31 de julho de 2013

Imitação de Cristo - Livro 1 Capítulo 10

CAPÍTULO 10

Como se devem evitar as conversas supérfluas

1. Evita, quanto puderes, o bulício dos homens, porque muito nos perturbam os negócios mundanos ainda quando tratados com reta intenção; pois bem depressa somos manchados e cativos da vaidade. Quisera eu ter calado muitas vezes e não ter conversado com os homens. Por que razão, porém, nos atraem falas e conversas, se raras vezes voltamos ao silêncio sem dano da consciência? Gostamos tanto de falar, porque pretendemos, com essas conversações, ser consolados uns pelos outros e desejamos aliviar o coração fatigado por preocupações diversas. E ordinariamente sentimos prazer em falar e pensar, ora nas coisas que muito amamos e desejamos, ora nas que nos contrariam.
2. Mas ai! Muitas vezes é em vão e sem proveito, pois essa consolação exterior é muito prejudicial à consolação interior e divina. Cumpre, portanto, vigiar e orar, para que não passe o tempo ociosamente. Se for lícito e oportuno falar, seja de coisas edificantes. O mau costume e o descuido do nosso progresso espiritual concorrem muito para o desenfreamento de nossa língua. Ajudam muito, porém, ao aproveitamento espiritual os devotos colóquios sobre coisas espirituais, mormente quando se associam em Deus pessoas que pensam e sentem do mesmo modo.

História Eclesiástica - Primeira Época Capítulo 2

CAPÍTULO II

Vocação dos Apóstolos - Igreja de Jesus Cristo - São Pedro chefe da Igreja - Explicações - Portas do Inferno - Chaves do Paraíso - Primado de São Pedro e de seus sucessores - Infalibilidade dos Sumos Pontífices.
Vocação dos Apóstolos - Na idade de trinta anos começou o Salvador a pregar sua doutrina. Seus estupendos milagres assombravam as turbas que pasmadas o seguiam por toda parte. Pra o êxito de seus fins sacrossantos escolheu Jesus, de entre seus adidos, doze homens aos quais chamou Apóstolos. Eis aqui seus nomes: Pedro e seu irmão André, Tiago - o maior, João - Evangelista, Filipe, Bartolomeu, Matheus, Thomé, Tiago - o menor, Simão - o zeloso, Judas Tadeu e Judas Iscariotes. Este último foi quem mais tarde traiu o seu divino Mestre. Estes Apóstolos eram uns pobres e simples pescadores, e Jesus Cristo lhes confiou o depósito da fé e os enviou a pregar o Evangelho por todo o mundo, afim de que, como observa Santo Ambrósio, a conversão do mundo não fosse atribuída à sabedoria ou ao poder ao poder dos homens, senão unicamente à divina virtude . (Santo Ambrósio in C. VI, Lucas)
Igreja de Jesus Cristo - Por Igreja de Jesus Cristo se entende a congregação dos fiéis cristãos espalhados por toda a terra, que vivem debaixo da obediência do Papa, isto é, do Sumo Pontífice de Roma. Chama-se Igreja de Jesus Cristo, porque Ele mesmo a fundou durante sua peregrinação sobre a terra, e porque saiu de seu abrasado Coração e foi consagrada e santificada com seu Sangue; chama-se também assim porque todos os filhos da Igreja constituem uma só pessoa com Jesus Cristo por meio da fé, da esperança e da caridade.
Jesus Cristo a encheu de seu Espírito Santo a quem enviou para que permanecesse com ela e lhe ensinasse toda a verdade até à consumação dos séculos. Os Apóstolos foram os primeiros mestres e propagadores da Igreja; e a todos eles, em diversas ocasiões, dirigiu Jesus estas palavras: "Não fostes vós quem me escolhestes; mas eu vos escolhi e vos coloquei para que vades e produzais frutos; e que vosso fruto permaneça. Foi-me dado todo o poder no Céu e na terra: assim como meu Pai celeste me enviou, assim também eu vos envio. O que desatardes na terra, será também desatado no Céu. Aos que perdoardes os pecados serão perdoados; e aos que os retiverdes, serão retidos...
Quem vos ouve, a mim ouve, quem vos despreza, despreza a mim e a quem me enviou.
Quando comparecerdes em presença dos reis e governadores, não vos preocupeis com o que deveis responder. O Consolador, o Espírito Santo que meu Pai enviará em meu nome, Ele vos ensinará todas as coisas. Ele vos dará ciência e saber a que não poderão resistir nem contradizer todos os vossos adversários. Ide pois, eu sou o que vos envia: pregai o Evangelho a toda criatura ensinando e batizando em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo. O que crer e for batizado será salvo, porém o que não crer será condenado... Eu subo a meu Pai celeste, mas não vos deixo sós e permanecerei convosco todos os dias até a consumação dos séculos". Com estas palavras instituiu Jesus Cristo a grande Sociedade religiosa, ou a Igreja cuja administração, como se tem visto, confiou aos Apóstolos aos quais prometeu sua assistência contínua até o fim dos séculos.
São Pedro chefe da Igreja - O Salvador para demonstrar a necessidade de uma autoridade suprema na Igreja, a comparou sucessivamente a um reino e a uma república bem administrados, à fazenda de um grande Senhor, e a uma númerosa família, coisas todas que não podem subsistir sem uma autoridade que governe e dite leis, vele sobre sua observância, reprima aos rebeldes e recompense aos que as observam. O mesmo se dá com a Igreja Católica: chefe absoluto, supremo e invisível da Igreja é Jesus Cristo, seu fundador: e chefe visível instituído pelo próprio Jesus Cristo é São Pedro. De entre os Apóstolos, disse São Jerônimo, escolheu Jesus a São Pedro para dar-lhe a preeminência sobre todos os outros, afim de que a autoridade divinamente instituída, desvanecesse de antemão todo pretexto de discórdia e de cisma.
Eis aqui como São Pedro foi instituído Chefe Supremo da Igreja: Estando Jesus Cristo certo dia nos confins de Cesárea de Felipe, depois de ter orado, por algum tempo, perguntou a seus Apóstolos: "Que dizem de mim os homens? Um Apóstolo respondeu dizendo: Alguns dizem que sois o Profeta Elias". Outro replicou: "Disseram-me muito que éreis Jeremias ou João Batista ou algum dos profetas que tinha ressuscitado". O Salvador torna a perguntar: "Porém vós, quem dizeis que eu sou?" Tomando então a palavra Simão Pedro disse: "Vós sois o Filho do Deus vivo que veio a este mundo". Disse-lhe então Jesus: "És bem-aventurado, Simão, filho de João; porque o que disseste não te foi revelado pelos homens senão por meu Pai celeste; eu e de digo que és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha Igreja e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. E a ti darei as chaves das portas do Céu e tudo o que ligares na terra será ligado no Céu e tudo o que desligares na terra será também desligado no Céu". (Mat. C. 16)
Explicações - Estes fatos e estas palavras merecem alguma explicação. Pedro permaneceu silencioso enquanto Jesus não deu a conhecer senão o desejo de saber o que diziam os homens acerca de sua pessoa; mas quando convidou os Apóstolos para exporem seu modo de pensar, Pedro, no mesmo instante falou, como se falasse em nome de todos, porque ele já gozava de certa primazia ou superioridade sobre os demais companheiros. Pedro, pois, divinamente inspirado, disse: Vós sois o cristo: que era o mesmo de dizer: Vós sois o Messias prometido por Deus, que veio para salvar os homens. Filho de Deus vivo: ele aplica a Deus o epíteto de vivo, para diferenciá-lo das falsas divindades dos idólatras, que sendo fabricadas pelas mãos dos homens, não tem vida. Isto também equivalia a dizer: Vós sois o verdadeiro Filho de Deus, o Filho do Pai Eterno, e por isso sois com Ele Criador e Senhor absoluto de todas as coisas. Em seguida Jesus Cristo, com o fim de premiá-lo por sua fé, chamou-o de bem-aventurado, dando-lhe depois os motivos porque desde o dia que o havia seguido, lhe tinha mudado o nome de Simão pelo de Pedro, assim falando: "Tu és Pedro e sobre esta pedra, edificarei a minha Igreja". Do mesmo modo Deus mudou o nome de Abrão para Abraão quando estabeleceu que ele seria o pai de todos os crentes; o de Sarai em Sara quando lhe prometeu o nascimento prodigioso de um filho; e o de Jacó em Israel quando lhe garantiu que de sua estirpe nasceria o Salvador.
Jesus outrossim chamava bem-aventurado a São Pedro, porque tudo o que este tinha dito não lhe tinha sido revelado pelos homens, senão por seu Pai celeste. Aqui transluz a divina assistência à pessoa de São Pedro desde o mesmo instante em acabava de ser eleito o chefe da Igreja; assistência que continuou por toda a sua vida e que continuará nos romanos Pontífices até a consumação dos séculos.
Jesus disse em seguida: "Sobre esta pedra edificarei a minha Igreja". Com estas palavras quis dizer: Tu, ó Pedro serás na Igreja o que nos edifícios são os alicerces; os alicerces constituem a parte principal, a mais indispensável de uma casa, visto sobre eles descansar todo o edifício; assim também tu, ó Pedro serás o fundamento da minha Igreja, isto é, exercerás nela a autoridade suprema que te outorgo, a Igreja se conserve, e permaneça firme e inabalável. Sobre ti, a quem eu chamei Pedro, como sobre uma rocha e uma pedra firmíssima, por minha virtude eterna, eu levanto o edifício eterno da minha Igreja, que descansando sobre ti, será forte e invencível contra todos os ataques de seus inimigos.
assim como não há edifício sem base, assim também não há Igreja sem Pedro. Uma casa sem alicerce não pode ser erguida, e se o é, precipita-se ao primeiro impulso; assim também toda a Igreja que se quiser erigir sem Pedro não poderá erguer-se, e se o fizer cairá ao primeiro sopro. Nos edifícios as partes que não descansam sobre os alicerces desabam e caem, assim também na minha Igreja todo aquele que se separa de Pedro precipita-se no erro e se perde.
Portas do Inferno - As portas do Inferno são constituídas pelo poder de Satanás e representam as perseguições, as heresias, os erros, os esforços e as artimanhas que emprega o demônio para deitar por terra a Igreja. Todas estas potências infernais, juntas ou separadas poderão, sim, declarar guerra aberta à Igreja, obriga-la a estar sempre sob as armas, e por no caminho da perdição os que não forem suficientemente humildes, mortificados e vigilantes na oração; mas nunca poderão vencê-la, antes com todos os seus esforços não conseguirão mais do que aumentar a glória da Esposa do Redentor.
Chaves do Paraíso - Jesus Cristo disse finalmente: "Eu te darei as chaves do reino dos céus". As chaves são o símbolo do poder. Quando o vendedor de uma casa entrega as chaves ao comprador dá-lhe com elas a posse plena e absoluta da mesma casa; assim também quando se apresentam a um Rei as chaves de uma cidade simboliza-se com isto que a cidade o reconhece como Soberano; assim pois o haver entregue Nosso
Senhor a Pedro as chaves do Reino dos Céus significa que ele foi feito dono, príncipe e governador supremo da Igreja. Por isso Nosso Senhor Jesus Cristo continuou dizendo a Pedro: "Tudo o que atares na terra será atado no Céu; e tudo o que desatares na terra também será desatado no Céu".
Estas palavras põem em manifesto a suprema autoridade que foi dada a São Pedro; autoridade que obriga a consciência dos homens com decretos e leis em ordem a seu bem espiritual e eterno; e por meio da qual se absolvem os pecados e as penas que impedem conseguir esse mesmo bem espiritual e eterno. É bom notar aqui que também os outros Apóstolos receberam de Jesus Cristo a faculdade de atar e desatar (Mt. c. 17). Mas esta faculdade não lhes foi conferida senão depois de terem sido ditas a São Pedro as palavras magníficas que precedem, para que compreendessem que sua autoridade devia permanecer subordinada à de São Pedro, que foi feito seu príncipe e seu chefe, o qual também fora encarregado de conservar a unidade da fé e da moral. 
Por isto os demais Apóstolos e todos os Bispos que lhes sucedem devem depender de Pedro e dos Papas que também lhe sucedem para assim permanecerem perpetuamente unidos a Jesus Cristo, que do Céu assistirá seu Vigário e toda a Igreja até o fim dos séculos.
Primado de São Pedro e de seus sucessores - Tendo ressuscitado o Salvador, antes de subir ao Céu, entregou de fato a São Pedro a faculdade que lhe havia prometido.
Aparecendo a seus discípulos no lago de Genesaré, depois de ter tomado com eles algum alimento para que melhor se assegurassem de sua ressurreição, dirigiu-se a Pedro e disse: "Simão filho de João, me amas tu?" "Senhor, respondeu Pedro, Vós bem sabeis que eu vos amo" Jesus lhe disse: "Apascenta meus cordeiros". O Senhor tornou a perguntar: "Simão filho de João, me amas tu?" "Senhor, respondeu incontinente São Pedro, Vós bem o sabeis que vos amo". Jesus lhe disse: "Apascenta meus cordeiros". Jesus lhe perguntou pela terceira vez: "Simão Pedro, me amas tu mais do que estes?" Pedro, vendo que o interrogava três vezes sobre o mesmo assunto, perturbou-se. Nesse momento lembrou-se das promessas que outra vez lhe tinha feito e a que tinha faltado, temeu por isto que Jesus Cristo não gostasse de seus protestos, como se quisesse
predizer-lhe coisas futuras. assim, pois, com a maior humildade, afirmou: "Senhor, Vós sabeis tudo, meu coração vos é manifesto e por isso Vós também sabeis que vos amo."
São Pedro naquele momento, estava seguro da sinceridade de seus afetos, mas não o estava igualmente para o futuro. Jesus que bem sabia o desejo que São Pedro tinha de amá-lO, e a fraqueza de seus afetos, consolou-o dizendo: "Apascenta minhas ovelhas". Com estas palavras Jesus Cristo constitui São Pedro príncipe dos Apóstolos, pastor universal da Igreja e de todos os cristãos; porque todos os fiéis cristãos, espalhados por todas as partes do mundo e simbolizados pelos cordeiros, devem estar sujeitos ao chefe da Igreja, como os cordeiros estão a seus pastores; e as ovelhas simbolizadas pelos Bispos e demais ministros sagrados, posto que dão alimento da doutrina celestial aos fiéis cristãos, devem fazê-lo estando sempre em boa harmonia, unidos e submissos ao Supremo Pontífice, Vigário de Jesus Cristo na terra.
Apoiados nestas palavras de Jesus Cristo, os católicos têm acreditado como verdade de fé que São Pedro foi constituído por Jesus Cristo, seu Vigário na terra, e chefe supremo e visível da Igreja, e que recebeu d'Ele a plenitude da autoridade sobre os demais Apóstolos e sobre todos os fiéis.
É claro, pois, que a autoridade de Pedro deve durar enquanto durar a Igreja, isto é, até o fim dos séculos, pois que é certo que os alicerces devem durar o mesmo tempo que dura o edifício que sobre ele descansa; e por isso, depois de Pedro, sua autoridade passará a seus sucessores, que são os Romanos Pontífices. Esta verdade se acha explicitamente exposta em centenas de documentos da antiguidade cristã, e, entre outros, encontra-se formalmente declarada no Concílio Florentino nas seguintes palavras: "Nós definimos que a anta Sé Apostólica, e o Romano Pontífice é o sucessor do Príncipe dos Apóstolos, o verdadeiro Vigário de Cristo, o chefe supremo de toda Igreja, o mestre e o pai de todos os cristãos: e que a ele, na pessoa do bem-aventurado Pedro, foi dado, por Nosso Senhor Jesus Cristo, pleno poder de apascentar, reger e
governar a Igreja universal.
Infalibilidade dos Sumos Pontífices - Querendo São Pedro corresponder a tantas provas de benevolência, e demonstrar ao mesmo tempo sua gratidão ao Divino Salvador, havia declarado várias vezes que estava pronto a dar sua vida por Ele. Não obstante isto, o Divino Mestre o advertiu que não confiasse em suas próprias forças, mas sim no auxílio da divindade. Disse-lhe em seguida que cairia por fraqueza, assegurando-lhe sem embargo que depois se levantaria; encarregou-o de cuidar de seus irmãos e de conservá-los firmes na fé: "Tenho pedido por ti, ó Pedro, disse-lhe Jesus, para que não falte tua fé; e tu, uma vez convertido, confirma teus irmãos". <> (Luc. Cap. 22)
Com estas palavras o divino Salvador prometeu uma particular assistência ao chefe da Igreja, em virtude da qual nunca faltará sua fé, antes ao contrário contribuirá para fortalecer aos demais pastores. Com elas assegurou a São Pedro o dom da infalibilidade, isto é, o preservou do perigo de errar nas coisas que concernem à fé e aos costumes; porque disse a São Pedro que tinha pedido para que nunca faltasse sua fé: assim sendo, quem poderá por em dúvida que a oração de Jesus Cristo tenha sido ouvida? E certamente nosso divino Salvador, assegurou a São Pedro que sua prece tinha sido plenamente escutada: por isso como legítima consequência o encarregou de confirmar na fé os demais Apóstolos. Não se pode, pois, por em dúvida a infalibilidade de Pedro e de seus sucessores, sem afirmar que não foi ouvida a oração do Salvador,
absurdo que nunca poderá ser afirmado por um católico. Apoiados pois, os católicos de todos os tempos e de todos os lugares, nesta promessa de Jesus Cristo, sempre tem acreditado com muito poucas exceções, que o Romano Pontífice, como sucessor de São Pedro, é infalível nas sentenças que profere em matéria de fé e de moral. Esta verdade foi depois definida na sessão 11ª do Concílio do Vaticano (Vaticano I), como um artigo que devia necessariamente ser acreditado para se obter a salvação eterna.
Eis as suas palavras: " Nós definimos, que o Romano Pontífice quando fala ex cathedra, isto é, quando no exercício do cargo de pastor e mestre de todos os cristãos, por sua suprema autoridade apostólica, define alguma doutrina acerca da fé ou dos costumes para norma de toda a Igreja pela divina assistência que lhe foi prometida na pessoa do Bem-aventurado Pedro, goza da mesma infalibilidade, que o divino Redentor quis dar à Igreja nas definições das doutrinas acerca da fé ou dos costumes. Pelo que estas definições do Romano Pontífice são por si mesmas, e não pelo consentimento da Igreja, irreformáveis. Que se alguém ousar contradizer esta nossa definição, do que Deus nos guarde, seja excomungado".

