). E, como afirma S. Lourenço Justiniano com S. Pedro Damião, os espinhos eram tão longos que chegaram até a penetrar no cérebro (De triumph. Cti. Ag. c. 14). E o manso Cordeiro deixava atormentar-se ao gosto deles, sem dizer palavras, sem se lamentar, mas, fechando os olhos pelo excesso de dor, exalava continuamente amargos suspiros, como um supliciado que está próximo da morte, conforme foi revelado à beata Ágata da Cruz. Tão grande era a abundância de sangue que corria nas feridas da sagrada cabeça que não se via em seu rosto senão sangue, segundo a revelação de S. Brígida: Várias torrentes de sangue corriam por sua face, enchendo seus cabelos, seus olhos, e sua barba, não se vendo outra coisa senão sangue (Lib. 4 Rev. c. 70). E S. Boaventura ajunta que não parecia ser mais a bela face do Senhor, mas a face de um homem esfolado. Ó amor divino, exclama Salviano, não sei como apelar-te, se doce, se cruel, pois pareceis ser ao mesmo tempo doce e cruel (Ep. 1). Ah, meu Jesus, o amor vos fez a mesma doçura para conosco, levando-vos avos mostrar tão apaixonado para com nossas almas, e ele vos tornou cruel para convosco, obrigando-vos a sofrer tormentos tão atrozes. Quisestes ser coroado de espinhos, para obter-nos uma coroa de glória no céu (Dion. Cart. In Jo 17). Meu dulcíssimo Salvador, espero ser vossa coroa no paraíso, salvando-me pelos merecimentos de vossas dores; “aí louvarei sempre o vosso amor e as vossas misericórdias: cantarei as misericórdias do Senhor eternamente, sim, eternamente”.

3. Ah, espinhos cruéis, ingratas criaturas, por que atormentais de tal maneira o vosso Criador? Mas que adiante acusar os espinhos? diz S. Agostinho. Eles foram instrumentos inocentes: nossos pecados, nossos maus pensamentos foram os espinhos cruéis que atravessaram a cabeça de Jesus Cristo. Aparecendo um dia Jesus a S. Teresa, coroado de espinhos, a santa pôs-se a pranteá-lo. Disse-lhe, porém, o Senhor: Teresa, não te deves compadecer das feridas que me fizeram os espinhos dos judeus, apiada-te antes das chagas que me fazem os pecados dos cristãos. Ó minha alma, tu também atormentaste a venerável cabeça de teu Redentor com teus maus pensamentos. Sabe e vê que má e amarga coisa é o haveres deixado o Senhor teu Deus (Jr 2,19). Abre agora os olhos e vê e chora amargamente tua vida inteira os males que fizeste, voltando as costas com tanta ingratidão ao teu Senhor e Deus. Ah, meu Jesus, não mereceis ser tratado por mim como eu vos tratei: Eu fiz mal, eu me enganei; desagrada-me de todo o coração, perdoai-me e dai-me uma dor que me faça chorar toda a minha vida os erros que eu cometi. Meu Jesus, meu Jesus, perdoai-me, que eu quero amar-vos sempre.

4. “E dobrando o joelho diante dele, o escarneciam, dizendo: Salve, rei dos judeus. Cuspindo-lhe no rosto tomavam-lhe a cana e batiam-lhe com ela na cabeça” (Mt 27,29). E S. João acrescenta: “E davam-
lhe bofetadas” (Jo 19,3). Depois de aqueles bárbaros haverem colocado na cabeça de Jesus aquela crudelíssima coroa, não se contentaram com enterrá-la com toda a força com as mãos, mas se utilizaram
da cana como de um martelo para fazer entrar mais profundamente os espinhos. Começaram, entretanto, a zombar dele, como rei de burla, saudando-o primeiramente de joelhos, como rei dos judeus, e em seguida, levantando-se, lhe escarravam na face, esbofeteavam-no com gritos e risos de desprezos. Ah, meu Jesus, a que miséria estais reduzido. Quem por acaso passasse então por aquele lugar e visse Jesus Cristo esvaído em sangue, coberto com aquele trapo vermelho, com o tal cetro na mão, com aquela coroa na cabeça e tão escarnecido e maltratado por aquela gentalha, não haveria de tê-lo pelo homem mais vil e celerado do mundo? Eis o Filho de Deus tornando então o vitupério de Jerusalém. Ó homens, se não quereis amar Jesus Cristo porque ele é bom e é Deus, exclama o beato Dionísio Cartusiano, amai-o ao menos pelas imensas penas que sofreu por vós (In cap. 27 Mt). Ah, meu caro Redentor, recebei um servo que vos abandonou, mas que, arrependido, agora para vós se volta. Quando eu vos fugia e desprezava o vosso amor, não deixastes de correr atrás de mim para atrair-me a vós; por isso não posso temer que me expulseis agora que vos busco, vos estimo e vos amo sobre todas as coisas. Fazei-me conhecer o que devo fazer para agradar-vos, pois estou pronto para tudo. Ó Deus amabilíssimo, quero amar-vos deveras e não quero desgostar-vos mais. Ajudai-me com vossa graça, não permitais que vos torne a abandonar. Maria, minha esperança, rogai a Jesus por mim. Amém.

