31 de agosto de 2014

Propriedade privada e liberdade - Venerável Fulton Sheen

Por venerável Fulton Sheen



" A liberdade está plantada no espírito. Só as criaturas espirituais e racionais são livres. Só o homem tem determinação própria. Porque, dotado de razão, pode assentar os seus próprios projetos e propósitos e escolher os meios de usa-los. Sua suprema liberdade é obtida quando age dentro da lei de seu ser e escolhe dentre as boas coisas com o fim de alcançar o mais completo enriquecimento e a plenitude de sua personalidade em Deus.

A base de nossa liberdade, bem sabemos -, é nossa alma racional. Mas existe uma garantia externa de nossa liberdade, já que não somos puramente espirituais, mas porque somos compostos de corpo e alma, matéria e espírito, necessitamos de algum sinal visível e externo de nossa invisível liberdade espiritual. Ou, se o homem é livre porque tem uma alma espiritual, não deverá haver um sinal externo para essa liberdade interna, algo que possa chamar de seu no mundo exterior, assim como chama a sua alma propriedade dentro de si?

Liberdade significa responsabilidade ou domínio de seus atos.. Como pode, porém, esta responsabilidade interna melhor revelar-se externamente do que por meio da posse de alguma coisa material sobre a qual se possa exercer controle? O homem é mais livre em seu íntimo, quando possui alguma coisa no mundo exterior que possa chamar de seu , que possa dar cunho a sua personalidade.

Se o homem não possuísse nenhuma coisa que se pudesse tornar responsável, não seria livre nem dentro, nem fora de si. Dêem-lhe, porém, alguma coisa que possa afeiçoar à sua própria imagem e semlhança, assim como Deus o fez à sua imagem e semelhança e o homem será economicamente livre. Tal coisa é a propriedade privada.

A propriedade privada, então, é a garantia econômica da liberdade, tal como a alma é sua garantia espiritual - a prova de que é tao livre em seus atos externos quanto em seu fôro íntimo; a garantia de que é a fonte da responsabilidade não somente no que se refere ao que ele é, mas também ao que possui.

O direito à propriedade privada baseia-se na dignidade da pessoa humana e não num privilégio do Estado. O Estado pode confirmar o direito natural, mas em nenhum sentido o cria. O direito á propriedade  está, portanto, fundado na natureza humana. Não é o Estado que nos dá este direito. O homem tem esse direito antes do Estado e o Estado não pode destruí-lo sem destruir a natureza do homem.

Pelo fato de a propriedade em suas relações externas ser o sinal da liberdade, é que a Igreja tem feito da larga distribuição da propriedade privada a pedra angular de seu programa social. " A riqueza, constantemente aumentada pelo progresso econcômico e social, deve ser distrubuída por entre os vários indivíduos e classes de modo tal que seja alcançado o bem comum de todos" ( Quadragesimo Anno)

A Igreja por saber que a propriedade privada é a  garantia econômica de uma pessoa ou família, luta por ela. Porque renunciar à propriedade é ficar alguém sujeito a outrem. Se renunciar ao meu direito è propriedade, ficarei sujeito, quer:

1 - Ao Estado ou coletividade, como no comunismo,
2 - Ao próximo, como o capitalismo selvagem o quer
3 - A Deus, como no voto de pobreza.( neste caso, ele tudo possui, mas a tudo renuncia, pois nada tem a desejar)

Porque a abolição da propriedade é o começo da escravidão, opõe-se a Igreja ao capitalismo selvagem que encerra a propriedade nas mãos de poucos e ao comunismo, que confisca inteiramente em nome da coletividade.

Profundamente interessada na liberdade do homem, recorre a Igreja a um meio eficaz: sugere-lhe aquilo que o fará livre, isto é, dá-lhe alguma coisa que ele possa chamar de seu.


***

De: O problema da Liberdade

A hediondez espírita - Dom Corrêa (20/22)

A HEDIONDEZ ESPÍRITA

Dom José Eugênio Corrêa
Bispo de Caratinga
(1957-1978)

20. SÓ A IGREJA CATÓLICA É A IGREJA DE CRISTO

Jesus instituiu «uma só» Igreja, A SUA Igreja: «Pedro, tu és Pedra e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja».

A Igreja de Cristo é indefectível em matéria de fé e de moral, não pode fracassar: «...as portas do inferno não prevalecerão contra ela».

Essa Igreja goza da assistência divina e da promessa de perenidade: «Eu estarei convosco todos os dias até à consumação dos séculos».

Tudo o que a Igreja condena, Deus condena; e o que a Igreja ordena, Deus ordena: «Tudo o que ligares na terra, será ligado no céu: e tudo o que desligares na terra, será desligado no céu».

Qual é a Igreja de Cristo? Qualquer estudantezinho de história sabe muito bem que a única Igreja fundada por Cristo, e que vem até nós sem solução de continuidade, é a Igreja Católica, Apostólica, Romana. TODAS as outras religiões e igrejas são fundadas pelos homens: sabemos perfeitamente a data, o nome do fundador... E é bom notar que todas as religiões e seitas religiosas foram fundadas para satisfazer a caprichos humanos. E as seitas que se dizem cristãs são heréticas e unilaterais, porque se baseiam ou se apegam a uma ou poucas verdades cristãs e não querem saber de nada mais. Como se pudéssemos servir a Deus conforme nossos caprichos.

Religião não é coisa que estabelecemos, que escolhemos, que selecionamos, conforme nossos gostos e nossas idéias. Religião é o caminho indicado por Deus. Temos de servir a Deus como Ele quer ser servido. Temos de aceitar tudo o que Deus manda. «Ide, pois, e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo, ensinando-os a OBSERVAR TUDO O QUE VOS TENHO MANDADO...»

Não é verdade que todas as religiões são boas, e que isto é questão de gosto, e que podemos ir a Deus por qualquer caminho... Uma só, a Religião de Jesus Cristo, pode ser verdadeira. Este é o caminho, a verdade, a vida.

30 de agosto de 2014

Pensamentos Consoladores São Francisco de Sales.

14/15  -  Como será agradável para os pais e amigos conhecerem-se e conversar juntos no céu.

Deveríamos sempre ter em nossos pensamentos os dias eternos, e nada há que não devêssemos fazer em contemplação deles. Não diz Davi: "Por causa das palavras da vossa boca caminhei por vias duras e difíceis?" E que são estas palavras dos lábios de Nosso Senhor, senão palavras da vida eterna? São Pedro tinha razão em dizer: "A quem iremos nós, Senhor? vós tendes as palavras da vida eterna". É esta vida eterna com que Nosso Senhor, no Gênesis, queria mover Caim, quando lhe disse: "Se tu obras bem, não receberás a recompensa?" É esta vida eterna, por cujo desejo o santo Jacó se chama peregrino no Gênesis. "Os dias, respondeu ele a Faraó, da peregrinação da minha vida, assim os bons como os maus, duram cento e trinta anos, que ainda se não se aproximam dos nossos predecessores". "Lembro-me dos dias antigos, diz Davi, e tenho tido em minha alma anos eternos".
A vida eterna, para quem a considera bem, basta para mover os corações mais endurecidos. No princípio, no fervor da ordem de São Domingos, havia um pregador chamado Reginaldo, que pregava em Bolonha com um fruto indizível. Nesta cidade havia um homem sábio e rico, que, com medo de ser por ele convertido não o queria ouvir, como fazem muitos. Aconteceu contudo que tendo-o ouvido uma vez, dia de Santo Estevão, a respeito destas palavras: "Eu vejo os céus abertos", converteu-se e fez-se religioso.
Por causa desta vida eterna, Davi inclinava a sua vontade e coração a guardar os mandamentos de Deus; Santo Agostinho retirou-se com os seus religiosos antes de ser bipo, e São João Batista retirou-se para o deserto.
Todos os bem aventurados se reconhecerão entre si no céu, cada um por seu nome como diz o Evangelho, pois que nesta pequena amostra, que Nosso Senhor quis patentear no Tabor aos seus apóstolos,quis que conhecessem a Moisés e Elias, que nunca tinham visto.
Mas se isto assim é, que alegria receberemos, tornando a ver os que tanto amávamos nesta vida, onde conheceremos os novos cristãos, que agora se convertem à nossa santa fé, nas Índias, no Japão, nos Antípodas! E nas santas amizades, assim como começaram nesta vida, continuar-se-ão por toda a eternidade no outro. Amaremos as pessoas particulares; mas estas amizades particulares não gerarão particularidades; porque todas as nossas amizades terão a origem na caridade de Deus, que conduzindo-os todos, fará com que amemos a cada bem aventurado com este puro amor com que somos amados pela sua divina bondade.
O!Deus! que consolação teremos com esta celeste conversação que mantivermos uns com os outros!  Aí, os nossos anjos bons dar-nos-ão uma consolação maior do que a que se pode explicar e pensar, quando se nos tornarem conhecidos, e quando nos mostrarem com tanto amor o cuidado que tiveram pela nossa salvação, durante o curso da nossa vida mortal, lembramo-nos as santas aspirações que nos trouxeram, como um leite sagrado que foram beber no seio da divina bondade, para nos atrair na busca destas divinas suavidades de que então gozaremos. Não vos lembrais, nos dirão eles, duma inspiração que nos trouxe em tal tempo, lendo tal livro, ouvindo tal sermão, olhando para tal imagem, como de Santa Maria Egipcíaca, inspiração que nos excitou a converter-nos para Nosso Senhor e que foi assunto da vossa predestinação? Oh! Deus! Não se derreterão os nossos corações com um contentamento indizível?
Mas, além disso, cada um dos bem aventurados terá uma conversa particular com outro, segundo a sua categoria e dignidade. Santo Agostinho desejou um dia ver Roma triunfante, no seu triunfo glorioso, São Paulo pregando, e Nosso Senhor ensinando entre o povo, curando doentes, fazendo milagres. Oh! Deus! que consolação teve este grande santo, vendo a Jerusalém celeste no seu divino triunfo, o grande apóstolo São Paulo pregando e entoando com uma melodia sem rival os louvores que consograva eternamente a divina Majestade no céu! Mas, que excesso de consolação para Santo Agostinho o ver fazer este perpétuo milagre da felicidade dos bem aventurados por Nosso Senhor, cuja morte no-la adquiriu! Imaginai o delicioso entretenimento que terão estes dois santos, um com o outro, dizendo São Paulo a Santo Agostinho: Meu caro irmão, não vos lembrais que lendo a minha epístola fostes ferido por uma tal inspiração, que vos obrigou a converter-vos, inspiração que eu tinha obtido da misericórdia do nosso bom Deus pela oração que por vós fazia ao passo que lieis o que eu tinha escrito? Isto não causará uma admirável doçura no coração deste Santo Padre?
Oh! Deus! que consolação teremos nós, estando no céu, onde veremos a bendita face de Nossa Senhora inflamada no amor de Deus? E se Santa Isabel ficou transportada de gozo e contentamento, quando, um dia que a visitou, lhe ouviu entoar este divino canto: Magnificat anima mea Dominum, como terão os nossos espíritos e corações um contentamento inexprimível quando ouvirem entoar por esta sagrada cantora o cântico do eterno amor!
Oh! Deus! que doce melodia! Sem dúvida pasmaremos e nos inebriaremos em raptos inconcebíveis!
Mas, dir-me-eis vós, visto que conversaremos e nos entenderemos com todos os que tiverem nesta Jerusalém celeste, que diremos nós? De que falaremos? Qual será o assunto? Será o da misericórdia que Deus no mundo nos tiver feito, pela qual nos tornou dignos de entrar no gozo desta bem aventurada felicidade, na qual a alma nada mais terá a desejar; porque nesta palavra de felicidade esta compreendida toda a qualidade de bens, os quais contudo só formam um bem único, que consiste no gozo de Deus.
Mas de que trataremos nós na nossa conversação? Da morte e paixão de Nosso Senhor. Não o aprendemos na Transfiguração, onde não falou de nada tanto como do martírio que devia padecer em Jerusalém, martírio que era a morte deste divino Salvador? Oh! se pudéssemos compreender alguma coisa da consolação que terão os bem aventurados falando desta morte.
Passemos avante, eu vô-lo peço, e digamos alguma coisa de honra e graça que teremos em conversar com Nosso Senhor em pessoa. Oh! é aqui, sem dúvida, que a nossa felicidade redobrará indizivelmente.
Que faremos almas queridas, em que nos tornaremos, quando virmos este coração adorável e amabilíssimo do nosso divino Mestre, através da chaga sagrada do seu lado, ardente completamente ao amor que nos tem, coração no qual veremos todos os nossos nomes escritos com letras de amor? Ah! é possível, diremos então ao nosso divino Salvador, que me tenhais amado tanto, que graveis o meu nome em vosso coração e em vossas mãos? Isto contudo é verdade.
O profeta Isaias, falando na pessoa de Nosso Senhor, nos diz o seguinte: "Quando ainda acontecesse que a mãe esquecesse o filho que gerou, eu não te esqueceria, porque gravei o teu nome em minhas mãos". Mas Nosso Senhor, tornando ainda mais doce estas palavras, nos dirá: "Não só gravei o teu nome em minhas mãos, mas ainda em meu coração". Objeto, sem dúvida, de grande consolação é ver que somos tão estreitamente amados por Nosso Senhor, e como nos tem a todos em seu coração. Oh! que admirável gozo, para um dos espíritos bem aventurados, quando virem nesse coração sagrado e muito adorável os pensamentos de paz que tinha a seu respeito, na própria hora da sua paixão, pensamentos por meio dos quais nos preparava, não só os meios principais para a nossa salvação, mas ainda dispunha particularmente, com uma admirável bondade, todos os divinos atrativos, as inspirações e os movimentos bons, dos quais se queria servir este doce Salvador para nos atrair ao seu amor! Estas vistas, estas considerações particulares que fizermos a respeito de tão sagrado amor, com o qual tivermos sido e seremos tão cara e ardentemente amados por nosso soberano Mestre, não inflamarão os nossos corações com um amor e ardor rival? Ah! que não deveríamos fazer para gozar destas suavidades tão doces e agradáveis! 
Se temos tanto contentamento nesta vida mortal em ouvir falar do que amamos, que não nos podemos cansar, que alegria e júbilo receberemos em ouvir por toda a eternidade entoar os louvores da divina Majestade, que devemos amar e amaremos mais do que se pode explicar e compreender? E se, durante a vida, temos tanto gosto na imaginação da felicidade eterna, quanto mais gosto teremos no gozo desta mesma felicidade e glória que não terão fim e duração eternamente, sem nunca podermos ser rejeitados! Oh! como esta confiança aumentará muito a nossa felicidade e consolação!
Caminhemos pois gostosa e alegremente entre as dificuldades desta vida passageira; abracemos com os braços abertos, as mortificações, as penas e aflições, se as encontrarmos em nosso caminho, pois que estamos certos de que estas penas terão fim e terminarão com a nossa vida, depois da qual só haverá alegria, contentamentos e consolações eternas.
Crede-me, para viver contente com a peregrinação, convém ter presente à vista a esperança da chegada a nossa pátria, onde permaneceremos eternamente, e no entanto crer firmemente; porque, é certo que Deus, que nos chama para si, olha como nós vamos, e nunca permitirá que nos aconteça nada senão para nosso maior bem. Ele sabe quem nós somos, e estender- nos-á a sua mão paternal nos maus caminhos, para que nada nos demore.
Meu Deus! que consolação tenho na confiança de vos ver eternamente unidos na vontade de amar e louvar a Deus! Conduza-nos a divina Providência para onde quiser; tenho a esperança e confiança de que conseguiremos o fim e chegaremos ao porto. Viva Deus! tenho esta confiança. Estejamos alegres sem diminuição e seguros sem ignorância.

