26 de novembro de 2013

Encarnação, Nascimento e Infância de Jesus Cristo - Parte 1 - Meditação 10

CONSIDERAÇÃO X.

DO NASCIMENTO DE JESUS CRISTO.

PARA A NOITE DE NATAL.

Evangelizo vobis gaudium magnum..., quia natus est vobis hodie Salvator.
Anuncio-vos uma grande alegria; nasceu-vos hoje um Salvador (Lc 2,10).

Anuncio-vos uma grande alegria. Eis o que disse o anjo aos pastores de Belém, e eis também o que vos tenho dizer hoje, almas fiéis: Trago-vos uma nova de grande alegria. E que nova de maior alegria pode dar-se a pobres exilados, condena-dos à morte, do que a da vinda do Salvador, que quer não só livrá-los da morte, mas também obter a sua entrada na pátria? essa é precisamente a nova que vos trago: Nasceu-vos hoje um Salvador. Nesta noite nasceu Jesus Cristo, e nasceu por vós, a fim de vos livrar da morte eterna e de vos abrir o céu, vossa pátria, donde vos tinham banido os vossos pecados.
Mas a fim de que o reconhecimento para com esse Redentor recém-nascido vos decida a amá-lo doravante, permiti vos ponha ante os olhos as circunstâncias desse acontecimento, dizendo-vos onde nasceu, como nasceu, e onde se acha esta noite; podereis então vir lançar-vos a seus pés e agradecer-lhe tão grande benefício e tanto amor. Mas antes peçamos a Jesus e Maria nos iluminem.
I.
Permiti que antes vos historie em poucas palavras o nas-cimento desse Rei do universo, que desceu do céu para a vossa salvação.
Otávio Augusto, imperador romano, querendo conhecer as forças de seu império, mandou fazer um recenseamento geral de todos os seus súditos. Para esse fim prescreveu a todos os governadores, e entre outros a Cirino, na Judéia, obrigassem os habitantes de suas respectivas províncias a se fazerem inscrever cada um em seu lugar de origem e a pagarem ao mesmo tempo um tributo em sinal de sujeição. É o que atesta S. Lucas. Publicada que foi essa ordem, José obedeceu pronta-mente e sem esperar o parto de sua santa Esposa, o qual es-tava próximo. Obedeceu logo e se pôs a caminho com Maria, que levava em seu casto seio o Verbo encarnado, para se inscrever na cidade de Belém. A viagem foi longa; pois, segundo os autores, a distância era de noventa milhas, isto é, de quatro dias; foi além disso bem penosa porque foi preciso atravessar uma região montanhosa, os caminhos eram maus, era na estação dos ventos, chuvas e frio.
Quando um rei entra pela primeira vez numa cidade de seu reino, quantas honras não lhe prestam! quantos arcos de triunfo, quantos aparatos de todo o gênero! Prepara-te, pois, ó ditosa Belém! prepara-te para receber dignamente o teu Rei: o profeta Miquéias te anuncia que Ele vai visitar-te, esse grande Rei, que é o soberano Senhor, não só da Judéia, mas do mundo inteiro. Saibas, diz-te o profeta, que entre todas as cidades do universo, tu és a cidade afortunada que se escolheu para lugar de seu nascimento o Rei do céu vindo à terra para reinar não sobre a Judéia, mas sobre todos os corações dos homens na Judéia e em todos os lugares: E tu Belém Efrata, tu és pequenina entre os milhares de Judá; mas de ti é que há de sair aquele que há de reinar em Israel.
Mas eis que chegou a Belém dois pobres peregrinos José e Maria que leva em seu seio o Salvador do mundo. Entram na cidade e apresentam-se ao oficial imperial para pagar o tributo e se inscrever na lista dos vassalos de César, lista em que a-manhã será inscrito também o nome do filho de Maria, Jesus Cristo, que é o senhor de César e de todos os príncipes da terra. Mas quem os reconheceu? quem lhes foi ao encontro para honrá-los? quem os saudou? quem os acolheu? Ah! veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Vão eles como pobres, e como tais são desprezados; tratam-nos pior do que os outros pobres, todos os repelem. Por que? porque, como diz S. Lucas, enquanto lá estavam, chegou o momento em que Maria devia dar à luz. Foi naquele lugar e durante aquela noite que o Verbo encarnado quis nascer e tornar-se visível neste mundo; Maria o sabia e disso avisou seu casto esposo. José apressou-se a encontrar hospedagem conveniente em qualquer casa particular, a fim de não ser obrigado a conduzir a jovem Maria ao hotel, que não era lugar decente para uma jovem que ia dar à luz, tanto mais porque ele estava repleto de viajantes. Mas não achou ninguém que se dignasse ouvi-lo; mas de um, sem dúvida, o taxaram de imprudente por levar consigo sua esposa no estado em que se achava, e isso durante a noite e no meio de tão grande afluência de povo. Enfim, para não passar a noite na rua, foram constrangidos a apresentar-se na hospedaria; mas, ah! ela estava lá invadida por uma multidão de pobres que nela se refugiaram; forçaram-nos a retirar-se dizendo que não havia lugar para eles. Havia lugar para todos, mesmo para os mais pobres, só não para Jesus Cristo!
