CAPÍTULO XII
A CONTRA-REFORMA
Lutero desceu à sepultura, depois de uma morte atribulada e cheia de remorsos. Dele, como de Judas, pode-se repetir a palavra de Jesus Cristo: "Bonum erat ei natus non fuisset" - Melhor fora, para ele, se não tivesse nascido (Mat. 26,24).
Sua vida, tão triste e tão baixa, foi como que a luta titânica do inferno contra o rochedo indestrutível de Pedro.
Lutero caiu... vencido... como Juliano, o apóstata... e, como ele, talvez murmurando: Pedro, venceste, como o imperador gritara: Venceste, Nazareno!
Sim, Roma, a indestrutível, venceu... como sempre ela tem saído vitoriosa... e, enquanto em Wittemberg confiavam à terra os restos mortais do reformador já em putrefação, o Papado, cheio
de vida e de glória, levantava a fronte, e com aquela mão que a morte não consegue abater, construiu o maior e o mais belo monumento da vida cristã: O GRANDE CONCÍLIO DE TRENTO.
Não podemos silenciar esta reação católica, em nome da fé e da verdade, a qual se pode denominar: contra-reforma.
1. O CONCÍLIO DE TRENTO
Conforme vimos no desenvolvimento das peripécias da ignóbil existência do monge revoltoso, desde o princípio levantaram-se vozes pedindo um CONCÍLIO GERAL, julgando deveras oportuno, para resolver as contendas e restabelecer a unidade da fé, que se tentava esfacelar.
Grandes dificuldades, porém, se opuseram à realização projetada.
O Papa Paulo III considerava reunião conciliar como a principal missão de seu Pontificado; mas os tempos agitados, a desunião entre as autoridades, as agitações e revoltas contínuas dos protestantes não lhe permitiram realizar tão justa aspiração.
As cidades de Mântua e Vicência haviam sido indicadas para centro de reunião, que ali não se efetuou; só em 1542 é que se tornou possível a escolha da cidade de Trento, também sem resultado; deste modo a convocação definitiva ficou para 1545, ano em que Lutero começou a sentir os primeiros abalos de saúde.
Foram celebradas as primeiras sessões no Advento deste mesmo ano, com um reduzido número de assistentes.
Tudo se empenhou para fazer desta assembléia uma das mais importantes da história da Igreja: cinco Papas dirigiram sucessivamente os trabalhos do Concílio em circunstâncias excepcionalmente graves.
Os assuntos tratados, as decisões tomadas, servem até hoje de norma à sociedade cristã.
O Concílio foi duas vezes interrompido, primeiramente devida à agitação dos tempos, e depois por causa das lutas entre a França e a Alemanha.
O Concílio constou de 25 sessões, a que assistiram mais de 200 cardeais, Arcebispos e Bispos, 7 Superiores Gerais de Ordens, e grande número de representante de Bispos ausentes por graves razões.
Os chefes protestantes, convidados à reunião, recusaram-se a comparecer.
Seis doutores da reforma falsificaram, mais tarde, os atos conciliares em sua chamadas centúrias de Magdeburgo.
Cantu escreve com razão, a respeito da reunião de Trento: “Nunca monumento mais majestoso foi construído por uma assembléia mais augusta, tendo por base o ensino tradicional e a disciplina antiga. Erro algum foi poupado nestes decretos de fé, formulados com tal clareza, que excluem qualquer equívoco e feitos com tanto rigor que não admitem subterfúgios”.
Não há melhoramento fecundo quer não tenha sido incluído neste cânones e decretais, tão bem concebidos que se dobram admiravelmente às necessidades do tempo, adaptando-se às transformações sociais.
O Concílio ocupou-se simultaneamente do dogma e da moral, ou da doutrina e da reforma, publicando deste modo decretos dogmáticos e decretos disciplinadores, preparados por comissões particulares, discutidos depois em reuniões públicas e logo votados individualmente.
O Concílio de Trento foi o tiro mortal ao protestantismo que, desde então, não passa de um defunto ambulante, forçado a agarrar-se, desesperadamente, às autoridades civis para não cair em putrefação imediata.
