31 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

ESPESSAS TREVAS

17 de outubro. Já não prefiro sentir fervor ou não senti-lo.
Abandono-me ao que Jesus quiser. Ofereci-me a ele como vítima.
Quero ser crucificada.
Jesus meu, sou toda tua. Entrego-me por completo à tua divina vontade. Dá-me a cruz, porém dá-me força para levá-la. Não importa que me dês o abandono do Calvário ou o gozo de Nazaré.
Só quero ver-te contente, a ti. Nada me importa não sentir, estar insensível como uma pedra; porque sei que tu sabes que te amo.
Dá-me a cruz. Quero sofrer por ti; porém, ensina-me a sofrer amando, com alegria, com humildade.
Senhor, se a ti agrada, que aumentem mais as trevas de minha alma. Que eu não te veja. Não me importará, porque quero cumprir a tua vontade. Quero passar a minha vida sofrendo para reparar os meus pecados e os dos pecadores; para que se santifiquem os sacerdotes. Não quero ser feliz, mas que tu sejas feliz.
Quero ser soldado para que possa dispor a cada instante de minha vontade e gostos. Quero ser ardente, forte, generosa no teu serviço, Senhor, Esposo de minha alma.

SOU MUITO ORGULHOSA

18 de outubro. Hoje tive de vencer-me muito. Tive raiva, so­frimento por desobedecer e fazer minha vontade. Aborreci-me e pensei que não tinha vocação. Que era uma ilusão, só uma ideia.
Que me desesperaria depois; enfim, tantas coisas.
Além disso, uma madre distribuiu doces para nós. E como me deu um pequeno, deu-me raiva e não o aceitei. E depois não aceitei o outro que me deu. Jesus querido, que dizes deste soldado tão covarde? Perdoa-me. De outra vez serei melhor. Lanço-me nesse imenso oceano de amor de teu coração para assim abismar minha pequenez na grandeza de tua misericórdia.
Noto que sou muito orgulhosa. Porém, dou graças a Deus, que me iluminou com sua graça. Quero ser humilde, esquecer-me de mim mesma inteiramente.

SEREI SERVA

29 de outubro. Amanhã é dia de recreio para as irmãzinhas.
Nós, as Filhas de Maria, vamos substituí-las fazendo o ofício de Marta. Amanhã vou servir, ser servente, serva, é o que me compete.
Hoje não comunguei. Que pena tenho! Jesus me faz falta.
30 de outubro. Servi como irmã o dia inteiro. Gostei. Parecia-me servir a Jesus.
Jesus- fez-me ver a necessidade que tem a carmelita de viver sempre ao pé da cruz para aprender ali a amar e sofrer.
Tenho pena, pois sempre que peço dinheiro ao meu pai, ele me diz que não tem. Que irá fazer quando tiver de me dar o dote para eu ser carmelita? Creio que não vai querer me deixar ir. Vejo tanta hostilidade contra elas . . . Jesus meu, confio em ti. És todo-poderoso. Vem roubar-me e que seja logo!

30 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SEMPRE LEMBRAMOS DE VOCÊ

Sempre lembramos de você. Não imagina o quanto sentimos sua falta, pois seríamos duplamente felizes se você, paizinho, estivesse aqui.
Fizemos muitos passeios. Domingo fomos à fazenda do Sr. Ricardo Salas com cinco meninas. Foi muito divertido. Têm uma magnífica quadra de tênis. Divertimo-nos o dia inteiro.
Amanhã parece que veremos levantar voo um aeroplano. De boa vontade subiria para aterrissar em São Xavier e ir dar-lhe um beijo e um abraço muito apertado.
Mamãe está muito bem; recordando-o muito; pois você faz muita, muitíssima falta. Esperamos tê-lo bem depressa entre nós.
Venha logo, paizinho, para passarmos pelo menos dois dias com você, já que nós aproveitamos tão pouco quando você vem, por estarmos internas (Santiago, 29-9-19 17) .

EM PERÍODO DE PROVAS

2 de outubro. Passaram as férias do 17. Que feliz me encontro de novo no colégio, sem haver dado o meu coração a ninguém, todo de Jesus! Que prazer sinto ao viver outra vez na casa de Jesus! Tenho-o tão perto. A cada instante voa meu espírito para os do tabernáculo.
Contudo, faz muito tempo que não sei o que é fervor. Ouço a voz de Jesus; mas não o vejo. Não sinto seu amor. Estou fria, insensível. Isto me serve para ver meu nada, minha miséria.
Estou num período de provas. Nosso Senhor quer que busque somente a ele, sem buscar consolo de· nenhuma espécie na oração.
Porém, eu lhe dou graças, pois assim dou-me a ele sem mistura de interesse, não pelas consolações, mas porque o amo. Contudo, te­nho momentos de desalento, pois parece-me que Nosso Senhor me envia isto por causa de minhas ingratidões. Mas quero que se cumpra a vontade de Deus. Se ele quer e isto lhe agrada, quero passar minha vida neste estado de aridez pelos pecadores e sacerdotes (Santiago, 8-1 1-1917).

NÃO SEI O QUE TENHO

3-10 de outubro. Estive muito dissipada. Que fazer com tanta miséria? Jesus meu, minha Mãe, compadecei-vos de mim; livrai-me da tibieza! Estou enferma na alma. Não sei o que tenho. Vou fazer retiro. Vou indagar as causas da minha tibieza. Serei melhor.
Jesus me pede que seja santa. Que faça com perfeição o meu dever. Que o dever - disse-me - é a cruz. E na cruz está Jesus; quero ser crucificada. Disse-me que salvasse almas. Eu o prometi.
Estive muito unida a Nosso Senhor. Contudo, fervor eu não sinto. Estou muito esquisita. Tenho vontade de me portar mal, me enraivecer, enfim, chorar. Creio que tudo provém do meu estado físico, estou muito cansada. Jesus me disse que não me preocupe porque disto não tenho culpa.

29 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SINTO-ME MORRER

Morro, sinto-me morrer. Ontem já não podia mais de dor no peito. Estava sufocando. Não podia respirar. Jesus meu, dou-me a ti. Ofereço-te minha vida por meus pecados e pelos pecadores.
Minha Mãe, oferece-me como hóstia!
Estou em casa. Tive de vir porque não podia mais. Amanhã vou comungar. Quanto o desejo. Jesus meu, sou tão má! Necessito de ti para ser boa. Vem, Amor. Vem depressa e te darei meu co­ração para receber a meu Jesus.
11 de setembro. Era aniversário de minha primeira comunhão, fui comungar. Foi ideal! Faz sete anos uniu-se minha alma com Jesus. Que efusão foi esse primeiro encontro! Jesus pela primeira vez falou à minha alma. Que doce era para mim aquela melodia, que pela primeira vez ouvi.

SOFRER, AMAR E ORAR

Dia 5 de setembro de 1917, de Santiago, escreveu sua primeira carta a madre Angélica, priora das Carmelitas de Los Andes.
Entre outras coisas, diz: A senhora, Madre, já sabe por Chela o carinho e estima que tenho pelas Carmelitas e o desejo que tenho de estar algum dia entre elas. Mas tropeço em muitas dificuldades. A principal é minha própria saúde. Entretanto, já encomendei este assunto à Santíssima Virgem e creio que ela há de abrir-me as portas desse bendito abrigo, se for vontade de Deus, pois, mais que tudo, só desejo isto.
Nunca conheci pessoalmente nenhuma carmelita. Só li a vida de Ir. Teresa e de Isabel da Trindade. Desde então compreendi que o Carmelo é um pedacinho do céu e que a esse monte santo me chamava Nosso Senhor.
Sei que, se for ao Carmelo, será para sofrer. Mas o sofrimento não me é desconhecido. Nele encontro minha alegria, pois na cruz encontra-se Jesus e ele é amor. E que importa sofrer quando se ama? A vida de uma carmelita é sofrer, amar e orar. Eis aí todo o meu ideal. Meu Jesus ensinou-me desde criança estas três coisas.

TUDO ME ABORRECE E CANSA

13. Ontem vim visitar Rebeca, e madre Esquerdo conseguiu que me deixassem ficar. Eu estava feliz pois, tinha ânsias de vir ao colégio.
Não sei o que acontece comigo. É uma tristeza interior tão grande que me sinto como que isolada de todo mundo. Enfim, ontem, graças a Deus, pude meditar e senti devoção e amor, o que há muito tempo não me dava o Senhor nem mesmo na comunhão.
Estes dois meses de sofrimentos são dois meses de céu. Tudo ofereci a Jesus e lhe pedi que me desse a sua cruz.
Tirei como resolução a de viver muito alegre exteriormente.
Procurei madre Esquerdo. Recomendou-me que fizesse tudo por amor. Que buscasse não os consolos de Deus mas o Deus das consolações.

28 de agosto de 2021

Programação de Missas do Apostolado do IBP em Curitiba

Na Capela São José de Chambéry:

⛪️ Domingo, 28/08
XIV Domingo pós Pentecostes

08h30, Missa Rezada
10h00, Missa Cantada
19h00, Missa Rezada
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Na Casa do Padre: Olavo Bilac, 76

⛪️ 2ª feira, 29/08
07h30, Missa Rezada

⛪️ 3ª feira, 30/08
07h30, Missa Rezada

⛪️ 4ª feira, 01/09
07h30, Missa Rezada
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Na Capela São José de Chambéry:

⛪️ 5ª feira, 02/09
18h30, Exposição do Santíssimo
19h30, Missa Rezada

⛪️ 6ª feira, 03/09
Primeira Sexta-feira do mês
18h30, Hora Santa reparadora
19h30, Missa Rezada

⛪️ Sábado, 04/09
08h30, Atendimento de Confissões
09h00, Missa Rezada

⛪️ Domingo, 05/09
XV  Domingo depois de Pentecostes

08h30, Missa Rezada
10h00, Missa Cantada
19h00, Missa Rezada

Deus abençoe!
Pe. Thiago, IBP

27 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

QUERO ENTRAR AOS 18 ANOS

Cheia Montes foi a Los Andes e mostrou suas cadernetas onde eu havia escrito. Então perguntaram-lhe muitos por mim. E madre Angélica mandou-me dizer que lhe escreva. Vou escrever-lhe.
Quinta-feira, 16. Jesus meu, perdoa-me. Sou tão orgulhosa que não sei aceitar com humildade a mais ligeira humilhação. Jesus querido, ensina-me a humildade e envia-me humilhações. Quero ser pobre, humilde, obediente, pura como era minha Mãe e como tu, Jesus. Faze de tua casinha um palácio, um céu.
Segunda-feira, 20. Sinto-me insensível, fria como o mármore, sem poder meditar e nem mesmo comungar com devoção. Jesus meu, ofereço-te isto por meus pecados e pelos pecadores e pelo Santo Padre e pelos sacerdotes. Uno-me ao teu abandono no Calvário.
Terça-feira, 22. Recebi carta do Pe. Colom. Fala-me da escolha do mosteiro. Por outro lado, dizem-me que não pense, pois falta muito. Mas só falta um ano. Quero entrar para o convento aos dezoito anos.

SERVIU PARA HUMILHAR-ME

Estávamos em instrução, quando uma abelha se aproximou de mim. Sem saber como, dei um salto e corri para fora da sala.
Depois tive vergonha de não ter sabido vencer-me, ofereci a humilhação a Deus, e entrei. Madre Esquerdo olhou-me tão firme e profundamente que eu teria preferido que a terra me tragasse. Depois fui pedir perdão à Madre. Confesso que me custou, porém dirigi-me a minha Mãe, e ela, como sempre, me ajudou. Dou graças a Deus por este acontecimento, pois não o ofendi, mas serviu para humilhar-me.
Fui me confessar. Disse-me o Padre que não me inquietasse com as distrações, que serviam para humilhar-me.
Quanto me custa acostumar-me a me colocar. por último em tudo. Jesus me disse que ele estava sempre em último lugar!
27-28 de agosto. Sinto a cada instante fadigas. - Várias vezes tive de pôr toda a minha vontade para não me deixar levar pela tris­teza. Ontem tirei este propósito da meditação: mostrar-me alegre todo o dia. E o cumpri. Quase não podia mexer-me. Creio que é por causa da fraqueza em que estou: uma dor de cabeça constante.
Além disso, a dor nas costas. Sinto-me cada dia pior, -Não tenho ânimo para nada. Porém é a vontade de Deus. Que se faça como ele quiser. Minha Mãe, tudo coloquei em vossas mãos.

PRIVAM-ME DO CÉU

Hoje, 30 de agosto, fui à comunhão. Jesus meu, tu és minha vida. Sem ti eu morro. Sem ti desfaleço.
Hoje me senti mal. As fadigas não me deixam. Que fazer, se é a vontade de Deus? Olhar meu crucifixo dá-me forças. Vejo tudo escuro. Só venço porque Jesus está dentro de minha alma.
Ele me ilumina. Quando comungo sinto ânimo. Jesus me dá vida, não só a da alma, mas a do corpo. E tiram-me a comunhão. Privam-me do céu. Jesus querido, que se faça a tua vontade!
10 de setembro. Enferma sempre. Apresenta-se triste o meu porvir, não o quero olhar. Disseram que me iam tirar do colégio e teria de debutar no próximo ano. Causa-me horror. E ver, por outro lado; que não poderei ser carmelita por causa de minha saúde; Tudo isto me faz exclamar: Jesus meu, se é possível, que se afaste de mim este cálice; mas não se faça minha vontade senão a tua!

