22 de janeiro de 2014

O Diabo, Lutero e o Protestantismo - Pe. Júlio Maria - Capítulo 11

CAPÍTULO XI

ÚLTIMOS DIAS E MORTE DE LUTERO
Atingimos ao fim desta vida tão agitada. Os anos e as moléstias foram aos poucos lhe abalando a saúde; hábitos torpes e animalescos estavam de há muito estragando o seu rude organismo.
No entanto, se o corpo se lhe depauperava, o espírito ainda estava lúcido e a chama do ódio, “mola-mestra” da sua ação, não decaíra de intensidade.
Ele reage contra todas as inquietações e leva para frente a sua obra de demolição, até que a morte o prostre e o torne conhecido para sempre, diante das gerações futuras, como heresiarca do século dezesseis, o triste sucessor daqueles que, através dos tempos, perturbaram a Igreja católica pelas mais variadas cisões, e cuja memória é a expressão do ódio e do vício: Ário, Pelágio, Nestório, Eutíquio, Maomé, Fócio e o pai do protestantismo.
Sigamos Lutero nos seus últimos dias de vida.

1. O HOMEM TERRÍVEL
Aos seus seguidores Lutero queria deixar o seu testamento de ódio contra o Suma pontífice. Cameçous, mas não o levou a termo, pois a moléstia, viagens urgentes e, afinal, a morte, não lhe deixaram o tempo necessário para completar esta obra, a última prova de seus desvarios espirituais.
A ardência do ódio, em vez de arrefecer perante as ameaças da morte, parecia tornar-se mais violenta, tentando envolver todos quantos discordassem de sua orientação.
Os teólogos da Universidade de Lovaina tiveram a inaudita coragem de refutar, em 32 artigos, os principais erros do inovador. Lutero viu nisto um crime imperdoável e disse: “Estou furioso contra estes quadrúpedes de Lovaina, que pretendem ensinar, a mim, um velho e tão insigne teólogo; quero dar uma lição a estes monstros de satanás, mesmo que isso me custe o último suspiro”.
E, de fato, a resposta não se fez esperar; apareceu grosseira, orgulhosa, em 76 teses, com este título: “CONTA OS TEÓLOGO DE LOVAINA”. “Tais teses”, diz Kohler, “são mais insultuosas que instrutivas”, e deixam entrever o declive da inteligência de seu autor.
“O homem terrível”, como o chama Melanchton em uma carta a Camerário, “com seus ataques violentos, não suporta a mínima oposição; enerva-se, insulta, esbraveja como um endemoninhado.
Oh, se pelo menos Lutero se calasse, continua Melanchton, “mas não há jeito. Eu esperava que a velhice e a experiência dos erros cometidos lhe abrandassem o gênio, porém acontece o contrário, ele se torna cada vez mais violento na luta e na oposição” (Corresp. Ref. I. p. 794).
Pouco depois os teólogos da Universidade de Paris levantaram também a voz, para combater as doutrinas errôneas do reformador.
Nova lute ia suceder à primeira; Lutero se esforçou para responder, mas chegou apenas a escrever a epígrafe do escrito e curtas observações. A moléstia lhe fez cair a pena das mãos.
O título do novo pasquim, que não foi feito, é sugestivo e nos permite avaliar o estado de nervosidade do autor: “CONTRA OS ASNOS DE PARIS E LOVAINA”
O reformador sente-se abatido, neurastênico, irritado contra si e contra os outros: “Tenho nojo dos homens”, exclamou ele um dia, “e o mundo tem nojo de mim”.
“Ninguém é capaz de imaginar, dizia ainda, quanto custa e que suplício é, para um homem, persuadir a crer numa doutrina que os Padres da Igreja não admitem. Que agitações em seus corações ao pensar que tantos homens excelentes, esclarecido, doutos e, por assim dizer, a maior
e melhor parte do mundo cristão, acreditaram e ensinaram tal e tal artigo, e com eles tantas almas sadias: os Ambrósios, os Jerônimos, os Agostinhos!
Parece-me ouvi-los, em grito de angústia, repetir em coro: A Igreja! A Igreja!...
E a alma se me confrange em dor suprema. Oh,na verdade é uma prova rude separar-se alguém de tantos personagens santos!... romper com a própria Igreja, e não ter mais fé e confiança nos próprios ensinamentos”.
Ele escreve alhures: “Enche-me de espanto não ter plena confiança em minha doutrina. Por causa dela tornei-me inimigo de mim mesmo, enquanto os meus discípulos pensam sabê-lo na ponta do dedo”.
Tais eram os pensamentos íntimos de Lutero, nas horas de calma e de reflexão. Logo, porém, voltava ao estado anterior.
Punha-o sobretudo em desespero a visão do mal cada vez maior, que penetrava na sociedade.
“O mundo está repleto de satã e de homens satânicos”, escreve ele em carta íntima.
“O negócio irá mal, quando eu não estiver mais aqui. Mais de um „mane, tecel‟ está gravado nas paredes da reforma. Examinados, um por um, os meus auxiliares, não encontro nenhum merecedor de confiança”