Em vez de refutar, um por um, os erros de Lutero, será o bastante citarmos as diversas decisões tridentinas, para conhecer as objeções protestante e a resposta clara e insofismável, ditada pelos padres e publicada no catecismo então organizado, que é talvez o código mais teológico, mais simples e mais claro até hoje publicado sobre os assunto em discussão.
Podem reduzir-se a nove os decretos daquela assembléia, restabelecendo a verdade atacada, contra os erros introduzidos pela deforma do apóstata de Wittemberg.
2. SAGRADA ESCRITURA E TRADIÇÃO
O ponto central do protestantismo, o princípio que o levaria a todos os piores abusos, era o LIVRE EXAME da Sagrada Escritura.
Todo podem ser Papas, todos são inspirados pelo Espírito Santo, afora o Papa, tal era a grande regra de Lutero. Ora, com tal princípio não havia erro algum no mundo que não pudesse agasalhar-se nas páginas do livro Santo.
Urgia, pois, restabelecer a verdade e determinar claramente a única verdadeira maneira de interpretar a Bíblia.
O Concílio começou, pois, por fixar o cânon do catálogo dos livros inspirados, estabelecendo a Regra de interpretação.
Assim reza o primeiro decreto:“O Santo Concílio de Trento, ecumênico e geral, legitimamente reunido sob a direção do Espírito Santo, considerando que as verdade de fé e as regras de costumes estão contidas no livros escritos, ou quando não escritos, se acham nas tradições recebidas pelos Apóstolos da boca do próprio Jesus Cristo, ou transmitidas, pelo apóstolos, como o Espírito Santo as havia ditado, chegando de mão em mão até nós, recebe de acordo com o exemplo dos padres ortodoxos, todos os livros quer do Antigo, que do Novo Testamento, assim como as tradições que dizem respeito à fé e aos costumes conservados por uma sucessão ininterrupta, e os abraça com igual sentido de respeito e piedade”
Todos os livros da VULGATA foram depois proclamados autênticos, e aprovada a edição revista da Vulgata, como fazendo autoridade nas discussões e preleções públicas.
Condenando a LIVRO INTERPRETAÇÃO da Bíblia, o Concílio estatui expressamente, sob pena de anátema; “Ninguém, por confiança cega, tenha a ousadia de desviar a Escritura Sagrada para o seu sentido particular nem de achar um interpretação oposta à da Santa Igreja à qual assiste o direito exclusivo de interpretar a verdadeira significação das Escrituras, conforme ao sentimento unânime dos Padres” (Sessão IV).
3. O PECADO ORIGINAL
Na teoria protestante, o pecado original estragou completamente a nossa natureza; daí o duplo e monstruoso absurdo: “Não há mais em nós livre arbítrio e todas as nossas obras são más; inútil, portanto, esforçarmos-nos por praticar ações boas”.
O Concílio enuncia com clareza a verdade católica: “Transgredindo a lei de Deus, Adão perdeu a santidade e a justiça, em que fora criado; atraiu sobre si a ira de Deus, tornou-se escravo do demônio e sujeito à morte.
O primeiro homem, porém, não prejudicou somente a si próprio; transmitiu à sua posteridade o pecado, que é ruína da alma, e, com o pecado, a dor e a morte. Este pecado não pode ser apagado só pelas forças da natureza, mas pelos méritos de Jesus Cristo, o único Medianeiro, que nos reconciliou com Deus por seu sangue; estes méritos de Jesus Cristo são aplicados, tanto aos adultos como às crianças, pelo Sacramento do Batismo.
O Batismo é necessário a todos, segundo a palavra do Nosso Senhor. Pela graça do Batismo, a mácula do pecado original é verdadeiramente perdoada e apagada.
O Concílio reconhece, todavia, e confessa que a concupiscências permanece naqueles que foram batizados, neles ficando como um antagonista contra o qual tem de lutar, sem jamais saírem prejudicados os que lhe resistem valentemente com a fraca de N. S. Jesus Cristo” (Sessão V).
O Concílio exprimiu terminantemente não incluir neste decreto, de modo algum, a Virgem Maria, Mãe de Deus.