26 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

O AMOR É CÉU

Que espanto causará à alma ver que desfigurou a imagem de seu Criador. Que confusão haverá, quando Jesus Cristo se apre­sentar! Lembra-te, Jesus, de que toda a minha vida só desejei ser tua. Não sei por que não me causa tanto espanto o Juízo, pois não acredito que as almas que tomaram e elegeram a Jesus por dono de seu coração sejam rechaçadas. Um esposo tem compaixão de sua esposa. Minha Mãe, "Spes unica", quando eu comparecer diante de meu Juiz, dize-lhe que sou tua filhinha!
O inferno me gela. Só uma coisa me causa mais horror do que tudo e é o que disse Sta. Teresa: "Os condenados não amarão".
Oh! O coração humano como sofrerá então, pois Deus o criou para ele! Odiar a Deus é o maior suplício. Jesus querido, acabo de ver o que é o inferno, o terrível que é. Porém te digo que preferiria estar ali por uma eternidade, contanto que uma alma, ainda que seja tão miserável quanto a minha, te ame. Sim, minha Mãe, repete-o a Jesus a cada batida de meu coração. Ainda que eu sei que já não seria o inferno, senão céu, pois o amor é céu.

VOCÊ NÃO COMETEU PECADO MORTAL

Fui ingrata. Perdão, Jesus querido! Sou indigna de teus celestiais olhares. Dá-me só um refúgio em teu divino Coração. Ali quero viver purificando-me com teu fogo abrasador.
Confessei-me dos pecados de toda a minha vida. Que confusão ao ver-me tão pecadora! Quase acreditei que ia morrer de dor.
E qual seria minha alegria ao ouvir que o Padre me dizia: "Você, pela graça de Deus, não teve a desgraça de cometer nenhum pecado mortal. Você se expôs, e Deus com amor a preservou. Dê-lhe graças de coração".
Fiquei muda. Como expressar o que passou por minha alma?
Naquele instante sentia amor. E esse amor era puro, virginal. Oh! que grande é a misericórdia de Deus para esta sua miserável esposa!
Quantas graças à minha Mãe!

QUEM AMA SE SACRIFICA

14 de agosto. Sinto tristeza, abatimento. Trato de reprimi-la.
Estou contente por outra parte, pois me encarregaram de uma turma de recreio. Estou feliz: é uma prova de confiança.
Sinto tão difíceis de cumprir os meus propósito. Porém Jesus me animou colocando diante de meus olhos seu rosto desprezado, humilhado. Peço-lhe que me dê forças. Quero ser sempre a última em tudo, ocupar o último lugar, servir os outros, sacrificar-me sempre e em tudo para unir-me Àquele que se fez servo sendo Deus, porque nos amava.
Creio que no amor está a santidade. Quero ser santa; logo me entregarei ao amor, já que ele purifica e serve para expiar. Quem ama não tem outra vontade senão a do Amado. Logo eu quero fazer a vontade de Jesus. Quem ama se sacrifica. Eu quero sacrificar-me em tudo. Não me quero dar nenhum gosto. Quero imolar-me constantemente para parecer-me com aquele que sofre por mim e me ama. O amor obedece sem réplica. O amor é fiel. O amor não vaçila. O amor é o laço de união de duas almas. Pelo amor me fundirei ern Jesus.

25 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

UMA VIDA NO CÉU

Estou lendo Isabel da Trindade. Encanta-me. Minha alma é parecida com a sua; ela foi santa, eu a imitarei e serei santa. Quero viver com Jesus no íntimo de minha alma. Quero viver uma vida de céu - como diz Isabel - sendo um louvor de glória:
- vivendo em comunhão íntima com o Esposo de minha alma, entregando-me a ele sem reservas;
- cumprindo em tudo a vontade de Deus. Cumprindo a cada instante com alegria o meu dever;
- vivendo em silêncio. Assim o Espírito Santo tirará sons harmoniosos, e o Pai, junto com o Espírito, formará a imagem do Verbo;
- sofrendo. Já que Cristo sofreu toda a sua vida, e foi louvor de glória de seu Pai, sofrerei com alegria por meus pecados e pelos pecadores;
- vivendo uma vida de fé. Olhando tudo sob o ponto de vista sobrenatural. Refletindo a Cristo como num cristal em nossas ações;
- vivendo em contínua ação de graças. Que nossos pensamentos, desejos e atos sejam uma ação perpétua de graças;
- vivendo em contínua adoração. E já que não podemos estar constantemente em oração, renovar a intenção.

MINHA PAIXÃO DOMINANTE

8 de agosto. Hoje entro em retiro. Jesus me disse que vai fazer uma revisão em sua casinha para limpá-la.
Senhor, não sei como pagar-te tantos benefícios que me concedes.
Desde agora quero ser-te fiel. Quero que todas as minhas ações sejam segundo tua vontade.
Tenho confusão e vergonha por tantos pecados que cometi.
Deus meu, perdão! E pensar que o germe de todos os pecados é a soberba, e essa é a minha paixão dominante . . . Que sou eu, Senhor, senão miséria, nada criminoso, que me levantei contra meu Criador? Que tenho eu, Senhor, que tu não me tenhas dado?
Compreendi que o que mais me aparta de Deus é meu orgulho.
Desde hoje quero e me proponho ser humilde. Sem humildade, as demais virtudes são hipocrisia; as graças recebidas de Deus tornam-se dano e ruína.
Quão diferentes são as coisas olhadas sob a luz da morte.
Aparecem em toda a sua realidade.

24 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SOU MUITO ORGULHOSA

Quarta-feira, 4. Sacrifiquei minha visita ao Santíssimo para distribuir os livros. Custou-me.
5 de julho. Não fui perfeita: na aula de francês conversei. Entretanto, me venci bastante. Amanhã farei um dia de retiro.
Necessito muito. Uno-me a Nosso Senhor, porém não o imito.
Ainda sou muito orgulhosa e me proporei abater até os últimos germes do amor-próprio. Não sei sobre o que se pode basear, pois sou um nada criminoso. Aprecio a estima das criaturas. Porém, para que servirá se Deus não me estima?
Sexta-feira, 10. Tratei de fazer o retiro. Tirei proveito da meditação, pois meditei sobre Deus e, quando penso nele, fico mergulhada no amor. Vejo sua grandeza infinita e minha extrema miséria.
Conversei com Jesus e deu-me a entender o nada das apreciações humanas. Um dia a acham boa; percebem amanhã um defeito, imediatamente a acham má. Para que serve que as criaturas a amem, a encham de honras, se Deus a despreza?

QUASE ME ABORRECI

Terça-feira, 10. As meninas da classe brincaram tanto comigo, que quase chorei. Além disso, estava com dor de cabeça e dor nas costas, que não sabia o que fazer. Não respondi porque não queria faltar ao silêncio. Ofereci ao menino Jesus.
Depois, no recreio, disse-lhes que haviam ultrapassado os limites, que não brincassem assim. Então, quase me aborreci, porém depois ficamos de bem e à tarde mandaram-me um santo. Custa-me aguentar brincadeiras. Fico com raiva. E as meninas dizem que tenho bom caráter, e é porque não me aborreço e brinco também, que elas as fazem. Sinto que cada dia me querem mais, e isto é porque lhes dou bom exemplo.

FOME DE JESUS

11 de julho. Estou de cama constipada. Não falei bastante com Jesus. Sinto-o dentro de minha alma. Esta manhã tinha fome de Jesus, pois não pude comungar e desde que vim de Chacabuco, só um dia deixei de comungar. São 149 comunhões.
13 de julho. Hoje completei 17 anos. Um ano a menos de vida. Um ano a menos de distância da morte, da união eterna com Deus. Um ano só para chegar ao porto do Cannelo. Oh! Quando me abrirás tuas portas sagradas!
Quantas graças me concedeu o Senhor e quão mal lhe pago.
Meu Jesus, perdoe-me minhas ingratidões.

FELIZ PORQUE SOFRIA

15 de julho. Sofri bastante ontem. Deram-me uns remédios que me provocaram dores, porém não me queixava. Estava feliz porque sofria. Sentia como se nas costas me enfiassem alfinetes, porém lembrava-me de meu bom Jesus, quando o açoitavam, e me sentia muito feliz sem manifestar minha dor.
Rebeca me disse que eu ia perder pontos, que iam examinar o meu caso e passar outra na minha frente. No princípio me preo­cupei, mas depois pensei que a Virgem me havia concedido os pontos e as classificações e agora era vontade de Deus que eu ficasse doente; que minha mãe estaria mais contente vendo-me re­signada. Fiquei contente e disse que esta era a vontade de Deus.
Disse que eu pedira à Virgem o prêmio e esperava com certeza que ela mo daria. E se não o deu, dar-me-ia o prêmio eterno, pois estava cumprindo o meu dever.
Hoje vou mostrar-me alegre quando me aplicarem os remêdios. Por Jesus!

23 de agosto de 2021

THESOURO DE PACIÊNCIA

DA CRUCIFIXÃO DO SENHOR


 MEDITAÇÃO III 

 Encravado o Senhor na cruz, o levantaram ao alto, e ficou nu e exposto em público, diante de um concurso imenso. Pondera, ó alma minha, quanto seria o pejo do Senhor, a mofa do povo, o sentimento da Virgem Mãe em semelhante ocasião; e depois de teres ponderado estas coisas, faze reflexão sobre ti. Se te vês despida dos bens do mundo, da pompa e luzimento, que talvez noutro tempo terias: se te vês afrontada, injuriada e feita ludibrio de todos, consola-te com a companhia que te faz o mesmo Rei da Glória. Muito maior pejo terás algum dia, se te vires na presença de Deus, despida de boas obras, e somente coberta com a confusão de teus pecados. Pelo contrario, essa confusão, que padeces agora por Jesus Cristo, levada por seu amor te servirá de vestidura preciosa, que te adorne na presença de Deus e dos seus anjos. Os opróbrios de Jesus Cristo converteram-se  em púrpura magnifica de Rei Supremo: deixa-te ser companheiro do Senhor nesta confusão que padeces e nestes desprezos, que também o serás na sua honra, e serás coroada no céu com coroa de glória imensa.

JACULATORIA - 

Ó meu Jesus, pelo pejo que sentistes, quando vos vistes nu, compadecei-vos do pejo que me cobrirá diante de vossa presença. 







22 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SÓ DEUS NÃO MUDA

Propus não nomear meu eu não falar de mim. Custa bastante mas o farei por Jesus! Todas as noites dou-lhe um beijo no qual lhe envio o meu ser.
Hoje procurarei fazer todo o bem possível. Amanhã é meu dia.
Talvez seja o último que passe no mundo. Oxalá que seja assim.
24 de junho. Sofri muito porque minha mãe só veio me abraçar às 10h30m depois de muitas. Todo o dia sofri porque desejava que me agradassem mais por ser meu dia. Os corações dos homens um dia amam e no outro são indiferentes. Só Deus não muda.

PENSARÁ QUE SOU MENTIROSA

A propósito do tumulto que se armou no colégio por ter falado da falta de uma religiosa.
26 de junho. Sofri. Quase não me atrevo a olhar para a madre Esquerdo porque penso que me considera uma mentirosa. Que fazer?
Eu o fiz porque tinha fundamento. Eu vi o que afirmei. Que Deus perdoe essa pessoa. Rezei por ela para que não caia mais. Ontem era tanto meu sofrimento que cheguei a ficar doente. De noite quase agonizava porém Jesus e minha Mãe me consolavam. Sofro tudo por ele. Foi tanta a impressão de ver faltar assim que duvidei da minha vocação porque pensei que tudo era hipocrisia.
Mas Jesus me disse que não tinha o que estranhar pois um dos apóstolos havia caído. Que rogasse por ela.
Disseram-me tantas coisas que acreditei haver perdido tudo.
Ainda me disseram coisas que madre Esquerdo pensava de mim.
Sofri muito, pois foi para evitar que uma monja desse mau exemplo que falei. Que se faça a vontade de Deus. Sou aquela que sou diante de Deus. Que importam as criaturas?

É TÃO BOM DAR

27 de junho. Fui a primeira em história. Estou feliz. Eu que jamais tinha prêmios, agora a Virgem mos dá. Eu os peço para dar gosto ao meu papai e mamãe e sobretudo porque será o último ano e quero deixar boa recordação.
28 de junho. Hoje soube da madre Rios. Mandou-nos recados.
Quero tanto bem a essa Madre que preciso me vencer para não amá-la tanto e não lhe escrever.
Hoje, graças a Deus, foi um dia perfeito. Eu me venci bastante, sobretudo porque estou muito esquisita. Tenho vontade de chorar, de me enraivecer, falar, gritar.
30 de junho. À noite chorei ao vê-lo na cruz, pregado por meu amor, e como ele é bom e como eu tenho sido ingrata.
Amanhã vou exercer meu apostolado.
Juntei 30 pesos para meu dia. Vou comprar sapatos para Juanito. O mais ficará com minha mamãe para dar aos pobres. É tão bom dar! Juanito era um menino muito pobre a quem ela sempre ajudou.
Inclusive, chegou a rifar seu relógio para obter fundos a fim de socorrê-lo.

O AMOR-PRÓPRIO QUE NUTRO

3 de julho. Saímos ontem. Passamos o dia com as meninas.
E nos divertimos muito, ainda que eu sofresse por ver que fazem brincadeiras com a Rebeca, e a Lúcia sai com ela, e comigo nada.
Gosto que a agradem; mas gostaria que me agradassem também.
Além disso a Lúcia convidou Rebeca para visitar as monjas, e a mim nada. E eu tinha muita vontade, mas me sacrifiquei, pois Jesus o pediu. Toquei piano porque me pediram.
Todo o sofrimento foi causado pelo amor-próprio que alimento.
Proponho matá-lo pela raiz. Que Jesus e Maria me ajudem.

