30 de dezembro de 2009

Primeira ingratidão dos homens para com Jesus Sacramentado

A incredulidade dos que negam a presença real de Jesus Sacramentado.

Com tosquíssimas palavras, discorri até agora sobre as finezas de Jesus Sacramentado, e creio que quem passasse os olhos com atenção sobre essas folhas ficariam bem persuadidos de que são as mais excessivas que Deus pôde usar para com uma criatura. Mas já é tempo, meus Católicos, de mostrar-vos as ingratidões com que o mundo corresponde ao mesmo Sacramentado Amante, para que saibais dizer o que eu nunca soube dizer: quem está mais empenhado - Jesus em obrar finezas pelos homens, ou esses, em executar ofensas contra o mesmo finíssimo Jesus? Mas que Ele não permita que vos suceda como a quem toma à mão um espelho para olhar-se, que a cada parte encontra o seu retrato muito natural, sendo cada página destas um cristal que represente a vossa ingratidão.

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A primeira que se oferece à minha consideração é a abominável incredulidade de tantos que negam pertinazmente que o amantíssimo Jesus deixou realmente Seu Corpo e Sangue no Inefável Sacramento do Altar. Dardo é esse o mais penetrante para o amoroso Coração de Jesusm, porque não há mais viva dor para um verdadeiro amante do que, em lugar de corresponder a suas finezas, não dar crédito ao seu amor.
Esta sorte de ingratos não quer acabar de entender como pode o Redentor dar a comer Sua Carne e a beber Seu Sangue, e, com um desatino intolerável, põem a pleito o Amor e a Onipotência de um Deus. Disputavam entre si, refere o Evangelista, dizendo: Quomodo potest hit carnem suam nobis dare ad manducandum? Ó perfídia digna dos maiores castigos! Exclama o Grande Padre São Cirilo: Et quomodo tu flagris dignus non es, qui cum de Deo loquaris, interrogas quomodo? Ah! homem insensato! Quando se trata das proezas do Divino Amor, perguntas tu como? Dize-me: Como tu, arrastando grilhões e cadeias tantos anos no Egito, te viste um dia livre de tua escravidão? Como, padecendo fome pelo deserto, os céus choveram saborosos manjares para saciar-te? Como, para apagar a sede em que te abrasavas, brotou água em abundância das duras rochas? Como, para franquear-te o passo, dividiu-se o mar em duas partes? E se tu não me sabes dizer como um Deus obrou por ti essas e outras finezas, por que negas apenas esta, que fez por ti no Sacramento? Não é mesmo que tu confessas que converteu as águas em sangue, e com uma só palavra tirou do nada a formosura dos céus, a grandeza do mar e a redondeza e âmbito da terra? Como, pois, chamas dura aquela palavra com que converteu o pão em Sua carne? Durus est hic sermo - Duro é teu coração e duríssima tua incredulidade, pois buscas ordem na natureza do Corpo de Jesus, Que, contra toda lei da natureza, nasceu de um Virgem. Foi bastante a voz de um Profeta para fechar por três anos os céus e evitar que caísse uma gota de água sobre a terra. Obedereram esses à mesma voz, lançando chamas de fogo, que reduziram tantos corpos a cinzas, e só a voz de Jesus não poderá mudar as espécies dos elementos?
Ouço, entretanto, o incrédulo que me responde que bem se pode crer no que não se vê, mas não contra o que se vê. Que vês sobre o altar pão, e te digo que é Carne; que vês vinho, e te digo que é Sangue. Porém tu, ó néscio, não me entendes: o que tu vês com os olhos são os acidentes de pão e vinho, e o que deves crer com a fé é no Corpo e Sangue de Jesus. Não se enganam teus sentidos em julgar daquelas aparências, porque a Sabedoria Divina, neste Sacramento, acomodou-Se à limitada capacidade desses teus mesmos sentidos. Ouve como te instrui dessa verdade admirável a pena Angélica de São Tomás. Mudou, diz esse Doutor, o Redentor a substância de pão sem tocar em seus acidentes, para que juntamente tenha a fé seu lugar, e os sentidos não fiquem sujeitos ao engano. Vês aqui claramente convencidas a incredulidade e ingratidão tuas. O que vês, o que tocas, o que provas n'Aquela Sagrada Hóstia são apenas as espécies de pão e vinho, e o que vês é o Corpo e Sangue de Jesus. Como dizes, pois, que não te repugna crer no que não vês?
