20 de abril de 2014

DOMINGO DA PÁSCOA.

Fisionomia de Jesus Cristo

É a ressurreição de Jesus Cristo a grande prova da sua divindade.

Jesus predisse que seria entregue a seus inimigos, açoitado, condenado à morte, mas que ressuscitaria no terceiro dia.

Assim aconteceu.

Ora, só Deus pode prever e indicar o futuro.

Ele é, pois, verdadeiramente Deus.

Continuemos a estudar a fisionomia resplandecente de Jesus Cristo.

Já vimos, a última vez: a elevação de seu espírito e a fecundidade de suas palavras. É um reflexo luminoso da sua divindade, porém há outros reflexos não menos luminosos que devemos conhecer, e entre eles os que vamos meditar hoje, a saber:

1. O amor de seu Coração.
2. A força da sua vontade.

O homem, de fato, é uma inteligência, um coração e uma vontade; são as três faculdade da nossa alma; e são as três faculdades que nos manifestam claramente a alma de Jesus.

I. O amor de seu Coração

O homem ama, porém, ama pouco, e ama a poucos.

Todos os homens sentem esta triste chaga no coração, de não poderem sofrer muito tempo para aqueles que amam.

Há apenas uma exceção: é o coração de Jesus Cristo.

Ele ama e Ele dá tudo.

E, como não há maior prova de amor do que dar a própria vida para os que se amam, desde o primeiro até ao último instante da sua vida, Jesus Cristo aspira ao sacrifício.

A sua hora, como Ele diz, a que espera com impaciência, é a hora em que poderá enfim, no Calvário, elevar as suas dores até à altura de seu amor.

E não somente os homens amam pouco, mas amam poucas pessoas.

O homem sente que o seu amor é pequeno, tem receio de derramá-lo sobre os outros. Ele elege um pequeno número de escolhidos, faz-se um ninho onde coloca as pessoas que lhe são mais queridas: um pai, uma mãe, a esposa, os filhos e uns raros amigos.

O homem sente que tem apenas umas gotas de amor... e que espargindo-as não lhe sobrará bastante para os que mais estima.

Como o coração de Jesus é diferente do nosso! Ele ama todos os homens... e os ama com o mesmo ardor.

Os pequenos, os grandes, os pobres, os ricos, os justos, os pecadores, os banidos da sociedade, Ele não exclui ninguém.

Percorramos o Evangelho e procuremos quem Ele excluiu de seu amor.

Qual foi o ser bastante manchado para este coração tão puro... ou bastante vulgar para este coração tão nobre... ou demais grande para este coração humilde... ou demais pequenino para este coração sublime?...

E notemos que este coração tão terno e tão imenso é de uma pureza que não podemos chamar angelical; é pouco demais, pois é divino.

Ele vive no meio do mundo... senta-se à mesa dos pecadores... vê a seus pés todas as fraquezas... e nunca, nem sequer a sombra de um dúvida que surge numa consciência honesta, nem a sombra de um ultraje toca os seus lábios.

Os ímpios atacaram tudo na vida de Jesus Cristo, exceto a pureza deste ser celestial.

E este coração tão divinamente puro possui uma auréola única neste mundo, a de ter formado pelo seu contato e o seu exemplo uma legião de corações virginais, amantes e puros como Ele.

Oh! Só Deus pode realizar tais fenômenos. Jesus Cristo é, pois, Deus.

II. A força da sua vontade

A vontade é a terceira irradiação da nossa alma; vontade que se concentra na força.

Esta força é incomparável em Jesus Cristo e n’Ele reveste todas as modalidades da vida.

É a força modesta no triunfo, no meio do entusiasmo das multidões.
É a força paciente diante da ignorância e teimosia dos seus discípulos.
É a força misericordiosa diante da hipocrisia e da perversidade dos fariseus.
É a força serena e radiante em face das injúrias, das bofetadas, dos escarros, dos açoites.
É a força resignada na agonia, no meio dos mais atrozes desfalecimentos da natureza humana.

Eis já o que é divinamente grande e o que há de mais belo na ordem da força; entretanto não é tudo.

A última palavra da força de Jesus Cristo é o modo com que levantou o mundo conforme a sua expressão: Omnia traham ad meipsum. Arquimedes dizia: dai-me um ponto de apoio e eu levantarei o mundo. Jesus Cristo levantou o mundo sem ponto de apoio. Tomou doze operários pobres, grosseiros, sem gênio; e fez o que é mais difícil que levantar o mundo: mudou-os, transformou-os.

E para que o fato fosse mais incontestável, não o fez quando vivo, mas depois que se deixou pregar e morrer num patíbulo...

Morreu abandonado numa cruz e na hora em que a sua obra parecia aniquilada com Ele, Ele prova a sua força divina com maravilhas de além túmulo.

A impiedade julgou-O sepultado para sempre sob a pedra e sob o esquecimento e eis que de repente reaparece a sua obra, repleta de vida infinita e de eterna fecundidade.

Tudo isso é mais do que humano, é divino... e deve-se concluir que aquele que perpetra tais obras, é verdadeiramente Deus.