21 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

DÁ-ME TUA CRUZ

Hei de esquecer-me de mim mesma, vivendo com Jesus no fundo de minha alma. Viver em união de pensamentos, de sentimentos, de ações. E assim, ao olhar-me, o Pai encontrará a imagem de seu Filho.
Devo contemplar em minha alma a Jesus crucificado. Eu o imitarei e receberei ao pé da cruz o sangue de meu Jesus, que hei de comunicar aos meus próximos. Jesus meu, tu conheces a oferta: que te fiz de mim mesma pela conversão das pessoas que te nomeei. Não só te ofereço a minha vida, mas também minha morte. Como te aprouver dar-me eu a receberei com gosto, seja no abandono do Calvário, seja no paraíso de Nazaré. Além disso, se quiseres, dá-me sofrimentos, cruz, humilhações. Que eu seja pisada para castigar meu orgulho e o deles. Como tu quiseres. Sou tua. Faz de mim segundo tua santa vontade.
Sofro. Esta palavra expressa tudo para mim. Felicidade! Quando sofro estou na cruz de meu Jesus. Que felicidade maior haverá do que dizer-lhe: "Jesus, meu esposo, lembra-te que eu sou tua esposa; dá-me tua cruz!"?

CHAMEI-AS DE ANTIPÁTICAS

Amanhã é o dia da Trindade. Encontrará o Pai a figura de Cristo em mim? Quanto me falta para parecer-me com ele! Não tenho bastante virtude; abato-me muito depressa.
Outro dia, portaram-se mal as meninas na mesa e eu me impacientei. Depois disseram-me que não era firme porque as deixava conversar. Eu disse que não fazia caso. Tive muita raiva e, ao ver as meninas, chamei-as de antipáticas. Jesus teria agido assim?
Claro que não. Ele as teria repreendido e não teria se desculpado, nem teria insultado como eu fiz. É certo que me venci muito. Depois contei minha raiva e, no outro dia, pedi perdão às meninas para humilhar-me. Estas quedas servem para eu reco­nhecer que sou ainda muito imperfeita.

COMO SOMOS INGRATOS!

19 de junho. Desde que tenho este crucifixo vivo mais unida a ele. Oh! quanto o amo! Eu me ofereci a ele pela conversão dessas pessoas. Quanto sofro ao pensar que Jesus as chama e elas permanecem insensíveis. Oh! Deus meu, quanto nos amas e que ingratos somos! Jesus meu, Esposo de minha alma, ofereço-me a ti, fazes de mim o que quiseres. Hoje eu me venci muito para não ficar com raiva. Deus meu, e tu me ajudaste. Eu te agradeço.
Nos arranjos e recreios fui perfeita. Porém, não tanto nas aulas.
Nosso Senhor me disse que não aceitaria minha oferta. Porém que me ouviria e concederia a conversão dessas almas, mas ainda vai demorar. Que me unisse a ele crucificado; que me queria. ver .crucificada.

NÃO FALAR JAMAIS DO MEU EU

Amanhã, dia de São Luís Gonzaga, vou fazer o voto de não cometer nenhum pecado voluntário. Jesus, _ ajuda-me a cumpri-lo.
Minha meditação foi boa. Meu Jesus me falou muito esta manhã.
Sua voz era tão doce. Eu o amo tanto. Sou toda dele. Vou fazer o propósito de não mencionar jamais o meu eu, nem para o bem, nem para o mal.
Quisera chorar de reconhecimento. Já se reconciliou com sua Igreja esse senhor. Ah! que bom és, Jesus meu, quanto te amo! Oh! Virgem minha Mãe tu me ouviste! Porém. peço-te mais: a perseverança e também a conversão do outro. Peço-te por Jesus.
Hoje fiz dois grandes atos de humildade. Quanto me custaram!
Mas a Virgem me ajudou. Outro dia no recreio fazíamos atos mudos. Então eu lhes disse que representássemos a madre assistente.
Não notei que era falta de caridade mas uma menina fez-me entender isto. Logo compreendi o quanto sou má: em vez de dar o bom exemplo incito as outras a pecar. Sou indigna de usar a medalha de Filha de Maria. Por fim pedi perdão às meninas pelo mau exemplo que lhes dei. Vou contar à madre Esquerdo para que me repreenda na congregação. Quero ser humilde com Jesus crucificado.

20 de agosto de 2021

THESOURO DA PACIÊNCIA

DA CRUCIFIXÃO DO SENHOR


MEDITAÇÃO II

 Estendido o Senhor na Cruz, começaram os judeus a encrava-lo com a maior crueldade: corria o sangue, alegravam-se os ímpios, afligia-se a Senhora: repetiam-se os golpes com sanha, com raiva, com impiedade: talvez errariam de indústria os cravos, descarregando o martelo sobre os dedos do Senhor. O' alma, que vives aflita, compara com esta a tua crucifixão: vê se tem comparação a má vontade com que o crucificam, com esse ódio que tu supões naqueles que te ofendem. O teu amor próprio talvez te fará crer grande malevolência nas criaturas que Deus busca para instrumentos do teu castigo; e isto é o que mais te custa. Ora põe os olhos na malevolência com que crucificam a teu Deus e Salvador, e vê como, não obstante isso, o Senhor emudece e sua Mãe sofre; e de um e outro aprenderás a ter sofrimento nas tuas perseguições.

JACULATORIA -

 Ó Virgem aflitíssima, pela paciência que tivestes nesta ocasião, peço-vos que me deis paciência para me deixar crucificar.

19 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

UM CAPITÃO MUITO ESPIRITUOSO

Passamos muito bem. Vivemos uma vida tranquila, que é o que mais aprecio.
Dia 2 de fevereiro são as manobras; por isto virá muitíssima gente e há um regimento que arruma os caminhos, seu capitão é muito espirituoso: diz versos e canta.
Não fizemos nenhum grande passeio, pois os meninos vão para a cordilheira por seis dias. Asseguro-te que os invejo com toda a alma. Eu te contarei que sei a batalha de Chacabuco às mil maravilhas, pois o capitão nos ensinou no local.
São interessantes umas escavações que fizeram no cemitério dos índios e encontraram pedaços de panelas e pratos, cujas pinturas são admiráveis. (Chacabuco, 17-1-19 1 7) .

EU TE INVEJO PELA COMUNHÃO

Não te escrevi porque deves saber que sou uma insigne preguiçosa.
Assim é que em tua próxima carta dou-te permissão para que me repreendas à vontade, pois eu o mereço.
Não andamos a cavalo senão dez vezes desde que estamos aqui. Que te parece? Quando antes íamos de tarde e de manhã.
A tarde costumamos sair a pé, e quase sempre vamos a uma ermida da Santíssima Virgem numa serra. Ali rezo e peço por ti.
Passamos os dias lendo e costurando debaixo das árvores . . . e rezando, é certo.
Dia 1 O teremos a felicidade de ir a Lourdes e creio firmemente que irei presenciar o milagre de Nanito. Peço-te que todos os dias rezes à Virgem até o dia 10. Asseguro-te que te invejo com toda a minha alma por causa da Sagrada Comunhão, pois, eu, faz justamente um mês que não comungo. Lembra-te de mim quando comungares (Chacabuco, 4-1-1917).

UM CÉU NO DESTERRO

12 de fevereiro. Anteontem e ontem fomos a Lourdes. Só esta palavra faz vibrar as cordas mais sensíveis do cristão, do católico.
Lourdes! Quem não fica comovido ao pronunciá-lo? Significa um céu no desterro.
Sim. Tu és, Mãe, a celestial Senhora que nos guia. Tu deixaste cair das tuas mãos maternais raios do céu. Não acreditava que existisse felicidade na terra; mas ontem meu coração sedento dela a encontrou. Minha alma, extasiada aos teus pés virginais, te escutava. Eras tu que falavas e tua linguagem de Mãe era tão terna, era do céu, quase divina.
Quem não se anima ao ver-te tão compassiva ao revelar-te os seus íntimos tormentos? Quem é que chora entre os teus braços, sem que receba imediatamente teus ósculos imaculados de amor e de consolo? Se é pecador, tuas carícias o enternecem. Se é teu fiel devoto, somente a tua presença acende a chama viva do amor divino. Sim, Maria, és a Mãe do universo inteiro.
Trata-se da Gruta de Lourdes de Santiago.

DAR FELICIDADE AOS OUTROS

Merecem destacar-se estas resoluções entre outras que Juanita escreveu em seu Diário, tomando-as da História de uma alma reparadora.
Devo esforçar-me por ser mais amável, sem me permitir jamais palavra alguma de mau humor e muito menos frases picantes.
Não desperdiçarei ocasião alguma em que possa dizer uma palavra amável e agradável aos demais. Como tampouco reprimirei os sorrisos que possam comprazer àqueles com quem trato.
Suportarei com paciência o caráter das pessoas, cujo trato me desagrade e contraria, mostrando-me mais atenta e serviçal com elas que com as demais.
Esmerar-me-ei em proporcionar felicidade aos outros. Procurarei tomar a virtude amável para os outros.

18 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

1917

Fiel ao propósito de fazer diariamente oração e de comungar sempre que possa, Juanita aprofundou-se no amor de Deus e foi conquistada plenamente por ele. E, como ama a Jesus, necessita imperiosamente assemelhar-se a ele, "fundir-se nele" de tal modo que, quando o Eterno Pai a contemple, encontre nela uma boa cópia de seu Filho. Tal é sua aspiração, que exige dela que viva não fazendo a sua vontade, mas sim a de Deus: e abrindo-se aos demais em atitude de serviço.
Nesta escola do amor a Cristo - melhor que na de certos guias espirituais amigos de complicar a vida cristã regulamentando-a excessivamente - Juanita aprende que este é o sacrifício e a cruz que agrada ao Senhor e nos santifica: viver configurando-nos com Cristo. Quer dizer, viver amando ao Pai e os homens, nossos irmãos.

E este amor é exigentíssimo. Obriga-nos a sair de nós mesmos para entrar nos planos de Deus, tão diferentes dos nossos. Impõe o controle de nossas tendências desordenadas que - desumanizando-nos - destruiriam a imagem de Deus que devemos ser. Exige o sacrifício de nossa comodidade e de nossos gostos para promover a felicidade alheia. Amor comprometedor, porém, que nos leva à plena realização, à maturidade humana e cristã, à liberdade dos filhos de Deus, superando o egoísmo e o temor servil. Por isso, seu único ideal é colaborar com Cristo na salvação dos homens; e não a assustam nem o juízo, nem o inferno, nem a morte. Como o amor vence o inferno, a morte é a porta para embriagar-se eternamente de amor divino. (Ver "o amor é céu", à p. 53.)

PERÍODO DE PROVAS

Ao fim do ano, Juanita confessa que se sente fria, árida, insensível, presa de uma tristeza interior intensa Fala-nos de abandono, de trevas espessas. E que após o prelúdio dos sofrimentos físicos - debilidade, fadigas, dores de cabeça e nas costas, entrou de cheio na purificação espiritual que os místicos chamam de "noite escura da alma". Algo assim como o purgatório em vida. Exigência também do amor, que no crisol de seu fogo elimina dolorosamente tudo o que impede a total configuração da alma com Cristo.

MIL VIDAS OFERECEREI

1º de janeiro. Um ano a mais a caminho da pátria. Quantos benefícios recebidos e quantas graças desperdiçadas no ano que passou.
2 de janeiro. Sofro. Sangra-me o coração. Ah! mil vidas, se eu pudesse, ofereceria por ele! Todos os sofrimentos, meu Deus, enviai-me e dai-me graças para suportá-los, contanto que ele se converta.
Todos os dias faço minha meditação e vejo quão grande ajuda é para alguém santificar-se. É o espelho da alma. Quanto se conhece nela a si mesma! A dificuldade para mim é o respeito humano: que me vejam meditando e me chamem de beata.
25 de janeiro. Hoje prometi a Jesus cumprir sua vontade divina, aceitando com alegria o que ele mandar. A esposa há de unir sua vontade à do esposo e submeter-se a ele. Com quanto mais razão, eu, que sou sua escrava e que por grande favor ele me fez filha, irmã e esposa. Quão má e pecadora me vejo!"

17 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SEREI CARMELITA

Escrevi a minha irmã Rebeca no dia de seu aniversário, 15 de abril de 1916, para comunicar-lhe minha vocação.
Um ano a mais de vida há de tornar-te mais séria e formal, e também há de ser motivo para refletir sobre a vocação. Hoje venho fazer-te confidências. Nossos corações, que haviam formado um só, amanhã talvez se separem.
Vou confiar-te o segredo de minha vida. Esse desejo que sempre abrigamos em nossa infância de viver sempre unidas será bem depressa suplantado por ideal mais alto. Teremos de seguir caminhos distintos na vida. Eu fui aprisionada nas redes amorosas do Divino Pescador. Sou sua prometida e logo celebraremos nossos desponsorios no Carmelo. Serei Carmelita.
Eu me entreguei a ele. Dia 8 de dezembro me comprometi.
Meu pensamento não se ocupa senão dele. É o meu ideal. Suspiro pelo dia em que irei ao Carmelo para não ocupar-me senão dele, para desaparecer nele e para não viver senão a vida dele: amar e sofrer para salvar as almas. Tenho sede de almas.
Não tenho necessidade de nada, porque em Jesus encontro tudo o que busco. Pede-lhe por mim, Rebequita. Necessito de orações.
Vejo que minha vocação é muito grande: salvar almas, dar operários para a vinha de Cristo. Eu, como comprometida, tenho de ter sede de almas. Oferecer a meu Noivo o sangue que, por cada uma delas, derramou.
Sem dúvida que o teu coração de irmã se despedaça ao ouvir-me falar de separação. Mas não temas, irmãzinha querida. Não existirá jamais separação em nossas almas. Eu viverei nele. Busca a Jesus e nele me encontrarás, e ali os três prosseguiremos os colóquios íntimos que haveremos de continuar na Eternidade. Convido-te a viver com Jesus no fundo de tua alma.
Diremos a Jesus que edifique em nossas almas uma casinha.
O eu é o Jesus que adoramos interiormente. Porém Jesus pede esse trono e é preciso dar-lhe. A caridade há de ser a arma para combater esse deus. Ocupemo-nos do próximo, de servi-lo, ainda que nos cause repugnância fazê-lo. Desta maneira conseguiremos que o trono de nossos corações seja ocupado por seu Dono. Que Jesus, que é um bom arquiteto, edifique uma segunda casa de Betânia, onde tu te ocuparás em servi-lo na pessoa de teus próximos, como fazia Marta, e eu, como Madalena, permanecerei contemplando-o e ouvindo sua palavra de vida.
Guarda-me o mais completo segredo. Tua irmã que te quer em Jesus. Juana.

