18 de novembro de 2013

Encarnação, Nascimento e Infância de Jesus Cristo - Parte 1 - Meditação 2

CONSIDERAÇÃO II.

O VERBO ETERNO DE GRANDE SE FEZ PEQUENO.

Parvulus natus est nobis et Filius datus est nobis.
Nasceu-nos um Menino e foi-nos dado um filho. (Is 9,6)

Platão dizia que o amor atrai o amor: Magnes amoris, amor. Daí o provérbio citado por S. João Crisóstomo: Se queres ser amado, ama. De fato, o mais seguro de cativar-se o afeto duma pessoa, é amá-la e dar-lhe a entender que é amada.
Mas, Jesus meu, essa regra, esse provérbio é para os outros, para todos os outros e não para vós. Os homens são gratos para com todos, menos para convosco. Não sabeis o que mais fazer para testemunhar aos homens o amor que lhes tendes; nada mais vos resta a fazer para conquistardes o coração dos homens. E quantos são os que vos amam? Ah! a maior parte, digamos melhor, quase todos não só não vos amam, mas nem sequer vos querem amar. Ainda mais: vos ofendem e desprezam.
Queremos também nós ser do número desses ingratos? Oh! não, que não o merece esse Deus tão bom, tão amante que, sendo grande, e duma grandeza infinita, quis fazer-se pe-queno para ser amado por nós. — Peçamos a Jesus e Maria nos esclareçam.
I.
Para se compreender qual foi o amor que determinou a um deus fazer-se homem e criancinha em favor dos homens, seria preciso ter uma idéia da grandeza de Deus. Mas que homem ou que anjo poderia compreender a grandeza divina que é infinita?
Segundo S. Ambrósio, dizer de Deus que ele é maior que os céus, que todos os reis da terra, que todos os santos é fazer-lhe injúria, como seria injuriar a um príncipe o dizer que ele é maior do que um calamo de erva ou uma mosca. Deus é a grandeza mesma, e toda a grandeza é apenas uma mínima parcela da grandeza de Deus.
Considerando essa divina grandeza, convencido de sua absoluta incapacidade para compreendê-la, Davi exclamou: “Senhor, onde encontrar uma grandeza comparável à vossa?” De fato, como poderia uma criatura, cuja inteligência é finita, compreender a grandeza de Deus, a qual não tem limites: Grande é o Senhor, cantava o mesmo profeta; ele é digno de todo o louvor, e sua grandeza é infinita. — Não sabeis, disse Deus aos judeus, que eu encho o céu e a terra? De sorte que para falarmos segundo o nosso modo de entender, não passamos de atomozinhos imperceptíveis nesse imenso oceano da essência divina. Dizia o apóstolo: “Nele temos a vida, o movimento e o ser”.
Que somos nós em relação a Deus? Que são todos os homens, todos os monarcas da terra, e mesmo todos os santos e todos os anjos do céu diante da infinita grandeza de Deus? Somos menos que um átomo relativamente ao mundo inteiro; e para falarmos como Isaías, todas as nações são na presença de Deus como a gota d’água suspensa no bordo do vaso, como o peso que faz pender apenas a balança; e todas as ilhas não são senão um pouco de pó; numa palavra, todo o universo é diante dele como se não existisse.
Ora esse Deus tão grande se fez criança, e para quem? Por nós: Nasceu-nos um Menino, disse ainda Isaías. Mas para que fim? S. Ambrósio responde: “Fez-se pequeno para nos tornar grandes; quis ser envolvido em paninhos para nos livrar das cadeias da morte; desceu à terra a fim de que pudéssemos subir ao céu”.
Eis pois o Ser imenso feito criança; Aquele que os céus não podem conter, ei-lo enfeixado em pobres paninhos, e deitado num presépio estreito e grosseiro, sobre um pouco de palhas que lhe servem de leito e de travesseiro! S. Bernardo ex-clama: Vinde ver um Deus que pode tudo, preso em paninhos de sorte a não poder mover-se; um Deus que sabe tudo, priva-do da palavra; um Deus que governa o céu e a terra, necessitando ser carregado nos braços; um Deus que nutre todos os homens e todos os animais, precisando dum pouco de leite para viver; um Deus que consola os aflitos, que é a alegria do paraíso, e que chora, que geme e que procura quem o console!