Tu não vês produzir-se o ouro nas entranhas da terra, nascer pérola no profundo do mar, e enviar o sol sua influência ao seio das árvores e ao coração das plantas. Esses e outros muitos invisíveis segredos da naturezas, confessas, e só este amoroso arcano da conversão da Carne de Jesus faz-se impossível à tua incredulidade. Não foi assim que fez aquele coroado Lírio da França, Luiz o Santo, que, tendo-lhe sido referido que em sua corte aparecera visivelmente na Sagrada Hóstia um formosíssimo e gracioso Menino, escusou-se sempre de ir vê-lo, antepondo a segura obscuridade de sua fé à evidência clara de um milagre. Sabia bem aquele grande rei que mais se aprofundam debaixo terra os cimentos que mais asseguram os edifícios, do mesmo modo que, quanto mais se esconde a nossos olhos Este Sacramento, fundamento da nossa fé, tanto mais firme e imóvel fica o edifício da mesma fé. Essa deve ser a razão por que, na primitiva Igreja, todas as custódias e vasos sagrados para o Corpo Sacramentado de Jesus se formavam em figura de pomba: talvez para mostar-nos que Este Divino Sacramento só deve ser visto ou com os olhos cegos pela fé, ou com a singeleza e simplicidade de uma pomba.
Infeliz Avicena, por que te perdes tão miseravelmente! Dizes que te agrada a Lei Evangélica, a altura de seus Mistérios e o árduo de seus preceitos. Não contradizes que Deus seja uno na essência e trino em pessoas, que Se tenha encarnado nas entranhas de uma Virgem Pura, e morrido em Carne passível numa Cruz para redimir os homens. Mas que Deus-Homem, debaixo das espécies de pão, dê a comer Sua Carne, e que os homens comam a mesma Divindade a Que adoram, é coisa à qual não pode acomodar-se teu entendimento; e, assim dizes, acabe-se minha vida na seita de meus filósofos. Assim delirava a fantasia daquele a quem faltava o belíssimo órgão da fé. Essa era a dureza do coração ingrato à maior fineza do Divino Amor. Não entendia o que conheceu bem o Real Profeta quanto disse: comeram e adoraram todos os ricos da terra.
Esse é o maior excesso a que pôde chegar a humana ingratidão, porque aquele que nega Este altíssimo mistério de nossa fé, desterra do mundo, o quanto pode, retira de nossos olhos e aparta de nossos corações o amabilíssimo Corpo de Jesus, mais necessário para cada um de nós do que o sustento que nos alimenta, que o ar que respiramos e que a alma que nos anima. Tudo isso foi o que pretenderam os ímpios Luteros, Calvinos, Buceros e Zuinglios, uns afirmando que o Corpo de Jesus não permanece na Sagrada Eucaristia de um dia para outro, e que está ali somente enquanto se consagra. Outros ensinando que Este Sacramento não é mais do que um sinal, figura ou memória do Redentor; e, levando após si reinos e províncias inteiras, são já poucos os adoradores de nosso Rei Sacramentado. Voltai os olhos às finezas que vos deixo referidas, e as achareis não só mal correspondidas pelos homens, mas renegadas pela maior parte deles. Quantos são os Idólatras, que não conhecem Este Augustíssimo Sacramento? Quantos os judeus, que O negam? Quantos os hereges, que não O adoram? O menor número é o dos Católicos, que pelo menos Lhe dão crédito, mas não a devida adoração.

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