15 de setembro de 2013

DÉCIMO SÉTIMO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES.

Extensão da infalibilidade

Temos diante de nós o grande mandamento da lei de Deus: amar a Deus de todo o seu coração; e o segundo, que o Mestre proclama semelhante a este: amar ao próximo como a si mesmo.

O amor de Deus e o amor ao próximo ficam deste modo, inseparavelmente entrelaçados. Deus é a cabeça do corpo da humanidade, os homens são os membros deste corpo.

Estudando a infalibilidade da Igreja, encontramos nela este mesmo entrelaçamento: O Papa e os fiéis... a Igreja docente e a Igreja discente: a infalibilidade ativa e passiva...

Para esclarecer bem estas distinções vamos examinar hoje até onde se estende a infalibilidade e como são ligadas entre si:

1. A ativa e a passiva.
2. O Papa e os fiéis.

São questões conhecidas confusamente pelo povo, mas que convém destacar, para dar mais firmeza ao amor que devemos à santa Igreja.

I. A ativa e a passiva

O Papa sendo infalível, a Igreja inteira o é igualmente, não por si, mas pela sua inseparável união com o Papa.

A Igreja compõe-se da parte docente e da parte discente: a primeira ensina e a segunda é ensinada.

A parte docente é infalível ativamente na pessoa do Papa, isto é: ensina sem poder enganar-se.

A Igreja discente é infalível passivamente; isto é, os fiéis escutando a voz do Papa e dos Bispos unidos ao Papa e dos Padres unidos ao Bispo, não podem ser induzidos ao erro.

Deste modo, a Igreja inteira é infalível, uma parte pelo ensino e a outra pela obediência.

Eis porque Jesus Cristo disse: Ide e ensinai a todas as nações... ensinando-lhes a observar todas as coisas que vos mandei; e eis que eu estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos. (Math. XXVIII. 20).

Examinai bem este texto e vereis que ele tem uma extensão que à primeira vista não aparece.

Eis que estou convosco: estas palavras resumem e encerram tudo: não há exclusão de poder, nem de auxílio nenhum: Foi me dado todo poder no céu e na terra (Math. XXVII. 18).

Notai esta disposição. Jesus Cristo fala de seu poder, de seus Apóstolos e de todas as nações e, reunindo estes três elementos, Ele diz que está com eles, até o fim dos tempos.

É a infalibilidade completa da Igreja docente e discente, como acabamos de ver.

Até a consumação dos séculos. Não é somente convosco, com quem estou falando, completa o divino Mestre, a minha promessa se estende além, atinge todos os vossos sucessores, pois outros vos sucederão e a vossa raça nunca terá fim.

Eis como combinam admiravelmente estes dois termos: a Igreja e o Papa.

A Igreja e o Papa são um só.

Onde está o Papa aí está a Igreja.

E onde está a Igreja é aí que está o Papa.

Neste mundo vêem-se às vezes cabeças separadas do corpo, mas são de cadáveres.

Não é o bastante dizer que o Papa falando, a Igreja adere. Entende-se a Igreja no Papa.

O Papa fala com ela e nela. O que ele diz, ele o lê nas entranhas da Igreja. O mesmo Espírito Santo que põe tais palavras sobre os lábios do Papas põe também no coração da Igreja; ou melhor, ela já as tinha posto no coração, pois elas não sobem aos lábios do Papa senão porque saem do coração da Igreja.

É o encontro destas duas infalibilidades: a ativa, na cabeça, e a passiva no corpo, fundidas numa só, que forma a infalibilidade total da Igreja.

II. O Papa e os fiéis

Com este princípio geral, compreendemos melhor a paz e a tranqüilidade que formam o fundo e a auréola da fé católica.

Não é preciso ser cientista para, logicamente, o católico concluir a verdade absoluta da religião que professa.

Pode e deve dizer:

A minha religião, aprendi-a dos lábios de meu vigário, que depositou em minhas mãos e me explicou um pequeno livro: o Catecismo.
O que o vigário me ensina remonta ao Bispo que o mandou com este livrinho, resumo perfeito do Evangelho.
Por meio do Bispo, este ensino remonta ao Papa, que enviou o Bispo.
Pelo Papa, este ensino remonta, de Papa em Papa, em S. Pedro, que o recebera de Jesus Cristo.
A minha religião é a mesma que S. Pedro recebeu de Jesus Cristo.
Eu tenho a plena certeza disto, porque, se o Vigário que me ensina mudasse qualquer coisa na doutrina Católica, os outros sacerdotes e até os próprios fiéis, o denunciariam ao Bispo.
E se o Bispo mudasse qualquer coisa, os outros Bispos e até os Padres e os simples fiéis o denunciariam ao Papa, guarda vigilante da fé, e este o separaria da Igreja.
Uma mudança de fé, é pois, impossível hoje, como o foi em todos os tempos, pelas mesmas razões.
A minha religião é, pois, a religião que Jesus Cristo ensinou.