Em suma, diz S. Paulo que o Filho de Deus vindo à terra se aniquilou a si próprio. E por que? para salvar o homem e para ser por ele amado. “Meu divino Redentor, exclama S. Ber-nardo, na medida que vos abaixastes fazendo-vos homem e criança brilharam a misericórdia e o amor que nos mostrastes a fim de ganhar os nossos corações”.
Embora os Hebreus tivessem claro conhecimento do verdadeiro Deus que se lhes manifestara por tantos milagres, não estavam satisfeitos. Queriam vê-lo face a face. Deus achou o meio de contentar também esse desejo dos homens. Tomou a natureza humana e tornou-se visível a seus olhos, diz S. Pedro Crisólogo. E para melhor se insinuar aos nossos corações, continua o mesmo Santo, quis mostrar-se primeiro como uma cri-ancinha, porque nesse estado ele devia parecer-nos mais grato aos nossos afetos. Sim, acrescenta S. Cirilo e Alexandria, ele se abaixou à humilde condição duma criancinha a fim de se tornar mais agradável aos nossos corações. Era esse, com e-feito, o meio mais próprio para se fazer amar.
O profeta Ezequiel tinha pois razão de dizer, ó Verbo encarnado, que a época da vossa vinda à terra devia ser o tempo do amor, o tempo dos que amam. E com efeito por que outro motivo Deus nos amou tanto e nos deu tantas provas de seu amor, se não para ser amado por nós? Deus só ama para ser amado, diz S. Bernardo. Aliás o Senhor mesmo o declarou desde o início: E agora, ó Israel, que é o que o Senhor teu Deus pede de ti, se não que o temas... e o ames (Dt 10,12).
Para obrigar-nos a amá-lo, Deus não quis confiar a outrem o negócio de nossa salvação, mas quis fazer-se homem e vir resgatar-nos em pessoa. S. João Crisóstomo faz uma bela observação sobre a expressão de que se serve S. Paulo ao falar desse mistério; Ele nunca tomou a natureza dos anjos, mas tomou a carne dos filhos de Abraão. Porque, pergunta ele, não diz o apóstolo simplesmente que Deus se revestiu da carne humana, mas que a tomou como que à força, segundo a significação própria do vocábulo Apprehendit? E responde: disse assim por metáfora, para explicar que Deus desejava ser ama-do pelo homem, mas o homem lhe voltara as costas e não que-ria reconhecer o amor que Deus lhe tinha. Eis por que desceu do céu e tomou um corpo humano para se fazer conhecer e amar, como que à força, pelo homem ingrato que dele fugia.
É por isso que o Verbo Eterno se fez homem, e é também por isso que Ele se fez criança. Ele poderia apresentar-se sobre a terra como homem feito à semelhança do nosso primeiro pai Adão, mas o Filho de Deus preferiu mostrar-se ao homem sob a forma duma graciosa criança, a fim de ganhar mais de-pressa e com mais força o seu coração. As crianças são amá-veis por si mesmas e atraem o amor de quem as vê. O Verbo divino fez-se menino, diz S. Francisco de Sales, a fim de conciliar o amor de todos os homens.
Ouçamos S. Pedro Crisólogo: “Não é por ventura desse modo que deveria vir a nós Aquele que queria banir o temor e fazer reinar o amor? Que alma haverá tão feroz que se não deixe vencer pelos encantos dessa criança? que coração tão duro que se não enterneça à sua vista? e que amor não exige Ele de nós? Assim pois quis nascer Aquele que queria ser a-mado e não temido”. O Santo Doutor nos faz compreender que, se o divino Salvador quisesse, vindo ao mundo, fazer-se temer e respeitar pelos homens, ter-se-ia apresentado sob a forma dum homem perfeito e cercado da dignidade régia. Mas, como procurava apenas ganhar os nossos corações, quis aparecer no meio de nós como uma criança, e como a criança mais pobre e humilde, nascida numa fria gruta entre dois animais, colo-cado sobre a palha num presépio, sem lume e envolta em paninhos insuficientes para defendê-la do frio: Assim quis nascer Aquele que queria ser amado e não temido! Ah! meu Senhor e meu Deus, quem pois vos obrigou a descer do trono dos céus, para nascerdes num estábulo? Foi o amor que tendes aos homens! Quem vos arrancou da dextra do Pai Eterno, onde estais assentado, e vos deixou numa vil manjedoura? Vós que reinais sobre a abobado estrelada, quem vos estendeu sobre a palha? Quem do meio dos anjos vos fez residir entre dois animais? Foi o amor. Vós abrasais os serafins, e tremeis de frio! Vós sus-tendes o céu, e é preciso que vos levem nos braços! Vós nutris homens e animais, e tendes necessidade dum pouco de leite para vos sustentar! Vós sois a felicidade dos Santos, e eu vos ouço chorar e gemer! Quem pois vos reduziu a tão grande miséria? foi o amor: Assim quis nascer Aquele que queria ser amado, e não temido!
