14 de julho de 2013

OITAVO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES

A Constituição da Igreja

Recolhamos mais uma lição do Evangelho a respeito do assunto que tratamos: a Igreja.

O Evangelho conta que um homem rico tinha um feitor que administrava os seus bens, mas que infelizmente não foi fiel a seu mandato, merecendo ser deposto de seu cargo.

A parábola nos mostra um administrador e seus administrados.

A Igreja também tem uma administração que se chama: Igreja docente ou ensinante e administrados, que formam a Igreja discente ou ensinada.

Estes dois elementos formam a constituição da Igreja.

Examinemos hoje este duplo aspecto da Igreja, isto é, a autoridade governativa dos chefes e a submissão amorosa dos fiéis, meditando:

1. A forma deste governo;
2. A natureza deste governo.

São dois pontos importantes que é necessário pôr em plena luz, para compreender as belezas deste governo, instituído por Jesus Cristo, e compenetrar-nos da submissão que lhe devemos.

I. A forma deste governo

A forma do governo da Igreja é a monarquia eletiva temperada.

Esta forma de monarquia temperada faz do governo da Igreja o melhor dos governos, porque é o único que corresponde plenamente à sua finalidade.

De fato, a Igreja tem por fim reunir sob o seu poder, não somente um povo, mas todos os povos, para fazer deles uma única sociedade, ou melhor: uma única família, e isso sem perturbar-lhes a vida social, mas levando-os a uma mesma fé e a uma mesma vida moral.

Para alcançar isto, é preciso que a Igreja possua o governo que melhor se adapte a este fim sublime.

Ora, só a monarquia eletiva temperada pode alcançar este fim.

Tal monarquia evita as revoluções, que uma república gera necessariamente entre nações de língua, costumes e educação diferentes.

Ela afasta também a dissolução, que é praga do protestantismo, ou a autoridade tirânica, que tão facilmente os governos aristocráticos ou as monarquias absolutas produzem.

Digo que o governo da Igreja é monárquico, porque possui um único chefe, supremo, independente, chamado: o Santo Padre o Papa, ou Soberano Pontífice, tendo poder absoluto sobre a Igreja inteira.

O Papa é um verdadeiro monarca, cujo poder não é limitado, nem reconhece superior ou igual. O Papa reina e governa, sem ter precisão de assembléia ou de conselheiros: ele manda, todos obedecem.

Esta monarquia é eletiva, neste sentido que, nem o chefe supremo e único: o Papa; nem os chefes inferiores: os Bispos, adquirem a sua dignidade por uma sucessão hereditária.

Cada autoridade é tirada indiferentemente de todas as classes sociais, ao ponto que cada fiel, sendo apto a esta dignidade pela vocação sobrenatural, pode ser chamado a tornar-se Sacerdote, Bispo e Papa.

Tal forma de governo é ainda temperada, pois examinando-a de perto, notamos que ela é ao mesmo tempo:

Monárquica, porque consta d'um único chefe.

Aristocrática, porque auxiliada por príncipes que são os Bispos, governando cada um a sua Diocese, em seu próprio nome, sob a autoridade suprema do Papa.

Democrática porque os seus chefes são recrutados em todas as classes.

O conjunto do governo da Igreja é chamado hierarquia ou autoridade sagrada, porque esta autoridade foi instituída pelo próprio Jesus Cristo, para manter na Igreja a sua doutrina e o seu espírito.

Esta hierarquia consta de Bispos, de Sacerdotes e de ministros inferiores como são: os diáconos, e subdiáconos.

Esta hierarquia tem isto de especial, diz Bossuet, que cada membro age com a força do todo; e o todo respeite a função de cada membro.

II. A natureza deste governo

Como acabamos de ver: a forma do governo da Igreja é admirável de harmonia e de força.

A natureza deste governo é mais admirável ainda, pois está em relação com a missão que a Igreja recebeu de Jesus Cristo.

Esta missão é conservar o depósito das verdades reveladas, como o seu fim é conduzir as almas para o Céu:

Ora, para cumprir uma tal missão, a Igreja tem um tríplice dever:

a) Ensinar as verdades reveladas;
b) Administrar os sacramentos;
c) Velar sobre a sua conservação.

Deste tríplice dever resulta um tríplice poder para ser possível cumpri-lo:

a) De ensinar;
b) De administrar;
c) De governar.

A Igreja tem o dever e o poder de ensinar as verdades que lhe foram confiadas por Jesus Cristo: Ide, ensinai todas as criaturas... ensinando-lhes a observar todas as coisas que vos mandei. (Math. XXVIII. 19)

O segundo dever é administrar os sacramentos, por serem estes os canais transmissores da graça, sem a qual não há salvação.

O Apóstolo diz que Jesus Cristo os fez, a eles, Apóstolos, dispensadores dos mistérios de Deus. (1. Cor. IV. 1)

A Igreja tem, pois, o poder de batizar... Ide... batizando-os - de perdoar os pecados pela confissão: A quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados (Joan. XX. 13), De oferecer o Santo Sacrifício da Missa: Fazei isto, em memória de mim, (Luc. XXII. 19) de dar a Extrema Unção: Está alguém enfermo, chame os sacerdotes... e estes ungindo-o com óleo... (Th V. 14) numa palavra tem o poder de administrar os sete sacramentos.

