[Sermão] O culto dos santos, das relíquias e imagens
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
Ave Maria…
Fazemos hoje a Solenidade externa da Festa de Todos os Santos, celebrada no dia 1º de novembro.
“Laudate Dominum in sanctis ejus.” Louvai
o Senhor em seus santos, nos diz o Salmo 150 na Vulgata. Esse versículo
da Sagrada Escritura descreve com precisão a natureza da veneração
prestada aos santos pelos católicos, desde os primeiros séculos. Ao
venerar os santos glorificamos a Deus, louvamos a Deus em seus santos.
Veremos porque é possível cultuar os santos, os benefícios que derivam
do culto dos santos, de suas imagens e relíquias.
É bem conhecida a objeção dos
protestantes ao culto prestado aos santos. E, em geral, quanto mais
ignorante um protestante, mais virulento será seu ataque ao culto dos
santos. A heresia protestante diz que o culto dos santos não pode se
realizar em virtude de três objeções, basicamente. A primeira delas
consiste em afirmar que o culto dos santos se contrapõe ao fato de que
NSJC é o único mediador. São Paulo na sua 1ª Epístola a Timóteo afirma:
“há um só Deus e só há um mediador entre Deus e os homens, que é Jesus
Cristo homem, que se deu a si mesmo para redenção de todos.” Não resta
dúvida de que São Paulo estabelece NS como o único mediador. Ele faz
isso nos versículos 5 e 6 do capítulo 2. Nos versículos precedentes, ele
escreve a Timóteo: “Eu te rogo, pois, antes de tudo, que se façam
súplicas, orações, petições, ações de graças por todos os homens.” Em
seguida, diz: “Isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, que
quer que todos os homens se salvem e que cheguem a ter o conhecimento
da verdade.” São Paulo recomenda a Timóteo que interceda por todos e diz
que isso é agradável diante de Deus. Estaria São Paulo em contradição,
ordenando a Timóteo que reze pelos outros ao mesmo tempo em que diz que
só há um mediador. É claro que não. Nosso Senhor é o único mediador de
redenção, Ele é o único que nos redime e nos salva. Isso não impede que
haja mediadores de intercessão, que com suas orações pedem para que
Cristo nos aplique a sua redenção. Portanto, NS é o único mediador de
redenção, mas ele estabeleceu mediadores de intercessão subordinados a
Ele.
É possível, então, haver mediadores de
intercessão sem que NS deixe de ser o único mediador de redenção. Mas os
protestantes dizem – e é a segunda objeção – que os santos no céu não
tomam conhecimento de nossas orações, não podendo, assim, nos ajudar.
Isso é falso. É claro que os santos conhecem as nossas orações, pois
podem ver tudo em Deus, no Verbo de Deus, ainda que nossas orações sejam
meramente internas, sem nada exterior. Os santos no céu têm uma
caridade perfeita, inflamada, um amor perfeito por Deus e pelo próximo.
Eles querem o bem do próximo e querem agir para o bem do próximo. Seria
um contrassenso se no momento em que mais são movidos pela caridade, se
no momento em que mais querem e podem ajudar o próximo, os santos não
pudessem auxiliar aqueles que mais precisam, que somos nós. Portanto, os
santos no céu, ao verem Deus face a face, conhecem também os nossos
pedidos e nos ajudam, movidos pela caridade perfeita que possuem.
Finalmente, dizem os protestantes que
Deus é tão bom que não precisa de intercessores para nos dar o que
necessitamos. Estritamente falando, é óbvio que não haveria necessidade
absoluta de intercessores. Todavia, Deus é tão bom que quis que
tivéssemos intercessores e modelos, para o nosso próprio bem, para que
pudéssemos pedir as coisas com maior confiança, sabendo que somos
representados por pessoas que agradam mais a Deus do que nós, pobres
pecadores. Diz Santo Agostinho que Deus deixa de conceder muitas coisas,
se não houver a intervenção de um mediador e advogado digno. Vemos isso
na Sagrada Escritura com os amigos de Jó (Jó XLII, 8) e com Abimelec
(XX, 17). Deus só perdoou os pecados dos primeiros pela intercessão de
Jó e só perdoou a Abimelec pela intercessão de Abraão. Vale também
destacar que Cristo enalteceu a fé do centurião com grandes elogios,
apesar de o homem ter enviado ao Salvador os anciãos dos Judeus, em vez
de ir pessoalmente, para que pedissem ao Senhor a cura de um servo
doente (Lc VII, 2-10). E fez isso por acreditar que o pedido vindo dos
anciãos dos Judeus seria mais agradável do que o seu pedido feito
diretamente. Recorrer aos santos não é falta de fé. Deus é tão bom que
faz os santos cooperarem de modo especial na salvação das almas pela
intercessão deles. Assim, a intercessão dos santos em nada diminui a
bondade divina, mas a manifesta ainda mais perfeitamente.
A invocação dos santos é lícita e boa.
Ela está incluída no culto de dulia que é devido aos santos e que
consiste em reconhecer internamente e externamente a excelência dos
santos com relação às virtudes sobrenaturais, com relação à união íntima
deles com Deus. Esse reconhecimento vai acompanhado de certa submissão a
eles. Não se trata, portanto, de culto de latria, que é devido somente a
Deus. Ao venerarmos os santos, louvamos e veneramos a obra de Deus
neles, louvamos a graça divina que atuou de modo particular e excelente
neles. Ao elogiar a obra de um artista, elogiamos também e
principalmente o artista que é causa da obra. Ao venerar os santos,
louvamos verdadeiramente a Deus em seus santos, como nos diz o salmo.
