28 de julho de 2013

DÉCIMO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES

Inspiração e assistência

Nosso Senhor nos apresenta o contraste impressionante entre o fariseu orgulhoso e o publicano humilde.

O primeiro dá graças a Deus de ser melhor que os demais homens.

O segundo se reconhece como um pobre pecador e suplica a Deus que tenha misericórdia dele.

É a imagem do pecador orgulhoso e do justo humilde.

A Igreja tem por fim conduzir as almas a esta justiça e afastá-las do mal: é a sua missão divina.

Uma tal missão exige uma assistência divina, que não se deve confundir com: inspiração divina.

Já falamos da inspiração divina, dada por Deus aos profetas a aos Apóstolos; vamos agora tratar da assistência divina para melhor compreendermos a diferença entre o regime antigo e o novo, entre os princípios da Igreja e o seu governo atual.

Examinemos separadamente:

1. Em que consiste a inspiração;
2. Em que consiste a assistência.

A inspiração tinha por fim revelar novas verdades; a assistência tem por fim conservar e explicar as verdades reveladas.

I. A Inspiração

A inspiração é uma ação divina sobre a Escritura ou sobre o escritor; em virtude da qual a escritura tem o próprio Deus como autor.

A inspiração não é simplesmente passiva no sentido que Deus inspira ao escritor o desejo de escrever e o assiste para que não escreva erros, sem sugerir-lhe a verdade a escrever; mas ela é positiva, o que quer dizer que Deus inspira o escritor sacro a escrever, o ajuda enquanto escreve e lhe sugere o que deve escrever e como deve escrevê-lo.

Toda Escritura é divinamente inspirada, diz o Apóstolo. (II. Tim. III. 16)

Um simples raciocínio nos fará compreender isso.

Tudo o que deve ser crido de fé divina deve ser revelado por Deus;

Ora, toda a Sagrada Escritura deve ser crida de fé divina.

Logo, tudo nela é revelado por Deus.

Se a inspiração não fosse positiva, de fato, não existiria nenhuma diferença entre a Sagrada Escritura e as decisões da Igreja.

O Papa Leão XIII destacou bem esta verdade fundamental quando escreveu:

“O Espírito Santo, pela sua virtude sobrenatural, excitou e moveu os Escritores Sacros e os assistiu de tal modo, que lhes inspirou a idéia de escrever; estes escreveram exatamente e expressaram com infalível verdade o que Ele ordenou. Se assim não fosse, o Espírito Santo não seria o autor da Sagrada Escritura inteira”. (Encicl.: De studiis scrip. sacr.)

É provável que a inspiração se estenda até aos pormenores e a cada uma das palavras do texto sagrado e não somente aos objetos que dizem respeito a fé ou a moral, como pretendiam os modernistas.

Sendo, pois, a Sagrada Escritura revelada em seus pormenores, e até em cada uma das suas palavras, é claro que nenhum erro pode se encontrar na Bíblia, pois este erro deveria ser atribuído ao inspirador: o próprio Espírito Santo.

O período de inspiração durou 4000 anos, da primeira linha do Gênesis, até a última do Apocalipse.

Todo o Antigo Testamento foi época de inspiração.

O Novo Testamento o foi desde Jesus Cristo até a última frase do Apocalipse.

O vidente de Patmos parece tomar em suas mãos trêmulas de ancião, com perto de 100 anos de idade... de último dos Apóstolos... de último testemunho de Jesus Cristo na terra, os 72 livros inspirados, encerrando a época da inspiração com esta frase sublime a coroar a grande obra divina:

O que da testemunho destas coisas diz: sim, vem depressa: Amém. Vem Senhor Jesus! A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós. Amém. (Ap. XXII, 20, 21)

É a chave de ouro a fechar o ciclo de 4000 anos de inspiração!

Encerrando a época da inspiração, Deus não quis fazer-nos entender que nada mais tem a comunicar-nos.

Deus é infinito; e o homem é incapaz de conter o infinito de Deus. Deus não se esgotou, mas disse tudo o que tinha de dizer, o que quis dizer e o que nos era necessário.

II. A assistência

À dinastia dos inspirados, que ensinaram aos homens verdades novas, ainda não reveladas, sucede a dinastia dos Assistidos, que nada ensinam de novo, mas que guardam o que foi ensinado.

Esta dinastia é a dos Papas de Roma; centro vivo da Igreja Católica.

Quando Jesus Cristo disse aos Apóstolos: Ide, ensinai a todos os povos, ensinando-os a observar as coisas que vos mandei; (Matheus XXVIII, 19), Ele lhes comunicou nesta ordem a inspiração e a assistência.

A inspiração refere-se à sua pessoa de Apóstolos, é um privilégio pessoal, que os faz, a cada um em particular, infalíveis na revelação da doutrina. Esta inspiração, porém, limitou-se a eles e não foi transmitida a seus sucessores, os Bispos.

Nenhum dos Bispos, nem o próprio Papa, goza da inspiração divina. O que a Igreja recebeu e herdou dos Apóstolos é a assistência divina; é por isso que Jesus Cristo completou a ordem de ensinar com estas palavras: Eis que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos. É a assistência necessária para interpretar, explicar e aplicar o depósito da verdade divina.

A verdade não é um diamante que se esconde: é uma luz que deve iluminar.

Vós sois a luz do mundo!

Sendo a luz das inteligências, a verdade deve penetrar estas inteligências, para o que, duas coisas são necessárias: compreender e interpretar a palavra divina.

Compreender; pois toda Escritura tem necessariamente as suas obscuridades.