O católico mais instruído pode raciocinar do seguinte modo:

Negar um único artigo da minha fé seria negar a infalibilidade da Igreja.
Negar a infalibilidade da Igreja seria negar a eficácia da palavra de Jesus Cristo.
Negar a eficácia desta palavra seria negar a sua divindade, que provou por milagres.
Negar a divindade de Jesus Cristo seria negar o próprio Deus.
Negar a Deus seria negar a razão humana que reconhece invencivelmente a sua existência.
Ora, não se pode, sem loucura, negar a razão humana.

Tenho, pois, absoluta certeza que tudo o que a Igreja me ensina é o próprio Deus que mo ensina, de tal modo que se, o que é impossível, a Igreja me fizesse errar, teria eu o direito de poder dizer a Deus, o que disse um doutor: sois Vós Senhor, que me enganastes.

III. Conclusão

A palavra de Deus está primeiro em Deus.

Deus a deu a seu Filho e seu Filho a dá à Igreja, dizendo: Como meu Pai me enviou, assim eu vos envio: quem vos escuta, escuta a mim; quem os despreza, despreza a mim.

Basta: ouvindo a Igreja ouvimos o próprio Deus: estamos na luz e vivemos na certeza da nossa fé.

Tiremos a conclusão prática destas considerações. Quatro obrigações se nos impõem a respeito da Igreja.

1. Devemos escutar a Igreja, como escutaríamos o próprio Jesus Cristo, se Ele nos falasse.
2. Devemos consultar a Igreja quando qualquer dúvida ameaça a nossa fé.
3. Devemos obedecer à Igreja, certos de que sua palavra é a palavra infalível de Jesus Cristo, que nô-la transmite pelo magistério infalível da Igreja.
4. Devemos amar a Igreja e o seu chefe, o soberano Pontífice, personificação da Igreja e até se necessário fosse, dar a nossa vida para defendê-lo.

EXEMPLOS

1. Conversão de Adão Stobaens

O pastor protestante Adão Stobaens foi um dos protestantes mais instruídos e mais sinceros do século XVII.

O estudo do magistério infalível na Igreja Católica foi o grande assunto de suas pesquisas.

Após muitas relutâncias tirou a conclusão que entrevira, mas que enfim parecia apalpar com os dedos.

A Igreja fundada por Jesus Cristo é necessariamente uma sociedade visível.

Tal sociedade, divina em sua fé, deve possuir uma autoridade que sustente esta fé, e para isso que seja infalível.

Tal autoridade não existe no protestantismo: logo, ele não é a religião de Cristo; ela existe na Igreja Católica: logo, ela é a religião divina.

Renunciou ao protestantismo e tornou-se em fervoroso católico.

2. A infalibilidade segundo a Razão

O poeta protestante Shaw, escreveu: É bom informar os meus leitores protestantes que o famoso dogma da infalibilidade do Papa é o título mais modesto que se pode dar a um soberano.

Comparando a infalibilidade do Papa com as nossas democracias infalíveis, com as assembléias de médicos infalíveis, com as cortes de juízes infalíveis, com os nossos astrônomos infalíveis, com os nossos parlamentares infalíveis, devemos dizer que estes se proclamam infalíveis em tudo o que fazem e resolvem, enquanto o Papa, de joelhos perante Deus, confessa a sua ignorância e exige apenas que se lhe conceda a infalibilidade em certos casos urgentes, de conseqüências graves para a manutenção da doutrina de Jesus Cristo.

3. Resposta do Capuchinho

Durante o Concílio do Vaticano, conta Monsenhor de Segur, estava na moda o criticar a infalibilidade do Papa, cujo dogma os Prelados estavam estudando.

Depois da definição, uma rica dama apresentou-se um dia no Convento dos Capuchinhos, pedindo um padre para confessar-se.

- Meu pai, começou a Dama, aconteceu-me uma coisa singular: o meu confessor recusa-se dar-me a absolvição porque não creio na infalibilidade do Papa. Não posso crer nisto, é mais forte do que eu.

O Capuchinho, com uma expressão de bonomia, responde, sorrindo:

- Como? O seu confessor recusa-lhe a absolvição por causa disso? Pois bem, eu vou dá-la.
- V. Rvma. me absolve! Ó, meu pai, como o senhor é bom!
- Sim, absolvo a senhora, sem dificuldade.
- Mas então, como é que o meu confessor não quer absolver-me?
- Ó! É porque ele tomou a senhora por uma outra pessoa.
- Como me tomou por outra pessoa? Ele me conhece há muito tempo.
- Pode ser, porém ele julgou que a senhora era instruída.
- Instruída... mas meu pai, eu não sou uma ignorante!
- Não digo isso... porém a senhora não sabe o que é a infalibilidade do Papa. Tais questões não são do domínio de todos.

E aproveitando a surpresa da Dama o Capuchinho explicou-lhe simplesmente o estado da questão. Pela primeira vez a Dama viu claro no assunto.

- Como? Exclamou ela, a infalibilidade é só isso?... Mas eu creio nela de muito boa vontade.
- Está vendo, retomou um pouco sarcasticamente o Capuchinho, que a senhora pode receber a absolvição, pois labora num erro por ignorância, mas não está em pecado...

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(MARIA, P. Júlio. Comentário Apologético do Evangelho Dominical. O Lutador, 1940, p. 363 - 370)

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