20 de novembro de 2013

Encarnação, Nascimento e Infância de Jesus Cristo - Parte 1 - Meditação 4

CONSIDERAÇÃO IV.

O VERBO ETERNO DE INOCENTE SE FEZ RÉU.

Consolamini, consolamini, popule meus, dicit Deus vester.
Consolai-vos, meu povo, consolai-vos, diz vosso Deus. (Is 40,1)

Antes da vinda do Redentor, gemiam todos os homens, miseravelmente aflitos, sobre a terra. Eram todos filhos da cólera, e não havia quem pudesse aplacar o Senhor justamente irritado por seus pecados. Isso fazia chorar o profeta Isaías: Eis, dizia ele a Deus, eis que estais irritado... Não há ninguém.... que se levante para reter vosso braço vingador (Is 64,5-7). Ele falava verdade: um Deus tinha sido ofendido pelo homem, e este, não passando de mísera criatura, não podia expiar com nenhuma pena sua a ofensa feita a uma Majestade infinita. Era necessário um outro Deus para satisfazer em seu lugar à divina justiça. Mas esse outro Deus não existia; não pode haver mais de um Deus. De outro lado o ofendido não pode satisfazer a si mesmo pela ofensa recebida. Assim a nossa desgraça era irremediável.
Mas, consola-te, ó homem, diz o Senhor por Isaías. Consolai-vos, sim, consolai-vos, meu povo...,pois os vossos males estão terminados (Is 40,1). Deus mesmo achou o meio de salvar-vos contentando ao mesmo tempo a sua justiça e a sua misericórdia: Ei-las que se dão o ósculo da paz, segundo o Salmista (Sl 84,11). Como se realizou essa maravilha? O Unigênito de Deus se fez homem, tomou a forma do pecador e, encarregando-se das dívidas do homem, satisfez plenamente por eles à justiça divina pelos sofrimentos de sua vida e por sua morte. Por esse meio, a justiça e a misericórdia receberam ao mesmo tempo tudo o que reclamavam.
Assim para livrar os homens da morte eterna, Nosso Senhor Jesus Cristo se despojou de certo modo da sua inocência. De inocente se fez réu; isto é: quis aparecer como pecador. Sim, a isso o reduziu o seu amor por nós. Vamos considerar esse grande mistério; mas antes, peçamos a Jesus e Maria nos iluminem para que o façamos com fruto.
I.
Que era Jesus Cristo? Era, responde-nos o apóstolo, santo, inocente, sem mancha (Hb 7,26). Era, digamos ainda melhor: a santidade personificada, a inocência, a pureza, pois que era verdadeiro Filho de Deus, verdadeiro Deus como seu Pai, e tão caro a seu Pai que, nas águas do Jordão, seu Pai declarou ter encontrado nesse Filho todas as suas complacências. Ora, esse Filho amado, querendo livrar os homens de seus pecados e da morte a eles devida, que fez? Apresentou-se a seu Pai para tirar os nossos pecados (1Jo 3,5). Ofereceu-se para satisfazer pelos homens; e então o Pai Eterno, diz S. Paulo, o enviou à terra para se revestir da carne humana e se tornar em tudo semelhante aos homens pecadores (Rm 8,3). O apóstolo ajunta: Pelo pecado (cometido pelos judeus contra Jesus Cristo) Ele condenou o pecado (que reinava) na carne, o que significa, segundo a explicação de S. João Crisóstomo e de Teodoreto, que Deus condenou o pecado a perder o império que tinha sobre os homens condenando à morte seu divino Filho, que, embora revestido de carne aparentemente manchada de pecado, não era menos santo e inocente.
Assim, para salvar os homens e para ver ao mesmo tempo sua justiça satisfeita, Deus condenou seu próprio Filho a uma vida penosa e a uma morte cruel! — É isso verdade? É um artigo de fé. S. Paulo nos assegura com as palavras: Deus não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós (Rm 8,32). E Jesus Cristo mesmo o declarou: Deus amou de tal modo o mundo, que lhe deu seu Filho unigênito (Jo 3,16). Célio Rodígino narra num certo Dejótaro que sendo pai de vários filhos, e querendo deixar toda a herança a um filho que ele preferia a todos os outros, cometeu o bárbaro crime de degolar a estes últimos. Deus fez justamente o contrário: sacrificou seu dileto Filho, o seu Unigênito, para salvar criaturas desprezíveis e ingratas. Pois Deus amou de tal modo o mundo que entregou seu unigênito Filho!