O espiritismo é intrinsecamente anticristão

1 – A afirmação de que o espiritismo é, de si, anticristão, isto é, que é tal por sua própria natureza, vale tanto para o baixo espiritismo de terreiro, como para o chamado espiritismo científico ou racionalista, kardecista. Realmente, ambos professam doutrinas essencialmente opostas ao Cristianismo.

A principal doutrina do espiritismo, e que é o seu dogma fundamental, é a reencarnação. Professada por Alan Kardec e por algum outro filósofo pagão da antiguidade, este grave erro consiste em afirmar que a alma de uma pessoa, após a sua morte, fica vagando pelo espaço. E isso até conseguir se reencarnar em algum novo indivíduo humano no momento da concepção, a fim de que, sofrendo neste mundo, pague por pecados cometidos em outra existência terrena. Vejamos os absurdos dessa esdrúxula doutrina e sua contradição com verdades fundamentais do Cristianismo.

2 - Limitando-nos à reencarnação no mesmo nível, e não à regressiva em algum animal irracional, que é professada por muitos espíritas, podemos supor duas hipóteses:

= Uma, a de ser maior o número de mortes do que de nascimentos. Então teríamos de imaginar uma grande competição entre essas almas vagantes no espaço no momento de alguma nova concepção à espera de uma chance de voltarem a este mundo à procura de sofrimento. E nesse caso a reencarnação não seria um castigo, como afirma o espiritismo, mas um cobiçado benefício.

= Outra hipótese é a de ser maior o número de nascimentos, como acontece na realidade. Então, ou muita gente já está nascendo sem alma, ou chegará um tempo em que isso irá acontecer pelo inevitável déficit de almas a se reencarnarem. E que pensar da desproporção entre o número de habitantes da terra agora, e o de há cinco mil anos atrás?

3 - E mais: como o nível de comportamento moral dos homens, em geral, piorou muito neste século com a grande degradação moral dos costumes na sociedade atual, um grande número de almas regressarão ao espaço com mais pecados do que vieram. Então o resultado seria o inverso da própria finalidade da reencarnação. De qualquer modo, o círculo deverá repetir-se sempre, pois o indivíduo, em sua existência terrena, sempre peca. Sobretudo se prescinde da sua reabilitação sobrenatural em Cristo, único meio de verdadeira redenção.

4 – Além desses absurdos e contradições, que se notam à primeira vista pelo simples raciocínio, veremos a seguir outros graves erros que estão incluídos nessa incrível invenção espírita. Eis alguns:

A) Tem que se pressupor a pré-existência das almas ou espíritos humanos em número quase infinito para atender à crescente demanda dos novos seres humanos concebidos. Realmente, é necessário que se apele para isso, caso se queira evitar a contradição do “déficit” acima apontado. Esse pressuposto, já com tantas contradições, inclui o abominável erro panteísta da emanação dos espíritos por via de divisão do Ser divino. Então cada alma é partícula de Deus.

Além disso, nega-se a intervenção de Deus, criando cada alma individualmente, no momento devido. Nega-se, pois, a nossa condição de criaturas de Deus, para fazer de nós “deuses decaídos”.

B) Afirma-se ainda o absurdo de uma reencarnação ser para sofrer por pecados de que não se têm a mínima consciência, condição necessária para qualquer ato humano e meritório, e pois, expiatório. E mais: sem os méritos de Cristo, os atos humanos não têm o devido valor expiatório. Para tanto devem estar associados aos de Cristo, causa meritória de valor infinito.

C) Daí um outro grave erro anticristão da doutrina espírita: cada um se redime a si mesmo. Se assim é, quem conseguisse em suas sucessivas e hipotéticas reencarnações, pagar pelos seus pecados, tê-lo-ia feito exclusivamente por suas próprias forças naturais, independentemente das graças sobrenaturais provenientes dos merecimentos de Jesus Cristo. Em outras palavras, cada um seria “redentor” de si próprio. No entanto, segundo a divina Revelação, fora de Cristo não há redenção (At. 4,12).

D) Ademais, a reencanação é erro frontalmente contrário a outro ponto da divina Revelação. De fato, lemos na Bíblia: “Lembra-te de teu Criador no tempo da juventude (…), antes que a poeira retorne à terra …; e antes que o sopro de vida retorne a Deus que o deu.” (Ecl. 12,1-7) E mais: “Está estabelecido que o homem morra uma só vez, e depois disso haverá o juízo.” (Heb. 9, 27) E o resultado desse julgamento divino será definitivo. E será segundo o que cada um tiver merecido. (Lc. 23,43; Mt. 25,31-34 e 41) E nada de reencarnação.

E ) O espiritismo nega também, tanto a Divindade de Cristo como a sua Redenção. Trata-se, porém, de verdades bem claramente contidas na divina Revelação. Sobre a sua Divindade bastam essas afirmações de Jesus: “Eu e o Pai somos Um” (Jo. 10,30); “Quem vê a Mim, vê ao Pai” (Jo. 14,9); e sobre a necessidade de sua Redenção para a nossa salvação, está revelado: “Nenhum outro nome nos foi dado pelo qual possamos ser salvos, a não ser Jesus Cristo, Nosso Senhor.” (At. 4,12) Para o espiritismo, porém, Jesus é apenas “o Doce Rabi da Galiléia” ou um grande médium, talvez. Mas nunca “o Filho de Deus feito Homem” para salvar os homens.