III. Conclusão

Como conclusão e para completar a bela e suave fisionomia de Jesus, digamos que esta beleza da inteligência, esta bondade do coração e esta força da vontade, encontram-se n’Ele numa harmonia, num equilíbrio perfeitos.

Não se encontra nenhuma lacuna, nenhum desfalecimento, nenhuma mancha, nem tão pouco se encontra n'Ele qualquer excesso ou qualquer esforço.

Cada faculdade atinge o grau máximo da sua intensidade; porém nenhuma eclipsa ou diminui as outras. São harmoniosamente unidas, ao ponto de constituir o que é o traço divinamente belo da vida de Jesus: grandeza tranquila, doce simplicidade, paz sublime.

Jesus Cristo é o homem ideal em sua natureza humana: Ele é o Deus sublime em sua natureza divina.

E estas duas naturezas: a divina e a humana estão reunidas numa harmonia perfeita, numa única pessoa: a pessoa divina do Verbo Eterno, Filho de Deus e Filho do homem.

Todos nós somos um filho de um homem; Jesus Cristo é o filho do homem, no sentido absoluto. O Filho de Deus feito homem no seio da Virgem Imaculada.

EXEMPLO

A fisionomia de Jesus Cristo

O Cavalheiro de Beauterno, reproduzindo os sentimentos de Napoleão, nos deixou esta página de uma fé admirável e de uma expressão tão veemente que se sente nela a pata do leão de Sant' Helena: o grande Napoleão:

“Não haveria Deus no céu se um homem fosse capaz de conceber e de executar, com pleno êxito, o plano gigantesco de fazer-se adorar pelo mundo inteiro, usurpando o nome de Deus!

Jesus é o único que tem tido tal ousadia! Jesus é o único que disse claramente: Eu sou Deus!

A história não menciona nenhum outro que se tenha intitulado Deus, no sentido absoluto desta palavra.

As fábulas nunca contaram que Júpiter ou outros deuses do Olimpo se tenham denominado a si próprios, o que aliás teria sido da parte deles um cúmulo de orgulho, uma monstruosidade e uma extravagância absurda.

São os homens que os deificaram.

Alexandre pôde chamar-se: filho de Júpiter, porém, a Grécia inteira zombava dele por tal embuste. Nem sequer a apoteose dos imperadores romanos foi tomada a sério pelos romanos.

Maomé e Confúcio deram-se simplesmente como agentes da divindade; a deusa Egéria de Numa Pompilio nunca passou de uma inspiração haurida na solidão da floresta; os deuses de Brahma, da Índia, são uma simples invenção psicológica.

Como é, pois, possível que um judeu, cuja existência histórica está mais averiguada do que todas aquelas de seu tempo, ele só, filho de um carpinteiro, se tenha apresentado como Deus, como o Ser por excelência e o Criador do mundo?

Ele pede a adoração das criaturas; e por um prodígio que ultrapassa todos os prodígios, Jesus exige o amor dos homens, isto é: aquilo que há de mais difícil de obter, o que um sábio pede em vão a seus amigos... um pai a seus filhos... uma esposa a seu marido... um irmão a seus irmãos... numa palavra: o coração. Ele exige absolutamente este coração e o obtém imediatamente.

Concluo que Ele é Deus!

Alexandre, César, Aníbal, Luiz XIV, com todo o seu gênio malograram-se nesta empresa; conquistaram o mundo, mas não alcançaram nenhum amigo sequer!

Talvez seja eu hoje o único a amar a César, Aníbal, Alexandre.

O grande Luiz XIV, que tanto esplendor espargiu sobre a França e sobre o mundo, não tinha nem um amigo em seu reino inteiro, nem sequer em sua família.

Apenas havia exalado o último suspiro, foi deixado no isolamento de seu quarto de Versailles, abandonado pelos seus cortesões e talvez até sendo escarnecido. Não era mais o seu mestre... era um cadáver, um esquife, um túmulo e o horror de uma iminente decomposição.

Eu mesmo tenho apaixonado as multidões, que se deixavam massacrar para mim... A minha presença, a eletricidade de meu olhar, de meu acento, minha palavra ascendia neles o fogo do entusiasmo e agora que estou aqui, só, desterrado sobre este rochedo, quem luta e quem conquista impérios para mim?

Onde estão os cortesões de meu infortúnio?

Quem pensa em mim? Quem se agita por mim na Europa? Quem me ficou amigo fiel?

Onde estão os meus amigos?

Sim, dois ou três, que a vossa fidelidade imortaliza, vos partilhais e consolais o meu exílio.

Assassinado pelo revez das armas, morro aqui, antes do tempo e o meu cadáver será restituído à terra para ser o pasto dos vermes!...

Eis o próximo destino do grande Napoleão! Que abismo profundo sobre a minha miséria, o meu abandono e o reino eterno de Jesus Cristo, pregado há já 18 séculos, amado, adorado, invocado e cada dia vivo sobre os altares e em todas as partes do mundo... Será isso morrer? Não é antes viver? Eis a morte de Cristo, eis a vida de um Deus... Concluo que Jesus Cristo não é simplesmente homem, Ele é Deus verdadeiro!”

(MARIA, P. Júlio. Comentário Apologético do Evangelho Dominical. O Lutador, 1940, p. 164-171)

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