Meditemos bem estas palavras de Nosso Senhor: Deus amou de tal modo o mundo. A palavra de tal modo lá está, diz S. João Crisóstomo, para exprimir a grandeza desse amor. Como? Digna-se um Deus amar os homens, miseráveis vermes da terra, que levaram até à revolta a sua ingratidão para com Ele? E ama-os ao ponto de dar por eles seu unigênito Filho! Não entregou por eles um de seus servos, ajunta o Santo Doutor, não um anjo, nem um arcanjo, mas o seu próprio Filho, o seu unigênito Filho, a quem ama como a si mesmo. Esse Filho Ele o deu, e como? Pobre, humilhado, abandonado de todos, entregou-o às mãos dos algozes, para ser tratado como um malfeitor e pregado num patíbulo infame! — Ó graça, ó força do amor de Deus, exclama aqui S. Bernardo. Ah! quem se não enterneceria ao saber que um rei, para libertar um escravo, se viu constrangido a dar a morte a seu filho único, ao objeto de todas as suas afeições, a um filho que amava como a si mesmo? Se um Deus o não tivesse feito, quem poderia, exclama S. João Crisóstomo, quem poderia superá-lo ou imaginá-lo?
Mas, Senhor, parece uma injustiça condenar à morte um fi-lho inocente para salvar o escravo que vos ofendeu. Segundo a razão humana acusaríamos certamente de enorme injustiça o pai que fizesse morrer o filho inocente, para livrar indignos servos da morte devida a seus crimes. É a reflexão de Salviano. Mas não houve injustiça na conduta divina, porque o Filho mesmo se ofereceu a seu Pai para pagar as dívidas dos homens. Foi imolado porque Ele mesmo quis, diz Isaías. Eis pois Jesus que se sacrifica voluntariamente por nós, como vítima de amor. Ei-lo semelhante a um tenro cordeiro sob a mão do tosquiador; e embora inocente submete-se, sem abrir a boca, a todos os opróbrios, a todos os tormentos que os homens lhe infligem: Como um cordeiro diante do que o tosquia, guardará silêncio e não abrirá sequer a sua boca, continua o profeta (Is 53,7). Eis enfim o nosso amantíssimo Salvador que, para nos salvar, quer padecer a morte e todas as penas que temos merecido: Verdadeiramente Ele tomou sobre si as nossas fraquezas, e ele mesmo carregou com as nossas dores (Is 53,4). Levado ao desejo de garantir a salvação dos homens, diz S. Gregório de Nazianzo, ele não recua diante dos suplícios feitos para os maiores criminosos.
E quem pôde fazer isso? pergunta S. Bernardo. Qual foi a causa desse prodígio: um Deus que morre por suas criaturas! Fê-lo o amor de Deus pelos homens. O Santo considera nosso amável Salvador no momento em que se deixou prender e ligar pelos soldados no jardim de Getsêmani, como narra S. João: Prenderam a Jesus e o ataram: “Senhor, exclama ele, que há de comum entre vós e as cordas?” Senhor, diz ele, eu vos vejo atado como um criminoso por essa gentalha que vos quer conduzir à morte! Mas, ó meu Deus, que tendes a fazer com as cordas e as cadeias? As cadeias são para os malfeitores e não para vós, que sois inocente, que sois o Filho de Deus, a inocência e a santidade mesma. A isso replica S. Lourenço Justiniano: As cordas que arrastaram Jesus à morte não foram as cordas com que os soldados o amarraram, foi o seu amor pelos homens. “Ó caridade, exclama ele a seguir, quão forte é o teu vínculo que pôde prender um Deus!”
Lançando em seguida seus olhares sobre a injusta sentença de Pilatos, que condena Jesus à cruz depois de o haver declarado várias vezes inocente, S. Bernardo não pode reter as lágrimas e assim se dirige ao Salvador: Ah! Senhor, ouço esse juiz iníquo que vos condena a morrer na cruz! Mas, que mal fizestes? que crime cometestes para merecer suplício tão cruel e tão infame reservado aos mais hediondos facínoras? Ah! entendo, meu Jesus, continua ele, entendo qual é o vosso crime; é o excesso do vosso amor pelos homens. Sim, é antes esse amor do que Pilatos, que vos condena à morte; pois que vós mesmo quisestes morrer para pagar a pena devida aos homens.