Veneramos os santos louvando suas
excelências, celebrando as festas deles, fazendo obras de caridade ou de
mortificação em honra deles, expondo e venerando as imagens e relíquias
deles. Veneramos os santos também imitando os exemplos deles. E como
eles são imitadores de Cristo, ao imitar os santos, imitamos Cristo. É o
que diz são Paulo (1 Cor XI, 1): “Sede meus imitadores, como eu o sou
de Cristo.” Mas para imitá-los é preciso ler as vidas de santos. O
exemplo deles nos faz muito bem, pois são, de fato, o Evangelho colocado
em prática por pessoas como nós. A vida dos santos não é só para ser
admirada, mas para ser imitada. Não imitada naquilo que tem de
extraordinário, milagres, etc., mas no essencial, na conversão a Deus. E
veneramos os santos recorrendo à intercessão deles.
Vimos que entre os meios de honrar os
santos está a veneração de imagens e relíquias. Relíquia quer dizer
resto. As relíquias são, então, um pedaço do corpo de um santo (relíquia
de primeira classe) ou algum objeto que lhe pertenceu (relíquia de
segunda classe) ou ainda alguma coisa que tocou uma relíquia de primeira
classe (e teremos uma relíquia de terceira classe). Ao venerar as
relíquias de um santo veneramos, antes de tudo, a pessoa do santo e
também aquele corpo que foi templo do Espírito Santo e membro vivo de
Cristo, o corpo que junto com a alma praticou tantas virtudes, o corpo
que vai ressurgir glorioso um dia. Vemos na Sagrada Escritura como a
fímbria do vestido de NS opera prodígios (Mc VI, 54-56), vemos a sombra
de São Pedro curar os doentes (At V, 12-16) e vemos lenços e aventais
tocados por São Paulo afugentar os espíritos malignos e curar doenças
(At XIX, 11 e 12) . Grande deve ser a nossa veneração pelas relíquias
dos santos, imitadores de NS, relíquias que nos remetem aos santos e que
são também sacramentais.
As imagens dos santos também podem e
devem ser veneradas. “As imagens de Cristo, da Santíssima Virgem e de
outros Santos, se devem ter e conservar especialmente nos templos e se
lhes deve tributar a devida honra e veneração, não porque se creia que
há nelas alguma divindade ou virtude pelas quais devam ser honradas, nem
porque se lhes deva pedir alguma coisa ou depositar nelas alguma
confiança, como outrora os gentios, que punham suas esperanças nos
ídolos (cfr. Sl 134, 15 ss), mas porque a veneração tributada às Imagens
se refere aos protótipos que elas representam, de sorte que nas Imagens
que osculamos, e diante das quais nos descobrimos e ajoelhamos,
adoremos a Cristo e veneremos os Santos, representados nas Imagens.”
Assim ensina o Concílio de Trento. A proibição de fazer imagens no AT
não é mais válida, pois o risco de idolatria que existia para os judeus,
rodeados de pagãos idólatras, adoradores de imagens, já não existe. E
mesmo no Antigo Testamento, vemos Deus abrir algumas exceções para a
proibição das imagens, pois ele ordena que se façam querubins na arca da
aliança e manda que Moisés faça uma serpente de bronze, prefiguração de
Cristo crucificado, para que os judeus não perecem pelas picadas das
serpentes no deserto. Portanto o culto às imagens se dirige ao original.
O culto aos santos, às relíquias e
imagens está de pleno acordo com a obra da salvação e com nossa natureza
humana. Nós vivemos em sociedade, a Igreja é uma sociedade instituída
por Cristo. Nada mais natural que uns membros da sociedade prestem
auxílio a outros, nada mais natural que os membros da Igreja triunfante,
no céu, socorram os membros da Igreja militante, que somos nós. Nada
mais natural que peçamos a ajuda deles. Pela nossa natureza, somos corpo
e alma. Nós precisamos de coisas sensíveis que ajudem a nossa
inteligência e a nossa vontade a se elevarem às coisas espirituais.
Assim, os sacramentos são sinais sensíveis da graça, as cerimônias da
Igreja são sensíveis, a Igreja é uma sociedade visível com um chefe
visível, etc. As imagens e relíquias nos ajudam muitíssimo a manter a
nossa concentração, a considerar o exemplo e as virtudes de Cristo, de
Nossa Senhora, dos Santos. Tirar as imagens das igrejas prejudica a vida
de oração, diminui o apelo aos santos, nos privando de muitas graças.
Dessa forma, a vaga iconoclasta que atingiu muitas das nossas igrejas
nas últimas décadas, prejudica a oração do povo. O que corrobora tudo
isso é o fato de o próprio Deus ter se encarnado. Nossa religião não é
uma religião de anjos, mas uma religião fundada por Deus para nós
homens, feitos de corpo e alma. As duas coisas devem estar unidas e
devidamente ordenadas, sendo a alma a principal parte de nosso ser.
O culto aos santos, de tradição
apostólica, nos faz venerar os santos como amigos de Deus, nos faz
venerar os santos pelos dons que receberam de Deus. O culto dos santos
nos traz grandes benefícios, pois nos ajudam a obter graças que sozinhos
não conseguiríamos e nos dão um exemplo e vida em conformidade com
Cristo. Grandes benefícios nos trazem também o culto das relíquias e das
imagens.
Recorramos aos santos e peçamos a eles
que nos ajudem a alcançar o céu onde já se encontram
. Laudate Dominum in
sanctis eius. Louvai o Senhor em seus santos.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário