Qui autem perseveraverit usque in finem, hic salvus erit — “Quem perseverar até o fim, será salvo” (Matth. 24, 13).
Sumário. Meu irmão, puseste agora mãos à obra; começaste a viver bem. Dá por isso graças ao Senhor. Lembra-te, porém, que ao que começa a recompensa é apenas prometida, mas é dada somente ao que persevera até ao fim. Quantos começarem bem, talvez melhor do que tu, mas depois acabaram mal e agora ardem no inferno! Para obteres a perseverança, deves em primeiro lugar pedi-la a Deus, e de teu lado deves empregar os meios mais apropriados.
I. São muitos os que começam, diz São Jerônimo, mas são poucos os que perseveram. Um Saul, um Judas, um Tertuliano começaram bem, mas acabaram mal, porque não perseveram no bem. Devemos saber, continua o mesmo Santo, que Deus não pede somente o começo de vida boa, mas quer também o fim: o fim é que alcançará a recompensa. — Diz São Boaventura que a coroa se dá somente à perseverança: Sola perseverantia coronatur. Pelo que São Lourenço Justiniani chama a perseverança porta do céu: coeli ianuam. Ora, não poderá entrar no paraíso quem não der com a porta.
Agora, meu irmão, abandonaste o pecado, e crês com razão ter recebido o perdão. És, pois, amigo de Deus; sabe todavia que não estás ainda salvo. E quando estarás salvo? Quando tiveres perseverado até ao fim: Que perseveraverit usque in finem, hic salvus erit. Começaste a viver bem: agradece-o ao Senhor; mas avisa-te São Bernardo que a recompensa celeste é somente prometida ao que principia, mas é somente dada ao que persevera. Não basta olhar só ao fim: é preciso ir após ele até alcançá-lo, segundo a expressão do Apóstolo: Sic currite, ut comprehendatis (1) — “Correi de tal modo que o alcanceis”.
Já meteste a mão ao arado, principiaste a viver bem; mas agora, mais do que nunca, teme e treme: “Empenhai-vos na obra de vossa salvação com temor e tremor” (2), diz o Apóstolo. E por quê? Porque se olhares para trás — o que não permita Deus! — e voltares para a vida de pecado, Deus te declarará excluído do céu: Nemo mittens manum ad aratrum et respiciens retro, aptus est regno Dei (3) — “Nenhum que mete a sua mão ao arado e olha para trás é apto para o reino de Deus”.
II. A perseverança tão necessária para a salvação é um dom todo gratuito de Deus, que nós nunca podemos merecer. Mas, como ensina Santo Agostinho, obtê-la-ão da misericórdia divina todos os que lh'a pedem e por seu lado empregam os meios próprios para levar uma vida bem ordenada. — Se queres perseverar e salvar-te, freqüenta os santíssimos Sacramentos; faze todos os dias uma meditação e ouve uma santa missa; visita todos os dias a Jesus sacramentado e examina a tua consciência. Tem sobretudo grande devoção a Nossa Senhora, que se chama a Mãe da perseverança. Consagra-te também muitas vezes inteiramente ao Senhor, e dize-Lhe com ternura, especialmente de manhã, antes de te dares às ocupações:
† “Ó Deus eterno, eis-me aqui prostrado em presença de vossa infinita majestade, e adorando-Vos humildemente, consagro-Vos todos os meus pensamentos, palavras e obras deste dia, e tenho tensão de fazer tudo por vosso amor, para vossa glória, para cumprir a vossa divina vontade, para Vos servir, louvar, e bendizer, para ser iluminado acerca dos mistérios de nossa santa fé, para assegurar a minha salvação e esperar na vossa misericórdia, para satisfazer à vossa divina justiça pelos meus muitos e gravíssimos pecados, em sufrágio das almas santas do purgatório e para obter para todos os pecadores a graça de uma verdadeira conversão.
“Numa palavra, tenho a intenção de fazer tudo em união com as intenções puríssimas que em sua vida tiveram Jesus e Maria, todos os santos do céu e todos os justos da terra. Quisera que me fosse possível assinar esta minha intenção com o meu próprio sangue e repeti-la a cada instante tantas vezes, quantos são os instantes de toda a eternidade. Recebei, ó meu Deus amado, esta minha boa vontade; dai-me a vossa santa benção com a graça eficaz de nunca cometer um pecado mortal em toda a minha vida, e particularmente neste dia, no qual desejo e tenciono ganhar todas as indulgências que possa ganhar, e assistir a todas as missas que hoje vão ser celebradas no mundo inteiro, aplicando-as todas em sufrágio das almas santas do purgatório, a fim de que sejam livradas daquelas penas. Assim seja.” (4) (*II 141.)
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1. I Cor. 9, 24.
2. Phil. 2, 12.
3. Luc. 9, 62.
4. Indulg. de 100 dias cada dia, e indulgência plenária para quem a recitar durante um mês inteiro, com tanto que se confesse, comungue e ore segundo as intenções do Sumo Pontífice.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 9-11.)
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