QUERO SER DE DEUS

Retiro de 1916. Deus me manifesta sua vontade. Se eu a cumpro, o glorifico. Se ele é meu Pai e conhece o presente, o passado e o futuro, por que não abandonar-me a ele com inteira confiança?
O pecado é um monstro. Quantos pecados cometi na minha vida! e Deus não me castigou; antes pelo contrário, me tem cumulado de graças. Com que te pagarei, meu Deus? Aparta-te, ó pecado, de mim. Eu te aborreço com terrível ódio. Quero ser de Deus.
Jesus meu, desde agora me coloco em tuas divinas mãos. Faz de mim o que quiseres. Vi que só uma coisa é necessária: amar-te e servir-te com fidelidade; parecer-me e assemelhar-me em tudo a ti.
Nisto consistirá minha ambição. Quero passar contigo por todas as afrontas, com alegria. E se por fraqueza caio, Jesus querido, eu te olharei em tua subida ao Calvário e ajudada por ti me levantarei.
Não permitas que te ofenda nem mesmo levemente. Prefiro mil mortes a causar-te a mais ligeira pena.

16 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

SOFRER COM ALEGRIA

Sexta-feira, 22. Hoje voltamos ao colégio. Sinto desespero e uma vontade louca de chorar. A ti, Jesus meu, te ofereço este sofrimento, pois quero sofrer para parecer-me contigo, Jesus, meu amor.
Domingo, 24. Hoje, desde que me levantei, estou muito triste.
Parece que de repente meu coração se parte. Jesus me disse que queria que eu sofresse com alegria. Que ele havia subido ao Calvário e se havia deitado na cruz com alegria pela salvação dos homens. "Acaso não és tu que me buscas e queres parecer-te a mim? Portanto, vem comigo e toma a cruz com amor e alegria."
Isto custa tanto; porém basta que ele o peça para que eu procure fazê-lo. Aprecio o sofrimento por duas razões: a primeira porque Jesus sempre o preferiu. Segunda: porque sob o jugo da dor se embelezam as almas. Jesus, às almas que ele mais ama, envia este presente.

CARTA A VIRGEM

Encontro num caderno: "Meu espelho há de ser Maria. Posto que sou sua filha, devo parecer-me a ela e assim me parecerei a Jesus".
Também encontro uma carta que escrevi uma noite em que já não aguentava sofrer mais. "Minha Mãe quase idolatrada: escrevo para desafogar meu coração despedaçado pela dor. Não quero que juntes seus pedaços, Mãe de minha alma, senão que mane, que destile um pouco de sangue. A dor me sufoca. Minha Mãe, eu sofro; porém estou feliz sofrendo. Tirei a cruz de meu Jesus. Ele descansa. Que maior felicidade para mim?
Estou só, minha Mãe. Mamãe vai hoje para Viña ver o Inacinho, e nós ficaremos aqui. Até quando? Não sei. Até que Jesus o queira, não te parece? Sofro . . . e já não posso mais. Só te peço que cures os enfermos. Tu sabes quais são. Se queres, podes fazê-lo.
Mostra que és minha mãe. Ouve o grito da minha alma pecadora e arrependida que sofre e bebe o cálice da dor até o fundo. Mas que importa! Sofro, mas só quero a Jesus. Quero que ele seja o dono de meu coração. Dize-lhe que eu o amo, que o adoro. Dize-lhe que quero sofrer, quero morrer de amor e sofrimento. Que não me importa o mundo, mas somente ele.
Tu és minha mãe e te digo que sofro. Amanhã será quarta-feira e ninguém me chamará ao salão. Vem tu com teu Filho e minha felicidade será completa.
Faz que saiba minhas lições, minhas provas, meus exames.
Que receba prêmios para ver feliz a ti, a meu Jesus e a meu pais.
Maria, minha Mãe, ouve-me. Tua filha."

MEU ÚNICO AMOR

7 de setembro escrevi: "e amanhã o dia maior de minha vida. Serei esposa de Jesus. Quem sou eu e quem é ele? Oh! Jesus, meu amor, minha vida, meu consolo e alegria, meu tudo! Amanhã serei tua".
Minha Mãe, amanhã serei duplamente tua filha. Serei esposa de Jesus. Ele vai colocar em meu dedo o anel nupcial. Sou feliz, pois posso dizer com verdade que o único amor de minha vida tem sido ele.
Hoje, 8 de dezembro de 1915, com a idade de quinze anos, faço voto de não admitir outro Esposo senão a meu Jesus Cristo, a quem amo de todo o coração e a quem quero servir até o último momento de minha vida.

15 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

A NOIVA DE JESUS

Quarta-feira, 8. Hoje fizeram os votos duas noviças. Causou-me grande impressão. Diante da Santa Hóstia lhe prometeram ser suas esposas. Oh! que dignidade tão sublime! Quando poderei eu dizer ao mundo o meu último adeus! Também uma postulante recebeu o hábito. Pode-se dizer que é noiva de Jesus.
Estivemos com a madre Rios. Como gostei! E como faço o possível para representar-me que já estou no Carmelo, sentei-me no chão, aos pés da Madre; exemplo que seguiram várias meninas.
Domingo estarei a sós com madre Rios. Isto me assusta, pois penso contar-lhe toda a transformação que se operou em mim desde a operação, minha vocação para o Carmelo, enfim, tudo.
9 de outubro. Hoje me confessei. Que alivio! Tinha pecados que, embora involuntários, não gosto de tê-los. Como amo a Jesus, antes prefiro morrer do que ofendê-lo.

MAIS BONITA PARA JESUS

Domingo, 10. Disse a madre Rios que não estou nada acostumada e ela achou que o motivo está na idade em que entrei.
Sobre a operação, fez-me ver o grande fim a que me destinava Deus ao devolver-me a vida e os numerosos favores que me havia concedido.
Falei-lhe de meus flertes e ela me perguntou como pude flertar depois de tantos chamados de Deus. Que o amor humano se extingue, e o divino tudo abrange. Que cada vez que comungasse devia falar com Jesus Cristo sobre isto, e procurar ser cada dia mais bonita para ele, tendo mais virtudes. Que era Todo-poderoso aquele que se havia abaixado até mim para escolher-me para esposa.
Também disse-lhe que desejava entrar no Carmelo. E ela me perguntou: E a saúde? Poderá resistir? Ah! corpo miserável, que te opões aos desejos de minha alma! :Ês delicado. Fazem-te mal as austeridades e necessitas que te regalem. Porém meu Jesus fará o que quiser. Cumpra-se em tudo a sua santa vontade. Esta cruel incerteza é uma espécie de agonia para minha alma. Melhor, porque assim posso unir-me a meu Jesus no horto e consolá-lo um pouco.
Recomendou-me a vida de Sta. Teresa e de Teresinha do Menino Jesus. Eu disse que já li várias vezes e tiro tanto proveito, pois minha alma tem alguns pontos parecidos com a sua. E também porque eu, como ela, recebi muitos benefícios de Nosso Senhor, que pago tão mal a meu Jesus. Isto me enternece e prometo ser melhor.

ESTAMOS FELIZES

Terça-feira, 12. Festa de madre Esquerdo. Dia de recreio.
Estivemos muito contentes. Brincamos de esconde-esconde e depois com bandeirinhas, nós ganhamos. Leram os trabalhos do concurso de ortografia. Fui a primeira: por sorte, nenhum erro. Madre Rios riu comigo, o que me agradou muito.
Saímos hoje. Estamos felizes. Fomos confessar e depois à Alameda.
Porém, encontrava-me tão alheia a este passeio . . . pensava que ninguém pensaria nele. E eu procurava unir-me o mais possível.
Assim gozava.
Quarta-feira. Hoje fui à missa. Depois ao centro com a Lúcia.
De tarde fomos ver a Inês e Maria Salas. E as Salas Edwards.
A Cármen de Castro; porém não a encontrei. Só quando voltávamos a vi na rua. Abraçamo-nos. Estávamos felizes. Tanto tempo sem ver-nos. Gosto muito dela. Tem muitas qualidades.
Quinta-feira, 14. Encontro-me no campo. Andamos por toda a parte. Que felicidade!
Sábado, 16. Saímos cedo a cavalo com meus primos. E nos divertimos muito. Às duas, soltamos balões, o que aprecio muito.
Domingo, 17. Tivemos missa. Estive muito distraída, pois meus primos estavam no presbitério e nos olhavam e isto me tentava.

14 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

EU DEVO SEGUIR JESUS

Viemos em março e eu entrei no colégio.
No outro semestre minha mãe nos comunicou que entraríamos como internas. Apesar de meu sofrimento, não pude senão agradecer a Nosso Senhor que me prepara o caminho para que esteja mais acostumada a viver separada de minha família antes de entrar no Carmelo.
Acredito que jamais me acostumarei a viver longe de minha família: meu pai, minha mãe, esses seres que quero tanto. Entretanto, acaso viverei toda a vida sem separar-me deles? Assim o quisera eu: pagar-lhes com meus cuidados o que eles fizeram por mim. Porém a voz de Deus manda mais e eu devo seguir Jesus, ao fim do mundo se ele o quiser. Nele encontro tudo. Só ele ocupa meu pensamento, e tudo o mais fora dele é sombra, aflição e vaidade.

QUE SÉCULOS SÃO OS ANOS!

Hoje completo 15 anos. A idade em que todos gostariam de estar: as crianças para serem consideradas maiores, e os anciãos e os que passaram desta idade gostariam de voltar a ela por ser a mais feliz.
No ano que passou estive à morte, e deu-me a vida outra vez que fiz eu para receber este favor tão grande? Em que me ocupei nestes quinze anos?
Para uma mocinha é a idade mais perigosa. É a entrada no mar tempestuoso do mundo. Porém Jesus tomou o comando de minha barquinha e a retirou do encontro com outras naves; manteve-me solitária com ele. Por isso meu coração, conhecendo a este Capitão, caiu no anzol do amor, e estou cativa dele. Por ele deixarei tudo para ocultar-me atrás das grades do Carmelo, se for a sua vontade, e viver só para ele. Que dita! que prazer! É o céu na terra. Porém, por enquanto que séculos são os anos que se espera para dar-lhe o dulcíssimo nome de Esposo. Que tristes os dias de desterro! Porém ele está junto de mim e me diz com frequência: "Amiga muito querida". Isto me infunde ânimo e continuo esforçando-me para tomar-me menos indigna do título que levarei.

QUE SE TRANSFORME EM CINZAS O INTERNATO

2 de setembro de 1915. Hoje faz um mês e dois dias que nos disseram que entraríamos como internas. Ah! se soubessem como sofro se compadeceriam. Entretanto, devo consolar-me.
Sim! Podemos imaginar como deve ter sido lenta e dolorosa a adaptação à vida do internato. Suas cartas nô-lo mostram.
"Passeaste muito a cavalo? Eu, da minha parte, me despedi do ano passado cavalgando todos os dias. Temos feito grandes passeios e nos divertimos muitíssimo. Porém estes dias de felicidade virão a se obscurecer com esses tristes dias de colégio, que logo chegarão. Eu me desespero quando penso nisso" (Chacabuco, 8-2-1916) .
"Direi que faltam 7 dias - pensar? - só 7 dias para entrar nesse calabouço. Gela-me o sangue só de pensar. Se a gente está interna é muito desgraçada. Eu quero que sempre sejas feliz, ainda que eu sofra.  Quisera ver o internato em cinzas. (Chacabuco, 3-3-19 17).

13 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

PARECIAM-ME AÇOUGUEIROS

Em 8 de dezembro, senti que ia morrer. Desde esse dia caí de cama para levantar-me operada. Levaram-me ao pensionato de São Vicente, na 2ª-feira, 28. Só Deus sabe o que sofri. Ter de morrer fora de casa me atormentava. Por outra parte sentia grande repugnância de dormir em camas onde outros doentes haviam estado.
Comunguei às cinco da manhã. Que comunhão! Acreditava que era a última. Pedi a Nosso Senhor com toda minha alma que me desse coragem e serenidade. Que teria sido de mim sem o auxílio de Jesus?
Chegaram as meninas para ver-me. Joguei baralho com elas tranqüilamente; depois veio o doutor. Colocaram em mim uma quantidade de relíquias e subi para a maca. Tomei minha Virgem, abracei-me ao Crucifixo, beijei-o e disse-lhe: "Logo vos contemplarei face a face. Adeus".
Os médicos saíram. Pus-me a conversar tranquilamente, po­rém pareciam-me açougueiros. Mas Jesus venceu por mim.
Quando despertei, não sabia onde estava. Pensava que vinha do outro mundo, de tal modo que a cada pessoa que via, punha me a chorar. A dor era terrível e o clorofórmio causou-me terríveis efeitos. Porém, assim lembrava-me de oferecê-los a Nosso Se­nhor. Só um instante e nunca mais, me desesperei; imediatamente me arrependi.