2. DESGOSTOS E REMORSOS
Externando os seus desgostos e remorsos, ele escreve a cada instante, no fim de sua vida: “O mundo piora todos os dias e mais malvado fica. Os homens estão hoje mais açulados às vinganças, mais avarentos, mais sem misericórdia, menos modestos, mais incorrigíveis e piores do que no papismo. Quanto é escandaloso ver-se, depois do advento da reforma, o mundo andar diariamente de mal a pior.
Os nobres e os rústicos chegam a dizer não precisar de pregação, nem terem de pagar sequer um vintém por todos os nossos sermões juntos... Vivem como crêem: são e ficam porcos, e morrem como tais.
Há ainda chaga mais deplorável: os pastores, sim, os próprios pastores que sobem ao púlpito, são hoje os mais vergonhosos exemplos da perversidade e de outros vícios.
Daí vem não terem os seus sermões nem mais crédito, nem mais autoridade do que as fábulas recitadas por um histrião. E esses senhores ousam queixar-se de ser desprezados e cair no ridículo.
Por mim, admiro-me da paciência do povo e não sei como as crianças e o povo não os cobrem de lama”. Falando da corrupção do povo de Wittemberg ele esclamou um dia publicamente: “Fujamos desta Sodoma. Prefiro andar mendigando o meu pão a envenenar os meus últimos dias, vendo as desordens de Wittemberg.
Tenho nojo do mundo... e o mundo tem nojo de mim; e isto me alegra. É já tempo de retirar-me”
Sair de Wittemberg era o seu desejo.
Em 1544 ele tentou afastar-se, mas os seus amigos o persuadiram a desistir do plano, porém foi apenas por pouco tempo, e, em fins de julho, sem avisar, deixou sorrateiramente a cidade acompanhado de seu filho Hans e de uns dois amigos: Fernando von Maups e Cruciger seus companheiros de viagem até à próxima cidade de Zeitz.
De Zeitz escreveu à sua amásia: “Meu coração está um pouco refrescado; não gosto mais de ficar aí!” Nesta mesma carta exprime a vontade de vender a casa e jardim que possuía em Wittenberg e ir residir em Zulsdorf onde tinha uma pequena propriedade.
Desejava terminar ali a sua vida, porque, dizia mais tarde, “após minha morte, o povo não suportará a minha viúva em Wittemberg.”
Quando os chefes protestantes tiveram o conhecimento destes planos, instantemente, foram pedir-lhe que voltasse, sendo a sua presença em Wittemberg absolutamente necessária para manter a paz e favorecer a extensão da reforma.
Lutero deixou-se convencer e voltou para aquela cidade. Mais tarde saiu outra vez, indo para Mansfeld, tratar de negócios com o landgrave.
No meio destas idas e vindas, as suas cartas exprimem o mesmo tédio, os mesmos desesperos da vida. Lutero sente m mal estar inexplicável, que outra coisa não é senão o remorso cada vez mais feroz em sua consciência perturbada, com a aproximação da morte.