Do diabólico delírio dos mórmons - Pe. Leslie Rumble, M.S.C. (4/20)

Os Mórmons
ou
"Santos dos Últimos Dias"

Padre Leslie Rumble, M.S.C.
Doutor em Teologia  
Missionarii Sacratissimi Cordis
"Missionários do Sagrado Coração"

EXPERIÊNCIAS MÍSTICAS
Diz-nos Joseph que, pelo ano de 1820, tendo então uns quatorze anos de idade, teve a sua primeira visão. Declara que, no meio de todas as pretensões antagônicas das diferentes seitas protestantes, ele se interessou por saber à qual Igreja deveria aderir. Deu-se a uma fervorosa oração, durante a qual Deus Pai e Jesus Cristo simultaneamente lhe apareceram e lhe disseram que "a nenhuma", visto que todas as Igrejas existentes estavam erradas.
Três anos mais tarde, de acordo com o seu próprio relato, ele foi visitado por um anjo chamado Moroni. Esse anjo lhe disse que havia um livro, de lâminas de ouro, dando um relato dos primeiros habitantes da América e contendo a plenitude do evangelho eterno como a eles fora revelado. Essas lâminas estavam enterradas na terra. 
Joseph Smith foi o único designado para desenterrá-las, e com elas ele acharia dois "óculos", duas mágicas pedras transparentes metidas em aros de prata, as quais Deus preparara para o habilitar a traduzir o que estava escrito nas lâminas. Todavia, não devia ele tentar recuperar as lâminas antes de quatro anos passados. Depois o anjo lhe deu uma visão do lugar delas, de modo que ele fosse capaz de reconhecê-lo mais tarde quando lá fosse.
Escusa dizer que Joseph Smith ficou inteiramente excitado pelo pensamento de haver sido escolhido para restabelecer na terra a real Igreja de Jesus Cristo. Mas possuiu a sua alma em paciência até que, decorridos quatro anos, por ordem do anjo foi e achou as lâminas no lado oeste da colina Cumorah, a quatro milhas de Palmira, perto da estrada para Manchester. Com elas estavam os "óculos". E estes habilitaram-no milagrosamente a ler a linguagem de aparência estrangeira gravada nas lâminas, entendendo-as ele em inglês. Assim, levou consigo as lâminas e os óculos, ditou a uns escribas uma tradução delas, e, quando acabou, foi-lhe ordenado devolver as lâminas e os óculos ao anjo Moroni, que as levou para sempre deste mundo!
Estas pretensões são tão extravagantes, que a custo parece necessário refutá-las; todavia, até o dia de hoje todos os que se fazem Mórmons, espera-se que as aceitem. Por isto devemos penetrar mais a fundo no assunto.

29 de agosto de 2014

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - 41ª Parte

OPÚSCULO V

QUINZE MEDITAÇÕES SOBRE A PAIXÃO DE JESUS CRISTO, PARA O TEMPO QUE MEDEIA
ENTRE O SÁBADO DA PAIXÃO E O SÁBADO SANTO

MEDITAÇÃO I

Para o sábado da paixão

Jesus entra triunfante em Jerusalém

1. Avizinhando-se o tempo de sua Paixão, nosso Redentor deixa Betânia para se dirigir a Jerusalém. Achando-se perto dessa ingrata cidade, Jesus a contempla e chora. “Vendo a cidade, chorou sobre ela”. Chora, prevendo sua ruína em conseqüência do grande crime que aquele povo iria em breve cometer, tirando a vida ao Filho de Deus. Ah, meu Jesus, chorando então sobre aquela cidade, choráveis também sobre a minha alma, vendo a ruína que eu mesmo me procurava com meus pecados, obrigando-vos a condenar-me ao inferno depois de haverdes morrido para me salvar. Ah, deixai-me chorar o grande mal que me fiz, desprezando a vós, sumo bem, e tende compaixão de mim.

2. Jesus Cristo entra na cidade, o povo sai ao seu encontro, recebe-o com aplauso e festas e para honrá-lo junca o caminho com ramos de palmeiras e muitos estendem suas vestes por onde ele deve passar. Quem diria então que esse Senhor, reconhecido como o Messias e acolhido com tantos sinais de respeito, deveria atravessar as mesmas ruas com uma cruz sobre os ombros, condenado à morte! Ah, meu caro Jesus, agora esse povo vos aclama dizendo: “Hosana ao Filho de Davi, bendito o que vem em nome do Senhor”(Mt 21,9), e depois levantará a voz insultando Pilatos para que vos tire do mundo, fazendo-vos morrer crucificado: “Tira-o, tira-o, crucifica-o”(Jo 19,15). Adianta-te, minha alma, e dize-lhe com afeto: Bem-aventurado o que vem em nome do Senhor. Sede para sempre bendito por vossa vinda, ó Salvador do mundo, porque, do contrário, estaríamos perdidos.

Ó meu Salvador, salvai-me.

3. À tarde, porém, depois de tantas aclamações, não se encontrou ninguém que o convidasse a hospedar-se em sua casa e por isso teve de voltar a Betânia. Meu amado Redentor, se os outros não querem acolher-vos, eu vos quero acolher no meu pobre coração. Houve um tempo em que eu, infeliz, vos expulsei de minha alma, mas agora prefiro ter-vos comigo a possuir todos os tesouros da terra. Eu vos amo, meu Salvador, e o que poderá separar-me mais de vosso amor? Só o pecado. Mas vós haveis de livrar-me desse pecado com o vosso auxílio, ó meu Jesus, e vós também, ó minha Mãe Maria, com a vossa intercessão. 