F ) Outro erro do espiritismo é a evocação dos mortos com o fim de conhecer coisas ocultas, e outras práticas semelhantes. Tudo isso é explicitamente condenado na Bíblia em muitas passagens. Assim em Deuteronômio, 18,10-12: “Não se ache no meio de ti quem … se dê à adivinhação, à astrologia, ao feiticismo, à magia, ao espiritismo, à evocação dos mortos, porque o Senhor, teu Deus abomina os que se dão a essas práticas”.

G ) Por fim, o espiritismo, para se fazer crer, se exercita em várias práticas supersticiosas desde o baixo curandeirismo até as chamadas sessões que chamam de materialização dos espíritos. Mas, tudo não passa, ou de fraudes e truques, como o demonstrou o Pe. Herédia em “Fraudes espíritas e fenômenos metempsíquicos”, oude falsas curas por efeito de sugestão em pessoas portadoras de alta carga emotiva, e por isso, vítimas de fácil manejo nas mãos de hábeis hipnotizadores. Quando não é, em ambos os casos, efeito de influências diabólicas, pois Satã pode muito bem se aproveitar dessas práticas supersticiosas para se manifestar e seduzir os crédulos e desprevenidos.

O mistério da dor – A solução cristã

5 - A razão dessas divagações espíritas é a busca de solução para o mistério da dor. Inutilmente, porém, pois só o Cristianismo tem a solução adequada e realista para esse “mistério” da dor humana, que era chamado na antiguidade “a cruz dos filósofos”. Mas, segundo a doutrina revelada por Deus, os sofrimentos humanos nesta vida se explicam de duas maneiras que se completam: pelas limitações da própria condição humana neste mundo, e por sua vinculação ao tronco inicial, cujo chefe (Adão) prevaricou, e cujas conseqüências de carência espiritual e de propensão para o mal, todos nós herdamos.

6 - Deus enriquecera Adão com o dom gratuito da graça divina que o elevou ao plano sobrenatural na condição de filho pela graça da adoção divina. Perdendo essa graça por seu pecado, Adão perdeu-a para si e para os seus filhos e descendentes, para toda a humanidade. Mas a Redenção de Jesus nos restabeleceu na condição de filhos adotivos de Deus por uma nova comunicação da graça divina.

7 - E mais: Jesus Cristo nos trouxe ainda o ideal de perfeição cristã, ou seja, o ideal de ser perfeitos como o Pai celeste (Mt. 5, 48) pela imitação do próprio Jesus que é a imagem perfeita do Pai (Col. 1,15; 2 Cor. 4,4; Rom. 8,29); imitação que inclui a paciência nos sofrimentos a serem suportados por seu amor e em espírito de reparação. Assim, associamo-nos ao Ato Redentor de Cristo, que foi ato de reparação por nossos pecados. Por ele fazemos ainda o devido desagravo a Deus e obtemos misericórdia para o nosso perdão e salvação. A nossa salvação requer necessariamente tanto a graça da Redenção de Jesus Cristo, como a nossa cooperação. Tudo o contrário das invenções espíritas.

Coleção "Folhetos Católicos". Dom Licínio Rangel. União Sacerdotal São João Maria Vianney. 

Tesouro de Exemplos - Parte 348

VERDADEIRA CARIDADE

Qualquer amor não é caridade. Amor de caridade era aquêle de S. Joana de Chantal, que curava os enfermos, levava-os à sua casa e beijava-lhes as chagas. "Mas que fazes?" perguntaram-lhe um dia. "Beijo as chagas de Jesus". Se alguém ama a uma pessoa, porque é rica e poderosa ou porque é capaz de socorrê-lo e protegê-lo, seu amor não é caridade; é interesse.
"Caridade é... amar ao próximo como a si mesmo por amor de Deus.

Pena de dano que os réprobos sofrem no inferno.

Derelinquam eum, et abscondam faciem meam ab eo... invenient eum omnia mala – “Eu o deixarei, e esconderei dele meu rosto... todos os males virão sobre ele” (Deut. 31, 17).

Sumário. Não são as trevas, a infecção, os gritos, o fogo, que constituem o inferno; o que faz o inferno é a dor de ter perdido a Deus e de não O poder amar. Aparta-te (dirá o Juiz à alma na sentença final), aparta-te de mim; não te quero mais ver. Tu não mais serás minha, nem eu serei nunca mais teu. Ó separação amarga!... Quem sabe, meu irmão, se esta pena tão terrível não nos está reservada também? Fascinados como estamos pelos bens terrestres, não a compreendemos agora, mas experimenta-la-íamos, se um dia tivéssemos a desgraça de nos perder.

I. Todos os sofrimentos dos réprobos no inferno não são nada em comparação com a pena de dano. Não são as trevas, a infecção, os gritos, o fogo, que constituem o inferno: o que faz o inferno é a dor de ter perdido a Deus e de não mais O poder ver nem amar. É o que um dia o demônio disse quando Santa Catarina de Gênova lhe perguntou quem era: “Eu sou aquele”, respondeu, “que está privado de amor de Deus”. – Pelo que São João Crisóstomo diz que mil infernos não podem igualar esta perda; que mil infernos nada seriam em comparação com a pena de estar longe de Deus e ser odiado por Ele. Santo Agostinho acrescenta que os condenados, se gozassem a vista de Deus, deixariam de sofrer e o inferno tornar-se-ia paraíso: Ipse infernus verteretur in paradisum.

Fascinados como estamos pelos bens da terra, não podemos compreender o que seja o estar privado para sempre da presença de Deus, mas para fazermos uma leve idéia deste tormento, arrazoemos assim: Se alguém perdesse uma pedra preciosa no valor de 100 mil reis, sentiria grande mágoa; se tivesse o valor de 200 mil reis, a mágoa seria dobrada; maior ainda seria, se o valor fosse de 400 mil reis; numa palavra, a mágoa cresceria sempre em proporção do valor do objeto perdido. E qual é o bem que o réprobo perde? Um bem infinito, que é Deus; portanto, conclui Santo Tomás, a pena que esta perda lhe causa, é de algum modo infinita.

Todo o inferno está, pois, nestas primeiras palavras da sentença final: Discedite a me, maledicti – Retirai-vos, malditos, não quero que me torneis a ver a face. – Se ouvíssemos os gemidos de uma alma condenada, e lhe perguntássemos: Ó alma, porque estás gemendo tanto? Ela só teria esta única resposta: Estou gemendo, porque perdi meu Deus e nunca mais o tornarei a ver. Esconderei dele meu rosto; todos os males virão sobre ele.

II. Quando Davi condenou Absalão a não mais se apresentar diante dele, o jovem príncipe ficou tão aflito que respondeu: “Dizei a meu pai que me dê licença de o ver, ou que me mande matar.” (1) A um fidalgo de sua corte, que se tinha portado com pouco respeito na igreja, disse um dia Filipe II: “Não compareças mais em minha presença.” O cortezão retirou-se para casa tão consternado, que morreu de pesar. Que será então, quando, na hora da morte, Deus dizer ao réprobo: “Aparta-te; não te quero mais ver; nunca mais serás meu e eu nunca mais serei teu!” Voca nomem eius, non populus meus (2) – “Chama-lhe pelo seu nome: Não-meu-povo”.

Vós sois, meu Deus, o soberano Bem, o Bem infinito, e quantas vezes Vos perdi eu voluntariamente! Sabia que pelo meu pecado Vos ofendia gravemente, e no entanto o cometi! Ah, se não Vos visse pregado na cruz a morrer por mim, já não teria mais coragem para Vos pedir e esperar o perdão. A esta hora deveria estar no inferno, já há muitos anos, sem esperança de poder ainda amar-Vos e de recuperar a vossa graça perdida. Meu Deus mais do que todos os males detesto a injúria que Vos fiz, renunciando à vossa amizade e desprezando o vosso amor, por indignos prazeres da terra. Porque não morri antes mil vezes? Como pude ser tão cego e tão insensato?

Agradeço-Vos, meu Senhor, por me concederdes o tempo para reparar o mal que fiz. Já que, pela vossa misericórdia, estou ainda fora do inferno e Vos posso amar, quero amar-Vos, meu Deus. Nem por um só instante quero adiar a minha conversão. Amo-Vos, bondade infinita, amo-Vos minha vida, meu tesouro, meu tudo. Meu Jesus, lembrai-me sempre o amor que me haveis tido e o inferno em que devia estar, afim de que este pensamento me anime incessantemente a fazer atos de amor e a dizer-Vos: eu Vos amo, eu Vos amo. – Ó Maria, minha Rainha, minha Esperança e minha Mãe, se estivesse no inferno, já não poderia amar-Vos. Amo-Vos, minha Mãe, e em vós espero nunca deixar de vos amar, a vós e a meu Deus. Ajudai-me; rogai a Jesus por mim. (*II 121.)

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1. 2 Reg. 14, 25.
2. Os. 1, 9.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 311-314.)

30 de julho de 2013

Imitação de Cristo - Livro 1 Capítulo 9

CAPÍTULO 9

Da obediência e submissão

1. Grande coisa é viver na obediência, sob a direção de um superior, e não dispor da própria vontade. Muito mais seguro é obedecer que mandar. Muitos obedecem mais por necessidade que por amor: por isso sofrem e facilmente murmuram. Esses não alcançarão a liberdade de espírito, enquanto não se sujeitarem de todo o coração, por amor de Deus. Anda por onde quiseres: não acharás descanso senão na humilde sujeição e obediência ao superior. A imaginação dos lugares e mudanças a muitos tem iludido.
2. Verdade é que cada um gosta de seguir seu próprio parecer e mais se inclina àqueles que participam da sua opinião. Entretanto, se Deus está conosco, cumpre-nos, às vezes, renunciar ao nosso parecer por amor da paz. Quem é tão sábio que possa saber tudo completamente? Não confies, pois, demasiadamente em teu próprio juízo; mas atende também, de boa mente, ao dos demais. Se o teu parecer for bom e o deixares, por amor de Deus, para seguires o de outrem, muito lucrarás com isso.
3. Com efeito, muitas vezes ouvi falar que é mais seguro ouvir e tomar conselho que dá-lo. É bem possível que seja acertado o parecer de cada um: mas não querer ceder aos outros, quando a razão ou as circunstâncias o pedem, é sinal de soberba e obstinação.

Tesouro de Exemplos - Parte 347

EIS AQUI OS MEUS TESOUROS

Quando levavam à morte o diácono S. Lourenço, os soldados, sendo informados de que êle era o tesoureiro do Bispo, começaram a maltratá-lo para que lhes contasse onde havia escondido os tesouros... O  santo diácono mandou chamar os pobres, com os quais repartira todos os bens, e disse aos soldados: "Eis aqui os meus tesouros".
Tinha razão, porque tudo o que se dá aos pobres se converte em tesouros para a eternidade.

A alma culpada diante do Juiz divino.

Omnes nos manifestari oportet ante tribunal Christi – “Todos nós devemos manifestar-nos diante do tribunal de Cristo” (2 Cor. 5, 10).

Sumário. Têm-se visto criminosos banhados em suor frio, na presença de um juiz terrestre. Que maior terror não deve sentir o pecador diante do tribunal de Jesus Cristo? Ó céus! Verá acima de si o Juiz irritado, por baixo o inferno aberto, a um lado os pecados que o acusam, ao outro os demônios armados para o seu suplício. O Bem-aventurado Juvenal Ancina, impressionado por esta grande verdade, resolveu deixar o mundo e fez-se religioso. Meu irmão, o que farás? Continuarás a viver em teu estado de tibieza?

I. É sentimento comum entre os teólogos, que o juízo particular se faz logo que o homem expira, e que no próprio lugar onde a alma se separa do corpo, aí é julgada por Jesus Cristo, que não manda alguém em seu lugar, mas vem ele mesmo para a julgar. Qual não será o espanto daquele que, vendo pela primeira vez seu Redentor, o vir indignado!