4. A JUSTIFICAÇÃO
A opinião de Lutero era que o homem é justificado unicamente PELA FÉ em Jesus Cristo;Calvino pretendia que o homem assim santificado se torna impecável e não pode mais perder a graça.
O Concílio nos descobriu a plena luz da verdade. Admitiu a fé como raiz, fonte e algo imprescindível para a justificação, mas não como CONDIÇÃO ÚNICA, pois é preciso ainda observar os mandamentos e praticar boas obras. Com a prática destes últimos, a graça cresce e, contrariamente à doutrina protestante, perde-se pelo pecado; longe, portanto, de termos essa confiança imperturbável da nossa salvação,não podemos, enquanto dura esta vida mortal, presumir da nossa predestinação para a salvação eterna, pois ninguém tem certeza de sua salvação final.
Verdade é, que perdida a graça santificante, pode o homem reavê-la pelo sacramento da penitência, que é a segunda tábua salvadora depois do naufrágio; mas para isso se necessita da contrição, da confissão sacramental, quando possível, e da satisfação.
Enfim, a justiça alcançada, ou recuperada, pode e deve ser aumentada pela oração, pela mortificação, pelo cumprimento da lei de Deus e dos preceito do Evangelho. Deus não nos pede o impossível, e seu socorro é certo para quem o implora humilde e confiadamente (Sessão VI).
5. SACRAMENTOS EM GERAL.
Anteriormente lha o Papa Eugênio IV exposto de maneira admirável a doutrina sobre os sacramentos, em seu Decreto aos Armênios.
Não julgou o Concílio necessário repetir esta explicação, limitando-se a indicar o número deles, sua instituição divina, sua virtude santificante e sua eficácia, independente da santidade do ministro.
A respeito do Batismo, os anabatistas exigiam a sua renovação para os adultos, sob pretexto de não será criança capaz de produzir um ato de fé; por outra parte, Lutero, franqueando as portas mais largas aos apóstatas que desertavam dos conventos, tinha declarado que apenas as promessas do batismo eram obrigatórias e anulavam todos os demais votos, mesmo ulteriores.
A confirmação ficou sendo, como sempre fora, verdadeiro sacramento da nova lei e os bispos seu ministro ordinário (Sessão VII).
Os outros sacramentos, combatidos mais violentamente pelas doutrinas protestantes, foram objeto de estudo mais apurado e de definições mais extensas.
6. A EUCARISTIA
A reforma apresentava uma balbúrdia inexplicável a respeito do Santíssimo Sacramento do Altar.
O Concílio com uma perspicácia e segurança, onde era sensível o sopro do Espírito Santo, firmou que precisão a verdade opugnada.
Em primeiro lutgar afirmou solenemente a PRESENÇA REAL: - “Depois da consagração do pão e do vinho, Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, é contido, verdadeira, real e substancialmente, sob as aparências destas coisas sensíveis, segundo as próprias palavras de Jesus Cristo, referidas no Santo Evangelho.
Jesus Cristo está debaixo da espécie do pão, e, debaixo de cada uma das suas partes, não somente no momento da Comunhão, mas de modo permanente”.
Lutero acreditava na presença real, mas não na transformação das espécies.
O Concílio lhe opôs a fé católica: “Pela consagração faz-se uma conversão de toda a substância do pão na substância do corpo de Nosso Senhor; e de toda substância do vinho no seu sangue; e esta mudança é chamada pelo Igreja Católica: TRANSUBSTANCIAÇÃO.
Os Santos Padres declararam em seguida que é uso multo piedoso tributar à divina Eucaristia um culto solene, o cullo de adoração, pois Jesus Cristo é Deus, como o é o Pai. (Sessão XIII).
O Concílio manteve a doutrina que estatui não ser a Comunhão sob as duas espécies necessária para os simples fiéis; afirmou que tem traves e plausíveis motivos para dar a comunhão somente debaixo da espécie de pão, que o cristão recebe assim a Jesus Cristo inteiro, e as crianças, até a idade de díscreção, nenhuma obrigação tem de comungar, (sess. XXI).
Quanta ao santo sacrifício da Missa, o Concilio lembrou a sua instituição divina por Nosso Senhor, na véspera de sua morte.