Essa hospedaria é a figura de tantos corações ingratos que se abrem a uma multidão de miseráveis criaturas e permanecem fechados para Deus. Quantos amam seus pais, seus amigos e até os animais e não amam a Jesus Cristo e não fazem caso de sua graça nem de seu amor! A SS. Virgem disse um dia a uma alma devota: “Foi por disposição particular de Deus que não houve hospedagem entre os homens nem para mim nem para meu Filho; foi a fim de que as almas amantes oferecessem um asilo a Jesus e o convidassem com ternura a habitar em seus corações”.
Prossigamos a nossa narração. Vendo-se assim repelidos de todas as partes, José e Maria saíram da cidade para procurar ao menos algum abrigo fora de seus muros. Caminham ao escuro, giram, espiam; finalmente divisam uma gruta cavada na montanha abaixo da cidade. Segundo Barradas, Beda e Brocardo, foi esse o lugar em que nasceu Jesus Cristo: era uma escavação feita no rochedo, separada da cidade, uma espécie de caverna que servia de abrigo aos animais. — Meu caro José, disse então Maria, não é preciso ir mais longe; entremos nesta gruta e fiquemos aqui. — Mas como? respondeu então José; minha cara esposa, não vês que a gruta é aberta, fria e úmida, que a água escorre de todos os lados? Não vês que isto é um estábulo e não habitação para homens? Como queres aqui ficar a noite inteira e aqui dar à luz o teu divino Filho? — E não obstante, é verdade, replicou Maria, que este estábulo é o palácio em que o Filho eterno de Deus resolveu nascer.
Oh! que terão dito os anos vendo entrar a Mãe de Deus nessa gruta para lá dar à luz o Rei dos reis? Os príncipes da terra nascem em aposentos resplandecentes de ouro; preparam-lhes berços enriquecidos de pedrarias, de panos do linho mais fino, e são rodeados dos primeiros senhores do reino. Mas o Rei do céu vem ao mundo num estábulo frio e sem lu-me, só tem trapos pobres para se cobrir, e um miserável pre-sépio com um pouco de palha para repousar seus membros! — Onde está a sua corte? pergunta S. Bernardo; onde está o seu trono? Lá não vejo senão dois animais para lhe fazerem companhia, e a sua manjedoura para lhe servir de berço. — Ó gruta ditosa, que tiveste a ventura de ver nascer o verbo divino! Ó venturoso presépio, que tiveste a honra de receber o Senhor do universo! Ó palha afortunada, que serviste de leite àquele que repousa sobre as asas dos Serafins! Ah! ao considerarmos como Jesus quis nascer no meio de nós, deveríamos todos abrasar-nos de amor; ao ouvirmos os nomes: gruta, presépio, palha, leito, vagido, deveríamos, recordando-nos do nascimento de nosso Redentor, sentir os corações traspassados como de setas inflamadas. Sim, fostes felizes, ó gruta, ó presépio, ó palha! porém bem mais felizes são os corações que amam com fervor e ternura esse doce e amável Salvador, e que, inflama-dos de amor, o recebem na santa comunhão! Oh! com que de-sejo e contentamento vem Jesus repousar num coração que o ama!
II.
Apenas entrada na gruta, Maria se põe em oração; e tendo chegado a hora do nascimento do Salvador, desata os cabelos em sinal de respeito, e os derrama sobre os ombros. De repente vê uma grande luz; o seu coração exulta de gáudio celeste; abaixa os olhos, e, ó céu! que vê? vê sobre o solo uma criancinha, tão bela, tão amável, que arrebata; mas ele treme, estende as mãos para sua Mãe indicando que quer que Ela o tome em seus braços, segundo o que foi revelado a S. Brígida. Maria chama a José dizendo: “Vem ver o Filho de Deus que acaba de nascer”. José vem logo, e, vendo a Jesus pela primeira vez, adora-o derramando um rio de doces lágrimas. Em seguida a SS. Virgem toma com respeito seu caro Filho, conserva-o em seus braços com uma alegria misturada de terna compaixão, e põe-se a acalentá-lo, apertando-o contra o seu seio e cobrindo-o de seus beijos maternais. Considerai a devoção, a ternura, o amor que encheram o coração de Maria quando ela viu em seus braços, em seu regaço, o Senhor do universo, o Filho do Padre eterno, o qual quis também fazer-se filho dela, e que entre todas as mulheres a havia escolhido por Mãe. Ela o adora como seu Deus; beija-lhe os pés como a seu Rei, e as faces como a seu filho. Em seguida procura cobri-lo e enfaixá-lo; mas, ah! como são grosseiros e rudes aqueles pobres panos! ademais são frios, são úmidos; e nessa gruta não há fogo para aquecê-los.