Ante faciem indignationis eius quis stabit? (1) – “Diante da face de sua indignação quem é que poderá subsistir?” Este pensamento causava tal estremecimento ao Padre Luiz Dupont, que fazia tremer consigo a cela onde se achava. O Bem-aventurado Juvenal Ancina, ouvindo cantar o Dies irae, e pensando no terror que se há de apoderar da alma ao comparecer em juízo, resolveu deixar o mundo, o que efetivamente fez. – O aspecto do Juiz indignado será o anúncio da condenação: Indignatio regis, nuntii mortis (2). Segundo São Bernardo, será maior sofrimento para a alma ver Jesus Cristo indignado do que estar no inferno.

Têm-se visto criminosos banhados em suor frio na presença de um juiz terrestre. Pison, comparecendo no senado em traje de réu, sentiu tamanha confusão, que a si próprio se deu a morte. Que pena não é para um filho ou para um vassalo ver seu pai ou seu príncipe indignado! Que maior mágoa não deve sentir a alma à vista de Jesus Cristo, a quem desprezou durante toda a vida! Videbunt in quem transfixerunt (3) – “Verão aquele a quem traspassaram”. Esse Cordeiro, tão paciente durante a vida do pecador, então mostrar-se-lhe-á irritado, sem esperança de se deixar aplacar. Pelo que a alma pedirá às montanhas que a esmaguem e a furtem às iras do Cordeiro indignado: Montes, cadite super nos, abscondite nos ab ira Agni (4).

II. Opinam os Doutores que o divino Juiz virá julgar a alma em forma humana, e portanto com as mesmas chagas com que deixou a terra. Estas chagas serão motivo de consolação para os justos, mas que terror e espanto não inspirarão ao pecador! A vista do Homem-Deus, que, morreu para o salvar, far-lhe-á sentir mais vivamente a sua ingratidão.

Quando José do Egito disse a seus irmãos: Eu sou José, a quem vendestes, diz a Escritura, que pelo terror perderam a fala e ficaram calados (5). Que responderá, pois, o pecador a Jesus Cristo? Terá coragem de lhe pedir misericórdia, quando, primeiro que tudo, tem de lhe dar contas do abuso que fez da misericórdia? Que fará então? Pergunta Santo Agostinho, para onde fugirá o miserável, quando vir acima de si o Juiz irritado, por baixo o inferno aberto, a um lado os pecados que o acusam, a outro os demônios armados para execução do suplício e dentro de si os remorsos de sua consciência?

Ó meu Jesus, quero chamar-Vos sempre Jesus; vosso nome me consola e me anima, recordando-me que sois o Salvador que morreu para me salvar. Aqui me tendes a vossos pés; confesso que mereci o inferno tantas vezes quantas Vos ofendi pelo pecado mortal. Sou indigno de perdão, mas Vós morrestes para me perdoar. Ah, meu Jesus, perdoai-me antes de virdes a julgar-me. Então não poderei implorar a vossa misericórdia; mas agora posso pedi-la e espero-a. Então vossas chagas me inspirarão terror, agora insipiram-me confiança. Meu querido Redentor, acima de todos os males, arrependo-me de ter ofendido a vossa bondade infinita. Estou resolvido, antes, a aceitar todas as penas, todos os sacrifícios, do que vir a perder a vossa graça. Amo-Vos de todo o coração. Tende piedade de mim, segundo a vossa grande misericórdia: Miserere mei secundum magnam misericordiam tuam (6). – Ó Maria, Mãe de misericórdia, Advogada dos pecadores, obtentede-me uma grande dor dos meus pecados, o perdão e a perseverança no amor divino. Amo-vos, ó minha Rainha, e em vós ponho minha confiança. (II 108.)

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1. Nah. 1, 6.
2. Prov. 16, 14.
3. Io. 19, 37,
4. Apoc. 6, 16.
5. Gen. 45, 4.
6. Ps. 50, 1.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 309-311.)

29 de julho de 2013

Imitação de Cristo - Livro 1 Capítulo 8

CAPÍTULO 8

Como se deve evitar a excessiva familiaridade

1. Não abras teu coração a qualquer homem (Eclo 8,22); mas trata de teus negócios com o sábio e temente a Deus. Com moços e estranhos conversa pouco. Não lisonjeies os ricos, nem busques aparecer muito na presença dos potentados. Busca a companhia dos humildes e simples, dos devotos e morigerados, e trata com eles de assuntos edificantes. Não tenhas familiaridade com mulher alguma; mas, em geral, encomenda a Deus todas as que são virtuosas. Procura intimidade com Deus apenas, e seus anjos, e foge de seres conhecidos dos homens.
2. Caridade se deve ter para com todos; mas não convém ter com todos a familiaridade. Sucede, freqüentemente, gozar de boa reputação pessoa desconhecida que, na sua presença, desagrada aos olhos dos que a vêem. Julgamos, às vezes, agradar aos outros com a nossa intimidade, mas antes os aborrecemos com os defeitos que em nós vão descobrindo.

História Eclesiástica - Primeira Época Capítulo 1

PRIMEIRA ÉPOCA

Desde a fundação da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo, até a conversão de Constantino, o Grande. (ano 312 da era cristã).

CAPÍTULO I

Maria Santíssima e São José - Nascimento do Salvador - Adoração dos Reis Magos - Degolação dos Inocentes - A Sagrada Família no Egito - Disputa com os Doutores -São João Batista - Batismo de Jesus.
Maria Santíssima e São José - Aproximava-se o tempo para os quais os profetas tinham fixado a vinda do Salvador: todo o mundo esperava um mestre que, baixando do Céu, trouxesse à terra uma regra segura para discernir a verdade do erro e reformar assim os costumes depravados dos homens. Depois de 4.000 anos de contínuos suspiros, Deus decretou o cumprimento do mistério da Redenção. Uma Virgem chamada Maria, foi a mulher venturosa que Deus escolheu para ser mãe de seu Divino Filho. São Joaquim e Santa Ana, ambos descendentes da real estirpe de Davi, e da Tribo de Judá, foram os pais de Maria. Sendo já velhos, e faltando-lhes prole, dirigiram ao Céu suas orações, e o Senhor os ouviu, concedendo-lhes uma filha a que chamaram Maria. Aos três anos de idade foi esta apresentada ao Templo, para que, juntamente com as outras virgens, no exercício da piedade e do trabalho se preparasse desde então para ser digna mãe do Salvador do mundo. (São João Damasceno)
Tendo chegado à idade de tomar estado, respondendo a uma voz celeste, foi desposada com São José, varão santíssimo, oriundo de Nazaré, o qual viveu com ela como se fosse uma irmã.
Depois de breve tempo, o Arcanjo Gabriel foi enviado para anunciar a Maria a sublime dignidade de mãe de Deus. Certificada Maria que tudo era obra do Espírito Santo submeteu-se à Vontade do Altíssimo, dizendo ao Anjo: Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra.
Nascimento do Salvador - Corria o ano 4.000 da criação do mundo e Herodes, chamado o Grande, reinava na Judéia. Maria Santíssima e São José, obedecendo às ordens do Imperador Romano, César Augusto, se transportaram para Belém, pequena cidade da Judéia para inscreverem seus nomes nos registros do império. Estando as casas da Cidade cheias de forasteiros, tiveram de sair daí e alojar-se em uma gruta que servia de estábulo, onde se achavam dois animais.
Em tão humilde local, à meia-noite de 25 de dezembro, nasceu o Senhor do Céu e da terra. Nesse mesmo instante, um anjo revestido de luz deslumbrante, anunciou a boa nova a uns pastores que velavam guardando seus rebanhos, enquanto que uma multidão de anjos fazia ressoar nos ares aquelas palavras celestiais: "Glória Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade". Os pastores cheios de admiração por tão insólitos portentos, correram pressurosos a Belém e encontraram ali o celestial Menino.
Depois de o haverem adorado e reconhecido como seu verdadeiro Deus e Salvador, cheios de alegria voltaram a seus rebanhos bendizendo ao Altíssimo. Aos oito dias de seu nascimento o Menino foi circuncidado e foi lhe posto o adorável nome de Jesus, que quer dizer Salvador, como o tinha ordenado o anjo antes do seu nascimento.
Adoração dos Reis Magos - Algum tempo depois, alguns sábios do Oriente, guiados por uma estrela prodigiosa, que então apareceu em suas regiões, dirigiram-se à Jerusalém para adorar o recém-nascido Messias. Chegando à Jerusalém perguntaram a Herodes onde havia nascido o rei dos Judeus. A tão estranha pergunta perturbou-se Herodes; reuniu em Concílio os Príncipes e Sacerdotes e os Doutores da Lei e lhes perguntou onde havia de nascer o Messias. A Assembléia declarou que devia nascer em Belém de
Judá, segundo a profecia de Miquéias, que, falando do nascimento do Messias, disse: "E tu, ó Belém de Judá, não és a menor entre as principais de Judá, porque de ti nascerá o chefe que governará meu povo de Israel." Com tais informações saíram de Jerusalém os piedosos Reis e acompanhando o curso da estrela milagrosa chegaram onde se achava o divino Infante, e humildemente prostrados ofereceram-lhe ouro, incenso e mirra. Em seguida, avisados por um Anjo, regressaram por outro caminho a sua pátria.
Degolação dos Inocentes e fuga para o Egito - Herodes ao despedir os Reis recomendou-lhes encarecidamente que passassem por seu palácio e o inteirassem de quanto se referia ao novo rei, com o fim, porém, de fazê-lo perecer, temendo que crescendo o despojasse do seu trono. Mas, tendo esperado inutilmente pela volta dos reis, e presumindo por ventura alguma coisa do acontecido no templo, agitado por mil suspeitas, lavrou um decreto em que ordenava a degolação de todos os meninos que não tendo chegado ainda aos dois anos de idade se achassem em Belém e suas circunvizinhanças. Deus, porém, enviou um anjo que comunicou em sonhos a José as brutais disposições de Herodes, pelo que José fugiu para o Egito com Maria e o Menino. Daí só voltou depois que o anjo anunciou a morte de Herodes. Havendo morrido
Herodes, a Sagrada Família regressou a Nazaré, sua pátria, cumprindo-se assim a profecia de Oséias que havia dito em nome de Deus: Desde o Egito eu chamei meu filho. (Oséias, cap. 2)
Disputa com os Doutores - José e Maria juntamente com Jesus, viviam tranquilos em sua pátria, ganhando o pão com o trabalho de suas mãos. Na idade de doze anos, tendo ido Jesus com seus pais a Jerusalém para celebrar a Páscoa, perdeu-se. José e Maria debulhados em pranto, procuraram-no por três dias com incrível ansiedade; finalmente puderam encontra-lo no templo enquanto disputava com os Doutores da lei aos quais causava grande admiração com suas sábias perguntas e respostas. Vendo-o Maria lhe disse: "Filho porque procedeste assim conosco? Vê como teu pai e eu angustiados te procurávamos". Jesus lhe respondeu: "Porque me procuráveis? Não sabíeis que nas coisas que são de meu pai me convém estar?" É este o último fato que nos narra o Evangelho da infância de Jesus, que depois de regressar a Nazaré, submisso e obediente a Maria e a São José, se ocupou nos humildes trabalhos de simples artesão, até aos 30 anos de idade.
São João Batista - Quando o anjo anunciou a Maria a sublime dignidade de Mãe de Deus, disse-lhe também que sua prima Isabel, apesar de sua avançada idade, daria luz um filho destinado por Deus para preparar a receberem o Messias. Maria, sabedora, pela revelação de um anjo, das maravilhas que Deus estava obrando na pessoa de sua prima Isabel, foi logo a sua casa visitá-la e esteve com ela três meses.
Seis meses antes do nascimento do Salvador, Isabel deu à luz o filho prometido que recebeu o nome de João ao qual se acrescentou mais tarde o apelido de Batista, porque batizava as multidões. Este menino foi o precursor do Messias. Para fugir aos tumultos do século, retirou-se, ainda muito criança à soledade do deserto onde levou uma vida angélica; seu alimento se compunha de gafanhotos e mel silvestre e não tinha outra vestimenta além da pele de um cameio e um cinturão de couro. Estava João pelos trinta anos de idade quando recebeu ordem do Senhor de ir às margens do Jordão para pregar a penitência e anunciar a chegada do Messias. Todos corriam para ouvir seus sermões e muitos recebiam o batismo.
Batismo de Jesus - Jesus aos 30 anos de idade saiu de Nazaré para chegar às margens do Jordão, e receber também Ele o batismo. São João como nunca o tinha visto, não o conhecia ainda; entretanto iluminado pelo Espírito Santo, correu a seu encontro nas margens do Jordão, gritando para a multidão que o acompanhava: "Eis aqui o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo". Falando em seguida a Jesus, disse-lhe: "Tu queres que eu te batize, entretanto eu sou quem deveria ser batizado por ti". Respondeu-lhe Jesus: "Deixa agora porque assim nos convém observar toda justiça". Chegou São João e o batizou. Terminada a augusta cerimônia, abriram-se de repente os céus, e o Espírito Santo em forma de pomba, desceu sobre a cabeça de Jesus Cristo, fazendo ouvir ao mesmo tempo uma voz que disse: "Este é meu dileto filho, em quem pus as minhas complacências". Deste modo, Jesus foi proclamado solenemente verdadeiro filho de Deus, enviado para salvar os homens.