Sermão para o 10º Domingo Depois de Pentecostes - Diácono Pedro Henrique Gubitoso, IBP

[Sermão] O fariseu, o publicano e a humildade, fundamento da vida espiritual

Sermão para o 10º Domingo Depois de Pentecostes
17.08.2014 – Diácono Pedro Henrique Gubitoso, IBP.
Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Ave Maria…
Reverendo padre Daniel, caro confrade seminarista, caríssimos fiéis,
Um católico que acreditasse estar isento de todo pecado estaria redondamente enganado. Todo homem é pecador, “todo homem é mentiroso” diz o Salmo (s. 116). “ O justo peca sete vezes ao dia” diz o livro dos Provérbios (Pv 24,16). “Não há homem que não peque” diz o Eclesiastes (Ecle 7,21). “Aquele que diz que não tem pecado, faz Deus mentiroso” diz São João (1 Jo 1, 10). Todo homem precisa de Deus, da ajuda de Deus. O pré-requisito básico para qualquer vida espiritual sólida é reconhecer que somos pecadores e que precisamos de Deus, em outras palavras: é preciso ser humilde.
Para ilustrar esse propósito, Nosso Senhor nos apresenta a parábola do fariseu e do publicano, em que figuram duas pessoas e duas atitudes completamente opostas.
“Dois homens subiram ao templo para orar : um fariseu e um publicano”.
Quem eram os fariseus e os publicanos? Os fariseus eram membros de uma seita formada no século segundo antes de Cristo. Eles se caracterizavam pelo cumprimento escrupuloso e minucioso de toda a lei escrita que Moisés tinha deixado. Nosso Senhor muitas vezes no evangelho condenou a hipocrisia dos fariseus que cumpriam rigorosamente a lei exterior mas que não tinham boas disposições no interior de suas almas; ele os chama de “sepulcros caiados” (Mt 23, 27) pois por fora parecem formosos mas por dentro estão repletos de imundície. Muitas vezes, eram também escrupulosos com o pouco (imposto das ervas, entre outras prescrições da lei) ou inventam tradições próprias enquanto negligenciavam o mais importante (ajuda aos pais, por exemplo). Os publicanos, por outro lado, eram uma classe extremamente odiada e desprezada entre os judeus, por dois motivos: primeiro, porque eram cobradores de impostos contratados pelos romanos, ou seja, judeus que recolhiam dinheiro de outros judeus colaborando assim com o poder estrangeiro que dominava naquele momento a Palestina; segundo, porque numa tal função acabavam frequentemente se envolvendo com corrupção, cobrando impostos mais caros do que deveriam. O publicano Zaqueu, por exemplo, havia confessado a Nosso Senhor ter defraudado muitos bens. Outro publicano que conhecemos é Levi, futuro apóstolo São Mateus. Enfim, Nosso Senhor nesta parábola toma como exemplo dois personagens diametralmente opostos. Ele põe frente a frente o orgulho do fariseu e a humildade do publicano.
“O fariseu, de pé, orava no seu interior desta forma: Graças te dou, ó Deus, porque não sou como os outros homens: ladrões, injustos, adúlteros; nem, por exemplo, como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e pago o dízimo de tudo o que possuo.”
O fariseu não pede nada a Deus, somente agradece por todas as virtudes com as quais está ornado. Falta-lhe o essencial da oração: o pedido. Ele está completamente seguro e confiante em seus méritos, está ali como se exigisse um juízo divino, uma certificado de qualidade carimbado por Deus. Ele está de pé, no primeiro lugar da sinagoga, próximo ao altar. Seus olhos estavam fixados no céu quase como se o já tivesse conquistado. O fariseu passa o tempo de sua oração louvando suas próprias virtudes, ele não pensa em Deus mas somente em si mesmo e nas suas obras. Pior ainda, depois de tanto exaltar-se ele ainda por cima despreza o publicano ali presente.
“O publicano, porém, conservando-se a distância, nem sequer se atrevia a levantar os olhos ao céu; o que fazia era bater no peito, dizendo: Meu Deus, tende piedade de mim, que sou pecador!”
O publicano treme, teme e confessa que é pecador. Ele se conserva à distância, não se atreve a levantar os olhos aos céus. Santo Agostinho explica que o publicano não se atrevia a olhar pois esperava que Deus olhasse primeiro para ele. Enquanto que o fariseu atribuía a si todo o bem que tinha feito, o publicano se reconhecia como autor exclusivo de seus pecados. Sua oração é simples, mas perfeita e fervorosa : “Meu Deus, tende piedade de mim que sou pecador”. Assim devem ser nossas disposições quando vamos rezar ou nos confessar. Por maiores que sejam nossos pecados, devemos ter absoluta confiança na misericórdia divina. Deus ama nos perdoar, pois, como nos diz a colecta da missa de hoje, é perdoando e exercendo sua misericórdia que Deus manifesta maximamente a sua onipotência. O que Deus pede acima de tudo é um coração contrito.
“Afirmo-vos que foi este que voltou justificado para sua casa, e não o outro: Porque quem se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado.” 
São Bernardo diz: “O fariseu, que acreditava estar pleno, saiu vazio. O publicano, que se apresentou vazio pela absoluta indigência, foi repleto de misericórdia e de graça”. O fariseu, apesar de todas as obras que tinha realizado, saiu do templo pior do que quando entrou, não voltou justificado para a casa. Já o publicano, graças ao seu espírito de penitência e de humildade sai do templo completamente justificado. O que devemos aprender com esta parábola é que a humildade é um dos fundamentos da vida espiritual. São Tomás explica que há dois fundamentos da vida espiritual: a Fé e a humildade. A virtude de Fé é um fundamento positivo enquanto a humildade é um fundamento negativo. O que isto quer dizer? Se comparássemos a nossa vida da graça à construção de um prédio, a Fé seria o alicerce desse prédio pois é pela adesão às verdades reveladas que se começa qualquer vida cristã. Entretanto, a humildade é também fundamento da vida espiritual, mas num outro sentido, isto é, enquanto remove os primeiros obstáculos à perfeição cristã. Não é possível construir sobre um terreno cheio de destroços. A humildade, sendo uma virtude que modera o apetite desordenado da própria excelência, nos permite de limpar o terreno de nossa alma para que Deus possa começar em nós a sua obra de santificação. Enquanto nossa alma está repleta de amor-próprio como a alma do fariseu, é impossível progredir na vida espiritual pois neste caso a alma está muito cheia dela mesma e não há espaço para Deus.
Portanto, após ter recebido a Fé pelo batismo, o primeiro passo na busca da perfeiçã cristã é reconhecer nossa dupla pequenez: somos criaturas e ainda por cima pecadores. Em seguida, devemos reconhecer que tudo aquilo que temos de bom procede de graça de Deus. “Que tens tu que não tenhas recebido?” nos diz São Paulo (2Cor 4, 7). É precisamente por esta razão que as virtudes heróicas de alguns santos não somente podem, mas devem coexistir com a humildade; por mais que sejam perfeitos sempre reconhecerão que a santidade vem de Deus. A humildade, segundo a definição de Santa Teresa d’Avila, consiste em “caminhar na verdade”. Reconhecer o bem e o mal onde estão. Por mais que sejamos bons e pratiquemos a virtude devemos sempre ter em mente que estes bens nos vêm de Deus; exatamente como o faz Nossa Senhora no Magnificat: “Fecit mihi magna qui potens est”, isto é : “Aquele que é poderoso fez em mim grandes coisas”. Uma vez reconhecida por nós mesmos a nossa fraqueza e a nossa indigência diante de Deus, aí sim se abrem diante de nós os caminhos para progredirmos no exercício das outras virtudes.
Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Sermão para o 11º Domingo depois de Pentecostes – Diácono Tomás Parra, IBP