Vinde, reis, imperadores; vinde todos vós, poderosos da terra! vinde homenagear o vosso supremo Senhor, que por amor de vós quis nascer tão pobre nessa caverna. — Mas não vejo ninguém apresentar-se! Não, ninguém: o Filho de Deus veio ao mundo, e o mundo não o quis conhecer.
Mas se não vêm os homens, vêm os anjos prosternar-se aos pés de seu soberano Senhor; o Padre eterno assim o ordenou para honrar seu divino Filho: Adorem-no todos os anjos de Deus, exclama o Salmista. Eles vêm em grande número e, louvando o Senhor, cantam em transportes de alegria: Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens de boa vontade. Sim, glória à divina misericórdia, que quer que o Senhor, em vez de punir os homens rebeldes, tome sobre si a pena de seus pecados, e que os salve! Glória à divina sabedoria, que achou o meio de satisfazer à justiça e libertar o homem da mor-te por ele merecida! Glória ao poder divino, que tão admiravelmente triunfou do inferno! Suportando a pobreza, as dores, os desprezos e a morte, o Verbo eterno conquistou os corações de maneira tal que, ardendo em desejo de conhecer o seu a-mor, uma multidão de jovens dos dois sexos, de nobres personagens e até de príncipes, abandonou por Ele honras, riquezas e todas as coisas não excetuando a vida. Glória enfim ao divino amor, que moveu um Deus a fazer-se criança, pobre, humilde, a levar vida penosa e a sofrer morte cruel para mostrar aos homens o afeto que lhes tinha, e para ganhar o seu amor!
Nesse estábulo, diz S. Lourenço Justiniano, vemos a majestade divina como que aniquilada; vemos um Deus que é a sabedoria personificada levando o amor aos homens, por as-sim dizer, até a loucura.
III.
E agora Maria convida todos os homens, nobres e plebeus, ricos e pobres, santos e pecadores, a entrarem na gruta de Belém, a adorarem seu divino Filho e a lhe beijarem os pés. — Entrai, pois, almas cristãs, vinde ver sobre a palha o Criador do céu e da terra sob a forma duma criancinha, dum menino resplandecente de beleza e de brilhante luz. Agora que Ele nasceu na gruta e que está reclinado sobre palha, esse lugar já nada tem de repelente, mas tornou-se um paraíso. Entremos e não temamos.
Jesus nasceu para todos, para quem o deseja. Eu sou, diz Ele nos Cânticos, eu sou a flor dos campos e o lírio dos vales. Ele se diz Lírio dos vales, para nos dar e entender que, tendo Ele nascido tão pobre, só os humildes o podem achar. Eis por-que o anjo não anunciou o seu nascimento a César ou a Herodes, mas a pobres e humildes pastores. De resto, segundo o comentário do Cardeal Hugo, Ele se diz Flor dos campos, por-que é acessível a todos. As flores dos jardins são reservadas s seu dono; não é permitido a todos colhê-las nem mesmo vê-las; os muros que as cercam, a isso se opõem. As flores dos campos, ao contrário, são expostas à vista de todos os transe-untes, e cada um as pobre colher: assim Jesus quis estar ao alcance de todos que o desejam achar.
Entremos; a porta está aberta e, acrescenta S. João Cri-sóstomo, “não há guarda para dizer: Não é hora”. Os reis da terra fecham-se em seus palácios, e esses palácios são rodeados de soldados; não é fácil chegar-se a eles: quem lhes quer falar tem de suportar aborrecimentos: Venha em outra ocasião, agora não há audiência. Jesus Cristo não é assim: fica naque-la gruta, e sob a forma duma criança para atrair docemente todos os que se apresentam; a gruta está aberta, sem guardas e sem portas, de sorte que cada um pode entrar à vontade e em qualquer tempo para ver esse Rei-menino, falar-lhe e até abraçá-lo, se o ama e deseja.