22 de fevereiro de 2024

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO VIII

Da flagelação de Jesus Cristo

1. Entremos no pretório de Pilatos, convertido em horrendo teatro de ignomínias e dores de Jesus, e consideremos quanto foi injusto, ignominioso e cruel o suplício que aí sofreu o Salvador do mundo. Vendo Pilatos que os judeus continuavam a bradar contra Jesus, injustissimamente o condenou a ser flagelado: “Então Pilatos tomou a Jesus e mandou açoitá-lo” (Jo 19,1). Pensou esse iníquo juiz que com esse bárbaro tratamento despertaria a compaixão dos inimigos e o livraria da morte: “Eu o mandarei punir e depois o soltarei” (Lc 23,22). Era a flagelação castigo reservado só aos escravos. Nosso amoroso Redentor, diz S. Bernardo, não só quis tomar a forma de escravo, sujeitando-se à vontade de outrem, mas a de um mau escravo, para ser castigado com açoites e assim pagar a pena merecida pelo homem feito escravo do pecado (Sem. de pass. Dm.). Ó Filho de Deus, ó grande amante de minha alma, como pudestes vós, Senhor de infinita majestade, amar tanto um objeto tão vil e ingrato como eu sou, submetendo-vos a tantas para livrar-me do castigo merecido? Um Deus flagelado! Causa mais espanto um Deus sofrer o mais insignificante golpe do que os homens todos e todos os anjos serem destruídos e aniquilados. Ah, meu Jesus, perdoai-me as ofensas que vos fiz e castigai-me então como vos aprouver. Uma só coisa desejo: é amar-vos e ser amado por vós e declaro-me então pronto a sofrer todas as penas que quiserdes.

2. Chegado que foi ao pretório nosso amável Salvador, segundo a revelação de S. Brígida (1. c., c. 70) ele mesmo se despojou de suas vestes ao mando dos algozes, abraçou a coluna e entregou as mãos para serem ligadas. Ó céus, já se dá início ao cruel tormento! Ó anjos do céu, vinde assistir a este doloroso espetáculo e se não podeis livrar vosso Rei desse bárbaro ultraje, que os homens lhe fazem, vinde ao menos chorar de compaixão. E tu, minha alma, imagina-te presente a esta horrenda carnificina de teu amado Redentor. Contempla como teu aflito Jesus está com a cabeça baixa, olhando para a terra, e, todo confuso pela vergonha, espera por esse horrendo tormento. E eis que os bárbaros, como outros tantos cães raivosos, arremetem com seus açoites contra o inocente cordeiro. Ah! este bate-lhe no peito, aquele fere-lhe os ombros; um fustiga-lhe as ilhargas, outro golpeia-lhe as pernas: mesmo sua sagrada cabeça e sua bela face não ficam livres de pancadas. Já corre o divino sangue de todas as partes: já estão embebidos de sangue os azorragues, as mãos dos algozes, a coluna e a terra. “Todo o seu corpo é rasgado pelos açoites: ora os ombros, ora as pernas, são atingidas; chagas acrescentam-se a chagas e golpes a novos golpes” (De ch. ag. c. 14). Ah, cruéis, por quem o tomais? Cessai, cessai, sabei que vos enganastes. Esse homem a quem supliciais é inocente e santo: eu sou réu; a mim, que pequei, pertencem os açoites e os tormentos. Mas vós, Eterno Pai, como podeis sofrer essa grande injustiça? como podeis suportar que vosso Filho querido assim padeça? e não o socorreis? que delito cometeu ele para merecer um castigo tão vergonhoso e tão cruel?

3. “Eu o castiguei por causa dos crimes de meu povo” (Is 53,8). Muito bem eu sei, afirma o Padre Eterno, que meu Filho é inocente; visto, porém, que ele se ofereceu para satisfazer a minha justiça por todos os pecados dos homens, convém que eu o abandone ao furor de seus inimigos. Ó meu adorável Salvador, vós, para pagar os nossos delitos e em especial os pecados de impureza (que é o pecado mais comum entre os homens), quisestes que fosse dilacerada vossa carne puríssima. Quem não exclamará com S. Bernardo: “Ó caridade incompreensível do Filho de Deus para com os homens!” Ah, meu Senhor flagelado, agradeço-vos tão grande amor e arrependo-me de ter-me unido eu também, com os meus pecados, aos vossos algozes. Eu detesto, ó meu Jesus, a todos esses prazeres depravados que vos ocasionaram tantas dores. Oh! há quantos anos deveria estar queimando no inferno. Por que me esperaste até agora com tanta paciência? Vós me suportastes para que afinal, vencido por tantas finezas de amor, me rendesse ao vosso amor e deixasse o pecado. Meu amado Redentor, não quero resistir por mais tempo ao vosso afeto: quero amar-vos para o futuro quanto em mim estiver. Vós, porém, já conheceis a minha fraqueza, e as traições com que vos tratei: desprendei-me de todas as afeições terrenas que me impedem ser todo vosso; trazei-me continuamente à memória o amor que me consagrastes e a obrigação que tenho de amar-vos. Em vós ponho todas as minhas esperanças, meu Deus, meu amor, meu tudo.

4. Gemendo, exclama S. Boaventura: “Corre o sangue divino e as chagas sucedem-se às chagas e as fraturas às fraturas” (Med. vit. Chr. c. 76). Por toda parte escorria o sangue divino e seu corpo sagrado tornara-se uma única chaga, mas aqueles cães furiosos não cessavam de ajuntar feridas sobre feridas, como predissera o Profeta: “E sobre a dor de minhas chagas acrescentaram novas chagas” (Sl 68,27). Os azorragues não só cobriam de feridas seu corpo inteiro, como também arrancavam pedaços de carne, ficando essas carnes sagradas (totalmente rasgadas, podendo-se contar todos os ossos (Contens. 1. 10, d. 4, c. 1). Diz Cornélio a Lápide que nesse tormento Jesus Cristo deveria naturalmente morrer: quis, porém, com sua virtude divina conservar a vida, a fim de sofrer penas ainda maiores por nosso amor. Já S. Lourenço Justiniano havia afirmado a mesma coisa. Ah, meu amantíssimo Senhor, digno de um amor infinito, tanto sofrestes para que eu vos amasse! Não permitais que, em vez de vos amar, venha ainda a vos ofender e desgostar-vos. Mereceria um inferno à parte, se, depois de ter conhecido o amor que dedicastes, me condenasse miseravelmente, desprezando um Deus vilipendiado, insultado e flagelado por mim e que, além disso, me perdoou tão compassivamente depois de havê-lo ofendido tantas vezes. Ah, meu Jesus, não permitais. Ó Deus, o amor e a paciência que me mostrastes constituiriam no inferno um outro inferno para mim.