Enfim, tem o poder de governar a Igreja, isto é: de fazer leis, pronunciar sentenças, reformar abusos e castigar os delinqüentes, quando isto for necessário.

Este poder foi dado aos Apóstolos: O que desligardes na terra será des1igado no Céu (Math. XVI. 19)

A S. Pedro Jesus deu a ordem de apascentar os cordeiros e as ovelhas, (Joan. XXI. 17) e ordenou que todos obedecessem à Igreja sob pena de ser considerado como um publicano ou um pagão (Math. XVIII. 17)

Eis, pois, a Igreja revestida divinamente de seu sublime magistério, que exerce pela sua hierarquia de ordem e de jurisdição, na mais suave harmonia e na mais suave união que pode existir num governo.

O governo da Igreja é uma instituição divina e por isso é imutável.

Jesus Cristo é o seu fundador e a sua cabeça, e como é imutável, os membros participam necessariamente desta imutabilidade. Ele era ontem, Ele é hoje, Ele ficará sempre o mesmo em todos os séculos; como diz S. Paulo (Hebr. XII. 8)

Os governos humanos podem alterar-se porque são feitos para o povo, e devem adaptar-se às necessidades do povo.

O governo da Igreja, sendo um governo divino, são os povos que devem submeter-se a ele enquanto ele fica o que foi desde a origem.

Esta imutabilidade constitui a glória, a força e o principio da imortalidade da Igreja.

Em razão da diversidade dos tempos, a Igreja pode modificar a sua disciplina sobre vários pontos, porém não muda os princípios de seu governo, que são invariáveis.

III. Conclusão

Tal é a bela, fecunda e harmoniosa constituição da Igreja; constituição única entre todos os governos, porque só ela é divina.

A Igreja não mendiga eleições, ninguém apresenta candidatos para os altos cargos; é o Espírito Santo que suscita as vocações, que as orienta e eleva até as mais altas funções.

Não fostes vós quem me escolhestes, disse Nosso Senhor aos Apóstolos, mas fui eu que vos escolhi (Joan. XV. 16) e Ele repete esta palavra a cada um de seus eleitos.

Destas considerações podemos inferir, como conclusão, os direitos e deveres da Igreja discente ou ensinada.

Em suas relações exteriores com a Igreja docente, os fiéis devem professar a mesma fé, participar dos sacramentos que lhes são próprios e obedecer à autoridade, ao único chefe da Igreja, o Soberano Pontífice, e a seus representantes na hierarquia da Igreja.

Em suas relações interiores devem ficar unidos a Jesus Cristo pela graça santificante, que é como a seiva divina que percorre toda a Igreja de Cristo.

EXEMPLOS

I. Submissão de Fenelon

Fenelon havia escrito um livro intitulado: As máximas dos Santos, que O Papa Inocêncio XII condenou em 1699, por achar várias máximas um tanto ambíguas, com interpretações um tanto quietistas.

A notícia da condenação foi remetida ao piedoso Prelado no dia 25 de Março, no momento que ia subir ao púlpito.

Deixando de lado o sermão que tinha preparado, Fenelon falou sobre a submissão à Igreja, com uma unção que arrancou lágrimas ao numeroso auditório.

Em 7 de Abril publicou uma Carta Pastoral na qual aceitou, sem reserva, a condenação de seu livro, e onde dizia:

“Oxalá nunca se fale de nós, senão para se lembrar que um Pastor deve ser mais submisso à autoridade da Igreja que a última das ovelhas; nunca porei o mínimo limite à minha submissão à Igreja”.

Mandou fabricar um ostensório, sustentado por dois anjos, dos quais um carregava vários maus livros, entre os quais figurava um, com a inscrição: “Máximas dos Santos, por Fenelon”.

Admirável exemplo de submissão à Igreja!

2. Carlos Magno e seu Filho

Carlos Magno, o maior príncipe de quem a França e a Europa podem gloriar-se, grande pelas suas conquistas, grande pelo seu amor às ciências, grande pela sabedoria das suas leis, grande pelas suas virtudes e grande pelo seu amor à Igreja, acabava de passar por provações cruéis, no fim da vida; viu morrer a sua filha e dois de seus filhos, ficando-lhe apenas o príncipe Luiz, que resolveu associar ao Império.

Chamou-o para junto de seu leito, onde jazia doente, e disse-lhe:

- Filho querido de Deus, de teu pai e de todo nosso povo, tu que Deus me deixou para minha consolação, tu o vês: a minha idade está adiantada, a minha própria velhice me vai escapando, o tempo da minha morte se aproxima.

Prometes-me de temer sempre a Deus, de observar a sua lei, de proteger a sua Igreja?

Luiz o promete, soluçando de emoção.

Vai, pois, meu Filho, tome a coroa lá em cima do altar, põe-na sobra a tua cabeça e não te esqueças de teus compromissos.

Grandes e sublimes lições que todos os pais deviam dar a seus filhos antes de morrer!

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(MARIA, P. Júlio. Comentário Apologético do Evangelho Dominical. O Lutador, 1940, p. 288 – 295)

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