Amai, pois, almas cristãs, exclama S. Bernardo, amai essa criança que é tão amável! “Grande é o Senhor, merece louvores infinitos; pequeno é o Senhor, merece infinitamente nosso amor”. Sim, diz-nos ele, esse Deus era desde toda a eternidade, como o é ainda agora e sempre, digno de todo o louvor e respeito por sua grandeza, como já cantou Davi: Grande é o Senhor, e muito digno de louvor. Hoje porém que o vemos feito menino, necessitado de leite, sem se poder mover, tremendo de frio, vagindo, chorando, procurando quem o pegue, aqueça e console; ah! como é amável e caro aos nossos corações. O Senhor é pequeno e excessivamente amável!
Devemos adorá-lo como Deus, mas o nosso amor deve igualar à nossa veneração para com um Deus tão amável e tão amante.
“Uma criança, observa S. Boaventura, gosta de achar-se entre crianças, no meio de flores e nos braços dos que a amam”. Se quisermos comprazer ao divino Infante, quer dizer o Santo, devemos tornar-nos crianças com ele, isto é, simples e humildes; levar-lhe flores das virtudes, mormente as da mansidão, da mortificação, da caridade; tomá-lo e nossos braços com amor.
“Que queres mais, ó homem, acrescenta S. Bernardino de Sena, que esperas ainda para te dares sem reserva a teu Deus? Considera as penas que Jesus sofre por ti; vê com que amor esse terno Salvador desceu do céu para te procurar. Não ouves os seus gritos, os seus vagidos infantis? Apenas nasci-do, dirige-se a ti escuta com ele te chama com seus vagidos: Ó alma a quem amo, parece dizer-te, eu te procuro; é por amor de ti, para obter o teu amor que vim do céu à terra”.
Ó Deus, os próprios animais, quando lhes fazemos algum benefício, quando lhes damos alguma coisa, mostram tanto reconhecimento! Vem a nós, obedecem-nos a seu modo como sabem, testemunham-nos alegria ao ver-nos. E nós, como podemos ser tão ingratos para com Deus, que se deu a nós, que desceu do céu à terra, se fez menino para nos salvar e ser de nós amado? Amemos pois o Menino de Belém! exclama o seráfico S. Francisco. Amemos a Jesus Cristo que com tanto empenho procurou ganhar os nossos corações!
II.
Se amamos a Jesus Cristo, devemos amar o nosso próximo, mesmo os que nos ofenderam. O Messias foi chamado, por Isaías, o pai do século futuro. Ora, para sermos filhos dum tal Pai, devemos amar os nossos inimigos e fazer bem aos que nos fazem mal. É o Senhor mesmo quem nos declarou: Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que nos fazem mal. É o Se-nhor mesmo quem nos declarou: Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam..., para serdes filhos do vosso Pai. Ele mesmo, aliás, deu-nos o exemplo dessa caridade quando pediu a seu Pai celeste perdoasse aos que o crucificavam.
Quem perdoa a seu inimigo, diz S. João Crisóstomo, não pode deixar de obter o perdão de seus próprios pecados. Isso até nos é garantido por uma promessa divina: Perdoai, e vos será perdoado. — Um religioso que aliás não levara vida muito exemplar, deplorava seus pecados na hora da morte, mas com muita confiança e alegria, pois dizia que jamais havia tomando vingança. Ele queria dizer: É verdade que ofendi a Deus; mas o Senhor prometeu perdoar aos que perdoam a seus inimigos; eu sempre perdoei aos que me ofenderam, devo pois estar seguro de que Deus perdoará também a mim.