5. Este tormento da flagelação foi um dos mais cruéis para o nosso Redentor, porque foram muitos os algozes que o flagelaram, pois, segundo a revelação feita a S. Maria Madalena de Pazzi, foram uns sessenta (Vita c. 6). Ora, estes, instigados pelo demônio e ainda mais pelos sacerdotes, que temiam que Pilatos depois desse castigo pusesse o Senhor em liberdade, como já afirmara dizendo: “Castigá-lo-ei e pô-lo-ei em liberdade”, assentaram tirar-lhe a vida com os açoites. Acordam todos os doutores com S. Boaventura que escolheram para esse serviço os instrumentos mais bárbaros, de maneira que cada golpe abria uma chaga, como diz S. Anselmo, chegando os golpes a milhares, porque, segundo o Padre Crasset, a flagelação foi feita conforme o uso dos romanos e não dos judeus, aos quais era proibido ultrapassar o número de quarenta vergastadas (Dt 25,3). O historiador Flávio José, que viveu pouco depois de Nosso Senhor, diz que Jesus foi de tal maneira dilacerado na flagelação, que foram postas a descoberto as suas costelas. O mesmo foi revelado à S. Brígida pela Santíssima Virgem: “Eu, que estava presente, vi seu corpo flagelado até às costas, de modo que eram visíveis suas costelas. E o mais doloroso era que, ao retraírem-se, os azorragues vinham com pedaços de carne”. (Lib. I revel., c. 10). Apareceu Jesus flagelado a S. Teresa. Quis a santa vê-lo retratado tal que lhe aparecera e disse ao pintor que representasse no braço esquerdo um grande retalho de carne pendente. Mas de que maneira devo pintá-lo? perguntou o pintor. Voltando-se então para o quadro, viu-o com o retalho já pronto. Ah, meu Jesus amado e adorado, quanto padecestes por meu amor! Ah, que não sejam perdidas para mim tantas dores e tanto sangue!

6. Mas das mesmas Escrituras se deduz quanto foi desumana a flagelação de Jesus Cristo. Por que foi que Pilatos, depois da flagelação, o mostrou ao povo, dizendo: “Eis aqui o homem”, senão porque nosso Salvador estava reduzido a uma figura tão digna de compaixão, que ele só com o apresentar ao povo julgava mover à compaixão até seus mesmos inimigos, levando-os a não exigirem mais a sua morte? Por que foi que, ao subir Jesus ao Calvário, as mulheres judias o acompanharam com lágrimas e lamentos? (Lc 23,27). Talvez porque essas mulheres o amavam e o julgavam inocente? Não, as mulheres comumente seguem os sentimentos de seus maridos e por isso também elas o tinham como réu. O motivo era que Jesus, depois da flagelação, oferecia um aspecto tão lastimoso e deplorável, que movia às lágrimas até os que o odiavam. Por que foi que nesse mesmo caminho os judeus lhe tiraram a cruz dos ombros e a deram a Simão para carregar? Segundo se deduz claramente de S. Mateus: “A este constrangeram para que levasse a cruz de Jesus” (Mt 27,32) e de S. Lucas: “E puseram-lhe a cruz para que a levasse após Jesus” (Lc 23,26), fizeram eles isso, talvez, por piedade para com Jesus e porque queriam aliviar-lhe a pena? Não, pois esses iníquos odiavam-no e procuravam afligi-lo o mais possível. Mas, como afirma o B. Dionísio Cartusiano, temiam que lhes morresse no caminho. Vendo que Nosso Senhor perdera na flagelação quase todo o sangue e que estava tão privado de forças que quase não podia mais ter-se em pé, caindo por isso debaixo da cruz ao longo do caminho e a cada passo, por assim dizer, exalando um último suspiro, foram constrangidos a obrigar a Cireneu a levar a cruz, visto que o queriam vivo no Calvário e pregado na cruz, como haviam resolvido, para que seu nome ficasse para sempre inflamado. “Arranquemo-lo da terra dos vivos e seu nome não seja mais recordado”, segundo a predição do Profeta (Jr 11,19). Ah, Senhor, grande é a minha alegria sabendo quanto me tendes amado e que conservais por mim o mesmo amor que me tínheis no tempo de vossa paixão. Mas quão grande é a minha dor ao pensar que ofendi a um Deus tão bom. Pelos merecimentos de vossa flagelação, ó meu Jesus, vos suplico o meu perdão. Arrependo-me de vos haver ofendido e proponho antes de morrer que novamente vos ofender. Perdoai-me todas as ofensas que vos fiz e dai-me a graça de o futuro amar-vos sempre.