A Missa é um verdadeiro sacrifício; é propiciatório, tanto para os vivos como para os mortos.
É oferecido unicamente a Deus, por ser o ato de adoração por excelência; mas se faz nele memória dos santos, para agradecer a Deus pelas graças que Ele lhes concedeu e assim merecer o valioso socorro da sua intercessão junto ao Todo-Poderoso.
As orações da Missa foram criteriosamente determinadas, para estimular a piedade dos fiéis. Todas as cerimónias foram estabelecidas para o mesmo fim.
Enfim, as missas particulares, em que só o sacerdote comunga, não são, como ensinava Lutero, uma superstição Inspirada pelo demónio; são um verdadeiro sacrifício agradável a Deus; o povo nelas comunga espiritualmente.
O uso antigo de não rezar a Missa em língua vulgar deve ser conservado, a fim de melhor simbolliar a unidade da fé, pela unidade da linguagem e de Culto, (sess. XXII)
7. PENITÊNCIA E EXTREMA-UNÇÃO
A Penitência ou Confissão é um dos sacramentos contra o qual Lutero investiu com maior furor.
Convinha, pois, que o Concilio legislasse com toda precisão neste particular tão visado pelas iras do reformador.
"Em todo tempo, diz o Concilio, a Penitência tem sido necessária para alcançar o perdão dos pecados.
Jesus Cristo instituiu o sacramento da penitência, quando disse aos seus apóstolos: Recebei o Espírito Santo, os pecados serão perdoados a quem os perdoardos...
Todavia, não é possível chegar-se ao perdão da penitência senão pelas obras penosas; por isso, é quese denomina este sacramento batismo laborioso.
A forma do sacramento consiste nas palavras da absolvição; os atos do pecador, a contrição, a confissão e a satisfação constituem como que a matéria.
A confissão é de instituição divina, pois o sacerdote, sendo, então, juiz, não pode perdoar os pecados sem os conhecer, para o que dee o culpado declará-los. Na confissão devem ser acusados todos os pecados mortais, com seu número, quando possível, e com as circunstâncias que mudam a espécie.
A confissão auricular e secreta, praticada na Igreja, funda-se sobre a instituição divina e não é invenção humana.
O Concilio de Latrão determinou apenas a sua obrigação anual. O padre, para dar validade à absolvição, deve ter recebido do bispo um poder judicial.
Quanto a satisfação, é esta indispensável para o perdão. Cumpre reparar a injúria feita a Deus; por isso, o sacerdote impõe uma penitência sacramental, à qual se devem acrescentar obras de penitência.
A Extrema-Unção foi considerada pelos Padres como o suplemento da penitência.
O Concílio manteve contra o protestantismo a instituição divina deste sacramento, promulgado por S. Tiago, e cujos resultados, para o alivio espiritual e corporal dos doentes, o apóstolo descreveu tão claramente.
Os fiéis não podem, portanto, menosprezar, sem cometer pecado, um auxilio tão valioso", (sess. XIV).
8. ORDEM E MATRIMÓNIO
Lutero e Calvino, principalmente, tinham rejeitado a Ordem como sacramento; consideravam-na como um rito que institui os ministros da palavra e dos sacramentos; para os protestantes não há hierarquia; todos os cristãos são igualmente sacerdotes, e, para o exercício de suas funções, basta tenham a eleição do magistrado e o beneplácito do povo. Os bispos não são superiores aos simples padres.
Contra todas estas negações o concilio levantou a voz e restabeleceu a verdade sempre vigente na Igreja.
"O sacrifício e o sacerdote são tão intimamente ligados que um não poderia existir sem o outro. Porquanto Nosso Senhor, que estabeleceu o sacrifício da Missa, fundou da mesma forma o sacerdócio católico; fez dele um sacramento verdadeiro para o qual o futuro padre vai se chegando pelas ordens, que são em número de sete: as inferiores de ostiário, leitor, exorcista, acólito, e as ordens maiores: subdiaconato, diaconato e presbiterato, que se encontram desde os primeiros tempos da Igreja".
