3 de dezembro de 2009

Reflexão sobre o Evangelho Dominical - I Domingo do Advento - Parte 5 de 6

1º Domingo do Advento

De: "Pensamentos sôbre os Evangelhos e sôbre as festas do Senhor e dos Santos" - Pe. João Colombo. Nihil obstat: Pe. João Roalta - Imprimatur: Mons. J. Lafayette

Título original: "Pensieri sui Vangeli e sulle Feste del Signore e dei Santi" Milão, Itália.
Escrito entre 1927-1938. Primeira edição em 1939.

Lc. XXI, 25-33.


5- FUGI DA IRA DIVINA NO JUÍZO UNIVERSAL.

Os céus, como um toldo gasto pelo tempo,rasgar-se-ão, deixando cair as estrelas. Sobre a terra ouvir-se-á o profundo rugido do mar que se entornará, e o estrondo das águas a se precipitarem. As turbas humanas, amedrontadas, tremerão na expectação terrífica.
Então o Sinal do Filho do Homem aparecerá no céu: e todas as raças chorarão na terra.
Então o Filho do Homem virá sobre as nuvens do céu: e os anjos, com as trombetas, fá-las-ão soar sobre os continentes da terra.
Como veremos Cristo naquele dia? Imagino-o conforme o pincel de Miguel Ângelo o pintou na parede da Capela Sistina. A mâo direita levantada poderosamente para abater, e a esquerda dobrada para mostrar o rasgão do peito, como a dizer: “Firo-vos por não haverdes correspondido ao meu coração!” Nada é terrível como a vingança de um amor ultrajado; depois, se este amor é o de um Deus, a sua vingança só eterna pode ser: o inferno. Recordemos as maldições de Jesus contra as cidades ingratas ao seu amor.
Milagres e pregações certamente não haviam faltado aos lugares em torno do lago de Genesaré, e especialmente a Corozaim, a Betsaída, a Cafarnaum; e, no entanto daquela região, o Mestre virou-se para trás para, com a voz velada de uma amargura profunda, maldizer: “Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaída! Se Tiro e Sidon, longínquas cidades da Fenícia, tivessem podido ver uma parte minima dos prodígios que vós vistes, ter-se-iam convertido, e teriam feito penitência dos seus pecados. Em verdade vos asseguro que no dia do juízo haverá misericórdia para estas, mas não para vós. Haverá misericórdia para Sodoma incendiada pelo meu furor; mas para Cafarneum, onde debalde prodigalizei o meu amor, não mais haverá misericórdia”. (Mt., XI, 20-24).
Semelhante aquelas cidades ingratas é também a nossa alma. Quantas finezas afetuosas não tem usado conosco o Senhor! Desde o dia do nosso nascimento até hoje, é uma longa cadeia de preferências divinas, às quais talvez não tenhamos correspondido. Ai de nós! No dia do juízo haverá misericórdia para tantos infelizes que não sabiam orar, que não podiam escutar uma prédica, mas para nós não!. . . Ai de nós se não fugirmos à ira futura.
Os nossos anos já voam para o seu fim com a rapidez de uma roda; já a morte, furiosa, nos está às costas. Enquanto ainda nos resta um pouco de tempo, corrijamo-nos; acendamos as nossas lâmpadas com o óleo da fé e das boas obras; preparemo-nos para o advento do divino Juíz.
Ai de nós se não fugirmos da ira futura!
No dia do juízo final, duas coisas causarão o maior pavor: o aparecimento da Cruz, e o dAquele que nela foi crucificado. E, se nesta vida nós não nos fizéssemos amigos da Cruz e do Crucificado, não seria um belo para fugirmos à ira futura, e acharmos misericórdia naquele momento supremo?
Portanto, façamo-nos amigos da Cruz.
Façamo-nos amigos do Crucificado.



1- Amigos da Cruz.
Fazer-se cavaleiro de Carlos V não era coisa fácil, e para isso muitos haviam trabalhado inutilmente. Mas, no dia da sua coroação,quis o imperador que qualquer corajoso pudesse conseguir aquela honra, contanto que se deixasse percutir pela sua espada.
Era o dia 24 de fevereiro de 1530, em Bolonha: coroado com a coroa férrea, Carlos V saía de S. Petrônio, ao lado do Papa Clemente VII, e com garbo montou num magnífico corsel; duas apinhadíssimas alas de povo abriam-se à sua passagem. E eis que jovens destemidos, homens fortes, velhos senhores, vêm ao meio, inclinam a cabeça e dizem: “Quero ser cavaleiro”. Percutindo-os com o punho da espada, Carlos V respondia: “Esto miles” (Sê soldado). Os postulantes eram muitíssimos, e de toda parte ouvia-se clamar: “Sire, sire, a mim! A mim!”.
Finalmente o imperador sentiu faltarem-lhe as forças: “Não posso mais”, suspirou; mas o grito dos pedintes crescia a cada passo: “A mim! A mim!”. Então ele pegou a espada e atirou-a sobre o povo, exclamando: “Amai a minha espada e a minha guerra: faço-vos todos cavaleiros”. “Todos! Todos!” Um brado de alegria irrompeu por toda a cidade: cada um queria beijar a espada imperial. À noite, Bolonha ardeu de fogo e ecoou de músicas triunfais.
Este episódio da história bolonhesa serve-me para imprimir na vossa mente o conceito do sofrimento cristão. O nosso Rei imortal, Jesus Cristo, passa pelas cidades deste mundo. Todo aquele que quer ser seu cavaleiro, todo aquele que quer triunfar com Ele no dia final da sua vitória, deve deixar-se percutir pela sua espada: a cruz. Por pouca dor Ele nos retribuirá uma alegria infinita; por breve guerra, conduzir-nos-á a uma vitória eterna.

1- Amai, pois, a sua cruz! E ama-lá-eis quando, com fé, com paciência, suportardes as tribulações que a cada dia da vida encontrareis. Considerai como fêz Jesus Cristo, o Rei divino, e depois segui-o: factus oboediens usque ad mortem, mortem autem crucis. (Fil., II, 8). E por que nos rebelarmos quando a Providência de Deus nos fere com a sua espada nos haveres, na família, na saúde? Não sabemos que, se Deus nos toca, é para nos fazer seus cavaleiros no Paraíso? E havemos de imprecar contra Ele?

2- Amai,pois, a sua guerra! Ela é guerra contra as seduções do mundo. Sempre e por todos os lados estamos cercados de perigos espirituais: o mundo é todo uma malignidade.
Amai a sua guerra! Ela é guerra contra nós mesmos. Há em nós duas partes contrastantes: uma parte é animal e terrena, a outra é espiritual e celeste; a primeira elevaños ao bem, a segunda abaixa-nos ao mal. É esta parte de nós que devemos sufocar e renegar com as suas inclinações perversas, com os seus afetos venenosos.
Se tivermos amado a cruz e a guerra contra o mundo e contra nós mesmos, não sentiremos pavor ao aparecimento do Sinal do Filho do Homem, no dia do juízo. “Eis a cruz!” clamarão os Anjos; outros chorarão, porém não nós, que naquele momento a saudaremos com as palavras de Santo André Apóstolo: “Salve, ó cruz, longamente carregada! Salve, ó cruz, com alegria esperada! Acolhe-me sob a sombra do teu braço direito, porque fui discípulo dAquele que penduraram em ti!”