Por mais claro e metódico que seja um escritor, ele não é compreendido por todos os seus leitores, pela razão muito simples que o leitor devia estar no mesmo nível intelectual que o escritor para compreender toda a extensão de seu pensamento; sendo-lhe inferior, haverá necessariamente coisas que o escritor compreende bem, procura fazer compreender bem, mas que o leitor não entende.

Uma perfeita compreensão entre escritor e leitor, supõe uma igualdade intelectual.

Ora, a Sagrada Escritura é a palavra da inteligência divina, que supera infinitamente a inteligência humana.

Logo, há e deve haver obscuridades na Sagrada Escritura: não na palavra divina como tal, mas na inteligência do homem.

É o que fez dizer a São Pedro, falando das Epistolas de São Paulo: Há algumas coisas difíceis de entender que os indoutos, inconstantes adulteram, para a sua própria perdição. (2 Pet. III. 16)

A Igreja, encarregada de conservar e interpretar a palavra divina deve, pois, compreendê-la perfeitamente, infalivelmente, e para isso ela precisa da assistência divina: Eis que estou convosco até a consumação dos séculos.

III. Conclusão

Compreendemos agora a distinção tão simples e tão fecunda entre: inspiração e assistência. A confusão destes dois termos é a base das objeções que os protestantes formulam contra a infalibilidade do Papa.

Julgam que o Papa, que a Sagrada Escritura, a tradição e a razão proclamam infalível, é um homem inspirado por Deus, quando é apenas um homem assistido por Deus.

Cada protestante diz-se assistido por Deus na interpretação da Bíblia; só o Papa não o é: Vê-se logo o absurdo da asserção.

Esta distinção nos prepara ao estudo da infalibilidade e nos dá, desde já, a solução do problema.

O plano divino é admirável e lógico. S. João ao terminar o Apocalipse indica claramente o papel da Igreja na interpretação da Sagrada Escritura.

Eu protesto, diz ele, a todos os que virem as palavras da profecia deste livro, que se alguém lhes juntar alguma coisa, Deus o castigará com as pragas escritas neste livro." (Apocalipse, XXII. 18).

Vê-se claramente que nada de novo pode ser introduzido: a inspiração está encerrada; o que se deve fazer agora é guardar, interpretar e aplicar a palavra divina pela, assistência do Espírito Santo. S. João diz à Igreja: Guardai este depósito - depositum custodi - Jesus acrescenta: Eu estou convosco até a consumação dos séculos. Eu confio a minha doutrina a Pedro... e tu, Pedro, confirma os teus irmãos na fé, na doutrina, na virtude.

EXEMPLO

A perpetuidade da Igreja

O destino das dinastias humanas é nascer, desabrochar e murchar. Filhas do trabalho que são, elas vivem um momento e tombam para sempre no pó.

Para assegurar a sua duração, cercam-nas de garantias, decretam leis de hereditariedade dos tronos, prevêem minoridades e regências... Aqui, consagram os monarcas; acolá, chamam-se as nações a ratificarem num escrutínio universal a fundação de um Império; e todos aplaudem-se de terem feito uma obra imortal... e eis que o tempo a derruba de repente, quando menos o pensam.

Mas há uma dinastia de Príncipes eletivos, cujo número está em 263, e que, ela só, conta mais membros do que todas as dinastias reunidas que hoje reinam no mundo inteiro.

Esta dinastia despreza o exílio, pois todos os Papas voltam para Roma, mortos ou vivos!

Esta dinastia despreza a morte, pois o Papa morrendo, tem a certeza de ter o seu sucessor!

Esta dinastia resiste às vicissitudes, pois ela dura tanto que o tempo, e se o tempo perdurasse ainda séculos e séculos, o último Papa seria, tão bem que o segundo, e com cem mil anos de intervalo, o Sucessor certo, legitimo e reconhecido de São Pedro!

Um dia a Cúpula do Kremlin ruirá, as torres de Notre Dame abismar-se-ão na voragem, o pescador do Tamisa amarrará a sua barca a qualquer arco, ao pé das ruínas de São Paulo...

De todas as catedrais do mundo, somente São Pedro de Roma ainda ficará em pé, Roma será ainda do Papa! O Papa, o único sobrevivente a todas as dinastias de hoje estará ainda em Roma.

Os Bossuet destes tempos remotos dirão como o do século de Luiz, o grande: “Ó Santa Igreja Romana, se eu me esquecer de ti, apegue-se a minha língua à boca; paralise-se a minha destra, se tu não fores o objeto dominante de meus pensamentos e o centro das minhas afeições!” '

Ignoro quais serão os povos que dominarão então o mundo; quaisquer que sejam porém, os seus interesses políticos, a sua língua, a cor e os traços da sua raça, afirmo que sempre haverá entre eles um interesse comum, um amor comum: o amor à Sede apostólica, à língua da Igreja!

Uns segundos serão suficientes à telegrafia aperfeiçoada para levar a todos os recantos do universo as bênçãos do Pai comum de todos os fiéis e para trazer a este Pai comum os agradecimentos de todos os fiéis!

E, quando na solenidade da Páscoa ou da Ascensão, o Pontífice destes séculos futuros estender os dois braços sobre o seu rebanho inteiro, espargindo a palavra além dos mares e dos oceanos, nas igrejas onde a centelha elétrica fizer tremular, ao mesmo tempo, o mesmo nome e a mesma prece de todas as igrejas abençoadas pela mesma mão, levantar-se-à para Roma, para Pedro, uma torrente de ação de graças, em que se ouvirão, através das diversidades dos idiomas, estas palavras do Concilio de Nicéia: Credo in unam Catholicam et Apostolicam Ecclesiam. (Mons. Besson)

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(MARIA, P. Júlio. Comentário Apologético do Evangelho Dominical. O Lutador, 1940, p. 288 – 295)

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