7. O profeta Isaías pinta-nos, mais claramente que todos os outros, o estado lastimoso a que foi reduzido nosso Redentor. Afirmou que sua santíssima carne na paixão não só seria toda dilacerada, mas também toda triturada e despedaçada (Is 53,5). Porque seu Eterno Pai, continua o Profeta, para dar à sua justiça uma maior satisfação e para fazer os homens compreenderem a malícia do pecado, não se contentou enquanto não viu seu Filho retalhado e pisado pelos açoites: “O Senhor quis quebrantá-lo na sua enfermidade” (Is 53,10), de maneira que o corpo bendito de Jesus tornou-se semelhante ao de um leproso, coberto de chagas dos pés à cabeça: “E nós o reputamos como um leproso ferido por Deus e humilhado” (Is 53,4). Ó meu Senhor dilacerado, a que estado vos reduziram nossas iniqüidades! “Ó bom Jesus, nós pecados e vós fostes castigado”, exclama S. Bernardo. Que a vossa imensa caridade seja para sempre bendita e vós amado como o mereceis por todos os pecadores e especialmente por mim, que vos desprezei mais do que os outros.

8. Apareceu uma vez Jesus flagelado a Sóror Vitória Angelini, e mostrando-lhe seu corpo todo ferido, disse-lhe: Estas chagas todas, Vitória, te pedem amor. E S. Agostinho, todo abrasado em amor, exclama: “Amemos o Esposo que tanto mais se nos recomenda, quanto mais disforme se nos apresenta e tanto mais caro e mais amável se mostra à sua esposa”. Sim, meu doce Salvador, eu vos vejo todo coberto de chagas: olho para vosso belo rosto, e, ó Deus, não me parece nada belo, mas horrível, denegrido pelo sangue, cheio de equimoses e escarros. “Não tem mais beleza, nem brilho e nós o vimos e não tinha mais aparência” (Is 53,2). Mas quanto mais desfigurado vos vejo, ó meu Senhor, tanto mais belo e amável me pareceis, pois sinais de que são essas deformidades, senão de ternura do amor que me tendes? Eu vos amo, ó Jesus, dilacerado e chagado por meu amor. Quisera ver-me também despedaçado por vós, como tantos mártires que tiveram tão feliz sorte. Se não posso agora oferecer-vos feridas e sangue, ofereço-vos ao menos todas as penas que me couberem em parte; ofereço-vos o meu coração, com o qual quero amar-vos o mais ternamente possível. E o que deverá amar com mais ternura a minha
alma senão a um Deus flagelado e exangue por mim? Eu vos amo, ó Deus de amor, eu vos amo, bondade infinita, amo-vos, ó meu amor, meu tudo: amo-vos, e não quero cessar mais de dizer, nesta e na outra vida: eu vos amo, eu vos amo. Amém.

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A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo Piedosas e edificantes meditações sobre os sofrimentos de Jesus

CAPÍTULO VII

Do amor de Jesus em sofrer tantos desprezos em sua paixão

1. Diz Belarmino que os espíritos nobres sentem mais com os desprezos que com as dores do corpo, pois se estas afligem a carne, aqueles atormentam a alma, a qual, sendo mais nobre que o corpo, tanto mais sente as ofensas que lhe são feitas. Mas quem poderia imaginar que a personagem mais nobre do céu e da terra, o Filho de Deus, vindo a este mundo por amor dos homens, tivesse de suportar deles tantos vitupérios e injúrias, como se fosse o último e o mais vil dos homens. “Nós o vimos desprezado e como o último dos homens” (Is 53,2). Assevera S. Anselmo que Jesus Cristo quis sofrer tantos e tão grandes desprezos que não podia ser mais humilhado do que o foi na sua paixão (In Fl 2). Ó Senhor do mundo, sois o maior de todos os reis e quisestes ser desprezado mais que todos os homens para ensinar-me a amar os desprezos. Já, pois, que sacrificastes a vossa honra por meu amor, quero sofrer por vosso amor todas as afrontas que me forem feitas.

2. E houve também uma espécie de afrontas que não sofresse na sua paixão o Redentor? Foi afligido por seus próprios discípulos. Um deles o atraiçoa e o vende por trinta dinheiros; um outro o renega mais vezes, protestando publicamente não o conhecer, atestando com isso envergonhar-se de o haver anteriormente conhecido. Os outros discípulos, vendo-o preso e ligado, fogem e o abandonam (Mc 14,50). Ó meu Jesus abandonado, quem tomará a vossa defesa se, no começo de vossa prisão, que vos são mais caros vos abandonam e fogem? E afinal, ó meu Deus, essa afronta não terminou com a vossa Paixão. Quantas almas, depois de se haverem dedicado ao vosso seguimento e serem favorecidas por vós com muitas graças e sinais especiais de amor, arrastadas por alguma paixão de vil interesse ou de loucos prazeres, vos abandonaram com ingratidão? Quem se encontrar ao número desses ingratos, diga gemendo: Ah! meu caro Jesus, perdoai-me que não quero mais abandonar-vos; prefiro perder mil vezes a vida a perder a vossa graça, ó meu Deus, meu amor, meu tudo.