[Sermão] Fundamentos para o apostolado leigo

Sermão para o 11º Domingo depois de Pentecostes
24.08. 2014 – Diácono Tomás Parra
Em nome do Pai…
Ave Maria…
Reverendo Padre, Caros irmãos,
               Neste 11º domingo depois de Pentecostes, a leitura do evangelho narra o episódio da cura do surdo-mudo, descrita por São Marcos. É muito frequente, no Evangelho, que os judeus tragam seus doentes para serem curados por Cristo. São Marcos conta que na região de Genesaré, “em todos lugares onde (Ele) entrava, nos povoados, nas cidades ou nos campos, colocavam os doentes nas praças, rogando que lhes permitisse ao menos tocar na orla de seu manto.  E todos que o tocavam eram salvos”. Mais tarde, vindo de Tiro, no caminho em direção ao mar da Galiléia, “trouxeram-lhe um surdo-mudo”, e“suplicavam-Lhe que lhe impusesse a mão” para curá-lo.
                Caros irmãos, a atitude destes judeus é um exemplo do apostolado do qual trataremos hoje. O primeiro tipo de apostolado é aquele exercido pela hierarquia mesma da Igreja. Como dizia Tertuliano, “Deus Pai enviou a Cristo, Cristo enviou aos apóstolos; os apóstolos, aos bispos”. E Cristo confiou de modo especial aos apóstolos a Missão de converter todos os homens: “Ide, pregai o Evangelho a toda criatura, aquele que crer e for batizado será salvo”.
                O segundo tipo é o apostolado leigo, que existiu durante toda a vida da Igreja. E nós podemos perceber isto na atitude destas pessoas que levavam os doentes até Jesus para que fossem curados. Não eram os apóstolos ou discípulos de Cristo que os levavam, mas os amigos e parentes.
                No Evangelho, a doença é um símbolo do pecado, e como Nosso Senhor veio ao mundo para destruir o pecado, ele começa curando os doentes. E esses próximos dos doentes que os levam a Ele representam os que cooperam com a obra de Cristo, que é a conversão dos pecadores para a salvação de suas almas. Considerando isto, podemos dizer que mesmo os fiéis leigos participam de certo modo desta Missão confiada aos apóstolos por Cristo. “Ide, pregai o Evangelho a toda criatura…”.
                Assim, caros irmãos, como membros da Igreja, cuja cabeça é Cristo, devemos todos trabalhar para salvar nossa alma e a dos nossos próximos, para o crescimento do reino de Cristo. A primeira maneira de fazê-lo é através doapostolado da oração.
Isto é claro no Evangelho de hoje. Primeiramente, pelo exemplo das pessoasque suplicavam a Cristo pela cura para o próximo ou para si mesmas. E quão insistentes eram essas súplicas, e acompanhadas também de uma grande fé. Fé tal que levou uma vez alguns amigos a baixarem um paralítico em seu leito, através de cordas, tendo feito uma abertura no telhado para poderem alcançar o Mestre. E, na ocasião, não somente a cura foi dada, mas também o perdão dos pecados.
                Porém, caros irmãos, também mereceram um favor especial do Senhor as súplicas dos parentes do surdo-mudo.
Nosso Senhor não o cura imediatamente, mas “tomando-o a parte, de entre a multidão, meteu-lhe os dedos nos ouvidos, e tocou-lhe a língua com a sua saliva”.Cristo atendeu suas orações, mas antes, quis se afastar da multidão, para nos ensinar a encontrar Deus no silêncio e na oração. E também para não haver ostentação no fazer milagres, nos ensinando a fugir da vaidade. De fato, como diz São João Crisóstomo, não há maior milagre que professar a humildade e praticar a modéstia. E para combater o orgulho, que se opõe a estas virtudes, toda a vida de Cristo foi exemplo de humildade e é sobre esta humildade que Ele fundou a religião. “Cristo fez-se, por amor de nós, obediente até a morte e morte de cruz. Por isso, Deus O exaltou …”.
São João Crisóstomo diz também que Cristo podia ter curado o surdo-mudo com uma só palavra, mas “meteu-lhe os dedos nos ouvidos, e tocou-lhe a língua com a sua saliva”, para mostrar que seu corpo estava cheio do poder de Deus. Essas curas que realizava mostram que em Cristo veio a restauração da natureza humana, que, por causa do pecado de Adão, tinha sofrido feridas de toda sorte. Além disso, gestos semelhantes ao de Nosso Senhor são utilizados até hoje no rito do batismo, para lembrar o cristão do dever que terá de receber a palavra de Deus pelo ouvido, e de professá-la com a língua.
Em seguida, caros irmãos, Nosso Senhor nos incita à oração pelo seu próprio exemplo. “Levantando os olhos ao céu, (Ele) suspirou”, (do latim ingemuit, gemeu).
Ele levanta os olhos ao céu para nos mostrar que é de lá que vem todos os bens. De lá, vem a cura para os doentes, o perdão para os pecadores. Ele geme de compaixão da miséria do homem decaído, apresentando suas súplicas ao Pai Celeste. Não que precisasse fazê-lo para obter o milagre, pois Ele é Deus, mas para nos ensinar como recorrer à misericórdia divina.
                É muito importante saber que a oração deve anteceder o apostolado do sacrifício e da caridade. E para isso temos o exemplo dos apóstolos e dos discípulos, que estavam, “todos estes, unânimesperseverantes na oração com algumas mulheres, dentre as quais Maria, Mãe de Jesus”, esperando a vinda do Espírito Santo antes de começarem a exercer a Missão de levar o Evangelho aos homens de todo o mundo. Apesar de terem sido discípulos do próprio Cristo, convivido com Ele, visto Seu exemplo e escutado seus ensinamentos pessoalmente, tinham ainda que rezar para receberem a força vinda do Céu, que lhes daria impulso para pregar a Boa Nova a todas as nações.
                Esta oração do Cenáculo, este recolhimento que antecede Pentecostes, é para nós um modelo. Pois nos ensina, caros irmãos, as três condições necessárias para que as nossas orações sejam atendidas com eficácia:
                Em primeiro lugar, a perseverança, pois lá estavam os apóstolos com os discípulos e Nossa Senhora, e ficaram em oração contínua, esperando que Cristo enviasse o Espírito Santo; e ali oraram durante dez dias. Esta perseverança vai de par, evidentemente, com a fé e a confiança na promessa divina: “Pedi e recebereis”. Não esqueçamos também a fé do paralítico, que desceu pelo teto para pedir a Cristo a sua cura.
                Em segundo lugar, a unanimidade: Também pela promessa divina:“Se dois de vós estiverem de acordo (…) sobre qualquer coisa que queiram pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos céus. Pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou no meio deles”. Caros irmãos, a oração em comum tem maior valor aos olhos de Deus que a oração individual, daí a importância de se rezar junto com os filhos em família, junto com bons amigos católicos.
                A terceira condição para que nossa oração seja eficaz para alcançar a vinda do reino do Pai, como pedimos no Pai-Nosso, é a mediação de Nossa Senhora. Ela estava no Cenáculo, em meio aos Apóstolos e discípulos cumprindo a missão de medianeira, missão que lhe foi dada por Deus desde a Encarnação do Verbo, pois, segundo o ensinamento de São Luís de Montfort, Deus Pai escolheu Maria para dar seu Filho ao mundo e, juntamente com seu Filho, lhe confiou todo o tesouro de suas graças e misericórdias. Ela se tornou o Canal que liga os homens à Cristo, que liga os homens ao único Mediador. E esta conduta, este modo de fazer, Deus não mudará até o fim dos tempos, de forma que recorrer à mediação de Nossa Senhora é o meio mais fácil de alcançar de Deus todas as graças.
                Jesus Cristo nos disse “é preciso rezar sempre, oportet semper orare”. A necessidade disso, caros irmãos, para os que têm a fé, é evidente. Em Fátima, Nossa Senhora dizia às três crianças: “Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas para o inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas”. Este apelo se dirige também a nós. Ora, se na época de Cristo havia inúmeros doentes que procuravam remédio em sua misericórdia, hoje existem muitos pecadores, mas que diferentemente daqueles, não buscam sua cura espiritual – o perdão – e caminham para a danação eterna. Pensar também em nossos vícios, nas necessidades de nossos próximos, no sofrimento dos que sofrem perseguições pela fé no Oriente, deve nos incitar a rezar ainda mais. Além disso, hoje, como sabemos, pecados graves e alguns vícios que clamam vingança aos céus são tolerados e facilitados pelas leis civis.
                É preciso, todavia, caros irmãos, não olhar somente os males, para não nos desencorajarmos. Mas saber que os Corações de Jesus e Maria estão atentos às nossas orações.  Que Ele, sendo Deus, pode imperar sobre o mal, como quando disse “Ephpheta” (Abre-te, desatate), e imediatamente os ouvidos do surdo-mudo se abriram, sua língua se desatou e ele começou a falar normalmente o aramaico, língua que ele supostamente desconhecia.
Mas é necessário saber também, que a oração, só, não basta. São Tiago nos ensina que a “fé, se não tiver obras, está completamente morta”. É preciso agir, rezar e agir. É preciso se sacrificar, como pediu Nossa Senhora, e praticar acaridade.
Pode-se fazer apostolado pelo sacrifício, unindo-se a Cristo em sua Paixão; isto é, renunciando a si próprio, pelo bem dos próximos, sobretudo renunciando ao amor-próprio e aos caprichos que incomodam os outros, mesmo se isso proporcionará, por vezes, algo que seja menos cômodo. Pode-se fazer o apostolado do sacrifício praticando,  por exemplo, na medida do possível, algum sacrifício do paladar (começar já pela abstinência da sexta-feira, costume muito louvável que muitos já não praticam em nossos dias)… oferecendo tudo sempre em união a Cristo pelos próximos.
                O apostolado pode se exercer ainda pela prática da caridade, que é reproduzir a vida de Cristo em nós pela nossa entrega a Deus e ao serviço do próximo. É isso que faziam os parentes do surdo-mudo.
Enfim, caros irmãos, nosso apostolado, qualquer que seja, deve sempre levar a Cristo. Não deve ter como fim nossa promoção ou servir nossos interesses próprios, ou ainda  lutar por um bem puramente natural. Nosso apostolado deve lembrar os israelitas do Evangelho de hoje, que tinham um só desejo: levar os doentes até o Mestre “rogando que lhes permitisse ao menos tocar na orla de seu manto”. Ele, Cristo Nosso Senhor é quem cura, quem perdoa os pecados.
Consideremos que Cristo venceu o mundo e a morte, e tendo morrido pelos pecados de todos os homens, ressuscitou. E Ele deseja ardentemente que estejamos unidos a Ele na cruz, para ressuscitarmos com Ele para a glória eterna.
Peçamos, enfim, caríssimos irmãos, a Deus Nosso Senhor o que se reza hoje na colecta, que nos perdoe nossos pecados e nossa falta de merecimentos, e nos dê aquilo que não ousamos esperar da pobreza de nossas orações.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Males que afligem a Igreja e a necessidade de oração - S.S. Leão XIII



Males que afligem a Igreja


" A todos são conhecidos os males que Nós deploramos: a luta desapiedada contra os sagrados e intangíveis dogmas, que a Igreja guarda e transmite; a zombaria da integridade da virtude cristã, que a Igreja defende; a trama de calúnias de mil modos urdidas; o ódio fomentado contra a sagrada ordem dos bispos, e principalmente contra o Romano Pontífice; os ataques dirigidos, com a mais impudente audácia e a criminosa impiedade, contra a própria divindade de Cristo, no intuito de extirpar pelas raízes e de destruir a obra divina da Redenção, que força alguma poderá jamais destruir nem cancelar.



Estes ataques não são, certamente, uma novidade para a Igreja militante. Porquanto, depois do aviso dado por Cristo aos Apóstolos, ela sabe que, para instruir os homens no caminho da verdade e guiá-los à salvação eterna, ela deve todo dia descer a campo e travar combate. E, na realidade, nos séculos ela sempre lutou intrepidamente até ao martírio, considerando como sua precípua alegria e glória o poder unir o seu sangue ao do seu Fundador: no qual está depositada a segura esperança da prometida vitória.



 Por outra parte, entretanto, não podemos ocultar nos o profundo senso de tristeza que penetra os melhores, ante esta contínua tensão de batalha. De fato, é motivo de imensa tristeza ver o grande número dos que, pela perversidade dos erros e por esta insolente atitude contra Deus, são arrastados para longe e impelidos para o abismo; o grande número dos que, pondo num mesmo plano todas as formas de religião, pode-se dizer que já estão na iminência de abandonar a fé divina; o número notável dos que são cristãos só de nome, e não cumprem os deveres da sua fé.



E ainda mais nos aflige e nos atormenta o ânimo o considerarmos que a causa principal de tais ruinosos  e deploráveis males está na exclusão completa da Igreja das ordenações sociais, enquanto de propósito se hostiliza a sua salutar influencia. E nisto é de reconhecer um grande e merecido castigo de Deus, o qual cega miseravelmente as nações que se afastam d’Ele.



A necessidade da oração 



 Este estado de coisas mostra, com evidência sempre maior, o quanto é necessário que os católicos orem e supliquem a Deus com fervor e perseverança "sem nunca cessar" (1Tim 5, 17); e não somente em particular, porém ainda mais em público. Reunidos nos sagrados templos, conjurem Deus a se dignar, na sua infinita bondade, de livrar a sua Igreja "dos homens insolentes e malvados" (2 Tim 3, 2), e a reconduzir os povos ao caminho da salvação e da razão, na luz e no amor de Cristo.



Espetáculo incrível e maravilhoso! Enquanto o mundo percorre o seu caminho tormentoso, fiado nas suas riquezas, na sua força, nas suas armas e no seu engenho, a Igreja, com passo veloz e seguro, atravessa os séculos, depositando a sua confiança somente em Deus, a quem, de dia e de noite, ergue o olhar e estende as mãos súplices. Porque, embora na sua prudência não desdenhe os socorros humanos que, pela bondade divina, os tempos lhe oferecem, todavia não é nestes meios que ela deposita a sua principal esperança; mas sim na oração, coletiva e insistente, elevada ao seu Deus.



Nesta fonte ela alimenta e fortifica a sua vida; porque, elevando-se, mediante a oração assídua, acima das vicissitudes humanas, e mantendo-se constantemente unida a Deus, é-lhe dado viver, plácida e tranqüila, da própria vida de Cristo. E nisto ela é fiel imagem de Cristo, a quem o horror dos tormentos, sofridos pelo nosso bem, nada diminuiu nem tirou da beatíssima luz e da felicidade que lhe são próprias"

A hediondez espírita - Dom Corrêa (19/22)

A HEDIONDEZ ESPÍRITA

Dom José Eugênio Corrêa
Bispo de Caratinga
(1957-1978)

19. NINGUÉM PODE FAVORECER O ESPIRITISMO!

Ajudar as obras espíritas, colaborar de qualquer modo com o Espiritismo, é favorecer a heresia. E quem favorece qualquer heresia fica excomungado, conforme diz o cân. 2316 do Direito Canônico.