Da grande farsa do herege espírita Chico Xavier

Ou: a ridícula heresia espírita nas terras brasileiras 

[extraído do livro "Espiritismo: Orientações para os Católicos" de Dom Boaventura Kloppenburg, O.F.M]

A PSICOGRAFIA DE CHICO XAVIER

O Sr. Francisco de Paula Cândido, mais conhecido como Francisco Cândido Xavier, ou simplesmente Chico Xavier, é nosso médium mais conhecido e idolatrado. Nasceu em Pedro Leopoldo, MG, em 1910. Dizem que não fez mais que o curso primário. De família católica, entrou em contato com o espiritismo em 1927. Desde 1959 vive em Uberaba. Leva uma vida simples, com muita dedicação aos que sofrem e de intensa atividade psicográfica. Seus livros psicografados já passam de 250 e são amplamente difundidos, principalmente pela Federação Espírita Brasileira, fato que, por si só, comprova sua fidelidade à doutrina codificada por AK. Afirma-se que já tem mais de quinze milhões de exemplares vendidos. Não há outro autor que se compare. Em 1982 seu nome foi sugerido para Prêmio Nobel da Paz, com o endosso, segundo dizem, de mais de dez milhões de simpatizantes.

No prefácio de sua primeira obra psicografada, Parnaso de Além -Túmulo, o próprio Chico se apresenta como um moço com "o mais pronunciado pendor para a literatura", com "a melhor boa vontade para o estudo", que em casa "estudou o que pôde". O Jornal das moças de 1931 publicava sonetos seus. Um amigo de Belo Horizonte, que o conheceu naqueles anos, deu-me estas informações:

- "Conheci o Francisco Xavier em 1933. Nessa época ele ainda trabalhava numa pequena casa de comércio, em Pedro Leopoldo. Na ocasião, em julho de 33, salvo engano, ele me deu para ler Um álbum de poesias dele. Eram poemas, sonetos, quase todos melhores do que a imitação de Guerra Junqueiro que publicou no Parnaso de além túmulo. Foi por intermédio de Francisco Xavier que conheci Augusto dos Anjos. Ele declamava grande parte do Eu. Lera tanto Augusto dos Anjos que o sabia de cor. Ainda me lembro muito de ouvi-lo declamar com entusiasmo o 'Árvore da serra'. Em 1933 ele estava encantado com Augusto dos Anjos. Já por essa época ele lia o espanhol e o francês: assim me disse várias vezes. Conhecia bem a literatura brasileira e lia muito. Nós nos correspondíamos em fins de 1933 e 1934, e é pena que não tenha guardado as cartas dele, da época. Nelas, o tema era literatura e poder-se-ia ver bem que ele não era quase analfabeto, com apenas a instrução primária, conforme afirma no prefácio no Parnaso. É o que lhe posso informar por conhecimento próprio. Ainda devo acrescentar que lá por 1941 ou 42 visitei, com alunos do Seminário, a Fazenda do Estado, em Pedro Leopoldo, onde me encontrei com ele. Conversamos sobre santa Teresa e são João da Cruz. Eu acabara de ler as obras de santa Teresa e ele conhecia bem não só santa Teresa, mas também são João da Cruz".

A propaganda espírita exalta a perfeição dos vários estilos na obra mediúnica de Chico Xavier. Dizem que Olavo Bilac, Humberto de Campos e outros mestres da nossa literatura reapareceram através do lápis de Chico Xavier em sua antiga perfeição. E propagam que até um Agripino Grieco reconheceu o inconfundível estilo de Humberto de Campos. Mas o que na realidade encontro nas declarações de Agripino Grieco é um pouco diferente. Diz ele, tex-tualmente, ao Diário da Noite, de São Paulo, de 26-6-1944 (no tempo do famoso processo que a família de Humberto de Campos moveu contra a Federação Espírita):

- "A Humberto de Campos, entretanto, penso que já bastariam os livros por ele escritos ainda em vida, para que sua glória se tornasse imperecível. Os livros póstumos ou pretensamente póstumos nada lhe acrescentam à glória, sendo mesmo bastante inferiores aos escritos em vida. Interessante: de todos os livros que conheço como sendo psicografados, escritos por intermédio da mão ligeira de um médium, nenhum se equipara aos produzidos quando era o escritor que fazia a pena deslizar sobre o papel. O mesmo sucede com as obras do espírito de Vítor Hugo, 'apanhadas' aqui no Brasil e em português. Parecem-me todas de um Vítor Hugo em plena caducidade, com uma catarreira senil das mais alarmantes. " Outra coisa: em geral esses livros só se reportam a coisas terrestres: não são livros do além, mas simplesmente do aquém, retrospectivos, autobiográficos, de um mundo que já conhecemos miudamente...".

Outro crítico, o Sr. João Dornas Filho, comparou o Olavo Bilac póstumo de Chico Xavier com as produções do poeta vivo:

- "Pois bem, esse homem, que em vida e segundo a doutrina espírita estava sujeito às deficiências, aos erros, à contingência do estado de encarnação e só desencarnado poderia realizar ou iniciar o seu período de perfeição; esse homem que no estágio de imperfeição nunca assinou um verso imperfeito depois de morto ditou ao Sr. Chico Xavier sonetos inteirinhos abaixo de medíocres! Cheios de versos malmedidos, mal-rimados e, sobretudo, numa língua que Bilac absolutamente não escrevia" (Folha da Manhã, SP, 19-4-1945).
É necessário assinalar mais um ponto importante. Já AK nos revela nas Obras póstumas (mas não ditadas depois de sua morte) como trabalhou sobre o material acumulado para codificar O livro dos espíritos: "Da comparação e da fusão de todas as respostas, coordenadas, classificadas e muitas vezes remodeladas no silencio da meditação" nasceu aquela obra fundante do espiritismo. Quando nos vêm mensagens do além, ou até mesmo revelações destinadas a "completar, explicar e desenvolver" a doutrina cristã, coisa que os espíritas pretendem com sua "terceira revelação", fazemos questão de ter as novas "revelações" exatamente assim como vieram ou foram ditadas e não como foram depois "remodeladas" por algum mortal deste mundo. Coisas semelhantes aconteceram com obras de Chico Xavier. O jornal espírita O poder, de Belo Horizonte, de 10-5-1953 (n. 392), publicou um artigo do espírita Sousa de Prado, com notáveis revelações sobre o que acontece atrás dos bastidores do espiritismo nacional. Sousa de Prado revela que um dia foi procurado pelo presidente da Federação Espírita, Wantuil de Freitas, tendo na mão um maço de provas tipográficas. "Você sabe - dizia ele - que quem corrige todos os trabalhos recebidos pelo Chico Xavier é o Quintão". Manuel Quintão também foi presidente da Federação. E Sousa de Prado lhe respondeu: "Sei, por sinal que, com tais correções, consegue desfigurar quase completamente o estilo dos espíritos que ditam as obras ao médium, enxertando-lhes termos esdrúxulos, que eles nunca usaram enquanto encarnados". Confidenciou-lhe então o Sr. Wantuil de Freitas:

- Ora, como você sabe, o Quintão erra constantemente, principalmente no emprego da crase, e na pontuação; e eu tenho grande empenho em que isso saia correto. Por isso, fiz uma nova revisão, emendando os principais erros que encontrei. Como, porém, eu sou Um pouco fraco no português..." e posso ter emendado coisas que estivessem certas, queria que você conferisse, comigo, as emendas que fiz".

De tudo isso concluo que Chico Xavier é um cidadão bom e inteligente, poeta por inclinação natural, muito lido, capaz de reproduzir mediocremente, em estilos diversos, inúmeras páginas sobre assuntos bastante banais e que são revistas e corrigi das por outras pessoas mais competentes e melhor formadas.

A propaganda espírita é muito mais categórica e positiva que o próprio Chico Xavier. Os espíritas não têm dúvidas: aquelas mensagens são realmente dos espíritos do além. No prefácio de Parnaso de além túmulo o próprio Chico Xavier é bem mais reservado e prudente. Eis suas palavras:

- "O que psicografo será das personalidades que assinam os poemas? E o que não posso afiançar. O que afirmo categoricamente é que, em consciência, não posso dizer que são minhas, porque não despendi nenhum esforço intelectual ao grafá-las no papel. A sensação que sempre experimentei ao escrevê-las era a de que vigorosa mão impulsionava a minha".

Aqui temos a sincera descrição do fenômeno. Mas é também sua explicação. O fenômeno certamente não foi produzido por forças do além. Qualquer bom psicólogo saberá explicá-lo. Chico Xavier deixa de ser um problema teológico e passa à competência da psicologia.

"NOSSO LAR": UM EXEMPLO CONCRETO

Mas tomemos um exemplo concreto de uma das obras psicografadas por Chico Xavier, sua obra mais popular: Nosso lar, com 460.000 exemplares vendidos até 1985, ditada por um espírito chamado "André Luis", que, segundo se afirma nos arraiais espíritas, teria sido em vida o conhecido médico Dr. Osvaldo Cruz. Nesta obra, "André Luís" relata uma multidão de acontecimentos, desde sua morte até seu ingresso, como cidadão, na fantástica colônia espiritual chamada "Nosso lar".

Imediatamente depois da separação do corpo (morte), o espírito, agora "desencarnado", de André Luís passou por um período bastante difícil, confuso e desorientado, sempre andando, sem saber por onde nem para onde. Era o estado de "erraticidade", descrito abundantemente por AK. "Persistiam - conta ele - as necessidades fisiológicas, sem modificação. Castigava-me a fome todas as fibras, e, não obstante o abatimento progressivo, não chegava a cair definitivamente em absoluta exaustão. De quando em quando, deparavam-se-me verduras que me pareciam agrestes, em tomo de humildes filetes d'água a que me atirava sequioso. Devorava as folhas desconhecidas, colocava os lábios à nascente turva, enquanto mo permitiam as forças irresistíveis, a impelirem-me para frente. Muitas vezes suguei lama da estrada, recordei o antigo pão de cada dia, vertendo copioso pranto. Não raro era imprescindível ocultar-me das enormes manadas de seres animalescos, que passavam em bando, quais feras insaciáveis" (p. 17; sigo a 4" edição). Durou oito anos a peregrinação.

