14 de outubro de 2009

Matrimônio Cristão - Católico - Final 9/14

O ato civil
82. Pelo que respeita à natureza religiosa de qualquer matrimônio e muito especialmente do matrimônio cristão, que é também Sacramento, tendo Leão XIII, na Carta Encíclica, que já várias vezes citamos e declaramos Nossa, largamente tratado e firmado, com graves argumentos, o que nesta matéria se deve considerar, e julgando Nós bastar somente focar aqui alguns pontos, para essa mesma Encíclica vos remetemos.
83. Principalmente, quem queira investigar os antigos monumentos da história, interrogar a imutável consciência dos povos e consultar as instituições e os costumes de todas as gentes pode deduzir claramente, ainda que só à luz da razão, ser inerente ao próprio matrimônio natural qualquer coisa de sagrado e religioso, “não sobrevinda mas congênita, não recebida dos homens mas fazendo parte da natureza”, visto o matrimônio ter “Deus por autor e ter sido desde o princípio tal ou qual imagem da Encarnação do Verbo de Deus” (Leão XIII, Enc. Arcanum, 10 fevereiro, 1880). A razão sagrada do casamento, que está intimamente conexa com a religião e com a ordem das coisas sagradas, dimana não só de sua origem divina, que já relembramos, mas também de seu fim, que é gerar e educar a prole para Deus e conduzir igualmente os cônjuges, mediante o amor cristão e o recíproco auxílio, e ainda, finalmente, da própria missão natural do matrimônio, querida pela providencial inteligência de Deus Criador, para ser como o vínculo da transmissão da vida, no qual servem os pais como ministros da Onipotência divina. A tudo isto acresce a nova razão de dignidade derivada do Sacramento, mediante a qual o matrimônio cristão se tornou muito mais nobre e foi elevado a tal sublimidade, que se apresentou ao Apóstolo como “um grande mistério”, “em tudo digno de honra” (Cf. Ef 5, 32; Heb 13, 4).
84. A natureza religiosa do matrimônio e o sublime significado da sua graça e da união entre Jesus Cristo e a Igreja exigem dos esposos um santo respeito às núpcias cristãs e um santo zelo por que o casamento que estão para contrair se aproxime o mais possível desse mesmo modelo.
Matrimônio misto
85. Muito faltam neste ponto, por vezes pondo em perigo a própria salvação eterna; os que temerariamente contraem matrimônio misto, de que a providência e o amor materno da Igreja afasta os fiéis por gravíssimas razões, conforme se deduz claramente dos muitos documentos compreendidos naquele cânon do Código onde se lê: “A Igreja proíbe em toda a parte, com grande severidade, que se realize o matrimônio entre duas pessoas batizadas, uma das quais seja católica e a outra pertencente a seita herética ou cismática, e, se houver perigo de perversão do cônjuge católico e da prole, é proibido também pela própria lei divina” (Cod. Jur. Can, c. 1060). E, se a Igreja, por vezes, devido a circunstâncias dos tempos, das coisas e das pessoas, é levada a conceder a dispensa destas severas disposições (salvo o direito divino e removido, quanto possível, com oportunas garantias, o perigo de perversão), só muito dificilmente o cônjuge católico não recebe nenhum dano de tal matrimônio.
86. De fato, dele deriva, não raro, uma triste defecção da religião nos descendentes, ou, pelo menos, a queda fácil naquela negligência religiosa que se chama indiferença, vizinha da incredulidade e da impiedade. Acresce ainda que, nos matrimônios mistos, se torna muito mais difícil aquela viva união dos espíritos, que deve imitar o mistério há pouco relembrado da inefável união da Igreja com Cristo.
87. Facilmente, em verdade, virá a faltar a estreita união dos espíritos que, assim como é sinal e característica da Igreja de Cristo, assim deve ser distintivo, decoro e ornamento do casamento cristão. Costuma efetivamente dissolver-se ou, pelo menos, afrouxar-se o vínculo dos corações onde haja diversidade de pensamento e de afeto acerca das coisas mais altas e supremas que o homem venera, isto é, acerca das verdades e dos sentimentos religiosos. Depois surge o perigo de se enfraquecer o amor entre os cônjuges e de se arruinar a paz e a felicidade da sociedade doméstica, que floresce principalmente na unidade dos corações. E por isso há já muitos séculos o antigo direito romano tinha definido: “O matrimônio é a união do homem e da mulher e consórcio de toda a vida, a comunicação do direito divino e humano (Modestinus, in Dig. livr. XXIII, II: De Ritu nuptiarum, livr. I Regularum).
O divórcio
88. Mas o que sobretudo impede a restauração e a perfeição do matrimônio estabelecido por Cristo Redentor é, como já advertimos, Veneráveis Irmãos, a sempre crescente facilidade dos divórcios. De fato, os defensores do neopaganismo, nada tendo aprendido com a triste experiência, vão sempre atacando com ardor a sagrada indissolubilidade do casamento e as leis que lhe são favoráveis, e pretendem dever declarar-se lícito o divórcio, para que uma nova lei, mais humana, venha substituir as leis antiquadas.
Os vários pretextos
89. Apresentam eles muitas e variadas razões a favor do divórcio, umas provenientes de vício ou culpa das pessoas, outras inerentes às próprias coisas (chamam às primeiras subjetivas e às demais objetivas); em uma palavra, tudo o que torna mais áspera e ingrata a inseparável convivência. Pretendem basear tais razões e leis em muitos fundamentos: em primeiro lugar, o interesse de ambos os cônjuges, quer do inocente, que tem por isso direito de separar-se do cônjuge réu, quer do culpado de delitos, que, por isso mesmo, deve ser afastado de uma união ingrata e coagida; depois, o benefício da prole, que fica privada da boa educação ou perde o fruto dela, afastando-se muito facilmente do caminho da virtude, escandalizada pelas discórdias e outras culpas dos pais; finalmente, o interesse comum da sociedade, visto que este requer que, antes de tudo, se dissolvam de fato os matrimônios que já não servem para obter o fim em vista pela natureza; e pretendem, além disso, que a lei consinta os divórcios, quer para prevenir os delitos que são de recear na convivência de tais cônjuges, quer para evitar que a autoridade das leis e os tribunais continuem a ser objeto de ludíbrio, porque os cônjuges, para obter a desejada sentença de divórcio, ou cometem propositadamente os delitos em virtude dos quais o juiz pode dissolver o vínculo, segundo a lei, ou mentem descaradamente e juram falsamente tê-los cometido, apesar de o juiz ver com clareza a realidade das coisas. Portanto, dizem, as leis devem adaptar-se de qualquer forma a todas essas necessidades e às diferentes condições dos tempos, opiniões dos homens, instituições e costumes das nações. Os motivos apresentados bastariam por si sós, e principalmente se considerados em conjunto, para demonstrar com evidência que se deve absolutamente conceder a faculdade do divórcio por certos motivos.
90. Outros, com maior audácia, são da opinião de que o matrimônio, como contrato meramente privado que é, deve ser entregue ao consenso e ao arbítrio privado dos dois contraentes, como sucede com os outros contratos privados, e assim sustentam que pode ser dissolvido por qualquer motivo.

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