1915-1916

Vai se apoderando de Juanita o desejo de ser esposa de Jesus.
Quer ficar cada dia mais bonita para ele. Fascina-a a ideia de com ele colaborar na tarefa da salvação do mundo. Sente-se feliz porque Jesus é seu único amor. Chama-o "meu Noivo". Dia 8 de dezembro de 1915 faz com enlevo, pela primeira vez, o voto de castidade.
Este ideal a faz passar sem contratempos a difícil fase da vida em que se encontra. E quando inevitavelmente paga o tributo à instabilidade e insegurança de seus quinze anos - raivazinhas, "vontade louca de chorar", tirará proveito de sua debilidade. Aceitando sua limitação, comprovará que necessita apoiar-se mais em Cristo para realizar suas aspirações.
Este- ideal lhe. dará também forças para adaptar-se à vida de interna, tão contrária a seu temperamento afetuoso e mimado. Chegou a chama-la de calabouço o internato.

CONTAR UMA RAIVAZINHA

Logo depois fomos a Chacabuco, que meu pai havia vendido.
Eu não podia andar a cavalo, o que me causava um sofrimento muito grande, pois Não há nada que eu aprecie tanto como cavalgar.
Ficamos lá muito tempo. Tivemos missa frequente e senti-me feliz.
Para maior humilhação, contarei uma raivazinha que tive. Foi tão grande que parecia que eu estava louca. Minha irmã e minha prima não quiseram tomar banho de mar conosco porque éramos muito pequenas. Desgostei-me porque me chamaram de criança e não queria ir, mas me obrigaram. Quando estávamos nos vestindo, chegaram as meninas para apressar-nos, porém respondi que não me vestiria enquanto elas não fossem embora. Elas não quiseram sair e minha mãe disse para me vestir e eu, teimosa, não quis.
Mamãe até me bateu. . . tudo inútil. Eu chorava. E era tanta a raiva que tinha, que queria voltar ao banho. Minha mãezinha começou a me vestir, e eu continuava furiosa. Quando fiquei pronta, me arrependi e fui pedir perdão a minha mãe, que estava muito triste por me ver assim e dizia que ia embora para Santiago. Não ia ficar com uma menina tão raivosa. Ela não quis me perdoar, e eu chorava, inconsolável. Mandou-me sair de seu quarto e fui me esconder para chorar livremente. Chegou a hora de tomar lanche e eu não queria ver ninguém, pois tinha dado muito mau exemplo. Não sei quantas vezes pedi perdão, até que minha mãe disse-me que observaria qual a minha conduta daí por diante.
Creio que deste pecado tive contrição perfeita, pois o tenho chorado não sei quantas vezes. E cada vez que me lembro, me en­tristeço de ter sido tão ingrata com Nosso Senhor que acabava de me dar a vida.
Sua mãe explica esta cólera pelo "grande nervosismo que lhe provocou o clorofórmio".

12 de agosto de 2021


THESOURO DE PACIÊNCIA

SEXTO PASSO

DA CRUCIFIXÃO DO SENHOR

MEDITAÇÃO  I

Chegando Jesus Cristo ao Calvário, começam os soldados a despi-lo impiamente, e lá vai pegada a carne sacro santa aos vestidos: mandam-lhe imperiosamente que se lance sobre a cruz para o encravarem nela, e obedece o Omnipotente. Pondera, alma minha, a prontíssima obediência do Filho de Deus a tão vis criaturas e a um preceito tão áspero; porém, era vontade do Eterno Pai, e o Senhor Jesus olhava aqueles verdugos como ministros executores, escolhidos por Deus para encherem os desígnios da sua altíssima Providência. Ora desengana-te, alma atribulada, que neste mundo essas criaturas, a quem estas entregue, são ministros do Altíssimo, que o Senhor destinou para que se cumprissem em ti os altos e louváveis desígnios da sua Providencia. Se te vês crucificada, ou seja imediatamente pela mão de Deus, ou pela das criaturas, sabe que de qualquer modo sempre é por ordem do teu Deus; pois as Santas Escrituras dizem, que Deus armara as criaturas para vingança de seus inimigos: tu não podes negar que tens sido inimigo de Deus; agora o Senhor armou as criaturas para te castigarem a ti e te crucificarem na tua cruz: logo, se confessas que é razão sujeitar-te a mão de Deus, também é razão sujeitar-te a das criaturas, que por ordem do mesmo Deus te vão crucificando. Dize, pois, a Deus no meio da tua angustia: Aqui me tendes, Senhor, aqui me tendes: crucifica-me como fordes servido e pela mão de quem quiserdes. E consola-te, que, se o Senhor te mandar agora crucificar neste mundo em companhia de seu Filho, algum dia, em companhia do mesmo, pela sua própria mão te há de coroar na Glória.

JACULATORIA. 

Meu Deus, essas criaturas, que me crucificam, são ministros da vossa Providencia: aqui estou, Senhor, aqui estou.

11 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

I

ATÉ MINHA PRIMEIRA COMUNHÃO

1900-1910

Em 1906 Jesus principiou a tomar o meu coração para si. Durante um ano preparei-me para fazer minha primeira comunhão. A Virgem ajudou-me a limpar meu coração de toda imperfeição.
Na Eucaristia está a vida de nossa alma. É o momento do céu no nosso desterro. Suspiremos por ela! (c 114).
Para uma carmelita, a Eucaristia é um céu; e deveria ser para toda alma que crê. E pensar que comungamos sem um mínimo afeto de amor! Jesus aproxima-se repleto de infinito amor e nós o recebemos friamente e só procuramos fazer-lhe pedidos, sem o adorar, sem chorar de agradecimentos aos seus divinos pés! (c 151).
A comunhão é um céu na terra para a alma que se compenetra do ato que faz. Tiremos Jesus da sua fria prisão e abriguemo-lo no nosso coração, tão pobre, tão cheio de amor! (c 128).

1910-1914

A Primeira Comunhão causou em Juanita um impacto que durou toda a sua vida.
Desde esse primeiro encontro, Jesus a reclama para si. E ela responde com generosidade. Sua humildade talvez a faça exagerar inconscientemente quando diz que, em 1913 "não fazia caso da voz" do Senhor que a chamava.
Se, de fato, houve alguma reserva nesse período na sua entrega, a enfermidade de apendicite e a operação a obrigaram a reagir e a colocar-se incondicionalmente nas mãos do Senhor.

FALAVA-ME O SENHOR

Todos os dias comungava e falava com Jesus longo tempo.
Desde que fiz minha primeira comunhão, Nosso Senhor me falava depois da comunhão. Dizia-me coisas que eu não suspeitava, e ainda quando eu perguntava, dizia coisas que iam acontecer, e aconteciam. Porém eu continuava pensando que acontecia o mesmo a todas as pessoas que comungavam, e uma vez contei a minha mãe. Ela respondeu-me que dissesse isto ao Pe. Coloro; porém eu tinha vergonha (Santiago, 24 de abril de 1919).
Minha devoção especial era a Virgem. Contava-lhe tudo. Desde esse dia a terra, para mim, não tinha atrativo. Eu queria morrer e pedia a Jesus que me levasse no dia 8 de dezembro.
Todos os anos ficava doente no dia 8 de dezembro. Aos doze anos tive difteria. Em 8 de dezembro estive à morte. Minha mãe pensou que eu estivesse morrendo, porque uma tia minha morreu disso e o meu estado era pior que o dela. Morreu aos doze anos.
Era uma santa desde pequena. Porém eu não me parecia com ela.
Ainda não merecia o céu e Nosso Senhor não me levou.

NÃO FAZIA CASO DE SUA VOZ

Em 1913 tive uma febre espantosa. Nesse tempo Nosso Senhor me chamava para si, porém eu não fazia caso de sua voz. Então, aos catorze anos, enviou-me apendicite, o que me fez ouvir sua voz querida, que me chamava para fazer-me esposa mais tarde no Carmelo.
Meu mal de apendicite agravou-se e me tiraram do colégio, o que me deu muita alegria.
Com a enfermidade, fiquei tão mimada que não podia estar só. Lucita estava doente e Elisea - uma empregada - foi fazer-lhe companhia. Então tive inveja e comecei a chorar. Nosso Se­nhor me falou e me deu a entender quão abandonado e só estava no Tabernáculo. Disse-me que o acompanhasse. Então deu-me a vo­cação, pois disse-me que queria meu coração; é para ele, e que fosse carmelita. Desde esse momento passava o dia inteiro numa íntima conversa com Nosso Senhor, e sentia-me feliz por ficar só.
Eu, nesse tempo, não vivia em mim. Era Jesus quem vivia em mim. Levantava-me às sete. Tinha horário para todo o dia. Tudo fazia com Jesus e por Jesus.
Nosso Senhor mostrou-me como fim a santidade. Eu a alcançaria fazendo tudo o melhor possível.

10 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

MODIFIQUEI MEU CARÁTER

Em 1907 entramos no colégio.
Meu caráter tornou-se violento, eu era presa de raivas fero­zes; porém raras. Foi conosco a Chacabuco uma prima de mamãe, que não gostava de mim. Só mimava Rebeca. Com isso eu sofria como não é possível imaginar. Eu era terrível com ela; não suportava nada. A senhora pode saber, Madre, quanto a incomo­dávamos com nosso caráter. Minha mamãe contava-lhe as brigas que tínhamos com nossos irmãos. Custava-me obedecer. Sobretudo quando me mandavam, por preguiça demorava para ir.
Foi nesta época que Nosso Senhor mostrou-me o sofrimento.
Meu papai perdeu uma parte da fortuna, tivemos de viver mais modestamente.
Aos sete anos me confessei. As monjas nos prepararam.
Eu, cada dia, pedia permissão a mamãe para fazer minha primeira comunhão. Até que consentiu em 1910. E começou minha preparação. Parecia-me que esse dia não chegaria e chorava de desejos de receber Nosso Senhor. Um ano preparei-me para fazê-lo.
A Virgem ajudou-me a limpar meu coração de toda imperfeição.
No mês do Sagrado Coração, modifiquei meu caráter por completo.
Não brigava com os meninos. Às vezes mordia os lábios e apressava-me em vestir-me. Fazia atos que anotava numa caderneta. Ninguém me fazia perder a paciência. Os meninos, meus irmãos, o faziam de propósito; diziam muitíssimas coisas para me enraivecer; eu, porém, continuava, como se não os ouvisse.
Minha mãe estava feliz por me ver preparar-me tão bem para minha primeira comunhão.

PERDÃO PELOS RESMUNGOS

E do dia 10 de setembro de 1910 a primeira carta que se conserva de Juanita. Nela diz a seu pai: Obrigada por todas as bondades que recebi de vocês e por me terem colocado neste colégio. Aqui me ensinam a ser boa e piedosa e sobretudo me preparam para fazer minha Primeira Co­munhão. Agora só me falta pedir-lhes perdão pelas desobediências, resmungos que cometi. Espero não voltar mais a cometer essas faltas.
Sua filhinha que tanto os ama, Juana.
A tarde, pedi perdão. Lembro-me da impressão de meu paizinho.
Fui pedir-lhe perdão. Caíram-lhe lágrimas, levantou-me e me beijava dizendo que não havia por que pedir-lhe perdão, pois nunca o havia desgostado e que estava muito contente vendo-me tão boa. Sim, paizinho, porque era demasiado indulgente e bondoso comigo. Pedi perdão a minha mãe, que chorava. A todos os meus irmãos e, por último, a minha ama e empregadas. Todos me respondiam comovidos.

DIA SEM NUVENS

O dia de minha primeira comunhão foi um dia sem nuvens para mim. O dia 11 de setembro de 1910, ano do centenário de minha pátria, ano de felicidade e da recordação mais pura que terei em toda a minha vida. Foi um dia formoso também para a natureza. O sol difundia seus raios enchendo minha alma de felicidade e de ação de graças ao Criador.
Despertei cedo. Minha mãe vestiu-me, penteou-me. Tudo foi feito por ela. Eu não pensava em nada. Estava indiferente a tudo com exceção de minha alma para Deus. Chegou, por fim, o momento.
D. Jara nos disse palavras tão ternas e formosas que cho­rávamos todas. Aproximamo-nos do altar enquanto cantavam esse formoso canto: "Alma feliz", que jamis esquecerei.
Não é para se escrever o que se passou entre minha alma e Jesus. Pedi-lhe mil vezes que me levasse e ouvia sua voz querida, pela primeira vez. Pedi por todos, e a Virgem eu a sentia perto de mim. Pela primeira vez sentia uma paz deliciosa.
Depois fomos ao pátio distribuir coisas aos pobres e abraçar a família. Meu paizinho me beijava e me levantava nos braços, feliz.
Nesse dia foram muitíssimas meninas a minha casa. Para não dizer nada dos presentes que ganhei: a cômoda e minha cama estavam cheios.
Passou esse dia tão feliz, que será único em minha vida.
Mudamos de casa pouco tempo depois.

9 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

JESUS TOMOU MEU CORAÇÃO

Quando houve o terremoto em 1906, logo depois Jesus principiou a tomar meu coração para si.
Lembro-me de que minha mãe, com minha tia Juanita, nos levava à missa e sempre nos explicavam tudo. E eu, quando chegava a comunhão, enchia-me de desejos de receber a Nosso Senhor.
Em casa, sentavam-me na mesa e me interrogavam a respeito da Eucaristia. Eu respondia a todas as suas perguntas. Porém como me viam muito pequena, não me deixavam fazê-la.
Meu avôzinho não queria por nada que entrássemos no colégio.
Até que minha mamãe venceu e me colocou nas Teresianas.
Ia depois do almoço e saia às cinco. Depois de um mês me tiraram. Alegrei-me porque as meninas eram muito briguentas.
Havia uma que me fazia sofrer, porque sempre procurava fazer-me mal. Sempre, quando íamos à capela, ela tirava meu véu. Eu, pequena, não sabia defender-me. As outras gostavam de mim. Enfim, não conservo carinho por esse colégio, apesar de aí ter aprendido a ler.

