8 de setembro de 2013

DÉCIMO SEXTO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES (II)

Outra meditação para o mesmo dia.
O homem hidrópico e o vício de impureza.

Sumário. O hidrópico de que fala o Evangelho é figura do libidinoso, por duas razões. Primeiro, assim como o hidrópico, quanto mais bebe, mais sede tem, assim o desonesto nunca se sacia de pecar. Segundo, porque a impureza, por causa da cegueira de espírito e do endurecimento da vontade que acarreta, é tão incurável como a hidropisia. Infeliz do que se deixa dominar por este vício! Todavia não desespere, visto que para Deus nada é impossível.

I. Todos os enfermos cuja cura milagrosa por Jesus Cristo os evangelistas referem, representam algum mistério. Assim bem se pode dizer que o hidrópico de que fala São Lucas no Evangelho de hoje é uma figura do homem libidinoso. Sim, diz Santo Tomás de Vilanova, porque assim como o hidrópico, quanto mais bebe, mais a sede se lhe aumenta, assim o escravo do maldito vício da desonestidade jamais se sacia de pecar. – Se, pois, de todos os pecados já se pode dizer que, uma vez entrados na alma, nunca ficam muito tempo a sós, isto é muito mais aplicável ao pecado da impureza.

Um blasfemo não blasfema sempre, mas somente quando se encoleriza. Um ladrão não rouba todos os dias, mas somente quando se lhe oferece a ocasião. Mas o desonesto é uma torrente contínua de pecados, de pensamentos, de palavras, de vistas, de deleitações, de maneira que, quando se vai confessar, não pode explicar o número de pecados que cometeu. – Numa palavra, São Cipriano escreve que por este vício o demônio triunfa de todo o homem: do corpo, da alma e de todas as faculdades – Totum hominem agit in triumphum libidinis. A razão disto é porque nesta espécie de pecado é tão fácil tomar um mau hábito, que leva a pecar a natureza já corrompida.

Demais, o pecado desonesto arrasta as mais das vezes a outros crimes; tais como a difamação, o furto, a mentira, o ódio, a ostentação do mesmo vício e especialmente o escândalo, excitando e arrastando os outros a cometê-lo ou ao menos a cometê-lo com menos horror. Ó céus! Que mar imenso de pecados! Se um só pecado mortal é suficiente para condenar o homem ao inferno, qual será o inferno do desonesto que comete e faz cometer tão grande número de pecados?

II. Ainda sob outro ponto de vista a hidropisia é figura da impureza. Porque acarretando esta mais do que qualquer outro vício a cegueira do espírito e a obstinação da vontade, segue-se que é tão difícil a conversão de um desonesto, como é difícil a cura de um hidrópico. – fornicatio, et vinum, et ebrietas auferunt cor – “A desonestidade, o vinho e a embriaguez tiram os bons sentimentos”, diz o Senhor pela boca do profeta Oséas (1). Quer dizer que este vício, à semelhança do vinho, faz perder a razão.

Por isso o mesmo profeta afirma com razão que aos obscenos nem sequer se lhes ocorre a idéia de se converterem para Deus (2), ou, se porventura lhes ocorre, com malícia diabólica se obstinam a volver-se, quais animais imundos, no lodo da impureza. – São Jerônimo chega a dizer que, quando o vício desonesto chegou a ser habitual em alguma pessoa, de ordinário somente termina quando o desgraçado é lançado no inferno para arder no fogo: O ignis infernalis luxuria... cuius finis gehenna!

Meu irmão, lança um olhar em tua consciência, e se, como espero, a achas pura, rende graças a Deus, e fica humilde; porque o Senhor muitas vezes castiga os orgulhosos, permitindo que caiam em algum pecado impuro. – se, porventura, te achasses réu de pecados, não desesperes, pois que para Deus nada é difícil. É, porém, necessário que, resolvido a curar-te dos teus males, imites o hidrópico do Evangelho, pondo-te diante de Jesus Cristo, na pessoa do padre, seu ministro.

Faze, portanto, uma boa confissão geral de todos os teus pecados e emprega os meios que o confessor te prescrever. Sobretudo deves rogar ao Senhor que “a sua graça te previna sempre, te acompanhe, e te afervore na contínua prática das boas obras” (3). Invoca também a Virgem Santíssima, que é a Mãe da pureza e dize-lhe com confiança: “Ó Virgem Mãe, que nunca fostes manchada por pecado algum, nem atual, nem original, recomendo-vos e confio-vos a pureza do meu coração.” (4) (*III 548.)

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1. Os. 4, 11.
2. Os. 5, 4.
3. Or. Dom. curr.
4. Indulg. de 100 dias.

(Santo Afonso Maria de Ligório. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Terceiro: desde a duodécima semana depois de Pentecostes até ao fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 97-99.)

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