10 de abril de 2014

Preparação para a Morte

PONTO II
 
Os maus hábitos, além disso, endurecem o coração, permitindo-o Deus justamente em castigo da resistência que se opõe a seus convites.
Diz o Apóstolo que o Senhor “tem misericórdia de quem quer, e endurece a quem quer” (Rm 9,18). Santo Agostinho explica este texto, dizendo que Deus não endurece de um modo imediato o coração daquele que peca habitualmente, mas que o priva da graça em castigo da ingratidão e obstinação com que repeliu a que antes lhe havia concedido; e em tal estado o coração do pecador se endurece como se fosse de pedra.
Seu coração se endurecerá como pedra, e se apertará como a bigorna do ferreiro (Jo 41,15). Sucede assim que, enquanto alguns se enternecem e choram ao ouvir falar do rigor do juízo divino, das penas dos condenados e da Paixão de Cristo, os pecadores por hábito nem sequer se comovem. Falam e ouvem falar destas coisas com indiferença, como se disso não se importassem: e por causa destes golpes do mau costume, a consciência se endurece cada vez mais (Jo 41,15).
Por conseguinte, nem as mortes repentinas, nem os tormentos, trovões e raios, são capazes de atemorizá-los e fazê-los voltar a si. Ao contrário, mergulharão cada vez mais profundamente no sono da morte em que, perdidos, repousam (Sl 85,7). O mau hábito sufoca, pouco a pouco, o remorso da consciência de tal modo, que ao pecador habitual os pecados mais enormes não passem de coisas sem importância (Santo Agostinho). Perdem pecando, diz São Jerônimo, até essa vergonha que a ação culposa traz consigo naturalmente. São Pedro compara-os ao suíno que se revolve no lamaçal (2Pd 2,22), pois assim como este animal imundo não percebe o fétido da estrumeira em que se revolve, assim aqueles pecadores são os únicos insensíveis à hediondez de suas culpas, que todas as outras pessoas percebem e detestam. E se este lodaçal lhes tira até a faculdade da visão, é, porventura, para admirar — diz São Bernardino — que não voltem a si, nem quando os açoita a mão de Deus. Daí resulta que, em vez de se afligir com os seus pecados, ainda se regozijam, se riem e se vangloriam deles (Pr 2,14).
Que indicam estes sinais de diabólica dureza? — pergunta São Tomás de Vila Nova. São todos sinais de eterna condenação. Teme, pois, meu irmão, que não te suceda esta desgraça. Se tens algum mau hábito, procura libertar-te agora que Deus te chama. Enquanto sentes mossa na consciência, regozija-te, porque é indício de que Deus ainda não te abandonou. Urge, porém, corrigir-te e sair o mais breve possível desse estado, doutra maneira gangrenar-se-á a ferida e te verás perdido.
 
AFETOS E SÚPLICAS
 
Como poderei, Senhor, agradecer-vos devidamente todas as graças que me haveis concedido? Quantas vezes me tendes chamado, e eu resistido! Em lugar de servir-vos e amar-vos, por me terdes livrado do inferno e chamado com tanto amor, continuei a provocar vossa indignação e corresponder com ofensas. Não, meu Deus, não; muitas vezes vos tenho ofendido, não quero ultrajar mais a vossa paciência. Só vós, que sois a Bondade infinita, pudestes suportar-me até agora. Mas reconheço que, com justa razão, não podereis continuar a suportar-me.
Perdoai-me, pois, meu Senhor e Sumo Bem, todas as ofensas que vos fiz. De todo o coração me arrependo e proponho não tornar a injuriar-vos...
Porventura, hei de continuar a ofender-vos?... Aplacai-vos, portanto, Deus de minha alma, não pelos meus merecimentos, que somente valem para o castigo eterno, mas pelos merecimentos do vosso Filho, meu Redentor, nos quais deposito minha esperança. Pelo amor de Jesus Cristo, recebei-me na vossa graça e dai-me a perseverança no vosso amor. Desprendei-me dos afetos impuros e atraí-me inteiramente a vós. Amo-vos, soberano Senhor, excelso, amante das almas, digno de infinito amor... Oh, se vos tivesse amado sempre!...
Maria, nossa Mãe, fazei que não empregue o restante da minha vida em ofender vosso divino Filho, mas somente em amá-lo e chorar os pecados que hei cometido.

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