Até que encontrou outro espírito: Clarêncio, "um velhinho simpático que sorriu paternalmente", que se apoiava num cajado de substância luminosa. Foi então transportado. Pararam "à frente de grande porta encravada em altos muros, cobertos de trepadeiras floridas e graciosas" (p. 20). Acomodaram-no num leito de emergência, "no pavilhão da direita". Viu-se então num confortável aposento, "ricamente mobiliado". Serviram-lhe "caldo reconfortante, seguido de água muito fresca", portadora "de fluidos divinos". À noite ouviu "divina melodia". Levantou-se e chegou a um enorme salão, "onde numerosa assembléia meditava em silêncio". Soube que era a hora da oração, dirigida pelo governador, através do rádio e da televisão, "com processos adiantados".

No dia seguinte encontrou-se com o "irmão Henrique de Luna", do Serviço de Assistência Médica daquela Colônia Espiritual. Soube então que, só naquela seção, "existem mais de mil doentes espirituais". Examinado, recebeu o seguinte diagnóstico: "A zona dos seus intestinos apresenta lesões sérias com vestígios muito exatos de câncer; a região do fígado revela dilacerações; a dos rins demonstra características de esgotamento prematuro" (p. 30). Recebeu como remédio passes magnéticos.

Quero lembrar que se trata de descrições da vida do espírito, depois da morte: não de coisas desta terra.
Um dia foi passear: "Quase tudo melhorada cópia da Terra. Cores mais harmônicas, substâncias mais delicadas. Forrava-se o solo de vegetação... Aves de plumagens policromas cruzavam os ares... Identificava animais domésticos" (p. 38). Viu "vastas avenidas, enfeitadas de árvores frondosas". Entidades numerosas iam e vinham...

Afinal soube que estava numa das muitas colônias espirituais. Esta chama-se "Nosso lar", consagrada ao Cristo (p. 22) e fundada por portugueses distintos, desencarnados no Brasil, no século XVI, segundo consta dos "arquivos do ministério do esclarecimento" (p. 47). A colônia é dirigida por um governador (que naqueles dias comemorou o 114º aniversário de governança) assistido por 72 colaboradores. Divide-se em 6 ministérios, orientados cada qual por 12 ministros: o ministério da regeneração, do auxílio, da comunicação, do esclarecimento, da elevação e da união divina. É no ministério do auxílio que preparam as "reencarnações terrenas". Há, na colônia, "mais de um milhão de criaturas" (p. 207).

No passado a colônia teve que agüentar muitos apertos. Houve maus governadores, com muita oposição, inclusive assaltos por parte de outros espíritos, "que tentaram invadir a cidade, aproveitando brechas nos serviços de Regeneração, onde grande número de colaboradores entretinha certo intercâmbio clandestino" (p. 48). Mas o governador "mandou ligar as baterias elétricas das muralhas da cidade, para emissão dos dardos magnéticos" (p. 49).

Um dia foi de aerobus ao bosque das águas. Era um "grande carro, suspenso do solo a uma altura de cinco metros mais ou menos e repleto de passageiros" (p. 50). Outro dia visitou uma casa particular: "Móveis quase idênticos aos terrestres". Quadros, piano, livros. Com relação aos livros recebeu a seguinte informação: "Os escritores de má fé, os que estimam o veneno psicológico, são conduzidos imediatamente para as zonas obscuras do umbral". Havia também sala de banho. Ao almoço serviram "caldo reconfortante e frutas perfumadas, que mais pareciam concentrados de fluidos deliciosos" (p. 86).

Também o problema da propriedade recebeu sua solução. "Nossas aquisições são feitas à base de horas de trabalho. O bônus-hora, no fundo, é o nosso dinheiro. Quaisquer utilidades são adquiridas com esses cupons. " Cada família espiritual pode conquistar um lar (nunca mais que um), apresentando trinta mil bônus-hora" (p. 100).

Existe também o serviço de recordações. Aplicam-se passes no cérebro, que restituem "trezentos anos de memória integral" (p. 103).

Certa vez encontrou um ancião, gesticulando, agarrado ao leito, como se fosse louco, gritando por socorro, pedindo ar, muito ar! O homem estava sendo vítima de uma "carga de pensamentos sombrios, emitidos pelos parentes encarnados" (p. 127). Recebeu então passes de prostração. Há também "água magnetizada" e "operações magnéticas" (p. 136).

Num daqueles dias apareceu na colônia uma católica desencarnada na Terra. Chegou benzendo-se e dizendo: - "Cruzes! Credo! Graças à Providência Divina, afastei-me do purgatório..." Revelou que, na Terra, foi mulher de muito bons costumes, que rezou incessantemente e deixou uns dinheirinhos para celebração de missas mensais; em suma, fez o possível para ser boa católica. Confessara-se todos os domingos e comungara. Mas maltratara os escravos. "Padre Amâncio, nosso virtuoso sacerdote, disse-me na confissão que os africanos são os piores entes do mundo, nascidos exclusivamente para servirem a Deus no cativeiro." Morrera em 1888 e só em 1939 alcançou o "Nosso lar". Fora longo seu "esforço purgatorial" (p. 164). Também, católica. . .

Num domingo o governador resolveu realizar o "culto evangélico" no ministério da regeneração. Havia meninos cantores das escolas de esclarecimento, que cantavam o hino "Sempre contigo, Senhor Jesus", cantado por duas mil vozes. Depois de outra cerimônia do culto evangélico, cantaram o hino "A ti, Senhor, nossas vidas". No fim a ministra veneranda entoou "A grande Jerusalém" (p. 208).
É assim no "Nosso lar".

Nos outros volumes continua André Luís a descrever a vida e a atividade fantástica do mundo "depois da morte".

Eis a literatura dos nossos espíritas. Este é o tipo de livros que a Federação brasileira propaga, aos milhares, pelo Brasil.

O SOBRINHO TAMBÉM PSICOGRAFAVA...

O Sr. Chico Xavier tem um sobrinho. Chama-se Amauri Pena. Nasceu em 1933, em Pedro Leopoldo. Com ano e meio foi morar em Sabará, MG. Quando tinha apenas dez anos, já lera o Parnaso de além túmulo, do tio. Aos 13 anos escrevia poemas. Inteligente, lia muito e começou a imitar o estilo de outros autores. Educado em ambiente espírita, com o brilhante exemplo do tio à vista, foi persuadido de ser um grande médium. E começou a "psicografar". Segundo um jornal espírita, "recebeu composições de mais de cinqüenta poetas brasileiros e portugueses, cada qual em seu próprio e inconfundível estilo. Recebeu também uma epopéia camoniana, em estilo quinhentista". Cruz e Sousa, Gonçalves Dias, Castro Alves, Augusto dos Anjos, Olavo Bilac, Luís Guimarães Jr., Casemiro Cunha, Inácio Bittencourt, Cícero Pereira, Hermes Fontes, Fabiano de Cristo, Anália Franco e até Bocage e Rabindranath Tagore apressavam-se em procurar o sobrinho de Chico Xavier para fazer uns versos... Síntese, um boletim espírita de Belo Horizonte, dava ao médium a necessária publicidade.

Iam as coisas nas mais risonhas esperanças. E eis que, num belo dia de 1958, Amauri Pena procura a imprensa profana para fazer sensacionais declarações: "Tudo o que tenho psicografado até hoje - declarou - apesar das diferenças de estilo, foi criado por minha própria imaginação, sem que precisasse de interferência de almas de outro mundo". E explicava: "Depois de ter-me submetido a esse papel mistificador, durante anos, usando apenas conhe-cimentos literários, resolvi, por uma questão de consciência, contar toda a verdade".

E o sobrinho de Chico Xavier esclareceu mais: "Sempre encontrei muita facilidade em imitar estilos. Por isso os espíritas diziam que tudo quanto saía do meu lápis eram mensagens ditadas pelos espíritos desencarnados. Revoltava-me contra essas afirmativas, porque nada ouvia e sentia de estranho, quando escrevia. Os espíritas, entretanto, procuravam convencer-me de que era médium. Levado a meu tio, um dia, assegurou-me ele, depois de ler o que eu escrevera, que deveria ser seu substituto. Isso animou bastante os espíritas. Insistiam para que fosse médium".

O jovem e improvisado médium Amauri continua na descrição de sua estranha aventura: "Passei a viver pressionado pelos adeptos da chamada terceira revelação. A situação torturava-me e, várias vezes, procurando fugir àquele inferno interior, entreguei-me a perigosas aventuras. Diversas vezes, saí de casa, fugindo à convivência de espíritas. Cansado, enfim, cedi, dando os primeiros passos no caminho da farsa constante. Teria 17 anos. Ainda assim, não me vi com forças para continuar o roteiro. Perseguido pelo remorso e atormentado pelo desespero, cometi desatinos. Em algumas oportunidades, tentei recuar, sucumbindo, atordoado. Vi-me, então, diante de duas alternativas: mergulhar de vez na mentira e arruinar-me para sempre ou levantar-me corajosamente para penitenciar-me diante do mundo e de mim mesmo, libertando-me defi-nitivamente. Foi o que resolvi fazer, procurando um jornal mineiro e revelando toda a farsa. Sei das reações que minhas declarações causarão. Mas não me importo. O certo é que, enquanto me sacrificava pela propaganda de uma mentira, não me julgavam maluco. Não desmascaro meu tio como homem, mas como médium. Chico Xavier ficou famoso pelo seu livro Parnaso de além túmulo. Tenho uma obra idêntica e, para fazê-la, não recorri a nenhuma psicografia" .

Eis as principais declarações de Amauri Pena.

Claro que não podia faltar a reação espírita. Um dos mais notáveis escritores espíritas do Brasil ("Irmão Saulo") encontrou logo a explicação mais satisfatória do ponto de vista espírita. Sustenta que a mediunidade de Amauri é "inegável e irretratável". E explica que o fenômeno espírita "não depende da opinião dos médiuns, e não raro contraria mesmo essa opinião. O fenômeno mediúnico é um fato em si. O caso Amauri é um exemplo disso. Pouco importa que ele se retrate, que se diga autor das comunicações recebidas. O que importa é a análise das comunicações em seus próprios conteúdos, bem como das circunstâncias em que foram dadas". Não adianta negar a mediunidade, esclarece o espírita, "mesmo que ele não a aceita, mesmo que ele a queira negar", será e continuará médium. E o Reformador, órgão da Federação Espírita Brasileira, se consolou, ponderando que também Jesus foi traído por um de seus apóstolos... E o Amauri é classificado como "vítima de sua própria afinidade com os obsessores que o trazem acorrentado à vida irregular".

Duas são as lições que podemos colher do rumoroso caso:

1. Amauri Pena prova que é relativamente fácil imitar o estilo de outros. É mais uma questão de exercícios que de espíritos. Lá mesmo, na redação, diante dos jornalistas, imitou vários estilos. Diz ele: "Tenho uma obra idêntica (ao Parnaso de além túmulo) e, para fazê-la, não recorri a nenhuma psicografia". Um ilustre literato francês assegura que os "escritores vulgares e incapazes de estilo pessoal conseguem imitar admiravelmente o estilo de outrem. O pasticho é, efetivamente, um dom que todos podem ter”.

2. É inútil discutir com espíritas. Atitudes preconcebidas e totalmente anti-científicas esterilizam qualquer discussão séria. Declara Amauri Pena ter consciência de ser ele mesmo o autor dos versos, diz que sempre teve facilidade em imitar estilos, confessa que para isso se utiliza de seus conhecimentos literários - e os espíritas insistem em proclamá-lo médium autêntico, instrumento de Rabindranath Tagore! Nem mesmo AK, cem anos atrás, teria procedido assim. O argumento em que Kardec mais insistia era a passividade e a inconsciência do médium, a completa independência da mensagem que, mesmo contra a vontade do médium e contra suas idéias conscientes, ficava surpreendido ao ver a "comunicação". Já vimos isso. Poderia recordar muitas passagens nas quais o codificador constantemente argumenta com o fato da "independência absoluta da inteligência que se manifesta". Foi por isso - e só por isso - que Kardec chegou à conclusão de que esta "inteligência independente" devia ser distinta da alma do médium e, portanto, um espírito desencarnado. Semelhante raciocínio teria ficado totalmente sem base e sem valor, se o médium tivesse respondido tranqüilamente (como Amauri Pena): "Mas tudo quanto tenho escrito foi criado por minha própria imaginação e disso tenho plena consciência". Falando, por exemplo, do "sonambulismo desperto", um estado em que "as faculdades intelectuais adquirem um desenvolvimento anormal", confessa Kardec (na introdução ao Livro dos espíritos, p. 41): "Concordamos em que, efetivamente, muitas ma-nifestações espíritas são explicáveis por esse meio. Contudo, numa observação cuidadosa e prolongada mostra grande cópia de fatos em que a intervenção do médium, a não ser como instrumento Passivo, é materialmente impossível". Ora, precisamente este estado puramente passivo não é reconhecido pelo sobrinho de Chico Xavier. "Revoltava-me (diz ele) contra essas afirmativas (dos espíritas) porque nada ouvia e sentia de estranho quando escrevia".