Ao chegar ao tempo de sua Paixão, nosso divino Redentor suplicou a seu Pai o glorificasse logo aceitando o sacrifício de sua vida: E agora, meu Pai, glorificai-me (Jo 17,5). “Mas como! exclama admirado S. João Crisóstomo, chamais glória vossa uma Paixão e uma morte, acompanhadas de tantas dores e humilhações?” E lhe parece que Jesus lhe responde: “Sim, no meu amor pelos homens, tenho por glória sofrer e morrer por eles”.
II.
Dizei aos pusilânimes: Tomai ânimo e não temais; eis que vosso Deus trará a vingança e as represálias. Deus mesmo virá, e vos salvará (Is 35,4). Não temas, pois, diz o profeta, já não desconfieis, pobres pecadores. Como podeis temer não serdes perdoados quando o Filho de Deus desce do céu para vos salvar, e com o sacrifício de sua vida paga a Deus o que a sua justa vingança tinha direito de exigir por vossos pecados? Se as vossas ações são insuficientes para aplacar a cólera divina, eis que a aplaca esse Menino que vedes deitado sobre palha, a tiritar de frio, a chorar. Com suas lágrimas Ele aplaca Aquele a quem ofendestes. “Não tendes razão de vos afligir, ajunta S. Leão, por causa da sentença de morte pronunciada contra vós, pois que hoje nasceu-vos Aquele que vos trás a vida”. E S. Agostinho: “Eis um dia de doçura para os penitentes: hoje apagou-se o pecado; que pecador poderia ainda desesperar de sua salvação?” Se não podeis prestar à justiça divina a satisfação que lhe deveis, eis que Jesus a oferece em vosso lugar: começou a fazer penitência por vós nessa gruta, continuará essa obra de caridade durante toda a sua vida, e a consumará na cruz, pregando toda a sua vida, e a consumará na cruz, pregando nela, como diz S. Paulo, o decreto de vossa condenação para o apagar com seu sangue: Cancelando o quirógrafo do decreto que nos era desfavorável, que era contra nós, e o aboliu inteiramente, encravando-o na cruz (Cl 2,14).
Diz o mesmo apóstolo que, morrendo por nós, Jesus Cris-to se fez nossa justiça. E isso, explica S. Bernardo, no sentido de que Ele nos lavou de nossos pecados. E com efeito, aceitando por nós as dores e a morte de Jesus Cristo, Deus está obrigado por justiça, em virtude dum pacto entre Ele e o Salva-dor, a conceder-nos a remissão de nossas dívidas. Aquele que não conhecia o pecado, diz ainda S. Paulo, Deus o fez vítima do pecado, a fim de que sejamos por Ele justos aos olhos de Deus (2Cor 5,21). A inocência mesma tornou-se vítima dos nossos pecados, a fim de que, em virtude de seus méritos, e segundo toda a justiça, tivéssemos direito ao perdão. Eis por que Davi pedia a Deus que o salvasse, não só segundo a sua misericórdia, mas ainda segundo a sua justiça: Livrai-se na vossa justiça (Sl 30,12).
Deus sempre teve um extremo desejo de salvar os peca-dores. Já na antiga lei Ele os seguia dizendo: Transgressores dos meus preceitos, entrai em vós mesmos (Is 46,8). Pensai nos benefícios que de mim recebestes, no amor que vos testemunhei, e cessai de ofender-me. Voltai-vos a mim (Zc 1,3), e eu me voltarei a vós para vos abraçar. Vós que sois meus filhos, por que vos quereis perder e condenar à morte eterna? voltai-vos a mim, e vivereis (Ez 21,31).
Enfim a misericórdia divina do Senhor o fez descer do céu à terra, para nos subtrair à morte; assim afirma S. Zacarias: Pelas entranhas da misericórdia do nosso Deus, graças à qual nos visitou do alto o Sol nascente (Jesus) (Lc 1,78). Mas é pre-ciso refletir aqui no que diz S. Paulo: antes que Deus se fizesse homem, Ele era cheio de misericórdia por nós, mas não podia sentir compaixão de nossas misérias, porque a compaixão é um sentimento doloroso, e Deus é incapaz de dor. Ora, segundo o apóstolo, o Verbo Eterno se fez homem, sensível à dor como os outros homens para poder não só salvar-nos mas também ter compaixão de nós: Não temos um pontífice que não possa compadecer-se das nossas enfermidades, mas que foi tentado em tudo à nossa semelhança, exceto o pecado. Ele deveu em tudo ser semelhante a seus irmãos, a fim de ser compassivo (Hb 2,17).