E falando em geral do que concerne a todos, como podemos recear não obter o perdão de nossos pecados, quando pensamos em Jesus Cristo? Não foi para reconciliar os peca-dores com Deus que o Verbo Eterno se humilhou ao ponto de revestir-se da natureza humana? Não vim chamar os justos, disse ele, mas os pecadores. Digamos-lhe pois com S. Bernardo: “Sim, Senhor, abaixando-vos assim por nós, mostrastes até onde se estendeu a vossa misericórdia e a vossa caridade par conosco”. E tenhamos confiança, como nos exorta S. Tomás de Vilanova com as palavras: “Que temes, pecador? se te arrependeres de teus pecados, como te condenará aquele Se-nhor que morre para não te condenar? E se queres voltar novamente à sua amizade, como te repelirá aquele que veio do céu para te procurar?”
Não tema pois o pecador que não quer mais ser pecador, mas quer amar a Jesus Cristo; não se apavore mas confie. Se detesta o pecado e procura a Deus, longe de se afligir, alegre-se, como a isso o convida o Salmista. O Senhor protesta que quer esquecer-se de todas as ofensas dum pecador que se arrepende: Se o ímpio fizer penitência, já me não recordarei de todas as suas iniqüidades. E para nos inspirar ainda mais confiança, nosso divino Salvador se fez menino. “Quem temeria aproximar-se duma criança?” pergunta S. Tomás de Vilanova. As crianças nada têm de terrível, respiram só doçura e amor.
As crianças, diz S. Pedro Crisólogo, não sabem encolerizar-se; se lhes acontece irritarem-se, facilmente se acalmam. E de fato, basta apresentar às crianças uma fruta, uma flor, fazer-lhes uma carícia, dizer-lhes uma palavra afetuosa. Perdoam logo e esquecem todas as ofensas a elas feitas.
Também, acrescenta S. Tomás de Vilanova, uma lágrima, um sentimento de arrependimento basta para aplacar o Menino Jesus. Vamos pois lançar-nos a seus pés, conclui ele, agora que esse bondoso Mestre depôs sua Majestade divina e se oferece a nós sob a forma duma criança para dar-nos coragem e nos atrair a ele.
S. Boaventura diz igualmente que o Filho de Deus se a-presenta aos nossos olhos como uma criança cheia de doçura e misericórdia, para nos liberar do medo que nos poderia causar o pensamento de seu poder e justiça. Ó Deus de misericórdia, ajunta Gerson, ocultastes vossa sabedoria suprema sob as aparências duma criancinha a fim que ela nos não acuse de nossos pecados! Ocultastes a vossa justiça no abaixamento a fim que ela nos não condene! Ocultastes o vosso poder na fraqueza a fim de que ela nos não puna!
S. Bernardo por sua vez faz esta reflexão: Quando Adão pecou, ouviu a voz de Deus, que o chamava dizendo: Adão, onde estás? e ficou tomado de pavor: Ouvi a vossa voz, respondeu e tive medo. Mas o Verbo Eterno, aparecendo sobre a terra como homem, nada mais tem que inspire temor. Por isso o Santo exorta-nos a banirmos dos corações todo sentimento de temor: “O vosso Deus, diz ele, desta vez procura-vos não para vos punir mas para vos salvar”. O Deus que devia punir-te fez-se menino; a sua voz já te não espanta, porque a voz dum menino pequeno, sendo voz de prantos, inspira antes compaixão do que temor; não podes já temer que Jesus Cristo estenda as mãos para castigar-te, pois que sua terna Mãe as retém e encerra em paninhos.
Alegrai-vos, pois, ó pecadores, exclama S. Leão: o nasci-mento de Jesus é a aurora de alegria e de paz. — Ele é chamado por Isaías o Príncipe da paz. Jesus é Príncipe, não de vingança contra os pecadores, mas de misericórdia e de paz: constituiu-se Mediador de paz entre Deus e os pecadores. Se não podemos pagar a justiça divina, diz S. Agostinho, o Pai Eterno não pode desprezar o sangue de Jesus Cristo, que satisfaz por nós.
O célebre duque Afonso de Albuquerque, transpondo os mares, viu um dia o seu navio no risco de dar contra os escolhos. Julgava-se já perdido, quando, percebendo uma criança que chorava, a tomou nos braços e erguendo-a para o céu ex-clamou: “Senhor, se eu não mereço ser atendido, atendei ao menos os prantos desta criança inocente, e salvai-nos”. Terminada a prece, a tempestade acalmou-se e desapareceu o perigo. — Sugamos esse exemplo, nós, miseráveis pecadores.