Mas nossos espíritas insistem: "Pouco importa que ele se retrate, que se diga autor das comunicações recebidas, mesmo que ele não aceite, ainda que queira negar: ele é um grande médium"!

Aqui acabou-se a ciência. Venha, pois, Rabindranath Tagore...

Tesouro de Exemplos - Parte 346

A GLÓRIA VÃ DÊSTE MUNDO

Napoleão, para conquistar um reino, sofreu frio, cansaço, sono e expôs-se muitas vêzes aos perigos da  guerra. Seu reinado foi meteoro de um instante e êle morria derramando lágrimas de desengano, na ilha de S. Helena, no meio do mar.
César, suspirando pelo império de Roma, combateu árduas batalhas nas Gálias e apenas alcançou o umbral do sonhado império, caiu apunhalado aos pés da estátua de Pompeu.
Alexandre combateu com fôrça de vontade jamais vista na terra; e quando conseguiu o domínio do mundo, colheu-o a morte e com êle esfacelou-se o seu império.
Ora, se os filhos do século sabem sofrer indizíveis tormento, superar terríveis dificuldades para alcançar o reino de um dia, - por que os filhos da luz não hão de saber suportar pequenos sofrimentos, combater as paixões, repelir a lisonja do mundo para conquistar um reino eterno de felicidade?

Malícia do pecado mortal.

Tetendit enim adversus Deum manum suam, et contra omnipotentem roboratus est – “Estendeu a sua mão contra Deus e se fez forte contra o Todo Poderoso” (Iob 15, 25).

Sumário. Para nos induzir ao pecado, o demônio nos deixa ver o pecado somente à metade, mostrando-nos o deleite que nos traz e não o mal que encerra. Consideremos, porém, que esta malícia, pela injúria que faz a Deus, é tão grande que, se todos os homens e anjos se oferecessem a morrerem ou mesmo a aniquilarem-se, não poderiam satisfazer por um só pecado. Um verme da terra revolta-se contra a Majestade infinita. Ah, Senhor! Pelo amor de Jesus Cristo, iluminai-me para compreender a malícia do pecado.

I. Que faz aquele que comete pecado mortal? Injuria a Deus. Segundo Santo Tomás, a malícia de uma injúria mede-se pela pessoa que a recebe e não pela que a faz. A injúria feita a um arrieiro é um mal; feita a um nobre, é um mal maior; feita a um monarca, muito maior ainda.

Quem é Deus? É o Rei dos reis, o Senhor dos senhores: Dominus dominantium est et rex regum (1). Deus é a Majestade infinita; perante Ele são menos que um grão de areia todos os príncipes da terra, todos os Santos e todos os Anjos do céu: Quasi stillae situlae, pulvis exiguus (2). O Profeta ainda acrescenta que diante da grandeza de Deus, todas as criaturas são de tal modo pequenas, que é como se não existissem: Omnes gentes quasi non sint, sic sunt coram eo (3). Eis aí o que é Deus.

E que é o homem? Saccus stercorum, cibus vermium, responde São Bernardo. O homem é um vil montículo de corrupção, pasto dos vermes, que em breve o hão de devorar. O homem, continua o santo Doutor, é um verme miserável que nada pode, um pobre nu que nada tem. – E é este verme miserável que se atreve a injuriar a Deus; é este vilíssimo grão de pó que não hesita em excitar a cólera terrível da Majestade divina: Tam teribilem maiestatem audet vilis pulvisculus irritare!

Tem, pois, razão o Doutor Angélico em dizer que o pecado do homem contém de algum modo malícia infinita – Peccatum habet quamdam infinitatem malitiae, ex infinitate divinae maiestatis (4). Santo Agostinho chama o pecado, de um modo absoluto, um mal infinito: infinitum malum. – D’onde se segue que todos os homens e todos os anjos não poderiam satisfazer por um só pecado, ainda que à morte e ao aniquilamente se oferecessem. Deus castiga o pecado mortal com o grande suplício do inferno; mas, qualquer que seja o castigo, todos os teólogos são unânimes em dizer que fica abaixo do que o pecado merece: citra condignum. E que pena poderia jamais castigar, como merece, o verme que se levanta contra seu Senhor?

II. Sendo tão grande e horrorosa a malícia de um pecado mortal, como é que ele é cometido tão freqüentemente até por cristãos? “Isso é devido”, responde São Leonardo de Porto Maurício, “a uma arte hábil do demônio, que nos mostra o pecado só pela metade; o que quer dizer que nos deixa ver o encanto e deleite que nos traz o pecado e não a malícia e monstruosidade que ele encerra.” Oh, se todos soubessem o que é o pecado mortal! Ao menos tu, meu irmão, a quem Deus concedeu a graça de meditar hoje na hediondez deste monstro, fica sempre longe, afastado dele. E se no passado tens ofendido o teu bom Deus, pede-lhe agora humildemente perdão.

É verdade, meu Senhor, Vós me haveis distinguido, acima dos outros, com os vossos benefícios; e eu Vos fiz objeto preferido das minhas ofensas, injuriando-Vos mais que a qualquer conhecido meu. Ó Coração angustiado do meu Redentor, que sobre a cruz fostes tão aflito e atormentado à vista de meus pecados, concedei-me, pelos vossos merecimentos, um claro conhecimento e uma viva dor dos meus pecados. Ah, meu Jesus, vejo-me cheio de vícios, mas Vós sois todo poderoso; podeis, portanto, encher-me de vosso santo amor. Tenho confiança em Vós, que sois a bondade, a misericórdia infinita. Ó meu Bem soberano, pesa-me de Vos ter ofendido. Oxalá tivesse morrido antes de Vos ofender e nunca Vos tivesse causado desgosto!

Ó Senhor, eu vivi esquecendo-me de Vós, mas Vós não Vos esquecestes de mim; prova-mo a luz que nesta hora me comunicais. Visto me haverdes dado a luz, dai-me também força para Vos ser fiel. Prometo antes morrer mil vezes do que voltar-Vos novamente as costas; mas as minhas esperanças estão em vosso auxílio: In te, Domine, speravi, non confundar in aeternum (5) – “Em Vós, Senhor, esperei, não serei confundido”. – A vós também, ó Maria, minha Soberana, me dirijo: In te, Domina, speravi, non confundar in aeternum – “Em vós, ó Senhora, esperei; não serei nunca confundido”. Ó minha Esperança, em vós confio que nunca tornarei a ser inimigo do vosso Filho. Rogai-lhe que me deixe antes morrer do que entregar-me a esta suprema desgraça. (*II 67.)

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1. Apoc. 17, 14.
2. Is. 40, 15.
3. Is. 40, 17.
4. S. theol. 3, q. 2, c. 2 ad 2.
5. Ps. 30, 1.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 306-309.)

28 de julho de 2013

Imitação de Cristo - Livro 1 Capítulo 7

CAPÍTULO 7

Como se deve fugir à vã esperança e presunção

1. Insensato é quem põe sua esperança nos homens ou nas criaturas. Nào te envergonhes de servir a outrem por Jesus Cristo, e ser tido como pobre neste mundo. Não confies em ti mesmo, mas põe em Deus tua esperança. Faze de tua parte o que puderes, e Deus ajudará tua boa vontade. Não confies em tua ciência, nem na sagacidade de qualquer vivente, mas antes na graça de Deus, que ajuda os humildes e abate os presunçosos.
2. Se tens riquezas, não te glories delas, nem dos amigos, por serem poderosos, senão em Deus, que dá tudo, além de tudo, deseja dar-se a si mesmo. Não te desvaneças com a airosidade ou formosura de teu corpo, que com pequena enfermidade se quebranta e desfigura. Não te orgulhes de tua habilidade ou de teu talento, para que não desagrades a Deus, de quem é todo bem natural que tiveres.
3. Não te reputes melhor que os outros para não seres considerado pior por Deus, que conhece tudo que há no homem. Não te ensoberbeças pelas boas obras, porque os juízos dos homens são muito diferentes dos de Deus, a quem não raro desagrada o que aos homens apraz. Se em ti houver algum bem, pensa que ainda melhores são os outros, para assim te conservares na humildade. Nenhum mal te fará se te julgares inferior a todos; muito, porém, se a qualquer pessoa te preferires. De contínua paz goza o humilde; no coração do soberbo, porém, reinam inveja e iras sem conta.

Sermão 9º Domingo depois de Pentecostes - Padre Daniel Pinheiro - IBP


[Sermão] “O Senhor chorou”. Ou: A virtude da Piedade em Cristo e em nós, e os pecados que mais ofendem a Deus.