Também prestigiar e favorecer o Espiritismo tomar parte em suas sessões ou atos de culto. Tomar parte em qualquer culto herético também acarreta excomunhão, segundo o mesmo cân. 2316 do Direito Canônico.

Temos as nossas obras de caridade, que se mantêm com dificuldade. É preciso que todos os católicos se unam e conjuguem seus esforços para manter e melhorar cada vez mais as nossas obras de caridade, o brilho do culto divino, e as nossas obras educacionais e culturais... Se, em vez de ajudarmos as «nossas» obras que precisam de nós, vamos ajudar as obras do demônio, estamos traindo a fé, e fazendo assim o pecado de Judas.

O voto dos católicos para os católicos. As esmolas dos católicos para as obras católicas. A energia e atividade dos católicos para a nossa Igreja, para o nosso Deus... O resto é falta de caráter e de linha, é traição, é ser quinta coluna...

28 de agosto de 2014

Sermão de Santo Antônio aos Peixes



Visto aqui.

Pensamentos Consoladores de São Francisco de Sales.

13/15  -  Como o pensamento do céu é próprio para nos consolar.

O Fim do homem é a visão clara e o gozo de Deus que espera obter no céu. Bem aventurado pois aquele que emprega esta curta vida mortal em adquirir este bem eterno, preferindo o dias passageiros desta vida ao da imortalidade e aplicando todos os seus momentos mortais, que lhe restam, à conquista da santa eternidade. A verdadeira luz do céu não lhe faltará, para lhe fazer ver e tomar o caminho seguro e conduzi-lo com felicidade a este porto de eternas delícias.
Os rios correm incessantemente e volvem como diz o sábio, para o mar, que é o lugar do seu nascimento e do último repouso; todo o seu movimento só tende a uni-los à sua origem. "Oh! Deus, diz Santo Agostinho, criastes o meu coração para vós e só em vós encontrará repouso; mas que tenho eu no céu, senão a vós, ó meu Deus, e que mais quero sobre a terra? Sim, Senhor, porque vós sois o Deus do meu coração o meu quinhão e partilha na eternidade". Eis, em particular, alguns pontos que devemos crer neste assunto.
Primeiro, que há um paraíso ou glória eterna; estado perfeitíssimo, no qual se reúnem todos os bens e onde não há mal algum; mundo de maravilhas, cúmulo de felicidade, gozo incomparável ultrapassando infinitamente todo o desejo; casa de Deus e palácio dos bem aventurados; cidade apeticível e amável e tão preciosa, que todas as belezas do mundo juntas nada são, comparadas com a sua excelência, e ninguém pode conceder a grandeza infinita dos abismos das suas delícias.
Considerai que, por uma eternidade, estas almas felizes gozam desta felicidade de Deus, entregando-se completamente a todas, e o Eterno Filho que diz benignamente a seu Pai: "Meu Pai, eu quero que os que me destes fiquem eternamente comigo, e vejam a claridade que eu tive em Ti antes da formação do mundo". E, dirigindo-se a seus caros Filhos: "Não vos tinha eu dito que o que me amasse seria amado por meu Pai e que nós nos manifestaríamos a ele?" Então esta santa companhia, abismada em prazer no seio da Divindade, canta o aleluia eterno de gozo e louvor ao seu Criador.
Em segundo lugar, cremos que a alma, entrando no céu limpa de todo o pecado, no mesmo instante verá a Deus sem sombras, a ele mesmo, face a face, como é, contemplando, por uma vista de verdadeira e real presença a própria essência divina, e nele as suas infinitas bondades.
O dulcíssimo São Bernardo, estando ainda jovem em Chatillon-sur-Seine, na noite de Natal esperava na Igreja que começasse o sagrado ofício, e esperando, adormeceu dum leve sono, durante o qual (oh! Deus meu! que doçura!) viu um espírito, e com uma visão muito distinta e clara, como o Filho de Deus tendo desposado a natureza humana, tendo-se tornado criancinha no seio de sua Mãe, nascia virginalmente em seu sacrossanto seio, com uma humilde suavidade, misturada com majestade celeste; visão que encheu com tal forma seu coração de satisfação e júbilo, que toda a vida sentiu sentimentos extremos, e a memória deste mistério da natividade de seu Mestre dava-lhe um gosto espiritual e uma suavidade sem igual.
Ah! mas se uma visão imaginária do nascimento temporal do Filho de Deus enlevou e contentou tanto o coração duma criança, ah! que será quando os nossos espíritos, gloriosamente alumiados com a feliz claridade, verem este nascimento eterno, pelo qual o Filho procede, Deus de Deus, divina e eternamente? É então que a alma será deificada, cheia de Deus, e feita como Deus, por participação, eterna e imutável de Deus, unindo-se com ela, como o fogo inflama o ferro e o penetra, comunicando-lhe a sua luz, esplendor, calor, e outras propriedades; de maneira que o toma pelo mesmo fogo.
Como Deus nos deu a luz da razão, pela qual o podemos conhecer como autor da natureza, e a luz da fé, pela qual o consideramos autor da graça, do mesmo modo nos dará a luz da glória, pela qual o contemplaremos como fonte de beatitude e da vida eterna; mas fonte que não só de longe contemplaremos, como fazemos agora pela fé, mas que veremos pela luz da glória, mergulhados e abismados nela.
Em terceiro lugar, a alma será para sempre bem aventurada entre a nobreza, a beleza e a multidão dos cidadãos e habitantes desta ditosa pátria, com os seus milhões de anjos, querubins e serafins, esta multidão de apóstolos, mártires, confessores, virgens, santas mulheres, cuja quantidade é inumerável.
Oh! como é ditosa esta companhia! O menor dos bem aventurados é mais belo do que todo o mundo; que será vê-los, todos? Eles cantam o doce cântico do eterno amor, gozam sempre duma alegria constante, compartilham de contentamentos indizíveis, e vivem na consolação duma infeliz e indissolúvel sociedade.
Mas, oh! Deus! se a boa amizade humana é tão agradavelmente amável, que será ver a suavidade sagrada do amor recíproco dos bem aventurados? De certo, os corações dos cidadãos do paraíso estarão abismados em amor e admiração de beleza e doçura dum tal amor.
Em quarto lugar, no paraíso, Deus dar-se-á completamente a todos; e não em parte por ser um todo que não tem partes; mas dar-se-á diversamente e com tantas diferenças como forem os bem aventurados. Assim como uma estrela é diversa das outras em claridade, assim serão diferentes os homens uns dos outros na glória, à proporção que o tiverem sido em graça e méritos; e como nenhum homem talvez é igual em caridade a um outro neste mundo, assim nenhum bem aventurado será igual a outro em glória no céu.
Considerai como é bom ver esta cidade em que o grande rei tem a sede na sua majestade, cercado de todos os seus bem aventurados servos; aí estão as multidões de anjos, que cantam hinos, e à companhia dos cidadãos celestes; aí se encontra a multidão veneranda dos profetas, o sagrado número dos apóstolos, o vitorioso exército dos inumeráveis mártires, a augusta assembléia dos pontífices, o sagrado rebanho dos confessores, os verdadeiros e perfeitos religiosos, as santas mulheres, as humildes viúvas, as puras virgens. A glória de cada qual não é igual, mas contudo recebem todos um igual prazer, porque é aí que reina a plena e perfeita caridade.
Um fio de glória, uma gota de amor dos bem aventurados vale mais, tem mais força e merece mais estima do que todos os outros amores e conhecimentos que possam ter os corações dos homens mortais.
Em quinto lugar, apesar de grande diversidade e diferença de glória, contudo cada alma bem aventurada, contemplando a infinita beleza de Deus, e o abismo do infinito que fica por ver nessa mesma beleza, fica perfeitamente satisfeita e saciada, e contenta-se com a glória de que goza, segundo o lugar que tem no céu, por causa da amabilíssima Providência divina que assim o ordenou.
Que alegria o estar cercado por toda a parte de prazeres incríveis, e como uma ave bem aventurada, voar, cantar para sempre no ambiente da Divindade!
Que favor e contentamento, depois de um milhão de desgostos, penas e trabalhos, sofridos nesta vida mortal, depois dos desejos infinitos do verdadeiro bem nunca satisfeitos neste mundo, ver-se no porto de toda tranquilidade e ter enfim encontrado a viva e poderosa fonte das frescas águas da vida imortal e a santíssima Divindade, que só podem apagar e satisfazer o desejo humano? 

Do diabólico delírio dos mórmons - Pe. Leslie Rumble, M.S.C. (3/20)

Os Mórmons
ou
"Santos dos Últimos Dias"

Padre Leslie Rumble, M.S.C.
Doutor em Teologia  
Missionarii Sacratissimi Cordis
"Missionários do Sagrado Coração"

O PROFETA JOSEPH SMITH
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias é assim chamada por pretender oferecer a plenitude da revelação que Deus fez à humanidade por meio de Jesus Cristo — plenitude que foi reservada a estes últimos tempos, e aos "santos", ou àqueles que querem fazer-se discípulos dos novos ensinamentos conforme ensinados por Joseph Smith.

Fanfarrão e diabólico Joseph Smith sendo "inspirado" por um chapéu

Obviamente devemos começar perguntando quem é esse Joseph Smith. E imediatamente topamos com dificuldades, pois temos de resolver se a história da vida dele revela um homem que se afigure a espécie de pessoa que Deus teria escolhido para tal missão. Joseph Smith, filho de um fazendeiro, nasceu em Sharon, Vermont, E.U.A., a 23 de dezembro de 1805. Sua família mudou-se para Palmyra, em 1815, e, quatro anos depois, para a pequena cidade de Manchester, Ontário, County, N.Y. Todos os biógrafos concordam em que Joseph recebeu pouca ou nenhuma instrução no sentido escolástico do termo. Os próprios Mórmons, como veremos, insistem muito nisto.
Nervoso, ele era altamente temperado, e sujeito a ataques epilépticos a que mais tarde chamou transes, e durante os quais pretendia que lhe advinham visões celestes. Mas ele próprio provou-se um inventador tão arguto e tão pouco dotado de qualquer senso de veracidade, que é impossível tomar a sua palavra como sendo a realidade das suas experiências. O Dr. Edward Fairfield, antigo presidente do Michigan College, disse que três testemunhas que haviam conhecido pessoalmente Joseph Smith desde dez anos de idade lhe disseram que "ele era simplesmente um mentiroso notório". Mas por que teria ele volvido a sua atenção para o campo religioso?
Para compreender isto, devemo-nos lembrar de que, durante a primeira metade do século dezenove, uma onda de entusiasmo evangélico varreu toda a América. Metodistas, Campbellistas, Congregacionalistas, Milleristas, Shakers e outros procediam, um após outro, a reuniões reavivamentistas, pondo distritos inteiros em fermentação religiosa e despertando as mais vivas controvérsias. Frenesi e histeria tornaram-se a ordem do dia. Novas religiões — cultos esdrúxulos com crentes loucos — brotaram como cogumelos durante aquele período emocional. E o excitável Joseph Smith não deixou de ser afetado pela atmosfera reinante, de superstição e de credulidade. Nesse comenos, veio para Manchester um pregador reavivamentista, ex-Batista, chamado Sidney Rigdon, que aderira aos Campbellistas. Rigdon era um homem bem educado, inteligente, e dotado de grande facilidade na citação das Escrituras. Veio-lhe porém o pensamento de que, em vez de pregar as doutrinas de Alexandre Campbell, ele podia do mesmo modo erigir-se em mestre de Israel e pregar o seu próprio sistema. Por isto decidiu dar ao mundo uma revelação totalmente nova. Em Joseph Smith, com quem se encontrou nesse tempo, achou ele um cooperador de boa vontade, embora no fim ele é que tenha sido reduzido a cooperar com Joseph Smith. Porque Joseph Smith tinha as qualidades psicopáticas necessárias para um "visionário", qualidades que faltavam a Rigdon.