Temos ofendido a Deus; merecemos ser condenados à morte eterna; com razão quer a justiça divina ser satisfeita. Que te-mos a fazer? Desesperar? Oh! não: ofereçamos a Deus essa terna criancinha que é o seu Filho, e digamos-lhe com confiança, se não podemos expiar as ofensas que vos temos feito, lançai os olhos sobre o divino Infante, que geme, que chora, que treme de frio sobre a palha nesta gruta; Ele satisfaz por nós e vos pede misericórdia. Se não merecemos o perdão dos nossos pecados, considerai os sofrimentos e as lágrimas do vosso Filho inocente, que o merece por nós e vos pede misericórdia.
Esse meio de salvação é precisamente o que S. Anselmo nos indica. Ele diz que Jesus mesmo, querendo nos não ver perdidos, encoraja a quem se acha réu diante de Deus nestes termos: “Pecador, toma ânimo; se tuas iniqüidades já te fizeram escravo do inferno e não tens meio de te livrares dele, toma-me, oferece-me a meu Pai; assim escaparás à morte e te salvarás. Será possível imaginar-se maior misericórdia?” pergunta o Santo Doutor. A Mãe de Deus ensinou o mesmo à Irmã Francisca Farnese. Colocou-lhe nos braços o Menino Jesus e disse-lhe: “Eis o meu Filho; aproveita-te dele oferecendo-o muitas vezes a Deus”.
E se quisermos estar ainda mais seguros do perdão, re-clamemos a intercessão dessa augusta Mãe, que é todo pode-rosa junto de seu divino Filho para obter o perdão aos pecadores, como ensina S. João Damasceno. E como razão, porque, segundo S. Antonino, as preces de Maria junto dum Filho que tanto a quer e deseja vê-la honrada, têm o valor de ordens. É isso que faz dizer a S. Pedro Damião, que quando a SS. Vir-gem vai pedir a N. Senhor em favor de algum de seus servos, ela parece antes mandar que pedir: “Vós vos aproximais do trono de Jesus, não só para lhe suplicar, mas para em certo sentido lhe dar ordens, e antes como Rainha do que como serva, porque, para honrar-vos, o vosso Filho nada do que lhes pedis vos recusa”. Também S. Germano ajunta que Maria, em virtude da autoridade materna que exerce, ou, para melhor dizer, que exercera outrora sobre a terra a respeito de seu divino Filho, pode impetrar o perdão aos maiores pecadores.
Afetos e Súplicas.
Ó doce, ó amável e santo Menino, tudo fizestes para vos fazer amar dos homens. Basta dizer que de Filho de Deus vos fizestes Filho do homem, e que quisestes nascer não só como todos os outros filhos dos homens, porém mais pobre e mais humilhado que todos os outros, escolhendo para habitação um estábulo, e para leito um pouco de palha! Quisestes mostrar-vos a nós, a primeira vez, nessa humilde e tocante condição de criança, para começar a ganhar os nossos corações desde o vosso nascimento. E depois continuastes, durante toda a vossa vida, a dar-nos provas sempre maiores de vosso amor, até morrerdes exsangue e desonrado num patíbulo infame! Donde vem pois a ingratidão dos homens para convosco? Tampouco vos conhecem, e menos ainda vos amam! Ó meu Jesus, quero ser do pequeno número destes últimos. É verdade que no passado eu vos desprezei e, esquecendo o vosso amor, só procurei satisfazer-me, sem fazer conta de vós e de vossa amizade. Mas hoje vejo o mal que fiz, sinto dor e arrependimento de todo o coração. Caro Infante, meu Salvador, perdoai-me pelos méritos de vossa santa infância. Amo-vos, meu Jesus, e vos amo tanto que, mesmo que todos os homens se separassem de vós e vos abandonassem, eu vos prometo de vos não deixar ja-mais, ainda que tivesse de perder mil vezes a vida. Estas luzes e esta boa vontade que agora tenho vós mas destes. Agrade-ço-vos, meu amor, e vos peço mas conserveis com vossa graça. Mas conheceis a minha fraqueza e as minhas infidelidades passadas. Por piedade não me abandoneis; do contrário tornar-me-ei pior do que antes. Permiti que meu pobre coração vos ame, ó divino Infante. Este coração outrora vos desprezou, mas hoje está todo enamorado de vossa bondade.
Ó Maria, gloriosa Mãe do Verbo encarnado, não me abandoneis vós que sois a Mãe da perseverança e a dispenseira das graças. Ajudai-me e ajudai-me sempre. Com o vosso socorro, ó minha esperança, confio ser fiel a Deus até a morte.

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