Sermão para o Nono Domingo depois de Pentecostes
21 de julho de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
Rezemos para que a presença do Papa no Brasil possa trazer bons frutos.
 “Videns civitatem, Jerusalem, Dominus flevit.” Vendo a cidade – Jerusalém – o Senhor chorou.
O Evangelho deste Domingo nos fala das lágrimas de Nosso Senhor Jesus Cristo. As lágrimas são, antes de tudo, um sinal de tristeza. Mas, devemos nos perguntar, como aquele que é verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus pôde chorar, uma vez que ele tinha a visão beatífica em sua alma? Pois Cristo desde o momento de sua encarnação via Deus face a face, e essa visão impede todo sofrimento. Como pôde, então, aquele que via Deus face a face entristecer-se? Precisamos lembrar que Cristo veio ao mundo para satisfazer por nossos pecados e que satisfez por nossos inúmeros pecados aceitando os sofrimentos – até à morte e morte de cruz – com uma caridade infinita, a fim de nos salvar.  Dessa forma, ele tinha a visão beatífica, Ele via perfeitamente a Deus, como os santos no céu e muito mais perfeitamente que os santos no céu, mas a impassibilidade, quer dizer, a ausência de sofrimento e a imortalidade que decorrem dessa visão face a face de Deus, não se encontravam em Jesus Cristo enquanto ele viveu nessa terra, antes de sua ressurreição. E isso voluntariamente. Cristo via Deus face a face, mas sofreu e quis sofrer para satisfazer perfeitamente por nossos pecados.
Sabendo que Cristo podia chorar, devemos nos interrogar sobre o porquê dessa tristeza profunda de Nosso Senhor no episódio relatado pelo Evangelho. O choro vem da tristeza e a tristeza nos atinge quando vemos algum bem que amamos ameaçado, atacado, destruído. Assim, por exemplo, os parentes choram a perda de um ente querido, manifestando com isso o amor que tinham para com ele. Para compreender, então, porque Nosso Senhor Jesus Cristo chora no Evangelho de hoje, devemos compreender o que ele ama. Ora, Cristo é o abismo de todas as virtudes, isto é, Ele possui e exerce o mais perfeitamente possível todas as virtudes, ou quase todas, pois há virtudes que Cristo não possuía, porque há virtudes que supõem um defeito precedente, como a virtude da penitência supõe um pecado pessoal anterior. E essas virtudes que supõem um defeito anterior, Cristo evidentemente não as possuía, pois Ele é o cordeiro imaculado. Ele sofria com caridade infinita pelos pecados dos outros, mas não pelos seus, pois Ele não os tinha.
Entre todas as virtudes que Cristo possuía e exercia perfeitamente, encontra-se a virtude da piedade. Mas piedade em sentido próprio e não no sentido de devoção ou religiosidade, nem de compaixão ou misericórdia. A virtude da piedade propriamente dita é aquela que nos inclina a render aos pais, à pátria e a todos os que se relacionam com eles a honra e o serviço que lhes são devidos. A justiça nos diz que nos tornamos devedores daqueles que nos deram benefícios. Somos devedores, em primeiro lugar, de Deus, em razão de sua excelência e em razão de todos os bens inumeráveis que nos deu. Além disso, é Ele que nos dá o ser e nos governa. Em segundo lugar, são os pais que nos dão o ser e nos governam. E, finalmente, a pátria, em que nascemos e que nos nutre. E por isso, depois de Deus, o homem é devedor sobretudo dos pais e da pátria, nos diz São Tomás. A primeira dívida é paga com a prática da virtude da religião, pela qual damos a Deus, em união com Nosso Senhor e na medida das limitações de nossa natureza humana, o que lhe é devido. A segunda dívida devida aos pais e à pátria é paga com a prática da virtude da piedade.
Cristo possuía, assim, a virtude da piedade de modo perfeito. Ele amava, então, imensamente a sua pátria e, sobretudo, Jerusalém, o centro de sua pátria. Por isso Cristo chorou, caros católicos. Como Jerusalém recusava o verdadeiro Messias, a verdadeira religião e a salvação, Nosso Senhor chorou, vendo a ruína de tantas e tantas almas que recusaram a sua misericórdia. Toda a destruição material de Jerusalém, profetizada por Cristo e realizada no ano 70, é nada diante da ruína espiritual causada pela cegueira voluntária de Jerusalém. Quantas graças, quantos privilégios dados à cidade santa. E com que ingratidão e infidelidade ela pagou. É o dever dos filhos não só obedecer aos pais em tudo o que é lícito e mostrar o devido respeito, mas também socorrê-los quando esses precisam de ajuda. Nosso Senhor tentou socorrer Jerusalém de todas as formas: orações, ensinamentos, ameaças, milagres, profecias, morte na Cruz. Mas Jerusalém continuou cega e endureceu o seu coração.
Hoje, caros católicos, não há somente uma Jerusalém no mundo, há várias. Quantas nações receberam graça sobre graça, favor sobre favor de Cristo e agora respondem com ingratidão e infidelidade, dizendo: Não queremos que Ele, Jesus Cristo, reine sobre nós (regnare Christum nolumius). Já não queremos suas leis, nem sua Revelação; Revelação, aliás, única verdadeira, pois confirmada por tantos milagres e profecias verdadeiros. E vemos nesses países – que são criaturas de Deus – o jugo doce e suave de Cristo lançado por terra e calcado pelos homens. Consideremos, porém, somente a nossa pátria, que tem se distanciado cada vez mais de Deus, da religião católica, com a aprovação cada vez mais larga, embora sorrateira, do aborto (esse crime que nunca se justifica), com a aprovação de uniões contrárias à natureza, com o laicismo galopante.
Se somos católicos, buscando, então imitar a Cristo, devemos também nós ter e praticar a virtude da piedade para com nossa pátria, caros católicos, porque ela também é princípio de nosso ser, de nossa educação e ela nos governa, fazendo tudo isso enquanto proporciona aos pais – e por meio deles aos filhos – grande quantidade de coisas necessárias e convenientes para o nosso ser. Devemos praticar a virtude da piedade para com nossa pátria como o fez Nosso Senhor Jesus Cristo, obedecendo a ela em tudo o que é bom e socorrendo-a em suas dificuldades, sobretudo espirituais. Devemos, caros católicos, praticar a virtude da piedade buscando que nossa pátria reconheça a verdade e se submeta a ela e possa assim ajudar seus filhos não só materialmente, mas também espiritualmente, mostrando a eles o caminho, a verdade e a vida: Jesus Cristo. Para tanto, devemos rezar por ela, fazer apostolado por ela, nos mortificar por ela. Com esses atos ajudaremos nossa pátria sem cair no excesso de endeusá-la, com um nacionalismo descabido, e sem cair no defeito de rejeitar nossa pátria e dizer como os pagãos: minha pátria é onde me sinto bem. Não, caros católicos! Temos verdadeiro dever de justiça para com a nossa pátria, apesar de seus defeitos.
Mas Jerusalém, que Nosso Senhor Jesus Cristo ama tanto, caros católicos, representa também, e evidentemente, a alma de cada um de nós, agraciada por Deus com inúmeros benefícios, com incontáveis graças e graças abundantes. Recebemos, sobretudo com o batismo, todas as condições para receber Cristo em nossas almas. Nosso Senhor ama, então, cada uma de nossas almas. O amor de Cristo por nós é um amor puro e sobrenatural. É um amor que quer o bem dos homens. Mas não qualquer bem como as riquezas, o reconhecimento, um prazer instantâneo ou qualquer outro bem que se limite a esse mundo. O bem que Nosso Senhor quer é o bem de nossa santificação, de nossa salvação eterna. A tristeza de Nosso senhor vem, então, primeiramente, do fato de muitos desprezarem seus mandamentos e não alcançarem, como consequência, a vida eterna e terminarem perdendo eternamente as suas almas, no inferno. A tristeza de Cristo é causada pelos pecados que impedem a nossa salvação. Cristo chora porque muitas vezes preferimos um instante de satisfação nesse mundo à alegria eterna no céu, ofendendo gravemente as suas leis e crucificando-o novamente.
Assim, Nosso Senhor chora não só sobre Jerusalém, mas sobre as almas. E ele chora sobre as almas quando elas não o amam, quer dizer, quando não cumprem a sua lei. Ele se entristece quando as almas preferem entregar-se ao pecado mortal em vez de se entregarem a Ele.  O pecado mortal, caros católicos, é a transgressão voluntária da lei de Deus em matéria grave. É a negação de Deus como supremo legislador, como soberano governador, como supremo juiz, como supremo benfeitor, como nosso verdadeiro bem e felicidade suprema. O pecado mortal é uma ofensa grave a Deus pela desobediência de suas leis, leis que têm por objetivo o próprio bem do homem e de Deus. O pecado mortal é a recusa total do amor de Deus por nós. O pecado mortal é o inferno em potencial, um potencial que pode virar realidade e muitas vezes vira realidade quando menos esperamos.
A cena histórica e real descrita hoje pelo evangelista é o choro de Nosso Senhor diante de Jerusalém. Estamos pouco antes de sua triunfante entrada nessa mesma cidade no Domingo de Ramos. O povo Judeu vai aclamá-lo como o Filho de Davi, quer dizer, como o Messias. Mas Nosso Senhor chora. Nosso Senhor chora porque, três dias depois, esses mesmos que o aclamaram como o Messias vão pedir a sua crucifixão, recusando a sua lei, a sua graça. Eles louvaram a Cristo com a boca, mas o coração deles estava longe de Deus. Nosso Senhor chora, então, particularmente pelos pecados de nós católicos que o louvamos com a boca, mas que o crucificamos com as nossas obras pecaminosas.
São Paulo, em sua Epístola de hoje, cita alguns dos pecados que mais entristecem a Nosso Senhor. E ele nos dá, então, alguns exemplos que se aplicam de maneira muito especial a nós católicos desses tempos atuais. Tempos em que o amor do homem até o desprezo de Deus tem destruído as mais evidentes verdades católicas.
O primeiro pecado mencionado por São Paulo é a idolatria. A idolatria que nos faz adorar um falso Deus no lugar do verdadeiro. A idolatria de nossos dias é o relativismo, uma espécie de religião acima das religiões. Ele tem como propósito igualar todas as religiões: colocar em pé de igualdade a religião fundada por Cristo – homem-Deus – e as religiões que são fruto da invenção humana ou do pai da mentira.  Ora, religiões que ensinam doutrinas contraditórias não podem ser ambas verdadeiras. Uma só pode ser a verdadeira. Uma só é a verdadeira religião, aquela anunciada pelos profetas e confirmada pelos milagres de Cristo: a religião católica, como já dissemos.
O segundo pecado de que nos fala o Apóstolo é a impureza (ver a esse respeito o sermão sobre a luxúria): quantos hoje, mesmo entre católicos levam uma vida completamente desregrada nesse ponto. Mesmo entre o clero, infelizmente. Quantos perdem o céu por causa de um ato que nos assemelha ao animais irracionais. Quantos pecados cometidos contra a castidade. Muitos cometidos sozinhos. Muitos não esperam o casamento. Aqueles que casam se divorciam e se juntam, em adultério, com outra pessoa. Os casados utilizam métodos anticoncepcionais e assim por diante. Ora, os bens do matrimônio são três: (i) a fidelidade – contra o adultério – (ii) a indissolubilidade – contra o divórcio e o recasamento – e (iii) os filhos – contra a anticoncepção e mentalidade contraceptiva. E um dos bens do sacerdócio é o celibato.
Esses pecados e todos os outros pecados, caros católicos, entristecem a alma de Nosso Senhor. Dominus flevit. O Senhor chorou à vista de Jerusalém que ia cometer o deicídio. Nosso Senhor chorou em previsão de todos os nossos pecados. Foram nossos pecados que crucificaram a Cristo. E nosso crime é ainda maior que o dos judeus, pois professamos e reconhecemos que Cristo é Homem e Deus e veio para nos salvar. Dominus flevit. O Senhor chorou por causa de nossas ofensas. O Senhor chorou porque nos amou profundamente, porque buscou em tudo a nossa salvação, mas nós preferimos o pecado. Quanta ingratidão!
É preciso, então, parar de ofender a Cristo, praticando a religião. Sabemos que hoje, neste mundo que se opõe cada vez mais à virtude, isso não é fácil. Mas Nosso Senhor não prometeu a facilidade, caros católicos. Ele não veio trazer a paz, pelo menos não como o mundo a compreende, mas Ele veio trazer a guerra. Ele deu a cada um uma cruz e junto com essa cruz, Ele deu graças abundantes para carregá-la e uma Mãe para nos ajudar, Nossa Senhora. São Paulo nos diz: Deus não permitirá que sejais tentados além do que podem as vossas forças. Assim, se o combate é difícil, porque o pecado em nossa sociedade é abundante, a graça de Nosso Senhor é superabundante, seu jugo é leve e suave. O Apóstolo afirma hoje, DEUS É FIEL: ele sempre nos dá as graças necessárias. Resta saber se nós somos fiéis às promessas de nosso batismo. Devemos mostrar nossa fidelidade pela submissão de nossa inteligência às verdades reveladas por Deus e pela prática incondicional da moral católica, evitando assim entristecer e ofender ao Sagrado Coração de Nosso Senhor Jesus Cristo. Não basta honrar Deus com os lábios para depois crucificá-lo, como fizeram os Judeus na semana santa. Se Deus é fiel, também nós devemos sê-lo.
Convertamo-nos, então. Tenhamos confiança em Nosso Senhor Jesus Cristo: sem Ele nada podemos fazer. Busquemos a confissão. E se cairmos de novo, levantemo-nos, com verdadeiro arrependimento, e busquemos novamente a confissão. Tenhamos confiança: a misericórdia de Deus é imensa. Alegremos a alma de Cristo, pedindo perdão pelos nossos pecados, comungando com frequência, desagravando – com boas obras – o Coração de Nosso Senhor, ferido por nossos pecados.  Alegremos o Coração de Nosso Senhor e o Imaculado Coração de Maria pela prática da virtude, pela prática sincera e íntegra da religião católica. Ele nos ajudará com suas graças. Alegrando o coração de Cristo também o nosso coração se alegrará profundamente. Como nos diz o Salmista (118,1): “Felizes aqueles cuja vida é pura e seguem a lei do Senhor”. Felizes porque a lei do Senhor é para nosso bem e para a maior glória dEle.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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