24 de novembro de 2013

VIGÉSIMO QUARTO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES.

Eucaristia, Cristo e Papa

Hoje é o último Domingo do ano eclesiástico.

No 1o Domingo do advento e no 24o após Pentecostes, último do ano, o Evangelho nos apresenta a narração terrificante do juízo final.

Mas no meio destes relâmpagos e trovões, no meio das tribulações que assolam o mundo, o Evangelho nos mostra o Cristo, o Filho do homem, vindo sobre as nuvens do céu, com grande poder e majestade.

É o Cristo que triunfa... é também a Igreja de Cristo, que depois de ter atravessado todos os horrores do ódio e da perseguição, pode apresentar-se diante de seu Chefe, com todos aqueles que ela salvou do naufrágio da fé e da virtude.

O Cristo é a Igreja... a Igreja é o Cristo, de modo que o triunfo de Cristo será também o triunfo da Igreja.

Terminemos o nosso estudo apologético examinando um último fenômeno da vida da Igreja: a sua união inseparável com a divina Eucaristia, juntando num mesmo amor: o Cristo presente na Eucaristia e o Cristo presente no Papa.

Vejamos um instante como são inseparáveis:

1. O amor à Eucaristia e ao Papa.
2. O ódio ao Papa e à Eucaristia.

Vamos aqui averiguar um fenômeno curioso, histórico, cuja conclusão, para quem sabe raciocinar, é de grande alcance, mostrando-nos Jesus Cristo na Eucaristia e no Papa.

I. Dois amores inseparáveis

Para provar a nossa tese que o amor ao Papa cresce nas almas à medida que cresce o amor à Eucaristia, basta percorrer um instante a história da Igreja. Ali veremos que estas duas devoções nascem juntas, crescem, diminuem e morrem juntas. São como as duas rodas de um carro, das quais uma não se move sem a outra, porque têm o mesmo eixo.

Tomai um século qualquer, examinai os seus sentimentos para com o Papa e conhecereis logo os seus sentimentos para com a Eucaristia.

A Idade Média, por exemplo, distingue-se de modo particular pelo amor à Eucaristia, construindo-lhe as esplêndidas catedrais, compondo-lhe hinos ardentes, lançando para o firmamento as suas inimitáveis igrejas góticas. É um hino vibrante de pedra, de arte, de poesia para a Eucaristia.

Ao mesmo tempo examinai a devoção desta época ao Papa... é o mesmo entusiasmo, a mesma arte, os mesmos edifícios, que se dedicam ao papa, com que se canta a glória do Papado.

Não basta a Idade Média prostrar as almas aos pés do Papa, depositam a seus pés reinos, impérios, querendo que ele seja o rei do mundo como o é da Igreja; o representante do mundo, como o é de Cristo.

Este entusiasmo que a impiedade atribui às vezes à ambição dos Papas, não é senão a obra da devoção do povo.

O mesmo fenômeno que averiguamos na vida das nações, podemos verificá-lo na alma dos Santos.

Duas devoções parecem neles sem limites: a devoção à Eucaristia e a devoção ao Papa.

Do mesmo modo que estas duas devoções elevam-se juntas para o alto; assim elas se inclinam juntas para baixo.

Desde que o amor à Eucaristia inflama as almas, a veneração ao Papa se estende e se firma, mas desde que o senso da Eucaristia vai baixando, o amor ao Papa desaparece na mesma decadência.

Citemos apenas o exemplo do século XVII.

Este século teve uma grande idéia da majestade de Deus, da dignidade do sacerdócio, faltava-lhe porém a concepção do amor de Deus.

Não compreendia o amor de Deus e por isso não podia compreender a Eucaristia.

Daí esta qualquer coisa de frio, de gelado que se nota em sua espiritualidade. A escola de Jansênio, em vez de aproximar as almas da Eucaristia, as afastava sob pretexto de respeito.

Suprimiram a comunhão freqüente... e não conheciam mais senão o Deus majestoso, mas terrível da Eucaristia, em vez do pai amoroso, que quer dar-se a seus filhos.

Ao mesmo tempo e na mesma medida as almas iam-se afastando do Papa. Fechavam a Eucaristia num Tabernáculo que não se abriu mais e fechavam o Papa na prisão do Vaticano.

O primeiro era um Cristo morto.
O segundo, o seu representante, devia ficar um Papa morto.

O primeiro não podia mais ser recebido.
O segundo não devia mais ser escutado.

E neste ambiente jansenista, pouco faltava para que suprimissem os hinos de Sto. Tomás, como chegaram a suprimir a oração pelo Papa.

II. Dois ódios inseparáveis

Há um outro fenômeno não menos curioso. Suprimindo estas duas devoções, a da Eucaristia e a do Papa, elas são substituídas por dois ódios iguais: o ódio à Eucaristia e o ódio ao Papa.

Além de outros exemplos, temos o da grande reforma de Lutero. Vemos nele o triste espetáculo da força lógica das doutrinas.

Condenado pelo Papa, Lutero se revolta contra ele e logo começa a revoltar-se contra a Eucaristia. Escreve: — “Prestar-me-iam um grande serviço se me indicassem um meio eficaz de negar a presença real”, pois julgava que nada lhe serviria mais para fazer mal ao Papado.

Este meio que Lutero não encontrara, Calvino o encontrou: A Eucaristia é apenas um símbolo, uma lembrança; Jesus Cristo não está presente nela, não passa de um pedaço de pão, bradou ele...

E como é impossível parar em cima do plano inclinado, vêm as blasfêmeas: zombam da Eucaristia e do Papa.