3. ÚLTIMA VIAGEM
Em 23 de janeiro de 1546, Lutero foi terminar umas negociações na família do landgrave Alberto Mansfeld, em Eusleben. Viajou em companhia de seus três filhos, o professor particular destes e o seu amigo Aurifaber, o futuro compilador dos seus discursos de mesa.
Durante três dias se deteve em Halle, na casa de seu amigo Jonas, por causa da inundação do rio Saale. Daí escreveu a Catarina, em 25 de janeiro:“Não quisemos lançar-nos à correnteza e tentar a Deus, pois o diabo, nosso inimigo, reside na água, e, depois, não quero ver o Papa alegrar-se com a notícia de minha morte” (Cartas 5. p. 780).
No dia seguinte ele pregou em Halle, com toda a veemência permitida pela sua idade e moléstia, contra o Papa, os cardeais, os monges, que apesar de todas a suas exortações e ameaças, haviam ficando fiéis aos seus deveres e à sua religião.
Baixando as águas do rio, no dia 28, Lutero o atravessou em companhia de Jonas, e prosseguiu a viagem para Eisleben; notando estar a enchente ainda bastante forte, o reformador gracejou para Jonas: “Caro amigo, não seria muito agradável ao demônio, se eu, Doutor Martinho, com meus três filhos e o senhor morrêssemos aqui afogados?”
Não morreu afogado, mas a morte mandou-lhe um aviso da sua venda próxima.
O tempo estava frio, e um vento gelado soprava sobre os viajantes, causando arrepios ao velho Lutero que se sentiu incomodado, com tonteiras e dificuldade de respiração. Consolou-se, entretanto, e falou ao companheiro: “É o diabo que me fez isso; ele costuma proceder desse modo, cada vez que pretendo fazer coisa de importante” (Hausrath 2, p. 493).
Chegados a Eisleben, escreveu em tom zombeteiro e supersticioso aos judeus, numerosos no lugar, onde lhe acontecera o resfriar-se: “Vós me suscitastes esta friagem, que soprou detrás no carro e penetrou, através do meu barrete, até ao cérebro” (Cartas à Catarina, 5, p.783-1).
Durante sua estadia em Eisleben, Lutero vinha quase diariamente observar os patinadores do lago. Daí escreveu cartas humorísticas, incitando uma iminente repressão aos judeus, sempre avessos à sua reforma.
Pregou ali 4 vezes e ordenou dois padres, por ocasião da Ceia, “conforme o uso apostólico” diz ele.
Em 14 de fevereiro, à sua amiga e querida Catarina comunicou estar terminado o negócio do landgrave, de que fora tratar, tencionando voltar naquela mesma semana.
No dia 16 entretendo-se à mesa, sobre a sua viagem de volta, exclamou, em tom zombeteiro, algo que se realizou, parece, por castigo divino: “Quando estiver de volta a Wittemberg, me deitarei num cadafalso e darei de comer aos vermes um gordo doutor!” (Erling. 6l. 437).
No dia seguinte, 17, declararam-se os primeiros sintomas do ataque de apoplexia que, no dia seguinte o fulminaria repentinamente.
Passou o dia perturbado, inquieto, sentindo como que uma mão de ferro a lhe apertar a garganta, sem deixá-lo quase respirar.
Passeava de uma lugar para outro, ora estava em pé, ora deitado, ora inclinado à janela para melhor conseguir respiração.
Viu como que estender-se diante de si um pano fúnebre; ruídos estranhos atordoavam-lhe os ouvidos; espectros lquméricos povoavam-lhe a imaginação.
Tudo lhe dava a impressão de ser o último aviso de Deus.
Então ele disse: “Eu fui batizado aqui em Eisleben, quem sabe se não devo ficar aqui?”
A última hora, o instante da “grande viagem”, se aproximava...