Quão grande é a compaixão de Jesus Cristo para com os pobres pecadores! Disso nos dá uma idéia, tomando os traços daquele bom Pastor que vai à procura da velha desgarrada, e que, depois de achá-la, convida seus amigos a regozijarem-se com ele: Congratulai-vos comigo, porque achei a minha ovelha que se havia tresmalhado (Lc 15,6). Toma-a sobre os ombros e aperta-a a si de medo de tornar a perdê-la.
É por causa dessa compaixão que Ele se representou sob o emblema daquele bom pai que vendo de volta, e prostrado a seus pés, o filho pródigo que o havia deixado, não o repele, mas o abraça, o cobre de carícias e quase fica fora de si de consolação e ternura vendo-o arrependido. Correndo, lançou-lhe os braços ao pescoço e beijou-o (Lc 15,20). É essa com-paixão que faz que, expulso duma alma pelo pecado, não se afasta, mas permanece à porta de seu coração, em que não cessa de bater por meio de suas graças para nele entrar: Estou à porta, diz Ele, e bato (Ap 3,20). É essa compaixão que o fazia dizer a seus discípulos, cujo zelo indiscreto queria tirar vingança dos que o haviam repelido: Vós não sabeis de que espírito sois (Lc 6,53). Vedes qual é minha compaixão para com os pecadores e desejais vingança? Ide; retirai-vos, porque não estais animados do meu espírito. É essa compaixão enfim que o fez dizer: Vinde a mim todos os que trabalhais e vos achais carregados, e eu vos aliviarei (Mt 11,28).
E de fato, com que ternura esse amável Redentor perdoou a Madalena logo que ela reconheceu suas faltas, e a converteu numa grande santa! Com que bondade perdoou ao paralítico, ao qual restituiu ao mesmo tempo a saúde do corpo! Com que bondade se portou sobretudo para com a mulher adúltera! Os sacerdotes levaram-lhe essa pecadora para que Ele a condenasse. Mas, voltando-se para ela, disse-lhe: Ninguém te condenou?... nem eu te condenarei (Jo 8); isto é: se nenhum daqueles que te trouxeram aqui te condenou, como poderia eu fazê-lo, eu que vim salvar os pecadores? Vai em paz e não peques mais.
Nada temamos de Jesus Cristo; temamos tudo de nós mesmos, de nossa obstinação, se depois de termos ofendido o Senhor, recusarmos obedecer à sua voz, que nos convida à reconciliação. Meditemos estas palavras de S. Paulo: Quem deveria condenar-nos? O Cristo Jesus que morreu... e que continua a interceder por nós (Rm 8,34). Se quisermos obstinar-nos no pecado, Jesus Cristo será obrigado a condenar-nos; mas se nos arrependermos do mal que fizemos, que medo havemos de ter? Quem nos há de condenar? Não é o nosso próprio Salvador que morreu para não nos condenar? Para perdoar a nós, não quis perdoar a si mesmo, diz S. Bernardo.
Vai, pois, pecador, ao estábulo de Belém, e agradece a Jesus Menino que treme de frio por ti naquela gruta, que geme e chora por ti sobre a palha. Agradece a teu divino Redentor que veio do céu para te chamar e salvar. Se desejas o perdão, Ele te espera no presépio para to conhecer. Apressa-te, pois, pede-lhe perdão e depois não percas a lembrança do amor que Jesus te testemunhou. Não te esqueças, diz o profeta, da imensa graça que te fez tornando-se fiador por ti junto de Deus e tomando sobre si o castigo que havias merecido. Não o esqueças e dá-lhe o teu coração. E saibas que, se o amares, os teus pecados não te impedirão de receber de Deus as mais abundantes e assinaladas graças, com que costuma favorecer as almas que lhe são mais caras. Tudo contribui para o nosso bem (Rm 8,28), diz o apóstolo; mesmo os nossos pecados, ajunta a Glosa. Sim, mesmo a lembrança das suas faltas é útil ao pecador que as chora e detesta, porque assim se torna mais humilde e mais grato para com Deus que o acolhe com tanto amor apesar da sua indignidade. Haverá maior alegria no céu por um só pecador que se converte, disse Jesus, do que por noventa e nove justos (Lc 15,7).
