O Livro da Confiança
Pe. Thomas de Saint Laurent
Capítulo V - Razões da confiança em Deus
III - Sua Bondade
A
verdade é que Nosso Senhor é adoravelmente bom: o seu Coração não pode
ver sofrer, sem sangrar. Essa piedade fá-Lo operar alguns dos seus
maiores milagres espontaneamente, antes mesmo de ter recebido qualquer
súplica.
A multidão segue-O através das montanhas desertas da Palestina; durante três dias, esquece-se, para ouvi-Lo, da necessidade de comer e de beber. O Mestre chama, porém, os Apóstolos: “Vede essa pobre gente, diz-lhes: não os posso despedir assim: cairiam de inanição no caminho. Tenho pena dessa multidão” (56). E multiplica os poucos pães que restavam aos discípulos.
Outra
vez, dirigia-se Ele à pequena cidade de Naim, escoltado por uma turba
bastante numerosa. Quase ao chegar às portas, encontra um cortejo
fúnebre. Era um jovem que levavam para a última morada: filho único de
pobre mãe viúva. Nada esperando mais da vida, em profundo desalento,
seguia, lamentavelmente, a triste mulher o corpo do seu filho. A vista
dessa dor muda emocionou vivamente o Mestre. Tomou-se de misericórdia.
“Pobre mãe aflita, disse, não chores!” (57). E, aproximando-se da
padiola onde jazia o cadáver, restitui vivo o jovem à sua mãe.
Almas
feridas pela provação: consciências perturbadas pela dúvida, talvez, ou
pelo remorso: corações torturados pela traição ou pela morte; vós que
sofreis, acreditais, por acaso, que Jesus não tenha piedade das vossas
dores?... Isso seria não compreender o seu imenso amor. Ele conhece as
vossas misérias; Ele as vê, e o seu Coração compadece-se delas. É por
vós, hoje, que Ele lança o seu brado de compaixão; é a vós que Ele
repete, como à viúva de Naim: “Não chores mais, Eu sou a Resignação, Eu
sou a Paz, Eu sou a Ressurreição e a Vida!”.
Essa
confiança, que naturalmente nos deveria inspirar a divina bondade,
Nosso Senhor no-la reclama explicitamente. Faz dela condição essencial
dos seus benefícios. Vemo-Lo, no Evangelho, exigir atos formais dessa
confiança antes de operar certos milagres.
Porque
é que Ele, sempre tão terno, se mostra assim duro na aparência para com
a cananéia que Lhe pede a cura da filha? Repele-a por diversas vezes;
mas nada a faz desanimar. Multiplica ela as suas súplicas tocantes; nada
lhe diminui a confiança inabalável. Era isso justamente o que pretendia
Jesus: “O, mulher, exclama com alegre admiração, grande é a tua
confiança!” E acrescenta: “Faça-se como desejas” (58).
“Fiat tibi sicut vis”. A confiança obtém a realização dos nossos desejos: é Nosso Senhor, Ele próprio, quem o afirma.
Estranha
aberração da inteligência humana! Cremos nos milagres do Evangelho,
visto que somos católicos convictos: cremos que Cristo nada perdeu do
seu poder subindo aos Céus; cremos na sua bondade, provada em toda a sua
vida... E, no entanto, não sabemos abandonar-nos à confiança nEle!
Como
conhecemos mal o Coração de Jesus! Obstinamo-nos a julgá-Lo pelos
nossos fracos corações: parece em verdade que queremos reduzir a sua
imensidade às nossas mesquinhas proporções: Custa-nos admitir essa
incrível misericórdia para com os pecadores, porque somos vingativos e
lentos em perdoar. Comparamos a sua infinita ternura com os nossos
pequeninos afetos... nada podemos compreender desse fogo devorador que
fazia do seu Coração um imenso braseiro de amor, dessa santa paixão
pelos homens que O dominava completamente, dessa caridade infinita que O
levou das humilhações do Presépio ao sacrifício do Gólgota.
Infelizmente,
não podemos dizer com o Apóstolo São João, na plenitude da nossa fé:
“Cremos, Senhor, no vosso amor!” - “Credidimus caritati” (59).
Mestre
Divino, queremos doravante abandonar-nos inteiramente à vossa direção
amorosa. Confiamo-Vos o cuidado do nosso futuro material. Ignoramos o
que nos reserva esse futuro, sombrio de ameaças. Mas abandonamo-nos às
mãos da vossa Providência.
Confiamos ao vosso Coração os nossos pesares. São por vezes terrivelmente cruéis. Mas Vós estais connosco para suavizá-los.
Confiamos
à vossa misericórdia as nossas misérias morais. A fraqueza humana
faz-nos temer todos os desfalecimentos. Mas Vós, Senhor, haveis de nos
amparar e preservar das grandes quedas.
Como
o Apóstolo preferido que repousou a cabeça sobre o vosso peito, assim
pousaremos nós sobre o vosso Divino Coração; e, segundo a palavra do
Salmista, aí dormiremos em deliciosa paz, porque estaremos, Oh! Jesus,
radicados por Vós numa confiança inalterável.
_______________________________________
56 ) Mc. 8, 2.57 ) Lc. 7, 13.
58 ) Mt. 15, 28.
59 ) 1 Jo. 4, 16.
Nenhum comentário:
Postar um comentário