4. A MORTE MISTERIOSA
Nada mais difícil que descrever a morte do reformador.
Correm tantas legendas e histórias acerca desta fato; muitos escritores trataram do assunto, de modo que o historiador imparcial não sabe em quem acreditar. Paira um mistério sobre este falecimento.
A razão desta balbúrdia é a seguinte: No tempo de Lutero, como ainda hoje, já estava arraigada a idéia de que um perverso deve necessariamente ter uma morte agitada, dolorosa, cruel; e o povo não admite possa uma pessoa reprovada morrer quieta e sossegada em seu leito de dores.
“Tal vida, tal morte”
É certo; é, porém, bom notar-se; tal morte se refere à sorte da alma e não ao gênero de morte do corpo.
É possível um criminoso, às vezes, ter uma morte suave, consolada, e perder a sua alma; como um predestinado, um santo, poder ter um trespasse doloroso, agoniado, e sua alma voar direito para o céu. Não se pode negar tenha sido Lutero um homem perverso, corrupto, vingativo, revoltoso, entregue aos mais baixos instintos; e, segundo a opinião citada, estava-lhe reservada a morte equivalente.
Os protestantes acusam os católicos de terem cercado os últimos instantes de seu reformador com pormenores ainda não bastante provados, exagerando talvez a verdade.
É possível. Não se pode atestar tenha sido aumentadas as proporções do caso, como não se tem certeza do contrário.
De outro lado, os protestantes, tanto os que assistiram à morte de seu chefe, como os que surgiram mais tarde, tinham todas as razões para apresentá-la como desenlace de um predestinado.
Os católicos tendiam a um rigor excessivo, e os protestantes, a uma indulgência exagerada. Para evitar discussões sem provas, cada um adotou, pois, a opinião mais coerente com as próprias idéias.
Desejo ser imparcial; por isso, sem adotar definitivamente esta ou aquela narração a respeito, citarei com brevidade os diversos modos de pensar.
A primeira opinião, a mais seguida entre católicos e protestantes, é a seguinte: Tendo Lutero resolvido voltar para Wittemberg, embora estivesse já alquebrado, doente e cansado, convidou os amigos para um banquete.
Pela tarde do dia 17 o chefe manifestara ligeira melhora, recobrando passageiramente o seu velho bom humor e espírito zombeteiro.
Comeram, beberam, cantaram; e, para agradar aos convidados, Lutero não deixou de beber bastante do bom vinho de Eisleben. Parecendo, entre os vapores do álcool, esquecer-se do seu estado doentio.
Alta noite os comensais se retiraram, ficando, somente Lutero, Justo Jonas, dono da casa, seu criado particular e um filho.
Conduzido ao seu quarto, Lutero sentou-se num sofá, mandando ao criado retirar-se, por não carecer mais dos seus serviços.
Que aconteceu nesta noite tremenda?
Só Deus o sabe.
De manhã, demorando-se Lutero mais que de costume em seu quarto, o criado foi bater-lhe à porta, mas não obteve resposta, nem notou o mínimo ruído. Conhecendo o servo o estado de seu mestre e receando qualquer catástrofe, chamou Justo Jonas e o filho de Lutero, e abriram a porta, não fechado por dentro. E uma cena mais horrenda e tétrica se ofereceu então aos seus olhos.
No meio do quarto, entre o móvel e o leito, o corpo de Lutero estava estendido no chão.... o rosto lívido, azulado, de olhar e boca desmedidamente abertos, os braços estendidos, o abdome intumescido, saindo-lhe as entranhas em redor do corpo.
Era um cadáver.
A mão justiceira de Deus havia prostrado aquele que durante tantos anos o blasfemara, na pessoa de seu representante visível na terra.
Lutero já estava na eternidade: excomungado, herege, apóstata, sacrílego, levando as mãos tintas de sangue e tendo a alma envolta em rancores ao Papa e à Igreja de Cristo.
Triste... Tristíssima bagagem para comparecer perante o Tribunal de Deus!
Justo Jonas e o criado, à vista do cadáver, já em começo de decomposição, com as entranhas derramadas pelo chão, recuaram de espanto, enquanto Hans Lutero soltou um grito estridente, caindo de joelhos perto de seu pai, para examinar se realmente estava morto.
Não havia dúvida; tinham diante de si um corpo frio e rígido; levantaram-no e deitaram-no sobre o sofá, indo um deles chamar o farmacêutico Landau para verificar a morte. Lutero falecera, vitimado por um ataque de apoplexia fulminante, proveniente talvez da indigestão dos alimentos e bebidas ingeridos no derradeiro banquete.
O pretenso reformador da Igreja morrera como vivera: como um trivial gastrônomo.
A medida da justiça divina estava repleta, e aquele que em vidas se intitulara “uma peste” para o Papa, e que, ao morrer seria a sua morte, foi apenas a peste da seita fundada por ele, em cuja história representa uma negra mancha: o seu desaparecimento não foi a morte do Papa, mas a desgraça espiritual de seus sectários.
Lutero morreu; o Papado não morre, porque Cristo é eterno.
O padre Leonel Franca, cuja sinceridade e ciência histórica são indiscutíveis, adota a mesma opinião e conclui: “Assim se calou, como um gastrônomo e libertino vulgar, o apóstata que se arrogava em reformador do cristianismo” (A Igreja, a reforma e a civilização. Pg. 200, citando Paulus: Lutero lebesende. Mainz 1896 p. 5).
“Na hierarquia dos anjos rebeldes, ainda que cause pesar aos seus amigos”, diz outro escritor de renome, “Lutero ocupa o grau mais baixo, mais próximo do lodo e do pântano” (Th. Mainage: Témoignages dês apostats. Paris 1916, p. 76).