2- Amigos do Crucifixo.
Para nos tornarmos amigo do Crucificado não há caminho melhor do que nos fazermos amigo dos pobres, dos doentes, de todos os que sofrem, de todos os que, de qualquer modo, estão crucificados na alma ou no corpo.
Na Turíngia não havia dor que Santa Isabel da Hungria não suavizasse, não havia necessidade que ela não socorresse, não havia desventura que ela ignorasse. Acorria às choupanas dos doentes, assístia os moribundos, vestia os nus, recolhia e instruía os órfãos. Nas grades do seu palácio, os pobres apinhavam-se cada dia, e nenhum se retirava sem algum consolo.
Uma vez ela deixou entrar nos seus aposentos um doente asqueroso; antes, ela mesma com suas mãos finas e cândidas começou a curar-lhe as chagas, a lavá-las, a beijá-las... Os servos, horrorizados, exclamaram: “Que estais fazendo! Que estais fazendo!...” Porém Isabel, tranqüilíssima, respondeu: “Beijo as chagas de meu Senhor Jesus Cristo: assim elas não mais me farão pavor no dia do juízo. É nesse dia que eu penso, e para ele, como posso. me preparo.
Era verdadeiramente uma rainha sábia, da sabedoria do Evangelho. De fato, o Evangelho diz abertamente o valor e a estima que será dada às boas obras no juízo universal. O grande Rei dirá aos que forem acolhidos à sua direita: “Vinde, benditos de meu Pai, a tomar posse do reino que desde o princípio do mundo eu vos tinha preparado. Achaste-me com fome e deste-me de comer; vistes-me nu e me vestistes; encontrastes-me peregrino na estrada e me abrigastes; soubestes-me prisioneiro e me visitastes; e, se estive doente, assististes-me”. E os justos, admirados, perguntar-lhe-ão: “Talvez te enganes, já que nunca achamos famintos, nem te vimos nu, e nem mesmo peregrino pela estrada, e nem também prisioneiro nem doente...”. “Não, não! - responderá o Rei – não me engano: tudo aquilo que fizeste a ao mais pequeno, ao mais esquecido entre os homens, a mim mesmo o fizestes”.
S. João Crisóstomo adverte-nos a não considerarmos como uma perda o bem que fazemos , mas sim como um ganho; nós damos pão, e em troca receberemos o Paraíso; damos uma roupa , e em troca recebermos a veste nupcial para entrarmos no banquete dos céus; concedemos hospedagem sob o nosso teto, e teremos toda a eternidade; perdoamos pouco, e seremos perdoados em muito; enxugamos as lágrimas alheias e seremos alegrados para sempre. Digo-vos que nem mesmo um copo de água pura oferecido por amor de Deus, será perdido! Antes vos digo que no dia do juízo final nós não possuiremos senão aquilo que houvermos dado.

Conclusão.
S. Felipe Benizi, religioso da Ordem dos Servos de Maria Virgem, estava morrendo.
Além da doença, além da dor, havia dias em que o atormentava uma terrível visão. Parecia-lhe já se achar perante o tribunal de Deus, e em torno dele surgiam os demônios a exprobrar-lhe os pecados de sua vida passada, mesmo os mais remotos, mesmo os mais pequenos... ante essa vista, ante essas palavras, o agonizante abria os olhos horrorizado, tremia, e não tinha mais ersperança. “Dai-me o meu livro! Dai-me o meu livro!” gritava ele com voz apavorada.
Dos presentes, alguns correram a tomar um livro, outros outros; mas ele o recusava a todos, sem achar repouso. Finalmente, um percebeu que os olhos do moribundo se haviam fixado num Crucifixo ali ao lado; tomou-o e colocou-lhe entre as mãos gélidas e suadas.
Mal o teve, como um sedento ele o pôs sobre a boca para o beijar ansiosamente: beijou o lenho da cruz, beijou as chagas d’Aquele que a ela estava suspenso. Seus olhos iluminaram-se como ao surgir de uma aurora interior; a sua fronte expandiu-se numa doce serenidade; o seus lábios distenderam-se num dulcíssimo sorriso. E assim la se foi ele ao encontro do juízo de Deus.
Amara a Cruz, amara o Crucifixo com todas as suas forças. Que haveria de temer.


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