27 de agosto de 2014

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - 40ª Parte

CAPÍTULO X

Da paciência que devemos praticar em união com Jesus Cristo, para alcançar a vida eterna

O mistério da paciência.

1. Falar de paciência e de sofrer é tratar de uma coisa que os amantes do mundo não praticam e nem sequer entendem. Só as almas que amam a Deus e compreendem e põem em prática. S. João da Cruz dizia a Jesus Cristo: “Senhor, eu nada mais vos preço que padecer e ser desprezado por vós”. E S. Teresa exclamava freqüentemente: “Ó meu Jesus, ou sofrer ou morrer”. S. Maria Madalena de Pazzi: “Senhor, sofrer e não sofrer”. Eis como falam os santos extasiados por Deus, e assim falam porque sabem muito bem que uma alma não pode dar uma prova mais segura de seu amor para com Deus do que padecendo voluntariamente para dar-lhe gosto. Esta foi a maior prova que Jesus Cristo nos deu do amor que nos tinha. Ele como Deus nos amou ao criar-nos, enriquecendo-nos com tantos bens, chamando-nos a gozar da mesma glória que ele goza, mas em nenhum outro ponto nos mostrou melhor quanto nos ama do que fazendo-se homem e abraçando uma vida penosa e uma morte cheia de dores e ignomínias por nosso amor. E nós, como demonstraremos nosso amor por Jesus Cristo? Talvez levando uma vida cheia de prazeres e delícias terrenas? Não pensemos que Deus se compraz em nosso sofrimento: ele não é um senhor de índole cruel que se satisfaz vendo gemer e sofrer suas criaturas; pelo contrário, é um Deus de bondade infinita, todo inclinado a ver-nos plenamente contentes e felizes, todo repleto de doçura, afabilidade e compaixão para com os que a ele recorrem. “Porque vós, Senhor, sois suave e brando e cheio de misericórdia para todos os que vos invocam” (Sl 85,5). A condição, porém, de nosso infeliz estado atual de pecadores e a gratidão que devemos ao amor de Jesus Cristo, exigem que nós, por seu amor, renunciemos aos deleites deste mundo e abracemos com ternura a cruz que ele nos destina a levar após si nesta vida, indo ele à frente com uma cruz mais pesada que a nossa e isso para nos levar a gozar, depois da nossa morte, de uma vida feliz que não terá fim. Deus, pois, não se apraz e ver-nos sofrer; sendo, porém, a justiça infinita, não pode deixar impunes as nossas culpas. Por isso, para que essas culpas sejam punidas e não percamos um dia a felicidade eterna, ele quer que, pela paciência, expiemos as culpas e assim mereçamos a felicidade eterna. Não poderia ser mais bela e suave essa determinação da divina Providência, que satisfaz ao mesmo tempo à justiça e nos faz salvos e felizes.

2. Devemos, por conseguinte, pôr toda a nossa esperança nos merecimentos de Jesus Cristo e dele esperar todos os auxílios para viver santamente e nos salvar e não podemos duvidar de seu desejo de nos ver santos: “Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação” (1Ts 4,3). Isso é verdade, mas não devemos nos descuidar de satisfazer de nossa parte pelas injúrias que fizemos a Deus e de conseguir pelas boas obras a vida eterna. É o que o Apóstolo queria significar quando escrevia: “Completo em minha carne o que falta dos sofrimentos de Cristo” (Cl 1,3). Mas então a paixão de Cristo não foi completa e não bastou ela só para nos salvar? Ela foi pleníssima quanto ao seu valor e suficientíssima para salvar todos os homens: entretanto, para que os merecimentos da paixão sejam aplicados a nós, diz S. Tomás, devemos entrar com a nossa parte e sofrer com paciência as cruzes que Deus nos envia para nos assemelhar a Jesus Cristo, nossa cabeça, segundo o que escreve o mesmo Apóstolo aos Romanos: “Pois os que conheceu na sua presciência, também os predestinou para se fazerem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8,2 29). Nuca, porém, devemos esquecer, como nota o mesmo Doutor Angélico, que toda virtude que possuem as nossas boas obras, satisfações e penitências, lhes provêm da satisfação de Jesus Cristo. “A satisfação do homem tira sua eficácia da satisfação de Jesus Cristo”. E assim se responde aos protestantes, que dizem serem nossas penitências uma injúria à paixão de Cristo, como se ela não fosse suficiente para satisfazer por nossos culpas. O reino dos céus sofre violência.

1. Dissemos que, para poder participar dos merecimentos de Jesus Cristo, é preciso que nos esforcemos para cumprir os preceitos de Deus e nos façamos violência para não ceder às tentações do inferno. É o que o Senhor nos dá a entender, quando diz: “O reino dos céus sofre violência e só os violentos o arrebatarão” (Mt 11,12). É preciso que nos violentemos quando se trata da continência, da renúncia aos maus desejos, da mortificação dos sentidos, a fim de não sermos vencidos pelos inimigos. E se nos sentimos réus pelas culpas cometidas, diz S. Ambrósio, devemos então forçar o Senhor pelas lágrimas a nos conceder o perdão (Serm. 5).E o santo ajunta para nosso consolo: Ó feliz violência, que não é punida pela ira de Deus, mas recompensada por sua misericórdia. E todo aquele que nesse sentido fizer mais violência a Jesus Cristo, lhe será mais caro. E conclui: Primeiro devemos reinar em nós mesmos, dominando as nossas paixões para podermos depois arrebatar o reino do Salvador. É, pois, necessário fazer-nos violência, sofrendo as adversidades e perseguições, vencendo as tentações e as paixões, que sem isso nunca serão abatidas.

O Senhor nos declara que, para não perdermos nossa alma, devemos estar preparados a sofrer agonias de morte e a mesma morte: ao mesmo tempo, porém, nos diz que ele mesmo combaterá os inimigos daquele que estiver assim preparado: “Toma a defesa da justiça para salvares a tua alma, e peleja até à morte pela justiça, e Deus, pondo-se de tua parte, derrotará os teus inimigos” (Eclo 4,33). S. João viu ante o trono de Deus uma grande multidão de santos, vestidos de branco (pois no céu não entra nenhuma mácula), tendo cada um na sua mão uma palma, distintivo do martírio (Ap 7,9). Mas então todos os santos são mártires? Sim; todos os adultos que se salvam ou hão de ser mártires de sangue ou mártires de paciência, vencendo os assaltos do inferno e os apetites desordenados da carne. Os prazeres carnais enviam inumeráveis almas para o inferno, e por isso é preciso que nos resolvamos a desprezá-los com toda a energia. Persuadamo-nos de que ou a alma calcará aos pés o corpo ou o corpo subjugará a alma.

2. Repito: é preciso fazer esforço para se salvar a alma. Mas esse esforço é justamente o que eu não posso fazer, dirá alguém, se Deus não me auxiliar com sua graça. A este, responde S. Ambrósio: “Se olhares para ti, nada poderás; se confiares no Senhor, ele te dará forças”. Mas para se conseguir isso é necessário sofrer, não há outro remédio. Se quisermos entrar na glória dos bem-aventurados, diz a Escritura, é preciso sofrer primeiro com paciência muitas tribulações (At 14,21). S. João, contemplando a glória dos santos no céu, diz
justamente: “Estes são os que vieram de grandes tribulações e levaram suas vestes e as branquearam no sangue do cordeiro” (Ap 7,14). É verdade que esses estava no céu por se haverem lavado no sangue do cordeiro, mas todos aí chegaram depois de terem sofrido grandes tribulações. Ficai certos, escrevia S. Paulo a seus discípulos, de que Deus não permitirá que sejais tentados acima de vossas forças (1Cor 10,13). Deus é fiel e ele prometeu dar-vos o seu apoio, suficiente para vencer todas as tentações, contanto que nós lho peçamos: “Pedi e dar-se-vos-á; buscai e achareis” (Mt 7,7). Logo, não pode faltar à sua promessa. É um erro crasso dos hereges afirmar que Deus manda coisas impossíveis. O concílio de Trento diz: “Deus não impõe coisas impossíveis, mas, quando manda, te admoesta que faças o que podes e peças o que não podes e te auxilia par que possas”. (Sess. 6 c. 11). Escreve S. Efrém que, se os homens não são tão cruéis com seus jumentos, impondo-lhes cargas superiores às suas forças, tanto menos Deus, que muito ama os homens, permitirá que eles sofram tentações às quais não possam resistir (Tract. de patientia).

Cruz de toda parte.

1. Escreve Tomás de Kempis: “A cruz te espera por toda parte e por isso é preciso que tenhas paciência em toda parte, se quiseres viver em paz. Se carregares a cruz com boa vontade, ela te levará a ti ao fim desejado”. Cada qual neste mundo procura a paz e desejaria encontrá-la sem sofrimento; isso, porém, é impossível no estado presente, pois as cruzes nos esperam em todo lugar em que nos acharmos. Como, pois, encontrar a paz no meio dessas cruzes? Pela paciência, abraçando a cruz que se nos apresenta. Diz S. Teresa que todo aquele que arrasta sua cruz com má vontade sente-lhe o peso, por menor que seja; quem, porém, a abraça com boa vontade, não a sente, ainda que seja muito pesada. E Tomás de Kempis ajunta que todo aquele que leva a cruz com resignação, a mesma cruz o conduzirá ao fim desejado, que neste mundo é agradar a Deus e no outro amá-lo eternamente. O mesmo autor continua: “Qual dos santos viveu sem a cruz? Toda a vida de Cristo foi cruz e martírio, e tu buscas o gozo?” Que santo foi admitido no céu sem a insígnia da cruz? Como poderão entrar os santos no céu sem a cruz, se a vida de Jesus Cristo, nossa cabeça e redentor, foi uma cruz contínua e um martírio? Jesus, inocente, santo, filho de Deus, quis padecer durante sua vida inteira e nós andamos atrás de prazeres e consolações? Para dar-nos um exemplo de paciência, quis eleger uma vida cheia de ignomínias e dores internas e externas e nós queremos nos salvar sem sofrer ou sofrendo sem paciência, o que é padecimento duplo, mas sem fruto e com o acréscimo do castigo. Como poderemos pensar em amar a Jesus Cristo, se não queremos padecer por amor dele, que tanto padeceu por nós? Como poderá gloriar-se de ser discípulo do crucificado quem recusa ou recebe de má vontade os frutos da cruz, que são os sofrimentos, os desprezos, a pobreza, as dores, as enfermidades e todas as coisas contrárias ao nosso amor próprio?

