11 de janeiro de 2014

Sermão para a Oitava de Natal: Circuncisão de Nosso Senhor Jesus Cristo – Padre Daniel Pinheiro IBP

[Sermão] Circuncisão de Nosso Senhor: Ele derrama seu Sangue por muitos

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
Ave Maria…
Hoje, oitava do Natal, é a Festa da Circuncisão de Nosso Senhor Jesus Cristo e um dia de devoção também a Nossa Senhora, como nos mostram as orações.“Depois que se completaram os oito dias para ser circuncidado o Menino, foi-lhe posto o nome de Jesus.”
Caros católicos, depois de oito dias após seu nascimento o Menino Jesus se submete à cerimônia de circuncisão, cumprindo o rito dado por Deus a Abraão e mandado pela lei de Moisés, a fim marcar a aliança de Deus com o povo judeu. Nosso Senhor se submete à lei mosaica, entre outras coisas, para mostrar obediência e humildade, para não dar motivo de escândalo para os judeus, para mostrar a bondade da lei mosaica enquanto ela durou, para nos livrar dela e nos poder dar assim a nova lei, a lei da graça.
Oito dias após seu nascimento, Nosso Senhor derrama pela primeira vez seu sangue sacratíssimo para a nossa redenção. Ele o fará novamente no Jardim das Oliveiras, na flagelação, na coroação de espinhos, nas quedas durante a via sacra, na crucifixão e no seu Sagrado Coração transpassado pela lança. O escritor francês Blaise Pascal tem uma frase aparentemente bonita que diz para cada um pensar que tal gota de sangue foi derramada para a sua salvação. A frase é aparentemente bonita, mas é inexata. Nosso Senhor não derramou uma gota de sangue para cada um. Não, ele derramou seu sangue inteiro e sofreu tudo o que sofreu por cada um. A frase de Pascal reduz a abundância da redenção de Cristo, o que é compreensível, pois Pascal era jansenista, ou ao menos com fortes tendências jansenistas, estreitando, então, a porta da salvação muito além de sua estreiteza real. A redenção de Nosso Senhor foi abundante, superabundante. Onde abundou o pecado, superabundou a graça, nos diz São Paulo. Não foi uma gota do Salvador para cada pessoa, mas foi toda a sua vida para cada pessoa. Uma única ação de Nosso Senhor, sendo Ele homem e Deus, tinha um valor infinito diante da Santíssima Trindade e bastava para a nossa redenção. Mas Cristo quis sofrer, e bastante e desde o início, para reparar em perfeita justiça por nossos pecados, mas, sobretudo, para nos mostrar o seu amor por nós. Assim, o Sangue preciosíssimo de Cristo foi derramado por todos, para a salvação de todos. O Sangue Preciosíssimo de Cristo é suficiente para redimir e levar todos ao céu.
O Sangue de Cristo foi, então, derramado por todos no sentido de que obtém graças abundantes diante de Deus para que todos os homens se salvem. O Sangue de Cristo não foi, porém, derramado por todos no sentido de que todos se salvarão porque Cristo já fez tudo o que tinha que ser feito e nós não precisamos fazer mais nada. Se Deus nos criou sem nós, Ele não nos salvará sem nós. É preciso cooperar com as graças obtidas pelo Sangue Preciosíssimo de Cristo, se queremos realmente nos salvar. Mas, infelizmente, não são todos que cooperam com a graça divina e, por isso, podemos dizer que o Sangue de Cristo foi derramado por muitos, no sentido de que são muitos os que aproveitam os bens obtidos pelo sangue de Cristo. Muitos aproveitam e se salvam, mas não todos. Nas palavras da consagração no Rito Tradicional e na versão latina da Liturgia de Paulo VI, isso é bem claro, pois está dito que o Sangue de Cristo foi derramado por muitos, mas não por todos. Pro multis, por muitos, diz claramente o texto latino.
Sabendo que a redenção operada por Cristo é suficiente para salvar todos, alguns se precipitam e caem no erro que mencionamos, afirmando que já estão todos salvos, pois Cristo já fez tudo o que tinha que ser feito. E nesse caso, o Sangue de Cristo teria sido derramado por todos não simplesmente no sentido de que o sangue divino obtém graças para todos poderem se salvar, se cooperam com elas, mas no sentido de que já estão todos salvos pelo mero fato de Cristo ter derramado seu Sangue. É essa a infeliz ambiguidade presente nas palavras da consagração na tradução brasileira e em várias outras traduções da liturgia renovada em 1969. O original em latim das palavras de consagração diz que o Sangue de Cristo é derramado por muitos, como dissemos, sendo a palavra latina pro multis, utilizada sempre na liturgia e no Evangelho. Vemos na tradução brasileira e em muitas outras línguas, porém, a tradução “derramado (…) por todos.” Ora, esse derramado por todos, sobretudo nas circunstâncias atuais, em que as pessoas perderam a noção de pecado e acham que já estão salvas independentemente do que fizerem, é no mais das vezes interpretado como confirmando a salvação de todos, a salvação universal. Derramado por todos pode ser bem interpretado, se entendemos que o Sangue de Cristo foi suficiente e mais do que suficiente para obter para todos as graças para se salvarem, mas não no sentido de que todos se salvarão, pois é preciso ser fiel à graça e cooperar com ela para se salvar. Assim, a tradução errônea e aberta a más interpretações não é herética e não impede que a consagração ocorra, mas induz facilmente a um erro sério. É altamente conveniente que seja corrigida, como, inclusive, já pediu a Santa Sé há alguns anos. A Santa Sé pede que as novas traduções estejam em conformidade com o original latino. Esperemos que a nova tradução para o português da liturgia de Paulo VI venha com essa importante correção, sem deixar margem para uma suposta e falsa salvação universal. Ainda no ano retrasado, o Papa Bento XVI escreveu uma longa carta aos Bispos da Alemanha explicando a necessidade de que sejam corretamente traduzidas as palavras da Consagração, que estão entre as palavras mais sublimes de nossa santa religião.
Aproximemo-nos mais uma vez do Menino Jesus, que derrama, no dia da circuncisão, as primeiras gotas de sangue para a nossa salvação. E que o precisíssimo Sangue de Cristo seja, pela nossa cooperação com a graça, pela nossa fidelidade a ela, verdadeiramente para a nossa salvação eterna. Consideremos mais uma vez o amor de Deus por nós e tudo o que fez por nós… O mínimo que podemos fazer é entregarmo-nos inteiramente a Ele, como tudo o que somos e tudo o que temos. Rezemos a Deus e a Nossa Senhora para que cooperando com a graça possamos fazer parte dos muitos que se salvarão.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

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