3. Chegando Judas ao horto juntamente com os soldados, dirige-se para o mestre, abraça-o, beija-o. Jesus deixa-se beijar, mas, conhecendo seu pérfido desígnio, não pode deixar de se lhe queixar de sua pérfida traição, dizendo-lhe: Judas, é com um ósculo que entregas o Filho do homem? (Lc 22,48). E logo os insolentes ministros, seus comparsas, atropelam Jesus, põem-lhe a mão e o prende como a um malfeitor: Os ministros dos judeus prenderam a Jesus e o ligaram (Jo 18,12). Céus, que vejo? Um Deus preso: por quem? Pelos homens, por vermes criados por ele mesmo. Que dizeis isso , ó anjos do paraíso? Que têm convosco, pergunta S. Bernardo, as cadeias dos escravos e dos réus, convosco, que sois o Santo dos santos, o Rei dos reis e o Senhor dos senhores? (De Pass. c. 4). Mas se os homens vos prendem, por que vos não desligais e vos livrais dos tormentos e da morte que estes vos preparam? Eu o compreendo, não são tanto essas cordas que vos ligam, é o amor que vos prende e vos obriga a padecer e morrer por nós. “Ó caridade, quão fortes são os teus vínculos que prendem o próprio Deus, diz S. Lourenço Justiniano (Lg. vit. c. 6). Ó amor divino, só vós pudestes prender um Deus e conduzi-lo à morte por amor dos homens.

4. Contempla, ó homem, como esses cães arrastam sua vítima, diz S. Boaventura, e como ele os segue sem resistência como um mansíssimo cordeiro. Um o agarra, outro o liga; um o empurra e o outro o fere (Med. vit. Chr. c. 75). Preso, é nosso doce Salvador conduzido primeiramente à casa de Anás, depois à de Caifás, onde Jesus, sendo interrogado por esse malvado a respeito de seus discípulos e de sua doutrina, responde que não havia falado em segredo mas publicamente e que os mesmos que ali estavam presentes sabiam perfeitamente o que havia ensinado (Jo 18,20). A tal resposta um daqueles ministros, tratando-o de temerário, deu-lhe uma forte bofetada. Aqui exclama S. Jerônimo: Ó anjos do céu, como podeis guardar silêncio? será que tão grande paciência vos tornou mudos? Ah, meu Jesus, como é que uma resposta tão justa e tão modesta podia merecer uma afronta tão grande na presença de tanta gente? O indigno pontífice, em vez de repreender a insolência daquele atrevido, o louva ou ao menos dá-lhe sinais de aprovação. E vós, meu Senhor, sofreis tudo para pagar as afrontas que eu, miserável, tenho feito à divina Majestade com os meus pecados. Eu vos agradeço, ó meu Jesus! Eterno Padre, perdoai-me pelos merecimentos de Jesus.

5. Em seguida, o iníquo pontífice perguntou-lhe se ele era realmente o Filho de Deus: “Conjuro-vos pelo Deus vivo para que vos digais se sois vós o Cristo, Filho de Deus” (Mt 26,63). Jesus, por respeito ao nome de Deus, afirmou ser isso a verdade e então Caifás rasgou as vestes, dizendo que ele havia blasfemado. Todos gritaram então que ele merecia a morte. Sim, com razão, ó meu Jesus, eles vos declararam réu de morte, pois quisestes vos encarregar de satisfazer por mim, que merecia a morte eterna. Mas se com vossa morte me adquiristes a vida, é justo que eu empregue minha vida inteira e se necessário for a sacrifique por vós e vosso amor: socorrei-me coma vossa graça.