Entrai, pois, almas cristãs, vinde ver no presépio sobre palhas esse tenro Menino que chora. Vêde como é belo; vêde que luz irradia, que amor respira; seus olhos enviam setas de fogo aos corações que o desejam; seus vagidos são chamas para toda a alma que o ama; “o estábulo e o presépio, diz S. Ber-nardo, vos clamam que ameis aquele que tanto vos amou”. Amai um Deus que é digno de amor infinito e que desceu dos céus, se fez menino, se fez pobre, para vos mostrar seu amor e ganhar o vosso por seus sofrimentos.
Se lhe perguntardes: Ah! Menino encantador! dizei-me, de quem sois Filho? — Ele responderá: “Minha Mãe é essa Virgem toda bela e toda pura que está perto de mim. — E quem é o vosso Pai? — Meu Pai é Deus. — E como! vós sois o Filho de Deus, e nasceis em tanta pobreza e humilhação? quem poderá jamais reconhecer-vos? que caso farão de vós? — Não, responde Jesus, a santa fé me fará conhecer pelo que sou, e me fará amar pelas almas que vim resgatar da morte e inflamar de amor. Não vim para ser temido, mas amado; e se é como criança pobre e humilde que me mostro aos vossos olhos pela primeira vez, é para que me ameis mais, vendo a que humilhação me reduziu o amor que vos tenho. — Mas, dizei-me, amável Menino, porque girais assim os vossos olhos ao redor de vós? que estão olhando? Ouço-vos suspirar! dizei-me: porque suspirais? Ó Deus, vejo-vos chorar! dizei-me: porque chorais? — Ah! me responde Jesus, olho ao redor de mim, para ver se encontro uma alma que me deseje. Suspiro, porque quisera ver ao meu lado um coração ardente de amor por mim, como eu ardo de amor por ele. Choro, sim, e eis porque choro: porque não vejo, ou vejo bem poucas almas e corações que me procuram e que me querem amar!
Exortação para o beijamento dos pés do divino
Menino em uso em algumas igrejas.
Levantai-vos, almas fiéis; Jesus vos convida esta noite a virdes lhe beijar os pés. Os pastores que o foram visitar no estábulo de Belém levaram-lhe seus presentes; é preciso que lhe ofereçais também os vossos. Mas que lhe ides oferecer? Escutai-me: o mais agradável presente que possais oferecer a Jesus, é um coração arrependido e amante. Eis, pois, os senti-mentos que cada um lhe deve exprimir:
Afetos e Súplicas.
Vendo-me manchado de tantos pecados, não teria a ousa-dia de aproximar-me de vós, Senhor, se me não convidásseis com tanta bondade; mas já que me chamais tão amorosamente, não quero recusar o favor que me fazeis. Não, não quero acrescentar às minhas faltas esta nova ingratidão para convosco; depois de vos haver tantas vezes voltado as costas, não quero por falta de confiança resistir a um apelo tão doce, tão gracioso. Mas sabeis que sou extremamente pobre; nada tenho para vos oferecer. Não tenho outra coisa que o meu miserável coração, que venho trazer-vos. É verdade que vos ofendi outrora, mas hoje me arrependo, e vo-lo ofereço arrependido. Sim, adorável Menino, arrependo-me de vos haver contristado. Eu o confesso, sou o bárbaro, o traidor, o ingrato, que vos causou tantas dores e vos fez derramar tantas lágrimas no estábulo de Belém; mas as vossas lágrimas são a minha esperança. Sou um pecador indigno de perdão; mas tenho a vós que, sendo Deus, vos fizestes menino para perdoar-me. Ó Pai eterno, se mereço o inferno, olhai para as lágrimas que vosso Filho inocente derrama para me obter misericórdia. Não recusais nada às preces de Jesus Cristo; atendei-o pois que implora de vós o meu perdão nesta noite, que é uma noite de alegria, uma noite de salvação, uma noite de perdão. — Ah! caro Menino, meu Jesus, espero de vós o perdão; mas não me basta o perdão dos meus pecados: nesta noite concedeis grandes graças às almas; eu também desejo uma grande graça que deveis fazer-me, a graça de vos amar. Agora que estou arrependido aos vossos pés, abrasai-me todo de vosso santo amor, e prendei-me a vós; mas prendei-me de tal forma que me não possa mais separar de vós. Amo-vos, ó meu Deus feito menino por mim, mas amo-vos pouco; quero amar-vos muito, a vós compete fazer que assim seja. Venho beijar-vos os pés e trazer-vos meu coração; eu vo-lo entrego, não o quero mais. Transformai-o e guardai-o para sempre. Não mo deis mais, pois se o puserdes em minhas mãos, temo que vos torne a trair.
SS. Virgem Maria, vós que sois a Mãe desse divino Meni-no, sois também a minha Mãe: em vossas mãos deposito meu pobre coração, apresentai-o a Jesus. Se vós lho apresentar-des, Ele o não rejeitará. Apresentai, pois, meu coração a Jesus, ó minha Mãe, e pedi que o aceite.

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