5. OUTRAS OPINIÕES
Entre as diversas narrações dos antigos, a que acabo de citar é a mais universalmente aceita quer por protestantes sinceros, quer pelos católicos.
Uma segunda opinião acha que Lutero SE ENFORCOU: baseia-se numa CARTA DO CRIADO que o assistiu no dia da morte.
Segundo tal carta, todos os presentes, no dia seguinte ao em que encontraram Lutero ENFORCADO, haviam obrigado por JURAMENTO, em honra da nova doutrina, a nunca falar da cena presenciada.
Havendo, mais tarde abjurado o erro protestante asseveram ter o criado revelado o fato.
Foi no começo do século 17, em 1606, quando pelo primeira vez se encontrou o texto da carta do criado de Lutero, mencionado num livro do franciscano Henrique Edúlio, publicado em Antuérpia.
Qual é o VALOR deste documento?
É difícil dizê-lo; é certo não ter ele sido geralmente aceito pelos historiadores pósteros; nem a sua autenticidade, nem a sua falsidade foram bastante provadas.
Os protestantes rejeitam tal opinião como caluniosa; é natural, pois seria para eles uma nódoa sombria na vida e na morte, já tão torvas de seu fundador. Seriam filhos espirituais de um suicida, de um enforcado pelas próprias mãos.
O franciscano divulgador desta carta, além de um historiador de valor, é um homem de virtude reconhecida de modo a não se poder suspeitar da sua sinceridade, porém é possível que o documento publicado por ele tenha uma fonte menos sincera. Não nos cabe discutir esta opinião, por não dispormos de documentos bastante comprobativos, pró ou contra.
Uma terceira opinião foi emitida pelo médico do landgrave, dr. RATZBERG, chamado na ocasião da morte de Lutero. Este médico, conforme a primeira opinião, admite o ataque de apoplexia, a queda e o derramamento dos intestinos, mas ajunta que, na véspera do dia de sua morte, antes de deitar-se, à noite, escrevera com giz na parede de seu quarto o já conhecido verso:"Papa, eu fui a tua peste durante a minha vida; morrendo, serei a tua morte"
Tal pormenor, omitiram-nos os demais. Se a existência da inscrição não foi provada, é certo ter sido pronunciada e escrita por ele em outras circunstâncias já conhecidas sendo a expressão verídica de seus sentimentos odiosos ao Papa. (Na biblioteca de Groningen [Holanda] existe ainda um comentário sobre o Novo Testamento de Erasmo, no qual Lutero escreveu, com seu próprio punho, no lado interior da capa, esta execrada blasfêmia).
Um quarta opinião, de origem visivelmente protestante, pretende que Lutero faleceu de morte natural, sem acidente agravante, recitando versículos da Bíblia.
Dizem que, após o banquete, onde comera e bebera fartamente, sem nada sentir de anormal, ele se retirara cedo ao seu quarto, sendo ali subitamente atacado por uma perturbação cardíaca.
Tendo-se friccionado com panos quentes, melhorou, e dormiu sossegado uma parte da noite. Pela madrugada a mesma inquietação manifestou-se de novo. Foram chamados dois médicos, mas,
quando estes entraram, já o acharam estendido sobre o sofá, com um pulso imperceptível e a fronte coberta pelo suor da morte.
Voltando a si, momentos depois, asseveram ter dito: "Meu Deus, sinto-me tão agoniado, vou morrer".
Jonas, seu assistente, conta que, depois fez uma oração, dando graças a Deus de lhe ter dado Jesus Cristo, que ele havia pregado, enquanto o miserável Papa e todos os ímpios blasfemam.
Tendo Jonas perguntado se queria perseverar na religião que havia pregado, Lutero respondeu que sim: e pronunciando esta última palavra, morreu logo em seguida, às 3 horas da madrugada do dia 18 de fevereiro de 1546.
Vê-se claramente a falsidade destá última opinião fabricada pelos seus amigos, para esconder qualquer coisa que não queriam fosse conhecida.
Esta opinião protestante em vez de enfraquecer, confirma a opinião dos escritores católicos.
As palavras citadas não são de um moribundo, e a morte instantânea, que as segue, não combina com as palavras proferidas; pois há sempre um momento de agonia, a menos que seja um ataque apoplético que prostra a pessoa.
Aparecem reticências visíveis... e palavras ditadas pelo interesse para impressionar.
Lutero deixou neste mundo, como fruto de seu casamento sacrílego, 5 filhos, sendo 3 homens e 2 mulheres, havendo falecido uma menina com 8 meses de idade.
Conforme uma notícia do "Catholic Reviera", existem na América do Norte 20 famílias com o nome de Lutero, sendo elas católicas.
Um beneditino, Luis Lutero, celebrou ultimamente a missa de Requiem, para seu pai Sebastião Lutero, descendente em linha reta, de Martinho Lutero, quarto filho do próprio "reformador".