MORREU MEU AVÔZINHO

Em 1907 morreu meu avôzinho como um santo. Estávamos na fazenda, em Chacabuco. Minha tia Teresa com os dois meninos acompanhou-nos, a ele e a nós, de quem não se separava.
Todas as tardes fazia-nos andar a cavalo, tirando cara ou co­roa para ver quem seria a primeira. Sempre saía Rebeca. Vovô estava bem, quando uma noite veio-lhe o ataque de paralisia. Imediatamente minha tia o trouxe por terra para Santiago, onde logo lhe disseram que não havia cura. Faziam-no sofrer com os remédios mais terríveis.
Em 13 de maio, dia de sua morte, recebeu os sacramentos.
Chamou seus filhos. Aconselhou-os. Ao lado de seu quarto ficava o oratório. Principiou a missa. À elevação da consagração da santa hóstia, sua alma voou para o céu. Parecia adormecido. Sua morte foi a de um santo. Como o foi sua vida. Imediatamente avisaram-nos em Chacabuco.
Poucos dias depois trouxeram-nos a Santiago e, ao encontrar o quarto vazio, tive a impressão de que tudo se havia acabado.
E fiquei tão triste como não é possível imaginar.
Logo depois venderam a casa e a fazenda. Mudamos para a rua São Domingos, casa que como a outra é cheia para mim de recordações muito agradáveis.

MINHA DEVOÇÃO A VIRGEM

Quando fomos pela última vez a Chacabuco, minha tia Juanita deu-me uma Virgem de Lourdes de louça que estava sempre ao lado de minha cama, com à condição que eu tomasse um re­médio. Tomei-o e ela deu-me a imagem. Esta é a Virgem que jamais deixou de consolar-me e ouvir-me.
Desde os sete anos mais ou menos, nasceu em minha alma uma devoção muito grande por minha Mãe, a Santíssima Virgem.
Lucho deu-me esta devoção que tive e terei até minha morte. Contava-lhe tudo o que me acontecia e ela me falava. Ouvia sua voz dentro de mim mesma, clara e distintamente. Ela me aconselhava e me dizia o que devia fazer para agradar a Nosso Senhor. Eu acreditava que isto era muito natural e jamais ocorreu-me dizer o que a Santíssima Virgem me dizia (Santiago, 244-1919). Todos os dias, Lucho me convidava para rezar o Rosário e fizemos juntos a promessa de rezá-lo toda a vida, o que cumpri até agora. Só uma vez, quando era bem pequena, esqueci.
Nosso Senhor, desde aqui, pode-se dizer, levou-me pela mão com a Santíssima Virgem.

8 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

I

ATÉ MINHA PRIMEIRA COMUNHÃO

1900-1910

Em 1906 Jesus principiou a tomar o meu coração para si. Durante um ano preparei-me para fazer minha primeira comunhão. A Virgem ajudou-me a limpar meu coração de toda imperfeição.
Na Eucaristia está a vida de nossa alma. É o momento do céu no nosso desterro. Suspiremos por ela! (c 114).
Para uma carmelita, a Eucaristia é um céu; e deveria ser para toda alma que crê. E pensar que comungamos sem um mínimo afeto de amor! Jesus aproxima-se repleto de infinito amor e nós o recebemos friamente e só procuramos fazer-lhe pedidos, sem o adorar, sem chorar de agradecimentos aos seus divinos pés! (c 151).
A comunhão é um céu na terra para a alma que se compenetra do ato que faz. Tiremos Jesus da sua fria prisão e abriguemo-lo no nosso coração, tão pobre, tão cheio de amor! (c 128).
Neste primeiro período vale destacar:
- o ambiente de piedade em que Juanita foi educada;
- o trato familiar com Jesus e Maria que começa a ter desde pequenina;
- e o muito a sério que levou o compromisso batismal desde sua preparação para a Primeira Comunhão; pois a veremos colocando um empenho nada comum para sua idade em controlar suas tendências e modificar seu caráter.

MIMADA POR TODOS
Nasci em 1900, dia 13 de ju1ho. Minha mãe chama-se Lúcia Solar de Femández. E meu pai Miguel Femández Jara.
Vivíamos com meu avozinho, ancião já. Chamava-se Eulógio Solar. Pode-se dizer que era um santo. Todos os dias o víamos passando as contas de seu rosário.
Jesus não quis que eu nascesse como ele, pobre. Nasci em meio a riquezas, mimada por todos.
Eu era a quarta. A primeira chamava-se Lúcia e tinha sete anos; Miguel, o segundo, de seis anos. E Lucho, o terceiro, tinha três.
Depois, nasceu Rebeca, com um ano e oito meses de diferença de mim. Era eu, ainda que tão mimada, muito tímida. Rebeca era o contrário. As duas éramos muito mimadas. Fazíamos com meu avozinho o que queríamos e o enganávamos com beijos e carícias.
A mim, desde pequena, diziam que era a mais bonita dos meus irmãos. Eu me dava conta disto. Porém, estas mesmas palavras, as repetiam quando eu já era maior, às escondidas de minha mamãe, que não gostava. Só Deus sabe o quanto me custou desterrar este orgulho ou vaidade que se apoderou de meu coração quando cresci.
Meu caráter era tímido, de coração muito sensível. Chorava por tudo. Porém tinha um caráter suave. Eu jamais brigava com alguém.
Teve além destas outros dois irmãos: fJana, morta poucas ho­ras depois de nascer, e Inácio, que veio ao mundo em 1910.
Desde pequenina, alternando com Santiago, viveu grandes temporadas na fazenda Chacabuco, propriedade de seu avozinho.

7 de agosto de 2021

Santo Inácio de Loyola - Fundador da Companhia de Jesus

V. PEREGRINAR...

Um pregador célebre atraía o povo à catedral de Barcelona durante a quaresma de 1523, e D. Isabel de Roseli, uma das mais distintas senhoras da cidade, não faltava a nenhum dos sermões. D. Isabel tinha-se retirado completamente do mundo e vivia só para Deus e para seu marido, que, tendo perdido a vista, reclamava todos os seus cuidados.
Um dia, escutava ela o pregador de que falamos, quando o seu olhar se volta maquinalmente para o santuário. Os degraus do altar estavam cobertos de crianças, como de ordinário, e, entre elas, distingue um homem que lhe atrai a atenção. É um estrangeiro. Os seus vestidos são comuns, mas a fisionomia é celeste e os traços duma extrema distinção; o rosto pálido, magro, alongado, e parecia extenuado pela fadiga, pelo sofrimento ou pela mortificação; o seu manto é o dos peregrinos. Virá ele de longe e terá necessidade de socorros e de cuidados?...
Enquanto a boa senhora se entrega a estas observações, uma auréola luminosa rodeia a cabeça do estrangeiro, e D. Isabel crê ouvir uma voz interior que lhe ordena que não saia da igreja sem falar àquele peregrino.
Mas atribui esta voz a uma ilusão da fantasia, e entra em casa muito apressada depois do sermão para contar a seu marido o que viu e as impressões que recebeu - Deve ser um Santo, - acrescentou ela - e, se aprovas, mandarei um dos nossos criados convidá-lo, em teu nome, a fazer-nos a honra de jantar conosco.
- Da melhor vontade; - lhe respondeu o marido - será para mim uma felicidade ouvi-lo falar de Deus. Manda depressa o criado para que o encontre ainda na igreja.
Estava terminado o ofício quando o criado de D. Isabel se apresentou na catedral; mas o peregrino ainda ali estava e reconheceu-o facilmente pelo retrato que dele lhe tinham feito. Aproximou-se, pediu-lhe que saísse, e disse-lhe: - Senhor peregrino, meus amos, que são verdadeiros servos de Deus, enviam-me a dizer-vos, que faríeis uma obra agradável a Deus e à Santíssima Virgem, se quisésseis, a titulo de peregrino, fazer-lhes a honra de vos sentardes à sua mesa para jantar com eles. - Benvindo seja, meu irmão; - respondeu simplesmente o estrangeiro - sou servo dos seus amos; conduza-me, que eu o seguirei.
O santo peregrino encheu de consolação os seus hospedeiros pela maneira como falava de Deus. Pela elevação dos seus pensamentos, pureza de expressões, distinção de linguagem, não puderam duvidar da sua origem fidalga; mas, não ousando interrogá-lo sobre este ponto, D. Isabel perguntou-lhe somente qual o fim da peregrinação. - Roma, - respondeu.
Não ousava confessar o fim principal, os Lugares Santos, com receio de dar largas à vaidade, pois que naquele tempo aquela peregrinação era rara e atraía a estima sobre os que tinham a coragem de a empreender.
- E quando partireis?
- Embarcarei no bergantim que vai fazer-se à vela para a Itália.
- No bergantim! - exclamou D. Isabel - peço-vos que tal não façais, senhor peregrino, porque a vossa vida correrá risco Tomai passagem num navio mercante que partirá daqui a oito dias; o nosso Bispo dirige-se a Roma nesse navio e podeis fazer a travessia com ele.
- Esse santo Prelado é meu tio, - acrescentou o Sr. Rosell - e estou certo que lhe será agradável viajar convosco.
- Já entrei em relações com o capitão do bergantim; - disse Inácio de Loiola - mas retardarei a minha partida e irei no navio mercante, visto que assim, o desejais.
- Por felizes nos daríamos, acrescentou o Sr. Rosell - se aceitásseis hospitalidade em nossa casa durante os dias que tendes de espera.
- Não posso ceder a esse desejo, senhor; - respondeu Inácio - impus-me a lei de não ter outra morada senão o hospital, onde encontro grandes misérias a consolar e a aliviar.
- Pois bem, - disse Isabel - permiti ao menos que façamos as despesas da viagem.
- Senhora, - respondeu o Santo - comove-me a sua caridade e muito a agradeço; Deus lhe pagará o bem que deseja fazer-me e que não posso aceitar; uma condição da minha passagem a bordo do navio, é que o capitão ma concederá por amor de Deus.
Os novos amigos do nosso peregrino não puderam obter outras concessões e separaram-se dele com pesar.
Inácio, persuadido de que Deus se tinha servido de D. Isabel para o preservar dum grande perigo, foi buscar os seus manuscritos, que já tinha no bergantim. Apressemo-nos a dizer que tendo-se este navio feito à vela no dia imediato, foi assaltado por uma violenta tempestade e no mesmo dia submergiu-se, perdendo-se a carga e a tripulação.
O capitão do navio mercante consentiu em conceder passagem gratuita ao santo peregrino, mas com a condição de que ele se proveria de víveres e não pediria esmola aos passageiros. Inácio prometera não comer outro pão senão o que mendigasse; a condição imposta pelo capitão perturba a sua consciência e consulta o seu confessor; tendo-lhe este ordenado que se submetesse, o nosso herói encontrou meios de conciliar tudo. Percorreu todas as ruas da cidade estendendo a mão aos transeuntes, aceitando restos de pão, moedas de cobre, tudo o que lhe davam. Metia o pão duro num alforje, o dinheiro no bolso e a todos testemunhava um sincero reconhecimento.
Era assim que o brilhante Inácio de Loiola preparava as suas provisões para tão longa viagem!
Quando ele assim mendigava numa das maiores ruas de Barcelona, viu uma senhora nobre e rica de aparência à porta de uma casa; essa senhora ia a entrar; Inácio aproxima-se e pede-lhe uma esmola por amor de Deus
- Miserável vagabundo! -lhe responde ela -não tens vergonha do modo de vida que segues? Crês que não é fácil ver que não nasceste para mendigar? Não é a mim que tu enganas! Adivinho-te: dissipaste a tua fortuna como o filho pródigo, e agora estás reduzido a estender a mão para desonra e ignomínia da tua família.
Inácio escutou sem responder; com os olhos baixos e atitude respeitosa; parecia um criminoso na presença do juiz. A Sra D. Zepila, assim se chamava, continuou:
- Aonde vais, desgraçado?
- A Roma, senhora.
- Aqueles que lá vão não vêm melhores. Onde moras?
- No hospital.
- Como te chamas?
- Não posso responder a essa pergunta.
- Já o sabia! Vai-te, és um miserável! Não te darei esmola, que a não mereces !
- Diz V. Exa a verdade, senhora; eu não mereço esmola de ninguém, e sou o maior de todos os pecadores! Agradeço a V. Exa por me ter julgado e tratado como eu devia ser sempre tratado. Muito obrigado, senhora, muito obrigado!
E o nosso Santo retirou, depois de se ter profundamente inclinado diante da senhora que assim o acabava de humilhar.
D. Zepila era mãe de um filho que, com suas desordens, lhe arruinara a fortuna, fugira alguns anos antes e de quem não tinha notícias... A aparência de nobreza de Inácio, a distinção dos seus traços e da sua pessoa tinham-lhe lembrado o filho cujos desvairamentos deplorava, e, julgando-o também culpado, tratara-o sem piedade. A doçura e a humildade do nobre mendigo esclareceram-na e deram-lhe um grande pesar de o ter repelido com tanta dureza. Naquela mesma tarde, enviou-lhe uma esmola importante ao hospital, com recomendação de que orasse por ela e pelo filho cuja recordação lhe causara a irritação que lamentava com amargura.