Mas qual é o pecador que causa mais alegria no céu do que um grande número de justos? Aquele que, cheio de reconhecimento para com a bondade divina, se consagra com fervor e sem reserva ao celeste amor, como o fizeram um S. Pau-lo, uma S. Maria Madalena, uma S. Maria do Egito, um S. Agostinho, uma S. Margarida de Cortona. Para não falar senão desta última, ainda que ela tivesse passado vários anos no pecado, Deus lhe mostrou no céu o seu lugar colocado entre os serafins, e durante a sua vida não cessou de lhe prodigalizar sempre novas graças. Vendo-se tão favorecida por Deus, disse-lhe um dia: “Senhor, concedeis-me tantas graças! Já vos esquecestes das ofensas que vos fiz? — Acaso ignoras, respondeu-lhe o Senhor, a minha promessa de esquecer todos os ultrajes a mim feitos por uma alma que se arrepende sinceramente?” E de fato, é justamente isso que Ele declarou pelo profeta Ezequiel: Se o ímpio fizer penitência, eu não me lembrarei mais de nenhuma das iniqüidades que praticou (Ez 17,22).
Concluamos. Os pecados cometidos pois não nos impedem de tornarmo-nos santos. Deus oferece-nos todos os seus socorros contanto que os desejemos e os peçamos. Que resta ainda? Que nos demos inteiramente a Deus, que lhe consagremos ao menos os dias que ainda nos restam de vida. Eia, pois, que fazemos? Se não avançamos, a culpa é nossa, não de Deus. Façamos com que essas misericórdias e esses ternos convites que Deus nos faz, não sejam para nós uma fonte de remorsos e desespero na hora da morte, quando não tivermos mais tempo de fazer coisa alguma, quando chegar a noite, da qual diz Jesus: Vem a noite, quando ninguém pode trabalhar (Jo 9,14).
Recomendemo-nos à SS. Virgem Maria, que, segundo S. Germano, se gloria de santificar os pecadores mais perdidos obtendo-lhes não só uma graça ordinária de conversão, mas os mais assinalados favores. E Ela bem o pode fazer, pois que todas as súplicas que dirige a Jesus, são pedidos duma mãe a seu filho: “Gozando junto de Deus duma autoridade verdadeiramente material, obtendes aos maiores pecadores exímia graça de perdão”; assim fala o santo Arcebispo. Ela mesma nos anima a recorrermos à sua intercessão com as palavras que a Santa Igreja lhe põe nos lábios: Em meu poder estão os tesouros para enriquecer os que me amam (Eclo 24,25). “Vinde to-dos a mim, porque em mim, achareis toda a esperança de salvar-vos e de salvar-vos como santos”.
Afetos e Súplicas.
Ó meu Redentor e meu Deus, quem sou eu, para que me tenhais amado tanto? Que é que vos obriga a amar-me assim? Que tendes recebido de mim senão desprezos e desgostos, que antes vos deveriam obrigar a abandonar-me e a expulsar-me para sempre de vossa presença? ah! Senhor, aceito qual-quer outro castigo, mas não esse. Se me abandonardes e me privardes de vossa graça, já não poderei amar-vos. Não pre-tendo fugir do castigo, mas quero amar-vos, e quero amar-vos muito. quero amar-vos como é obrigado a amar-vos um peca-dor que, pagando com ingratidão tantos favores especiais e tantas provas de amor da vossa parte, vos abandonou tantas vezes e renunciou a vossa graça e ao vosso amor por prazeres miseráveis, efêmeros e envenenados.
Ó querido Menino, perdoai-me; arrependo-me de todo o coração de vos haver tantas vezes desgostado. Mas, meu Jesus, sabei que me não contento com um simples perdão. Desejo ainda a graça de vos amar muito, quero compensar, quanto possível, com o meu amor e minha ingratidão passada. Uma alma inocente ama-vos como inocente, agradecendo-vos por a terdes preservado da morte do pecado. Mas eu devo amar-vos como um pecador, isto é, como um servo rebelde, como um criminoso, condenado ao inferno tantas vezes quantas o mereci, e tantas vezes agraciado por vossa misericórdia, que me pôs em estado de salvar-me, me enriqueceu de luzes, de socorros e de convites para me santificar. Ó Redentor de minha alma, minha alma já se enamorou de vós, já vos ama. Vós me tendes amado tanto; vencido pelo vosso amor, não posso resistir por mais tempo a tantas finezas. Rendo-me enfim e ponho em vós todo o meu amor. Amo-vos, pois, Bondade infinita, amo-vos, Deus infinitamente amável! Aumentai sempre mais as chamas, multiplicai sem cessar as setas de amor que traspassam o meu coração. Por vossa glória, fazei-vos amar muito por este coração que muito vos tem ofendido.
Maria, minha Mãe, que sois a esperança e o refúgio dos pecadores, socorrei um pecador que quer ser grato a seu Deus; fazei que o ame e o ame muito.

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