9 de setembro de 2013

Do zelo da salvação das almas que devem ter os religiosos.

Recupera proximum tuum secundum virtutem tuam – “Assiste ao teu próximo segundo as tuas forças” (Ecclus. 29, 27).

Sumário. Quem ama muito o Senhor, não se contenta de ser só em amá-Lo; desejaria atrair todo o mundo ao seu amor. E que maior glória para o homem, que ser cooperador de Deus na grande obra da salvação das almas: correspondamos, pois, à nossa sublime vocação, abrasando-nos sempre mais de santo zelo, dirijamos para este fim todos os nossos empenhos. Deste modo, à medida que socorrermos as almas do nosso próximo, assecuraremos a nossa própria salvação e obteremos um lugar alto no paraíso.

I. Quem é chamado à Congregação do Santíssimo Redentor (a alguma ordem de vida ativa), nunca será verdadeiro seguidor de Jesus Cristo e nunca será santo, se não cumprir o fim de sua vocação e não tiver o espírito do seu Instituto, que é o de salvar as almas e as almas mais privadas de socorros espirituais, como são os pobres moradores do campo.

Foi este também o fim com que o Redentor veio ao mundo, pois declara “que o espírito do Senhor repousou sobre Ele e que o consagrou com a sua unção para pregar o Evangelho aos pobres” (1). Em nenhuma outra coisa quis experimentar se São Pedro o amava, senão na sua dedicação à salvação das almas: Simon Ioannis, diligis me?... Pasce oves meas (2) – “Simão, filho de João, amas-me?... Apascenta as minhas ovelhas”. Não lhe impôs, diz São Crisóstomo, esmolas, penitências, orações ou coisas semelhantes, mas somente que procurasse salvar as suas ovelhas: Apascenta as minhas ovelhas. Jesus Cristo declarou que teria como feito a si mesmo todo o benefício que fosse feito ao mínimo dos nossos semelhantes: Amen dico vobis: Quamdiu fecistis uni ex his fratribus meis minimis, mihi fecistis (3) – “Na verdade vos digo, que o que fizerdes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim é que o fizestes”.

Deve, portanto, qualquer membro da Congregação nutrir em supremo grau este zelo, este espírito de socorrer as almas. A este fim deve cada um dirigir todos os seus empenhos. E quando algum tempo os superiores o empregarem neste ministério, deve por nele todo o seu pensamento e toda a atenção. Já não se poderia considerar como verdadeiro membro da congregação aquele que não aceitasse com todo o afeto este emprego, quando imposto pela obediência, para tratar só de si mesmo, na vida de solidão e de retiro. – E que maior glória para o homem, que ser cooperador de Deus, como diz São Paulo, na grande obra da salvação das almas? Quem muito ama ao Senhor, não se contenta de ser só a amá-Lo. Quisera atrair todo o mundo ao seu amor, dizendo com Davi: “Engradecei o Senhor comigo, e exaltemos juntos o seu nome.” (4) Portanto, como exorta Santo Agostinho, todos os que amam a Deus: Si Deum amatis, omnes ad amorem eius rapite – “Se amais a Deus, atraí todos ao seu amor”.

II. Grande motivo para esperar a sua salvação eterna tem aquele que com verdadeiro zelo se emprega em salvar almas. Diz Santo Agostinho: “Se salvaste uma alma, predestinaste ao mesmo tempo a tua.” E o Espírito Santo promete (5): Cum effuderis esurienti animam tuam – “quando te tiveres empenhado pelo bem de um pobre”, - et animam afflictam repleveris – “e o tiveres enchido da graça divina por meio do teu zelo”, - implebit splendoribus animam tuam, requiem dabit tibi Dominus – “o Senhor te encherá a alma de luz e de paz”. São Paulo punha a esperança da sua salvação eterna na salvação dos outros que ele procurava; pelo que diz aos seus discípulos de Thessalonica: Vos enim estis gloria mostra et gaudium (6) – “Vós sois a nossa glória e alegria”.

Senhor meu Jesus Cristo, como posso agradecer-Vos dignamente, vendo-me por Vós chamado ao mesmo ministério que Vós exercitastes na terra, ao ministério de, com as minhas fracas forças, ajudar as almas a se salvarem? Como merecia eu esta honra e este prêmio, depois de Vos haver ofendido tão gravemente e sido causa que outros Vos ofendessem? Sim, meu Salvador, já que me chamais a ajudar-Vos nesta grande obra, quero servir-Vos com todas as minhas forças. Eis-me aqui a oferecer-Vos todos os meus trabalhos, e ainda o sangue e a vida para Vos obedecer. Não pretendo com isto satisfazer ao meu próprio gênio, ou receber a estima e os aplausos dos homens; outra coisa não pretendo senão ver-Vos amado de todos, como mereceis.

Bendigo a minha sorte e me dou por feliz por me haverdes escolhido para tão sublime ofício, no qual desde já faço o sincero protesto de renunciar a todos os louvores dos homens e a todas as minhas satisfações e de querer só a vossa glória. Seja vossa toda a honra e satisfação e para mim sejam somente os incômodos, os desprezos e as amarguras. Aceitai, Senhor, esta oferta que Vos faz um miserável pecador, o qual Vos quer amar e ver-Vos também amado dos outros; dai-me forças para a executar. – Maria Santíssima, minha advogada, vós que tanto amais as almas, ajudai-me. (IV 429.)

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1. Luc. 4, 18.
2. Io. 21, 17.
3. Matth. 25, 40.
4. Ps. 33, 2.
5. Is. 58, 10.
6. 1 Thess. 2, 20.

(Santo Afonso Maria de Ligório. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Terceiro: desde a duodécima semana depois de Pentecostes até ao fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 100-102.)

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