2. Não nos esqueçamos, antes sempre nos recordemos, das chagas do crucifixo, porque delas hauriremos a força de sofrer os males desta vida, não só com a paciência, mas até com alegria e satisfação, como o fizeram os santos: “Tirareis águas com alegria das fontes do Salvador” (Is 12,3). S. Boaventura comenta: “Das fontes do Salvador significa das chagas de Jesus Cristo” e exorta-nos a ter os olhos sempre fixos em Jesus moribundo, se quisermos viver sempre unidos com Deus. A devoção consiste, segundo S. Tomás, em estarmos prontos a executar tudo o que Deus exige de nós.

Cristo, nosso modelo.

1. Eis a bela instrução a que nos dá S. Paulo para vivermos sempre unidos a Deus e suportarmos com paciência as tribulações desta vida: “Recordai-vos daquele que dos pecadores suportou contra si uma tal contradição, para que não vos fatigueis desfalecendo em vossos ânimos” (Hb 12,3). Ele diz: Recordai-vos. Para sofrer com resignação e paz as penas da vida, não basta pensar de passagem, poucas vezes no ano, a paixão de Jesus Cristo; é preciso pensar a miúdo e mesmo todos os dias recordar-se das penas que Jesus suportou por nosso amor. E que penas foram essas? O Apóstolo diz: sofreu tal contradição. Tal foi a contradição que Jesus sofreu de seus inimigos que dele fizeram o homem mais vil, o homem das dores, segundo a predição do profeta: O último dos homens, o homem das dores, deixando-o morrer de pura dor e saciado de opróbrios em um patíbulo destinado aos mais celerados. E por que quis Jesus abraçar esse acervo de dores e vitupérios? Para que não vos fatigueis desfalecendo em vossos ânimos, isto é, para que nós, vendo quanto um Deus quis padecer para dar o exemplo da paciência, não esmoreçamos, mas tudo soframos para nos libertarmos dos pecados.

2. O Apóstolo continua a nos animar, dizendo: “Ainda não resististes até ao sangue, combatendo contra o pecado” (Hb 12,4). Reflete que Cristo derramou por vós todo o seu sangue na sua paixão, à força dos tormentos, e que os santos mártires, a exemplo de seu rei, sofreram com intrepidez as lâminas de fogo, as unhas de ferro que lhes despedaçavam até as vísceras. Nós, porém, ainda não derramamos nem sequer uma gota de sangue por Jesus Cristo, quando deveríamos estar prontos a sacrificar a própria vida para não ofendermos a Deus, como afirma S. Raimundo: Prefiro precipitar-me numa fogueira a cometer um pecado contra o meu Deus, ou, como dizia S. Anselmo, Arcebispo de Cantuária: Se eu tivesse de suportar todas as
dores corporais do inferno ou cometer um pecado, escolheria antes o inferno que cometer o tal pecado.

Meu jugo é suave.

1. O leão infernal não deixa de andar em redor de nós durante toda a nossa vida, para nos devorar, e por isso S. Pedro diz que devemos nos armar contra os seus assaltos com o pensamento da paixão de Cristo: “Havendo Cristo padecido na carne, armai-vos também do mesmo pensamento” (1Pd 4,1). S. Tomás afirma que só a lembrança da paixão é um forte anteparo contra as tentações do inferno. E S. Ambrósio, ou outro santo, escreve: Se o Senhor conhecesse uma outra via para a salvação, melhor que a do sofrimento, ele no-la teria feito conhecer: indo, porém, à frente com a cruz às costas, nos demonstrou que não há meio mais próprio para nos procurar a salvação que o sofrer com paciência e resignação e por isso quis ele mesmo dar-nos o exemplo na sua pessoa. Diz S. Bernardo que nós, contemplando as grandes aflições do Crucificado, acharemos mais suportáveis as nossas (Serm. 43 in Cant.).E em outro lugar: Que coisa te parecerá dura, se te recordares dos sofrimentos de teu Senhor? (Serm. de quadrupl. deb.). Tendo S. Delfina perguntado um dia ao seu marido S. Elzeário como podia suportar tantas injúrias com tão grande tranqüilidade, respondeu-lhe este: Quando me vejo injuriado, penso nas injúrias que meu Salvador crucificado e não ponho de lado tal pensamento enquanto não me sinto apaziguado. A ignomínia da cruz é agradável àquele que não é ingrato ao Crucificado, diz S. Bernardo (Serm. 25 in Cant.).Todas as almas que querem ser gratas a Jesus Cristo não detestam, mas se aprazem nos desprezos que recebem. Quem não receberá com prazer os opróbrios e os maus tratos, considerando somente os maus tratos que sofreu Jesus no começo de sua paixão, quando na casa de Caifás foi esbofeteado e pisado, e lhe escarraram no rosto, zombando dele como de um falso profeta, vendando-lhe os olhos com um pano, segundo o testemunho de S. Mateus? (Mt 26,27).

2. E como era possível os mártires sofrerem com tanta paciência os tormentos dos carnífices? Eram dilacerados com ferros, eram queima os nas grelhas: talvez não eram de carne ou perdiam os sentidos? não, mas eles não se punham a contemplar as suas feridas, mas as chagas do Redentor e assim pouco sentiam as próprias dores. Os tormentos não deixavam de os martirizar, mas eles os desprezavam por amor a Jesus Cristo. Não há dor tão atroz que não seja suportável à vista de Jesus morto na cruz. O Apóstolo escreve que nós pelos méritos de Jesus Cristo fomos enriquecidos com todos os bens (1Cor 1,5). Jesus, contudo, quer que, para obtermos as graças que desejamos, recorramos sempre a Deus por meio da oração e lhe supliquemos que nos ouça pelos méritos de seu Filho. E o próprio Jesus nos promete que, se assim procedermos, o Pai nos dará tudo o que pedirmos: “Em verdade, em verdade eu vos digo, se pedirdes alguma coisa ao Pai em meu nome, ele vo-la dará” (Jo 16,23). Dessa forma procediam os mártires, quando era excessiva a dor dos tormentos: recorriam a Deus e Deus subministrava-lhes a paciência para suportá-los. O mártir S. Teodato sentiu uma vez, no meio das crueldades a que o sujeitaram, uma dor tão acerba visto o tirano ter mandado intrometer-lhe nas chagas carvões ardentes, que ele suplicou a Jesus que lhe desse força para suportá-los e assim saiu vitorioso, terminando a vida no meio dos tormentos.

Nossa consolação na morte.

1. Não nos atemorizem, pois, todos os combates que temos de travar contra o mundo e contra o inferno; se formos prontos em recorrer a Jesus Cristo, ele nos concederá todos os bens, a paciência em todos os trabalhos, a perseverança e finalmente uma boa morte. Grandes são as amarguras que se sofrem na hora da morte e só Jesus Cristo pode dar-nos a constância e merecimento. Grandes são então especialmente as tentações do inferno, que se esforça de modo particular em arrastar-nos à perdição, vendo-nos próximos de nosso fim. Narra Rinaldo que S. Elzeário suportou as mais horríveis batalhas da parte dos demônios na hora da morte, apesar de ter levado uma vida tão santa. Ele afirma que grandes são as tentações do inferno nessa hora, mas que Jesus Cristo, com os merecimentos de sua paixão, abate as suas forças. Por isso quis S. Francisco que lhe recitassem a história da paixão na hora da morte. S. Carlos Borromeu, vendo-se próximo da morte, mandou colocar ao redor de si várias representações da paixão para entregar sua alma a Deus na contemplação dessas imagens. S. Paulo escreve que Jesus quis padecer a morte “a fim de destruir pela morte aquele que tinha o império da morte, isto é, o diabo, e para livrar os que pelo temor da morte se achavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2,14-15). Assim quis Jesus morrer para destruir com sua morte as forças do demônio que tinha até então o império a morte e por esse meio livrar-nos da escravidão de Lúcifer e por conseguinte do temor a morte eterna. Quis submeter-se a todas as condições e paixões da natureza humana (exceto a ignorância, a concupiscência e o pecado) e para que fim? para se tornar misericordioso, isto é, tomando sobre si mesmo as nossas misérias, tivesse mais compaixão conosco, já que muito melhor se conheceu as misérias experimentando-as do que considerando-as, e dessa maneira se sentisse mais pronto a socorrer-nos, quando tentados na vida e especialmente na hora da morte. A isso se refere aquela palavra de S. Agostinho: “Se te perturbares pela iminência da morte, não te julgues um réprobo, nem te entregues ao desespero, pois foi para impedir isso que Cristo ficou perturbado em presença de sua morte” (Lib. Pronost.).

2. O inferno na hora de nossa morte empregará todos os esforços para nos fazer desesperar da misericórdia divina, pondo-nos diante dos olhos todos os pecados da nossa vida. A recordação, porém, da morte de Jesus Cristo nos dará coragem e confiança nos seus merecimentos, para que não temamos a morte. S. Tomás comenta o aludido texto de S. Paulo da seguinte forma: “Cristo por sua morte destruiu o temor da morte: quando o homem considera que o Filho de Deus quis morrer, perde o medo da morte”. Quando consideramos que o Filho de Deus quis sofrer a morte para nos obter o perdão dos pecados, desaparece o temor e vem o desejo de morrer. A morte para os pagãos é motivo de grande pavor, pois para eles, com a morte, acabam-se todos os bens. A morte de Jesus Cristo, porém, nos dá uma firme confiança de que, morrendo na graça de Deus, passaremos da morte à vida eterna. Desta esperança S. Paulo nos dá um argumento seguro, dizendo que o Padre eterno entregou à morte seu próprio Filho por nós todos, a fim de nos enriquecer com todos os bens, porque, dando-nos Jesus Cristo, nos deu o perdão, a perseverança final, o seu amor, a boa morte, a vida eterna e todos os bens.

Nosso advogado.

1. Quando o demônio nos turbar durante a vida ou na hora da morte, apresentando-nos os pecados de nossa mocidade, respondamos-lhes com S. Bernardo: : “O que me falta de minha parte eu me usurpo da misericórdia de meu Senhor” (Serm. 61 in Cant.). Os méritos que me faltam para entrar no paraíso, eu os adquiro dos merecimentos de Jesus Cristo, que quis padecer e morrer justamente para obter-me aquela glória eterna que eu não merecia. S. Paulo escreve: “Deus é que justifica. E quem é que condenará? Jesus Cristo, que morreu, e mesmo ressuscitou, que está à direita de Deus e que também intercede por nós (Rm 8,33-34). Estas palavras são sumamente consoladoras para nós pecadores. Deus é quem perdoa a nós pecadores e nos justifica com sua graça. Ora, se Deus nos faz justos, como poderá nos condenar como réus? Talvez nos condenará Jesus Cristo, “o qual para não nos condenar se entregou a si mesmo por nossos pecados para nos arrumar do presente século perverso?” (Gl 1,4).