6. “Cuspiram-lhe então no rosto e deram-lhe bofetadas” (Mt 26,67). Depois de o julgarem digno de morte, como um homem já condenado ao suplício e declarado infame, aquela canalha pôs-se a maltratá-lo durante toda a noite com bofetadas, com golpes, com pontapés, arrancando-lhe a barba, cuspindo-lhe no rosto, motejando dele como dum falso profeta, dizendo-lhe: “Adivinha, ó Cristo, quem te bateu?” Tudo já predissera nosso Redentor por Isaías: “Entreguei meu corpo aos que me feriam e minha face aos que a laceravam; não desviei o rosto dos que me injuriavam e me cobriam de escarros” (Is 50,6). Diz o devoto Tauler ser opinião de S. Jerônimo que só no dia do juízo final serão conhecidas todas as penas e injúrias que Jesus sofreu naquela noite. S. Agostinho, falando das ignomínias sofridas por Jesus Cristo, diz: Se este remédio não curar a nossa soberba, não sei o que há de curá-la (Serm. 1 in dom. 2 quadr.) Ah, meu Jesus, vós tão humilde e eu tão soberbo! Senhor, dai-me luz, fazei-me conhecer quem sois vós e quem sou eu. Então suspiram-lhe no rosto! Ó Deus, que maior afronta, que ser injuriado com escarros! O último dos ultrajes é receber escarros, diz Orígenes. Onde se costuma escarrar, senão em lugares sórdidos? E vós, meu Jesus, sofreis escarros no rosto. Esses iníquos vos o maltratam com bofetadas e pontapés, vos injuriam e cospem no vosso rosto, fazem convosco o que querem e não os ameaçais, nem os reprovais: “O qual, sendo amaldiçoado, não amaldiçoava, sendo maltratado, não ameaçava, mas entregava-se àquele que o julgava injustamente” (1Pd 2,23). Como um cordeiro inocente, humilde e manso, tudo suportastes sem nenhum lamento, oferecendo tudo ao vosso Pai para nos obter o perdão de nossos pecados: “Como um cordeiro diante do que o tosquia, emudecerá e não abrirá sua boa” (Is 53,7). S. Gertrudes, meditando uma vez sobre as injúrias feitas a Jesus na sua paixão, pôs-se a louvá-lo e abençoá-lo; o Senhor com isso ficou tão satisfeito, que lho agradeceu amorosamente. Ah, meu Senhor ultrajado, sois o rei dos céus, o Filho do Altíssimo, não deveríeis ser maltratado, mas adorado e amado por todas as criaturas. Eu vos bendigo e dou-vos graças, amo-vos de todo o meu coração, arrependo-me de vos ter ofendido; ajudai-me e tende compaixão de mim.

7. Tendo amanhecido, os judeus conduziram Jesus a Pilatos, para que fosse condenado à morte. Pilatos declara-o inocente: “Não encontro nenhuma culpa neste homem” (Lc 23,4). E para ver-se livro dos insultos dos judeus, que continuavam a exigir a morte do Salvador, o envia a Herodes. Muito se alegrou Herodes por ter Jesus em sua presença, esperando que, para livrar-se da morte, haveria de fazer diante dele algum dos muitos prodígios de que ouvira falar. Fez-lhe por isso muitas perguntas. Mas Jesus, porque não queria livrar-se da morte, haveria de fazer diante dele algum dos muitos prodígios de que ouvira falar. Fez-lhe por isso muitas perguntas. Mas Jesus, porque não queria livra-se porque aquele malvado não merecia resposta, cala-se e não responde. Então esse rei soberbo o desprezou com toda a sua corte e, cobrindo-o com uma veste branca, para mostrar que o considerava um ignorante e insensato, o reenviou a Pilatos (Lc 23,11). O cardeal Hugo diz: Zombando dele como de um louco, vestiu-lhe uma túnica. E S. Boaventura: Desprezou-o como inepto, porque não fez milagres; como ignorante, porque não respondeu uma única palavra; como louco, porque se não defendeu. Ó Sabedoria eterna, ó Verbo divino, só vos faltava essa ignomínia de ser tratado de louco, privado de senso. Tanto vos interessa a nossa salvação, que por nosso amor quereis não só ser vituperado, mas saciado de vitupérios, como já profetizara a vosso respeito Jeremias: “Apresentará a face a quem o esbofetear e ficará saciado de opróbrios” (Lm 3,30). E como podeis amar tanto os homens, dos quais só ingratidões e desprezos recebeis? Ai de mim, que sou um desses que vos ultrajou mais do que Herodes. Ah, meu Jesus, não me castigueis como a Herodes, privando-me da vossa voz. Herodes não vos reconhecia por quem sois, eu vos proclamo meu Deus; Herodes não vos amava, eu vos amo mais do que a mim mesmo. Por isso não me recuseis as vozes das inspirações como eu merecia pelas ofensas que vos fiz. Dizei o que quereis de mim, que eu, com a vossa graça, estou pronto a executá-lo.