Contra as negações de Lutero e a sua aversão ao Papa, o concílio afirmou a existência de uma hierarquia, constando de bispos, sacerdotes e ministros inferiores; a superioridade dos bispos sobre os padres o seu poder exclusivo de administrar a confirmação e a ordem, sem intervenção do povo.
A primazia do Papa fora solenemente proclamada no concílio de Florença; era um fato já definido que não pedia novo exame. (sess. XXIII).
* * *
Quanto ao Matrimónio, Lutero o reduzira a um simples compromisso civil; não trepidara perante a poligamia e o divórcio, chegando a escandalizar seus próprios discípulos.
O concilio restabeleceu a verdade, nestes termos: "A perpetuidade e a indissolubilidade do matrimónio, diz ele, nos são reveladas desde a origem do gênero humano. Nosso Senhor lembrou a sua unidade e indissolubilidade primitivas, não consentindo que o homem separasse o que Deus unira, e fez dele um sacramento, enriquecendo-o com sua graça".
Depois o Concilio publicou os anátemas que condenam a poligamia e o divórcio; vingou o celibato voluntário e a virgindade; conservou para a Igreja Católica o direito de apontar impedimentos, e o de conhecer as causas matrimoniais e julgá-las. (sess. XXIV).
9. PURGATÓRIO E INDULGÊNCIAS
Já nos são bem conhecidos os ataques de Lutero contra as indulgências, o purgatório e a utilidade da oração pelos mortos.
Convinha que o Concílio confirmasse a doutrina católica e precisasse os pontos combatidos. É o que foi feito com esmero.
"A Igreja, instruída pelo Espírito Santo, reza o concílio, sempre ensinou, segundo as Sagradas Escrituras e a Tradição antiga dos Santos Padres, que há um purgatório, e as almas, nele detidas, podem receber alívio pelos sufrágios dos fiéis, e principalmente pelo Sacrifício do Altar”.
O Concílio insta que os bispos zelem pelo ensino desta doutrina, e encareçam diante dos fiéis as piedosas orações pelos mortos, o Sacrifício da Missa, as esmolas e mais obras pias. (sess. XXV).
Quanto às indulgências, o Concílio ensinou e preceituou "que se deve conservar, na Igreja, o uso das indulgências, muito proveitosas para o povo cristão, e aprovadas pela autoridade dos santos concílios".
Feriu com anátema todos aqueles que dizem serem elas inúteis, ou negam à Igreja o poder de concedê-las. (Ibid.)
10. O CULTO DOS SANTOS
Os reformadores, como os antigos iconoclastas, haviam combatido e rejeitado a invocação dos santos, o culto em honra da Mãe de Deus, a veneração das relíquias e imagens.
O Concílio rebateu as blasfêmias ímpias e restabeleceu a verdade e as práticas da tradição da Igreja.
"Os santos, que reinam com Jesus Cristo, apresentam a Deus suas orações pelos homens.
É bom e proveitoso invocá-los humildemente; e é uma impiedade acusar de idolatria um culto tão razoável, firmado nos costumes tradicionais, o qual não prejudica de modo algum a mediação do Salvador.
"Quanto às relíquias dos santos, os fiéis lhes devem respeito e veneração, porque são restos dos corpos que foram os membros vivos do Espírito Santo, e hão de resurgir um dia para a vida eterna.
Além disso, é preciso ter e conservar, especialmente nas igrejas, imagens de Jesus Cristo, da Virgem Mãe de Deus e dos outros santos, e tributar-lhes a honra e a veneração que lhes são devidas; não porque acreditemos nelas residir a divindade, ou uma virtude merecedora do nosso culto, ou porque lhes devamos pedir graças, ou pôr nelas a nossa confiança, conforme faziam os pagãos, cuja esperança estava nos ídolos, mas porque a honra que se lhes tribuía, refere-se aos protótipos que representam, segundo foi definido pelos concílios, e particularmente pelo segundo concilio de Nicéia, contra os iconoclastas, (sess. XXV).
11. DECRETOS DISCIPLINARES
O Concílio perseguia, de maneira clara e precisa, as diversas heresias de Lutero, assestando contra ela o golpe efe morte.