6. O ENTERRO DE LUTERO
O corpo de Lutero, bastante desfigurado e mal suportado pelos circunstantes, foi transportado no dia 20 para HALLE, e no dia 22, pelo madrugada, para WITTEMBERG, onde, por ordem do landgrave, devia ser sepultado na igreja, junto ao púlpito donde havia lançado a semente da revolta.
Dizem os escritores da época que, ao ser ele para lá transportado, o mau cheiro do cadáver se tornou tão penetrante e insuportável que, diversas vezes, os carregadores foram coagidos e deixá-lo por algum tempo, só, no meio dos campos, para poderem respirar um pouco de ar puro.
Contam ainda ter um bando de corvos, aliciados pela putrefação, seguido o cortejo lúgubre, como se fossem demônio montando guarda de honra a um de seus chefes.
Foram tais as diversas opiniões veiculadas a respeito da morte e do enterro do fundador do protestantismo.
Haverá qualquer exagero nestas narrações?
É difícil dizê-lo; só me foi possível reproduzir o que os contemporâneos narraram a respeito.
Que Justo Jonas, Célio, Aurifaber e, provavelmente, os filhos de Lutero tenham guardado silêncio sobre o fato é natural, pois a verdade seria a desmoralização da pessoa de seu amigo, de seu pai e até da reforma que este havia pregado e que eles mesmos seguiam.
E por isso, conforme o testemunho citado, que todos juraram nada revelar da morte de seu chefe; é por isso também que ficou envolta em tantos mistérios e incertezas uma morte que devia ser notória para todos.

7. CONCLUSÃO
Lutero desceu ao túmulo, como qualquer mortal; e, infelizmente, parece que acabou impenitente: a alma envenenada por sentimentos rancorosos, o coração transviado pelas paixões humanas, o espírito obcecado pela falsa idéia de um desígnio que o destinava para reformador.
A existência do herói de Wittemberg desconcerta o mais arguto psicólogo; é um complexo contraditório e um triste acúmulo de ócio e de atividade, de obsessão e de força, de baixezas e de elevação, mas tudo isso, tão entrelaçado, que querendo-se delinear a sua fisionomia, chega-se necessariamente à de um de seus contemporâneos:"Lutero é um tresloucado, ou, então, vítima de influência diabólica"
Cada vez se robustece em minha mente este mesmo conceito sobre o pai das seitas protestantes.
Iludido por sucessos passageiros, que as circunstâncias favoreceram, ele se julgou um gênio, um astro, um arauto do céu.
A morte implacável deitou no túmulo a sua audácia de deformador, porém o espírito de revolta que havia insuflado no mundo, o ódio ao Papa, que acendera nas almas, continuou, firmando o credo fundamental do protestantismo.
Um homem que se ufana de raciocinar sem preconceitos teria de parar diante deste quadro horripilante, como se detém diante da forca de Judas, e exclamar instintivamente: Não, a verdade não está aqui; só posso estar diante do mal, diante do vício, da perdição... e a verdade continua estar ao lado de Jesus Cristo, mesmo estando ele diante de Caifaz, de Pilatos ou de Herodes... A verdade está com ele, exclusivamente com ele e com seus sucessores: o Papa imortal de Roma, sucessor de S. Pedro, representante visível do Cristo invisível.
Para tornar esta verdade palpável, permitiu Deus fosse Lutero, sepultado no mesmo dia em que o povo católico celebrava a festa da "Cathedra Petri", dia comemorativo da fundação da primazia do Papa... data em que a Igreja canta as palavras do Salvador a Pedro: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno nunca prevalecerão contra ela” (São Mateus 16, 18).
Lutero procurou prevalecer contra a Igreja... mas terminou esmagado sob o peso da rocha de Pedro; e o Papa continua, como sempre, abençoando os seus filhos e suplicando que Deus se compadeça dos seus perseguidores.

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