6 de agosto de 2021

Santo Inácio de Loyola - Fundador da Companhia de Jesus

IV. MANRESA: COMUNICAÇÕES DIVINAS

Inácio de Loiola retomara a sua habitação no hospital D. de Santa Lúcia. Teria preferido a vida solitária na gruta onde recebera tantas graças e fruíra tão doces consolações; mas tendo-lhe a obediência imposto o sacrifício de habitar no hospital, teve que renunciar à gruta e não voltar lá senão para orar e meditar. Deus, porém, compensou-o superabundantemente não só desse sacrifício, mas das tribulações interiores com que lhe experimentava a fidelidade.
Ao abandonar o mundo, Inácio era ignorante como todos os fidalgos da sua época. Ninguém entendia melhor que ele da arte da caça, conhecia perfeitamente a ciência do bem viver e da alta cortesia; à frente dos seus homens de armas, teria desafiado o melhor capitão; no campo de batalha era um herói; mas, doutras coisas, nada sabia. Fazia versos, é verdade, e a sua rica e poética imaginação produzia-os com tanta facilidade como elegância. Mas escrevia-os sem ortografia, de que fazia pouco caso, o que então se deixava aos sacerdotes e aos letrados. O nosso herói não sabia mais que ler e escrever, e sabemos o uso, que tinha até então feito duma coisa e doutra.
Era contudo necessário no plano da sabedoria e da misericórdia infinitas, que o nobre penitente de Manresa possuísse no grau mais eminente o gênio, que faz os grandes homens, as virtudes que fazem os maiores Santos, a ciência que faz os maiores doutores.
Do gênio tem ele o gérmen: o desenvolvimento será pronto e completo; às virtudes praticou-as todas na perfeição antes de as conhecer; a ciência vai possui-la, antes de ter estudado.
Estava um dia Inácio na escadaria da igreja dos Dominicanos, onde, durante uma procissão, recitava o ofício da Santíssima Virgem. De repente, o seu espírito é arrebatado até ao seio de Deus, e é-lhe dado compreender e contemplar o Incompreensível mistério dum Deus, único em três pessoas distintas! Depois desta visão, fica muito tempo em presença do Santíssimo Sacramento e não pode testemunhar senão pela abundância das lágrimas o reconhecimento que lhe enche o coração.
Ao sair da igreja a sua alma expande-se junto dos religiosos em termos magníficos; fala-lhes do adorável mistério da Santíssima Trindade com palavras de fogo e numa linguagem sublime, evidentemente inspirada; os mais sábios escutam-no com admiração, ninguém duvida de que ele haja recebido luzes sobrenaturais, e todos exclamam, quando Inácio se afasta: "- Nunca nenhum doutor da Igreja falou tão eloqüentemente e com tanta clareza sobre este mistério! Nunca este Mistério foi apresentado sob tais imagens!"
A notícia desta maravilha espalha-se na cidade, correm para junto de Inácio e pedem-lhe para que fale da Santíssima Trindade. O Santo causa admiração àqueles que o escutam. Esquece a linguagem popular que afetava de ordinário e exprime-se com notável elegância; a sua eloqüência arrasta algumas almas e ganha-as para Deus. Não se cansam de o ouvir, ele não se cansa de falar, seguem-no nas ruas, acompanham-no nas suas diversas peregrinações; em toda a parte, aonde vai, lhe pedem que fale de Deus, e por toda a parte e sempre corresponde à expectativa geral com igual fala sobretudo da Santíssima Trindade; sobre este assunto, Inácio é inesgotável, porque tem sempre presente a sua visão.
Um dia, quando orava na igreja de Nossa Senhora de Manresa [22], foi de novo arrebatado, e vê e compreende todo o plano da divina sabedoria na criação.
Outro dia, assistia à santa missa na igreja de Monserrate[23], o seu olhar fixa-se com amor sobre a divina Hóstia exposta à adoração pública naquele dia, e vê e compreende a presença real de Jesus Cristo na adorável Eucaristia. Num dos seus passeios contemplativos, senta-se numa pedra perto da cruz do Tort, e o seu rosto volta-se para o Cardoner, que corre diante dele; de repente, perde todo o sentimento das coisas da terra, Deus dá-lhe um conhecimento claro e distinto de todos os mistérios da nossa fé e faz-lhe ver e compreender o encadeamento e o conjunto deles. Voltando a si, Inácio vai prostrar-se aos pés da cruz do Tort e demora-se ali bastante tempo em ações de graças"- Se, por impossível, - dizia ele algumas vezes - as Sagradas Escrituras desaparecessem da terra, com isso eu nada perderia". - As verdades da fé parecem-me tão claras, - dizia também - que, ainda que não estivessem contidas no santo Evangelho, não hesitaria em defendê-las e sustentá-las à custa do meu sangue!"
No hospital de Santa Lúcia, Inácio habitava um quarto que tinha uma tribuna para a capela [24].
Um sábado, depois de completas, entrou em êxtase, na sua tribuna, e ali esteve até ao sábado seguinte, à mesma hora. Durante estes oito dias, não tomou alimento algum e não mudou um só instante de posição; julgaram-no morto; auscultaram-lhe o peito, sentiram um ligeiro movimento de coração, e pensando que ele estava desmaiado, começaram a prodigalizar-lhe cuidados. Nada, porém, conseguiu chamá-lo à realidade da vida; compreenderam então que o seu espírito estava abismado em Deus, e ergueram-no para o despertar. Quando o puseram em terra, o Santo pareceu despertar dum doce sono, e, abrindo os olhos, disse, vertendo lágrimas: "-Ó Jesus! ó Jesus!" E mais nada.
Que se passou, durante estes oito dias, entre a alma de Inácio de Loiola e o Deus de amor que se dignava comunicar-se-lhe? Nunca ninguém o soube; mas há razões para pensar que o livro dos Exercícios Espirituais e o plano da santa Companhia de Jesus são os frutos desse longo êxtase, e que foi então que o próprio Deus o traçou na alma do nosso Santo. A todas as perguntas que lhe foram dirigidas a este respeito, Inácio respondia estas simples palavras "- Nada mais posso dizer senão que todos os favores de que a divina Majestade se dignou cumular-me são inexprimíveis !"
Fossem quais fossem as luzes sobrenaturais com que fora esclarecido, Inácio de Loiola, sempre humilde, não cessara de seguir a direção do Padre João Chanones, a quem ia regularmente pedir conselhos. Este santo velho dizia muitas vezes aos seus religiosos: "- O meu discípulo de Manresa é um grande mestre! Será um dia o defensor, o sustentáculo, o ornamento da Igreja; será reformador do mundo, verdadeiro sucessor de S. Paulo, e, por ele, a luz do Evangelho será levada às mais longínquas nações idólatras".
Uma santa jovem, conhecida em toda a Espanha pela beata de Manresa, só falava de Inácio com toda a veneração, e assegurava que via nele um dos maiores Santos da igreja.
Não havia mais. que uma voz para o proclamar homem de Deus, e todos repetiam que só a sua humildade lhe fazia ocultar o brilho do seu nascimento sob as aparências da maior pobreza.
Entretanto, o nosso herói sabia agora que a maior glória e Deus, para a qual ele, só queria viver e morrer, consiste na santificação das almas, e ardia no desejo de trabalhar para esse fim. "- Não basta, - dizia ele - que eu sirva o Senhor soberano do céu e da terra; é necessário que Ele seja amado por todos os corações; é necessário que todas as vozes o bendigam e cantem os seus louvores! Não basta que eu trabalhe para a minha própria perfeição; é necessário, para a maior glória da sua divina Majestade, que eu trabalhe para a dos outros!" Cheio deste pensamento, redobra as suas exortações, e a sua palavra, sempre ouvida com prazer, opera prodígios. De todas as circunvizinhanças correm para escutar aquele que pratica tão escrupulosamente o que aconselha, e é obrigado a subir a uma pedra, à porta do hospital, para se fazer ouvir de todos.
Já não é uma corda de cânhamo que lhe cinge o corpo é uma longa cadeia de ferro, pesada e áspera; o seu jejum é continuo, as suas disciplinas sangrentas, o seu rosto cavado pela austeridade da vida; o seu olhar não é da terra. É, o homem evangélico na mais alta perfeição; só o seu aspecto arrasta ao arrependimento e à penitência.
Alguns meses antes, a cidade de Manresa oferecia um doloroso espetáculo; os costumes eram relaxados; os sacramentos desprezados, a fé parecia quase extinta. Agora, é uma cidade exemplar. Inácio reformou-a completamente e restituiu-a a Deus.
Foi no próprio seio de Deus que ele hauriu o poderoso método que empregava para fazer vibrar mais profunda e eficazmente nas almas a palavra evangélica. Ele vê as vocações religiosas que desperta, os sacrifícios que obtém, a reforma de costumes que opera, e quer facilitar o meio de o espalhar e de multiplicar os seus frutos. Escreve o livro imortal dos Exercícios Espirituais, Deus continuava a prodigalizar os seus favores ao nosso Santo; algumas vezes foi-lhe dado ver e contemplar Nosso Senhor e sua divina Mãe, não duma maneira sensível, mas por uma espécie de vista interior, como ele mesmo explicou mais tarde ao Padre Gonçalves.
O demônio quis aproveitar-se da disposição em que tão frequentes visões mantinham o seu espírito. Algumas vezes uma serpente, de brilhantes e luminosas cores, se apresentara à sua vista, no campo. Inácio admirara-a; mas, não vendo nisso nenhuma significação e experimentando apenas uma espécie de perturbação depois do seu desaparecimento, tinha pensado que isso não podia ser senão uma ilusão do inimigo de Deus e dos homens. Representando-se-lhe a serpente um dia ao cimo da cruz do Tort, logo após um dos êxtases que tão maravilhosamente o esclareciam, notou que as cores da serpente tinham perdido o seu brilho. Desde este Momento, não havia dúvida para ele: reconheceu a presença do demônio. Desde esse dia, todas as vezes que a visão se renovava, bastava ao Santo fazer um movimento com o bastão para se ver livre desta imagem importuna.
Entretanto, Inácio tinha perdido o sono; as suas austeridades tinham-lhe deteriorado o estômago, que não suportava alimentos. Não pôde resistir mais tempo a tantas fadigas, privações e sofrimentos e caiu perigosamente doente. Foi um luto para Manresa. Os magistrados e os principais habitantes da cidade quiseram quinhoar da consolação de o tratar as suas expensas, em casa de D. André Ferreira de Amigante, para onde foi de novo conduzido. Os Dominicanos e os Beneditinos combinaram-se para lhe imporem o dever de Moderar as suas austeridades, e, apenas recobrou a saúde submeteu-se a tudo o que lhe impuseram. Abandonou as pobres roupas de Monserrate, aceitou as que lhe deram em troca e vestiu por cima delas uma longa batina de algodão cinzento tendo a forma da dos clérigos; consentiu também em cobrir-se com um manto de pano azul e com um boné do mesmo pano [25] para se preservar do frio, que começava a fazer-se sentir.
O valente cavaleiro de Jesus e de Maria acabava de fazer o seu primeiro ensaio de armas em Manresa. A espada da Palavra, com a qual tinha alcançado brilhantes e magníficas vitórias sobre as paixões humanas, havia-lhe sido dada pelo próprio céu, e a sua maravilhosa virtude não podia ser posta em dúvida, porque a reforma duma cidade inteira e dos seus arredores o atestavam evidentemente.
Nos romances de cavalaria, que Inácio bem conhecia, aos mais valorosos paladinos e àqueles cujas proezas haviam conquistado maior nomeada, é que eram concedidas as armas encantadas que asseguravam a vitória. Havia também armaduras que tinham a virtude de tornar invulneráveis aqueles que as usavam; mas sucedia por vezes que um malvado ou um traidor se apoderava delas por astúcia, e então o cavaleiro espoliado tornava-se vulnerável como um simples mortal.
"- Nada tenho feito, - dizia o nosso Santo - para merecer a espada maravilhosa que o meu Senhor e Mestre se dignou de confiar-me para sua glória. Recebendo-a, comprometi-me a, defender a sua honra em toda a parte e sempre; não posso nem devo deixá-la ociosa! Irei à Palestina atacar as falanges inimigas do meu soberano Senhor e da soberana Senhora e Rainha do mundo. A minha armadura encantada será composta da Fé, da Esperança, da Caridade, e da Oração. A graça sustentar-me-á e ajudar-me-á! Se eu conservar preciosamente esta santa armadura, serei invulnerável; se, ao contrário, não desconfiar constantemente do malvado e do traidor, a sua infernal astúcia poderá roubar-ma. Avante pois, contra a infidelidade que cobre a Terra Santa e guerra ao traidor maldito! "Inácio estava resolvido a partir. A peste diminuía de intensidade em Barcelona, os navios não podiam demorar-se a fazer-se ao mar, e o nosso Santo queria encontrar-se lá para embarcar no primeiro que se fizesse à vela para Itália.
A notícia da sua próxima partida causou intensa dor aos seus amigos. Orações, lágrimas, súplicas, tudo foi empregado em vão para o afastar de uma viagem que então se julgava das mais perigosas. Algumas pessoas inutilmente solicitaram o favor de o acompanhar, acrescentando - O senhor não sabe nem latim nem italiano; leve em sua companhia alguém que fale um ou outro idioma, para lhe servir de intérprete e evitar os inconvenientes, que resultam da ignorância da língua desses países. - Ainda que me dessem o filho do duque de Córdova - respondeu energicamente o nosso herói não o aceitaria. Se eu levasse companheiro de viagem, contaria com ele para me alimentar quando tivesse fome, para me levantar quando caísse... Não! Poria nele a confiança que só devo pôr em Deus; unir-me-ia a ele, em vez de só amar a Deus... Não! não quero ninguém..., ou, antes, parto acompanhado da Fé, da Esperança e da Caridade; a Fé me guiará, a Esperança será a minha despenseira e a Caridade não me abandonará nunca.
Inácio tinha como inimigos, naquela cidade, alguns homens, em pequeno número, é certo, cujo endurecimento no pecado havia resistido às suas constantes exortações. D. Inês Pascoal, temendo que ele fosse perseguido com as suas injúrias, e que a sua própria vida fosse ameaçada, chamou seu irmão D. Antônio Pujole, que era um dos familiares do Arcebispo de Tarragona, e pediu-lhe que acompanhasse a Barcelona o santo penitente. Não podendo recusar esta companhia, submeteu-se humildemente.
Inácio não tinha dinheiro; mas todas as bolsas se lhe abriram; queriam que levasse ao menos uma soma suficiente para as despesas da viagem. - A Providência, - respondeu ele - encarregar-se-á de fazer as despesas da viagem e do regresso. E, tomando os manuscritos e o bordão de peregrino, partiu a pé, não querendo outras provisões senão o pão da esmola, que lhe fosse dado no caminho, a água que a sua cabaça levava, e, principalmente, a confiança em Deus. Um sacerdote, chamado Caváglia, tinha-lhe sempre dado esmola com terno respeito. No momento de o abandonar, Inácio quis deixar-lhe uma lembrança do seu reconhecimento, mas não possuía nada: tem apenas o seu livro de oficio da Santíssima Virgem e faz o sacrifício de lho dar.
Não pode conter as lágrimas à vista da desolação daqueles que o amam; promete a todos as suas recordações e lembranças e arrancando-se enfim aos seus pesares e à sua ternura, encaminha-se para Barcelona com D. Antônio Pujole, que cavalgava perto dele numa mula.