A Eucaristia é uma idolatria.
O Papado é um homem perverso.

E estes mesmos homens que vão cercar Roma, lançam brados de ódio contra o papa, invadem as igrejas, violam os Tabernáculos, atiram ao fogo as Hóstias consagradas, e dançam em redor das chamas, cantando canções vergonhosas, onde não se vê o que odeiam mais: se o Cristo presente na Eucaristia, ou velado na pessoa do Papa.

Um século não havia passado e cenas mais horríveis se apresentam, frutos maduros da Reforma.

De fato, a Revolução nasceu da Reforma, como uma filha desnaturada nasce de uma mãe perversa sobrepujando-a em monstruosidade.

A Reforma havia quebrado os Tabernáculos para roubar as Hóstias sagradas. A Revolução depois de ter violado os Tabernáculos, manchou os altares.

Ela fez subir em cima deles criaturas perdidas, para infligir-lhes o mais baixo ultraje.

Mas vejam o declive.

Apenas haviam violado o Tabernáculo, violam o Vaticano. Invadem-no de noite e arrastam para fora o Papa. Estes mesmos republicanos que haviam assistido de armas na mão à profanação da Eucaristia, batiam palmas, vendo o Papa quase moribundo seguir como exilado para a França.

III. Conclusão

Convém notar bem este fenômeno, pois ele tem a sua moral e a sua apologia.

Há dois amores e dois ódios inseparáveis.

Estes dois amores são: — a Eucaristia e o Papa. Estes dois ódios são de novo: a Eucaristia e o Papa.

Que prova isto?

Prova que há uma íntima e inseparável união entre estas duas devoções.

A devoção ao Smo. Sacramento cria nas almas o amor ao Papa; como o desprezo do Papa traz a ruína da devoção à Eucaristia. É mais do que um fato: É uma lei.

Sim, é uma lei, e esta lei prova que debaixo de cada um destes véus, o que faz o objeto da nossa fé e do nosso amor, é a mesma, a única adorável pessoa de Jesus Cristo.

Hoje, estamos no século eucarístico. Os Congressos eucarísticos atraem, elevam e orientam as almas para o Tabernáculo; e ao mesmo tempo vemos a autoridade do Papa respeitada, amada, dominar as nações e as almas.

Cultivemos a devoção ao Papa, para que penetre em nós o amor à Eucaristia; e à medida que o amor eucarístico transforma as nossas almas, o nosso amor para o Papa aumentará na mesma medida. Será Jesus Cristo adorado na Eucaristia e escutado na palavra do Papa.

Como tudo se liga, como tudo se encadeia nas sublimes verdades da religião!

EXEMPLOS

1. O Papa e a primeira Comunhão

Na época da revolução francesa, o general Radet havia sido encarregado, em nome do Imperador, de insistir perto de Pio VII, para que renunciasse a soberania temporal de Roma.

O general penetra na sala de audiências.

Por ordem do Papa, abre-se a porta, e Radet indo até ela, avista o Santo Padre, imóvel e sereno, sentado à sua mesa de trabalho.

Maior e mais majestoso que o senado romano sobre suas sedes curnes, o Pontífice-Rei esperava os Gaulezes.

A esta vista, Radet pálido e trêmulo, leva a mão ao kepi e hesita... Uns momentos de profundo silêncio passam-se nesta atitude.

Mais tarde, falando deste acontecimento com o general Radet, um amigo lhe disse:

- Há qualquer coisa nesta expedição que não se compreende: depois de teres assaltado o Quirinal, com a espada na mão, paraste diante do Papa, sem defesa... que se passou ali?

- Que queres: Respondeu o general. Na rua, nos tetos, nas escadarias, diante dos Suíços, tudo ia bem; mas quando vi o Papa, ah! Neste momento recordei-me da minha primeira Comunhão.

2. Beato Claret

Lê-se na vida do Bem-aventurado Claret, fundador dos missionários do Coração Imaculado de Maria, que, estando a Espanha envolvida nas malhas da união liberal, apesar da resistência dos Bispos, ele resolveu retirar-se da Corte, porque a rainha Isabel, enganada, havia assinado um documento comprometedor.

Diante das lágrimas da rainha que reconheceu o passo errado e pediu perdão, o santo hesitou. Estando erguendo fervorosas preces perante o Bom Jesus do Perdão, Jesus Cristo lhe disse: “Antônio, retira-te!”

Tendo os Bispos insistido que voltasse para Madri e não abandonasse a rainha Isabel nestas horas difíceis, o Bem-aventurado foi consultar a Deus na visita das 40 horas de adoração, na Igreja de São Domingos em Vich.

De repente, saiu uma voz do Sacrário, dizendo: “Antônio, vai a Roma”.

O santo não hesitou e antes de dar a resposta definitiva foi ter com o Santo Padre Pio IX.

Na primeira audiência, foi recebido com afetuosas demonstrações pelo Papa, que lhe disse: — “Justamente, acabo de receber uma carta da rainha, pedindo-me que V. Excia. volte a ocupar o seu cargo o mais breve possível.

O Bem-aventurado inclinou a cabeça e resignado voltou a seu Calvário, como ele chamava a Corte, fazendo talvez o sacrifício mais generoso da sua vida.

A Eucaristia e o Papa são as duas vozes da verdade, ou melhor, é a mesma voz do único Jesus Cristo, escondido atrás destes dois véus.

O Papa manda os homens para a Eucaristia. A Eucaristia, nas horas da dúvida, os manda para o Papa.

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(MARIA, P. Júlio. Comentário Apologético do Evangelho Dominical. O Lutador, 1940, p. 430 - 437)

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