Os católicos hesitantes e os protestantes sinceros, enganados um instante pelas aparências do erro, podiam como que apalpar as heresias, os erros e as destruições acumuladas desde a primeira tentativa de rebeldia.
Nenhuma declaração nova partiu do conclave, mas foi ali repetido e popularizado o ensino sempre aceito no catolicismo.
A doutrina verdadeira, em consequência do choque contra as heresias, firmou-se mais; as expressões ficaram mais populares, e a fé inabalável da Igreja Católica reluziu com maior resplendor no meio da escuridão do protestantismo.
Enquanto Lutero havia engrossado as trevas, ao mesmo tempo que seus discípulos continuavam a semear a dúvida e a balbúrdia, a Igreja católica levantava-se bela e radiante, semeando ondas efe luz no mundo e nas almas, pela clareza e firmeza de sua doutrina imortal, que nunca mudou e não mudará, porque é a expressão da palavra divina.
Não parou aí, porém, a obra de reforma encetada pelo Concílio. Ao lado da exposição luminosa da doutrina, ocupou-se da disciplina da Igreja, estatuindo leis sábias e oportunas. Sem resumir as suas diretrizes, é suficiente lembrarmo-nos versarem especialmente sobre disciplina e costumes clericais, eleição de párocos, nomeação e escolha da bispos, disposições a respeito da simonia, pluralidade de benefícios e de sua hereditariedade.
Os sínodos provinciais entram novamente em vigor; as visitas episcopais recomeçam; as ordens religiosas de homens e as de mulheres têm de regressar à estrita observância de suas regras no tocante a clausura, à escolha dos superiores, às dispensas, â perfeição de seu estado, etc.
Para a santificação do povo católico, todos os abusos são apontados pelo conclave, pondo-se um freio à luxúria, a avareza e aos vícios dos príncipes e dos súditos.
Três providências admiráveis e eficazes foram tomadas para a direção geral da religião: a fundação de seminários para a formação do clero; a instituição do “Index” para o exame e condenação dos maus livros; e a redação do catecismo do concílio de Trento, modelo dos nossos catecismos atuais; enfim, a revisão e a unificação da liturgia romana: Missal e Breviário, a serem adotados em toda a Igreja.
12. CONCLUSÃO
Eis como do mal Deus sabe tirar o bem.
Permitiu Ele que Lutero, numa fúria que tornou evidente a obra do inferno, se batesse contra todos os dogmas e práticas da Igreja Católica, para que esta, como que por um instante abafada sob as ondas de poeira levantadas no mundo pela indiferença, pelo relaxamento dos costumes, pelo comodismo e a desunião, surgisse mais bela e fulgurante, dominando as paixões humanas.
Fato averiguado pela experiência é que a religião de Jesus Cristo progride mais nas perseguições, lutas, calúnias, e até no martírio cruento, do que na paz e no progresso material dos povos.
As paixões não dormem, como não descansa o demônio; por isso, quando o cristão quer cruzar os braços para descansar, depressa se torna um vencido.
Parece que a Igreja do século XVI estava adormecida... e, para acordá-la, o Altissimo não impediu a ação de Lutero, embora Ele não pudesse permitir fosse a Igreja derrotada.
Lutero passou pelo mundo como um meteoro de fogo, abatendo, destruindo tudo... e, no meio desta fúria iconoclasta, a morte o fez estacar, lançando-o na profundeza de um túmulo, desonrado pela sua vida e pela sua morte.
Simultaneamente Deus acendeu um farol poderoso para iluminar o mundo; foi o Concilio de Trento, e sob a sua irradiação fez surgir uma legião de santos para regenerar as almas e reconduzi-las ao único rebanho do Bom Pastor, de Pedro, de Jesus Cristo, como veremos pormenorizadamente, após examinarmos a vida dos santos desta época.
A pretensão de Lutero degenerou em deforma, pois desuniu e implantou nas almas a dúvida donde deveria nascer o ateísmo que hoje avassala a nossa época.
Mas a Igreja eterna de Cristo levantou-se também, para efetuar a contra-reforma, restabelecendo a verdade e ditando novas leis para a direção verdadeira do mundo.