8. Reconduzido Jesus a Pilatos, o governador o apresentou ao povo, para saber a quem queriam libertar nessa páscoa, se a Jesus ou a Barrabás, o homicida. Mas o povo gritou: Não este, mas Barrabás. Ao que perguntou Pilatos: Que farei então de Jesus? Responderam: Crucifica-o. Que mal, porém, praticou este inocente? interroga Pilatos. Ao que replicam: Seja crucificado. Ó Deus! até agora a maior parte dos homens continua a dizer: Não este, mas Barrabás, preferindo a Jesus Cristo um prazer sensual, um ponto de honra, um desabafo de cólera. Ah, meu Senhor, vós bem sabeis que houve um tempo em que vos fiz as mesmas injúrias, quando vos pospus aos meus malditos prazeres. Meu Jesus, perdoai-me, que eu me arrependo de meu passado e de hoje em diante quero preferir-vos a todas as coisas. Eu vos estimo e vos amo acima de todos os bens; prefiro mil vezes morrer a abandonar-vos. Dai-me a santa perseverança, dai-me o vosso amor.

9. Falaremos depois dos outros opróbrios que Jesus Cristo teve de sofrer até morrer numa cruz: suportou a cruz, desprezando a ignomínia (Hb 12,2). Consideremos, entretanto, como em nosso Redentor se realizou perfeitamente o que dissera o Salmista, isto é, que ele se tornaria na sua paixão o opróbrio dos homens e o ludíbrio da plebe: “Eu sou um verme e não um homem, o opróbrio dos homens e a abjeção da plebe” (Sl 21,7), chegando a morrer coberto de vergonha, justiçado pela mão do carrasco num patíbulo, como um malfeitor, no meio de dois celerados: “E foi posto no número dos malfeitores” (Is 53,12). Ó Senhor altíssimo, tornado o mais baixo de todos os homens, exclama S. Bernardo; ó excelso tornado vil, ó glória dos anjos tornada o opróbrio dos homens!

10. Ó graça, ó força do amor de um Deus, continua S. Bernardo (Serm. de pass. Dm.). É assim que o senhor supremo de todos se fez o ínfimo de todos! E quem fez isto? O amor. Tudo fez o amor que Deus consagra aos homens, para nos patentear quanto ele nos ama e ensinar-nos com seu exemplo a sofrer pacientemente os desprezos e as injúrias. “Cristo padeceu por nós, diz S. Pedro, deixando-vos o exemplo para que sigais os meus vestígios (1Pd 2,21). Eleazar, perguntado por sua esposa como podia suportar com tanta paciência as injúrias que lhe eram feitas, respondeu: Eu me ponho a considerar Jesus desprezado e confesso que minhas afrontas nada são em comparação com as que ele, sendo meu Deus, quis suportar por amor de mim. Ah, meu Jesus, e como é que eu, à vista de um Deus tão ultrajado por meu amor, não sei suportar o mínimo desprezo por vosso amor? Pecador e soberbo! Donde, Senhor, me pode vir este orgulho? Ah! pelos merecimentos dos desprezos que sofrestes, dai-me a graça de suportar com paciência e alegria as afrontas e injúrias. Proponho de agora em diante com o vosso auxílio não mostrar mais ressentimento e receber com alegria todas as injúrias que me forem feitas. Outros desprezos mereci eu, que desprezei a vossa divina majestade e por isso mereci os desprezos do inferno. Vós, meu amado Redentor, me fizestes mui doces e amáveis as afrontas, abraçando tantos desprezos por meu amor. Proponho, além disso, para vos comprazer, beneficiar quanto puder quem me desprezar ou pelo menos dizer bem dele e rezar por ele. E agora vos suplico encher de graças aqueles de quem recebi alguma injúria. Eu vos amo, bondade infinita, e quero amar-vos sempre quanto eu puder. Amém.