5 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

MINHA VIDA: RESUMO E DIVISÃO

SOFRER E AMAR

Começou Juanita o seu Diário aos quinze anos, Em 1917, dedicou-o a madre Rios, sua professora predileta. Foi então que o intitulou História da vida de uma de suas filhas e escreveu estas linhas introdutórias.

A senhora pensa que vai encontrar uma história interessante. Não quero que se engane. A história que vai ler não é a história de minha vida, mas a vida íntima de uma pobre alma que, sem mérito algum da sua parte, Jesus Cristo a amou especialmente e a cumulou de benefícios e graças.

A história de minha alma resume-se em duas palavras: SOFRER e AMAR. Aqui tem minha Vida inteira desde que me dei conta de tudo, quer dizer, aos seis anos ou antes. Eu sofria, porém o bom Jesus ensinou-me a sofrer em silêncio e a desafogar nele o meu pobre coraçãozinho.

A senhora compreende que o caminho que, desde pequena, Jesus me mostrou foi o que ele percorreu e amou. E como ele me queria, buscou para alimentar minha pobre alma o sofrimento.

Minha vida divide-se em dois períodos mais ou menos desde a idade da razão Até MINHA PRIMEIRA COMUNHÃO e DESDE MINHA PRIMEIRA COMUNHÃO até agora. Ou melhor, será até a entrada de minha alma NO PORTO DO CARMELO. Jesus me cumulou de favores tanto no primeiro período como no segundo.

4 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

GUIA BIOGRÁFICO

1940:

17 de outubro. Translado de seus restos ao sepulcro construído debaixo do coro das religiosas.

1947:

20 de março. Tem início o processo diocesano em vista de sua beatificação. Terminou em 4 de março de 1971.

1976:

A Santa Sé decide que se enriqueça o processo diocesano mediante o processo chamado "COGNITIONIS". E em 17 de novembro se inicia oficialmente o mencionado processo para complementar e enriquecer o anterior.

1978:

18 de março. Sessão de clausura do processo "COGNITIONIS", cujas atas são enviadas a Roma. Paulo VI, antes de morrer, dispõe que se abra o processo de Ir. Teresa o quanto antes.

1981:

20 de março. Decreto da santa Sé declarando a validez dos processos mencionados, trâmite importantíssimo do processo da beatificação.

1986:

23 de janeiro. Rescrito declarando o valor jurídico do processo feito em Santiago para recolher provas e documentação técnico-médicas sobre uma cura considerada milagrosa e atribuída a Ir. Teresa de Jesus de Los Andes.

22 de março. Decreto de reconhecimento das virtudes heroicas tanto teologais como cardeais e anexas de Ir. Teresa de Jesus de Los Andes.

1987:

Beatificação.

3 de agosto de 2021

Teresa de Los Andes - Deus, Alegria Infinita - Diário e Cartas

GUIA BIOGRÁFICO

1911:

8 de dezembro. Chama a atenção o fato que, no dia da Imaculada, esteve às portas da morte por diversas enfermidades, durante quatro anos seguidos - 1911 a 1914. Até 1915, continua recebendo esmerada formação no Colégio do Sagrado Coração como externa. Destaca-se por sua preocupação pelos anciãos e necessitados, chegando em certa ocasião a rifar seu relógio para socorrer um menino pobre. Trata com carinho as empregadas da casa e delas cuida quando estão enfermas, o mesmo faz com os moradores de Chacabuco durante as temporadas que ali passa com sua família. Ao ser vendida a fazenda, coubera-lhes uma parte - herança de sua mãe.
 

1914:

Dezembro. Sofre forte crise de apendicite. É operada no dia 30 no pensionato São Vicente de Santiago.

1915:

Restabelece-se da operação em Chacabuco, onde veraneia com os seus.

13 de julho. Ao completar seus quinze anos declara que Cristo a cativou. Ingressa como interna no Colégio das Mestras (hoje Portugal) do Sagrado Coração.

10 de outubro. Tem com a Madre Rios uma entrevista decisiva para a sua vocação. Juanita assegura-lhe que lhe faz muito bem a vida de Sta. Teresinha de Lisieux e que a leu várias vezes.

8 de dezembro. Faz voto de castidade que depois irá reno­vando periodicamente. Promete "não admitir outro esposo senão a Jesus Cristo".

1916:

Janeiro e fevereirp. Férias em Chacabuco. Passeios e caminhadas a Pé e a cavalo. Encantada pela equitação. Colabora nas missões e não deixa a meditação e a leitura espiritual.

15 de abril. Revela à sua irmã, Rebeca, o segredo da vocação: "Serei carmelita. Em 8 de dezembro eu me comprometi". No retiro espiritual do ano, impõe-se um método de vida, exigindo de si mesma a meditação, o exame diário e a prática da humildade.

1917:

Janeiro. A leitura de Sta. Teresa de Jesus a ajuda a vencer obstáculos para ser fiel ao seu propósito de fazer oração diariamente. Descansa várias semanas em Chacabuco.

10 e 11 de fevereiro. Peregrinação fervorosa ao santuário de Lourdes de Santiago. Entre suas resoluções para o ano figuram esquecer-se de si mesma; esmerar-se em proporcionar felicidade aos demais; viver com Jesus em seu interior e tomar amável a virtude.

Março. Regressa ao internato. O Pe. José Blanch, C.M.F. substitui como diretor espiritual o Pe. Artemio Colom, S.J. Impõe-se sacrifícios e oferece ao Senhor sua vida pela conversão de várias pessoas.

15 de junho. Recebe a medalha de filha de Maria.
27 de junho. É premiada como primeira aluna em história.
30 de junho. "É tão bom dar", escreve depois de juntar 30 pesos para comprar sapatos para um menino pobre e para ajudar outros necessitados.

Julho. Lê Ir. Isabel da Trindade. Fica encantada e sintoniza com ela porque seu sonho é também viver com Jesus no íntimo de seu ser e transformar toda a sua existência em louvor de Deus.

8 de agosto. Entra em retiro. Faz confissão geral e o confessor lhe assegurou que, pela graça de Deus, não cometeu em sua vida nenhum pecado mortal.

5 de setembro. Escreve sua primeira carta a madre Angélica, priora das Carmelitas de Los Andes, expressando seu ardente desejo de pertencer à sua comunidade, sabendo que a vida da carmelita é "sofrer e orar". Começa a se conscientizar de que terá de superar grandes dificuldades para ser carmelita: falta de saúde, oposição familiar e, inclusive, dificuldade para conseguir o dote, pois os negócios de seu pai vão muito mal.

20 de dezembro. Superados brilhantemente os exames e com prêmios, deixa o internato para gozar férias junto dos seus. Agora vivem na rua Vergara n. 92.

1918:

Intensifica sua correspondência com a madre priora das Carmelitas de Los Andes, pois seus desejos de ser carmelita vão aumentando.

Janeiro e fevereiro. Passa tranqüila e feliz grande parte do verão em Algarrobo. Pratica esportes: natação, tênis, passeios e caminhadas por montanhas e praias. Escreve cartas, sobretudo a seu pai ausente. Participa diariamente da missa e bênção do Santíssimo. Dá aulas de catecismo a 9 meninos. Sente sede do infinito. Tudo a leva a Deus, sobretudo a imensidade do mar.

12 de março. Regressa ao internato. Durante vários meses sofre provas interiores: abandono espiritual,
secura, aridez ...

7 de agosto. último retiro espiritual que faz no internato. Promete comungar e fazer exame de consciência e oração diariamente, e tratar de fazer em tudo a vontade de Deus.

12 de agosto. Deixa definitivamente o internato. Sai temerosa de que os familiares que se opõem à sua. vocação quisessem fazê-la freqüentar muitas festas e diversões. Propõe-se, por isso, ter firmeza de caráter e não se déixar levar pelo respeito humano nem pelo sentimento, mas pela razão e a consciência.
Como sua irmã, Lúcia, casou-se em junho, compete-lhe cuidar da casa, e não tem outro pensamento a não ser agradar a todos e sacrificar-se por cada um deles a todo momento.

7 de setembro. Escreve à madre priora de Los Andes pedindo-lhe que a admita em sua comunidade. Com imensa alegria, recebe resposta afirmativa.

Novembro. Nesta época lê o Caminho da perfeição, de Sta. Teresa. Descansa vinte e poucos dias em Cunaco, na fazenda de suas primas Elisa e Hermínia Valdés. Ali dá provas de seu bom humor, de sua alegria contagiante e de sua afeição pelo esporte, assim como de sua piedade e espírito de serviço. Colabora nas missões. escreve a seus familiares que se tornou famosa "com suas tentações de riso". Durante várias semanas atormenta-a a dúvida se deve ser carmelita ou religiosa do Sagrado Coração. Consultados seus diretores, desaparece a perturbação .

1919:

11 de janeiro. Viaja com a mãe a Los Andes. Acha que são simples, alegres e encantadoras as monjas. A pobreza do convento a seduz. Recuperada a tranqüilidade, regressa cheia de felicidade a Santiago.

14 de janeiro - 7 de março. Permanece na fazenda São Paulo - (perto de São Xavier de Loncomilla). Sem se descuidar dos trabalhos da casa, colabora nas missões, dá catecismo às crianças, dá-lhes aulas de diversas matérias e as entretém organizando brincadeiras, jogos e rifas. Também visitou umas trinta casas de inquilinos consagrando-as ao Sagrado Coração de Jesus.

7 de março. Regresso a Santiago. Descansa uns dias em Bucalemu; na fazenda de seus tios. Ali admiram sua destreza para montar a cavalo, qualificando-a de "verdadeira amazona".

25 de março. De Santiago escreve a seu pai uma carta enternecedora, pedindo-lhe autorização para ser carmelita.

3 de abril. Nasce Luz, sua "sobrinhazinha mimada", filha de sua irmã Lúcia.

6 de abril. Obtém o consentimento de seu pai para ingressar no Carmelo.

De 7 a 15 de abril permanece na fazenda de suas primas Valdés em Cumaco. Dali escreve a seu pai (dia 7) manifestando sua gratidão pelo generoso consentimento que lhe concedeu; e no dia 12, a Madre Angélica, comunicando-lhe que conta com a autorização paterna e que está decidida a ingressar no convento em 7 de maio.

Março-maio. Período em que, para Juanita, chegam ao auge, tanto a felicidade como a "pena mais horrível". A felicidade, porque logo estará realizando o seu so­nho de consagrar-se plenamente, ao Senhor, ingressando no convento. E o martírio mais terrível por ter de separar-se de seus pais e irmãos, aos quais ama com loucura, e que nas últimas. semanas choram sem consolo quando pensam que vão ficar sem aquela que é a "jóia, a alegria e o sol da casa". Seu pai, ausente nos últimos dias, não teve coragem de voltar "para não se encontrar lá no momento da separação".

7 de maio. Ingressa nas Carmelitas de Los Andes. Muda seu nome, chamando-se daí por diante Teresa de Jesus.

8 de maio. Escreve sua primeira carta do convento. É um testemunho eloqüente de seu amor filial e da felicidade que a inunda. Escondida na clausura, realiza contudo intenso apostolado, não só mediante a misteriosa fecundidade do sacrifício e da oração, como também por suas cartas. Com elas contagia seus familiares e amigas com o seu amor a Cristo, à Eucaristia e à SS. Virgem, ao mesmo tempo que apregoa sua alegria e felicidade, e que seu amor pelos seus assume maio­res proporções cada dia.

14 de outubro. Toma o hábito de Carmelita Descalça. Começa seu noviciado. Daí por diante escreve menos cartas, porém mais afetuosas e penetradas de humildade. Cartas que são boa prova de que os santos não são seres esquisitos e alienados, mas pessoas com grande equilíbrio e estabilidade. Vivendo em Deus "seu centro e sua morada" - Teresa participa da estabilidade e alegria daquele que é o Imutável, e vive em plenitude a condição humana. A que chegou ao convento com o sonho de ser "co-redentora do mundo" imolando-se pela Igreja e pela humanidade escreveu: "Assim passamos a vida: orando, trabalhando e rindo". Nem a morte teve nada de espantoso para ela, porque morrer é submergir
definitivamente em Deus, em cujos braços amorosos vivia.

1920:

Primeiros dias de março. Assegura que morrerá logo, dentro de um mês.

2 d e abril. 6.a-feira Santa. Cai de cama, gravemente enferma de tifo.

5 de abril. Administram-lhe os últimos sacramentos, a seu pedido.

6 de abril. Faz sua profissão religiosa, repetindo alegre e emocionada a fórmula de consagração ao Senhor.

7 de abril. última comunhão de Ir. Teresa.

12 de abril. Às 19h15min, morre santamente. Contava 19 anos e nove meses de vida e onze meses de Carmelita. "Logo fará milagres", escreve poucos dias depois o Pe. Julião Cea, C.M.F., que acertou plenamente. Desde então são incontáveis as pessoas que atribuem à sua intercessão graças e favores de toda espécie.