2. Ele se sobrecarregou com nossos pecados e entregou-se à morte para nos livrar desse mundo perverso e conduzir-nos com segurança ao seu reino e chega até a fazer o papel de advogado e intercede por nós junto de seu Pai. “O qual também intercede por nós”. S. Tomás, explicando estas palavras, diz que no céu intercede por nós, apresentando a seu Pai as suas chagas suportadas por nosso amor. E S. Gregório não encontra dificuldade em afirmar (o que afinal alguns não concedem) que o Redentor como homem, mesmo depois de sua morte, continua a orar pela Igreja militante que somos nós (In Ps. poen. 5). A mesma coisa declarou já antes dele S. Gregório Nazianzeno: “Intercede, i. é, suplica por nós, interpondo a sua mediação” (Or. 4 de theol.). E S. Agostinho no salmo 29 diz que Jesus ora por nós no céu, para aí nos impetrar alguma nova graça, pois que na sua vida nos obteve o que podia nos impenetrar, mas ora para exigir de seu Pai, por seus merecimentos, a nossa salvação, já alcançada e prometida. E ainda que o Pai tenha conferido ao Filho todo o poder, contudo esse poder ele, como homem, não possui senão em dependência de Deus. A Igreja afinal não costuma pedir a Jesus que interceda por nós, considerando nele o que há de mais sublime, isto é, a sua divindade e por isso suplica-lhe que nos conceda, como Deus, o que nós lhe pedimos.

O consumidor da nossa fé.

1. Mas voltemos à confiança que devemos pôr em Cristo, quando se trata de nossa salvação. S. Agostinho nos anima, dizendo que o Senhor, que nos livrou da morte com derramamento de todo o seu sangue, não quer a nossa perdição e que, se as nossas culpas nos separam de Deus e nos merecem desprezo, nosso Salvador, por seu lado, não pode desprezar o preço de seu sangue, derramado por nós (Serm. 30 de temp.). Sigamos, pois, com confiança o conselho de S. Paulo: “Corramos pela paciência para o combate que nos é proposto, olhando para o autor e consumador da fé, Jesus, que, tendo diante de si o gozo, sustentou a cruz, desprezando a ignomínia” (Hb 12,1-2). Ele diz: Corramos pela paciência para o combate que nos é proposto: pouco nos adiantará o começar se não continuarmos a combater até ao fim. Por isso diz: corramos pela paciência: a paciência no sofrer o trabalho do combate nos obterá vitória e a coroa prometida ao que vencer. Esta paciência será igualmente a couraça que nos defenderá dos golpes do inimigo. Como, porém, obtermos essa paciência? “Olhando para o autor e consumador da fé, Jesus”. S. Agostinho diz que Jesus desprezou todos os bens da terra, para nos ensinar a desprezá-los e não buscar neles a nossa felicidade, e doutro lado quis suportar todos os males terrenos para nos ensinar a não temer as calamidades deste mundo, sujeitando-se ele mesmo às nossas misérias, à pobreza, à fome, à sede, às fraquezas, às ignomínias, às dores e à morte da cruz.(De catec. rud.). Mesmo com sua ressurreição gloriosa quis nos animar a não temermos a morte, pois, se lhe permanecermos fiéis até à morte, depois desta obteremos a vida eterna, que é isenta de todo o mal e cheia de todo o bem. É o que significam as palavras do apóstolo: “O autor e consumador da fé, Jesus”, pois assim como Jesus é para nós o autor da fé, ensinando-nos o que devemos crer e dando-nos ao mesmo tempo a graça de crê-lo,é também o consumador da fé, prometendo-nos que haveremos um dia de gozar daquela vida na qual nos ensina a crer. E a fim de nos certificar do amor que vos dedica esse nosso Salvador e da vontade que tem de nos salvar, S. Paulo acrescenta: “Que tendo diante de si o gozo, sofreu a cruz”. Explicando S. João Crisóstomo esta palavra, diz que Jesus podia salvar-nos levando uma vida de regalo neste mundo, mas ele, para nos certificar melhor do afeto que nos consagra, escolheu uma vida de sofrimentos e uma morte ignominiosa , morrendo pregado a uma cruz como um malfeitor.

2. Apliquemo-nos, pois, ó almas amantes do Crucifixo, no restante de nossa vida, a amar quanto possível esse nosso amável Redentor e a sofrer por ele, já que tanto quis sofrer por nosso amor. E não cessemos de suplicar-lhe que nos conceda o dom de seu santo amor. Bem-aventurados seremos se chegarmos a ter um grande amor por Jesus Cristo. O Ven. Pe. Vicente Caraffa, grande servo de Deus, diz o seguinte em uma carta que mandou a alguns jovens estudiosos e devotos: “Para reformarmos nossa vida inteira, é preciso pôr todo o empenho no exercício do amor de Deus. É só a caridade divina, quando entra em um coração e dele se apodera, que o purifica de todo o amor desordenado e o torna logo obediente e santo. S. Agostinho diz: “Coração puro é o que está vazio de todo o afeto”, e S. Bernardo escreve: “Quem ama, só ama e não deseja mais nada”, querendo dizer que quem ama a Deus, não deseja senão amá-lo e expulsa do coração tudo o que não é Deus. E é assim que o coração vazio se torna cheio, i. é, cheio com Deus, que consigo traz todos os bens e então os bens terrenos não encontram lugar nesse coração e nem o seduzem. Que atrativo poderão ter para nós os prazeres da terra, quando experimentamos as consolações divinas? Qual a força da ambição das honras vãs, o desejo das riquezas terrenas, quando temos a honra de ser amados por Deus e começamos a possuir em parte as riquezas do paraíso? Para conhecer o adiantamento que fizemos no caminho de Deus, basta observarmos o progresso que fizemos no seu amor, se fazemos a miúdo durante o dia atos de amor de Deus, se falamos freqüentemente de seu amor, se procuramos insinuá-lo aos outros, se fazemos nossas devoções só para agradar a Deus, se sofremos com perfeita resignação, por amor de Deus, todas as adversidades, as enfermidades, as dores, a pobreza, os desprezos e as perseguições. Dizem os santos que uma alma que ama verdadeiramente a Deus, deverá amar tanto quanto respira, pois a vida da alma tanto no tempo como na eternidade deve consistir em amar o nosso sumo bem, que é Deus”.

Acesso ao Pai.

1. Persuadamo-nos, porém, de que nunca chegaremos a adquirir um grande amor para com Deus, a não ser por meio de Jesus Cristo, e se não tivermos uma devoção particular para com sua paixão, por meio da qual ele nos alcançou a graça divina. Escreve o Apóstolo: “Porque por meio dele temos acesso junto ao Pai” (Ez 2,18). Se não fosse Jesus Cristo, o caminho das graças estaria fechado para nós pecadores: ele nos abriu a porta, nos introduziu perante o Pai e pelos merecimentos de sua paixão nos obtém dele o perdão de nossos pecados e todas as graças que precisamos. Infelizes de nós, se não tivéssemos Jesus Cristo! E quem poderá louvar e agradecer suficientemente o amor e a bondade que este bom Redentor nos demonstrou, querendo morrer por nós, pobres pecadores, para nos livrar da morte eterna? “É difícil haver quem morra por um justo, ainda que talvez alguém se anime a morrer por um bom” (Rm 5,7). Apenas se encontra quem queira morrer por um homem justo; mas Jesus Cristo quis dar a vida por nós, quando éramos pecadores: “Porque ainda quando éramos pecadores, em seu tempo, Cristo morreu por nós” (Rm 5,8-9). Por isso nos assegura o Apóstolo que, se estivermos resolvidos a amar Jesus Cristo a todo o custo, podemos esperar todo o auxílio e apoio do céu: “Se, quando éramos inimigos de Deus, fomos com ele reconciliados pela morte de seu Filho, muito mais agora, já reconciliados, seremos salvos pela vida deste” (Rm 5,10). Notem os que amam a Jesus que fazem injúria ao amor que nos consagra esse bom Salvador, quando temem que ele lhes negue as graças necessárias para se salvarem e fazerem-se santos. E para que nossos pecados não nos façam perder a confiança, continua S. Paulo: “Não acontece, porém, com o dom o mesmo que com o pecado, porque se pelo pecado de um morreram muitos, ainda mais abundantemente a graça de Deus e o dom pela graça de um só homem, Jesus Cristo, se derramou sobre muitos” (Rm 5,15). Com isso quer significar que o dom da graça, alcançado pelo Redentor por sua paixão nos trouxe maiores bens do que foram os males ocasionados pelo pecado de Adão, já que têm maior valor os merecimentos de Jesus Cristo para obrigar a Deus a nos amar que o pecado de Adão para nos atrair o ódio do mesmo. “Pela graça de Jesus Cristo adquirimos maiores bens do que os que havíamos perdido pela inveja do demônio” (S. Leão Serm. 1 de ascens.).

2. Terminemos. Almas devotas, amemos Jesus Cristo, amemos esse Redentor que muito merece ser amado e muito nos amou, não deixando de fazer coisa alguma para ganhar o nosso amor. Basta saber que, por nosso amor, quis morrer consumido de dores numa cruz e, não contente com isso, deixou-se ficar no Sacramento da Eucaristia, onde em alimento nos dá o mesmo corpo que sacrificou por nós e em bebida o mesmo sangue que por nós derramou em sua paixão. Seríamos muito ingratos, não só ofendendo-o, mas também amando-o pouco e não lhe dedicando todo o nosso amor. Ó meu Jesus, pudesse eu me consumir inteiramente por vós, como o fizestes por mim. Mas, visto tanto me haverdes amado e me obrigado a amar-vos, ajudai-me então a não vos ser ingrato e muito ingrato eu seria se amasse alguma coisa fora de Vós. Vós me amastes sem reserva, também eu quero amar-vos sem reserva. Tudo abandono, renuncio a tudo para dar-me todo a vós e para não ter em meu coração outro amor senão o vosso. Aceitai-me, meu amor, por piedade, sem considerar os desgostos que vos causei no passado. Vede que eu sou uma daquelas ovelhas pelas quais derramastes vosso sangue: “Nós, pois, vos suplicamos que socorrais a vossos servos que remistes com vosso sangue precioso”. Esquecei-vos, meu caro Salvador, das ofensas que vos fiz. Castigai-me como quiserdes, livrai-me unicamente do castigo de não poder vos amar e depois fazei de mim o que vos aprouver. Tirai-me tudo, meu Jesus, mas não me priveis de vós, meu único bem. Fazei-me conhecer o que quereis de mim, que eu com vossa graça quero executar tudo. Fazei que eu me esqueça de tudo, para me recordar só de vós e das penas que sofrestes por mim. Fazei que eu em nada mais pense senão em dar-vos gosto e amar-vos. Por favor, olhai-me com aquele afeto com que me contemplastes no Calvário, ao morrer por mim na cruz, e ouvi-me. Em vós eu ponho todas as minhas esperanças. Meu Jesus, meu Deus, meu tudo. Ó Virgem santa, minha mãe e minha esperança, Maria, recordai-me ao vosso Filho e obtende-me a fidelidade no seu amor até à morte.