[Sermão] A boa Confissão
Ave Maria…
“Estava Jesus expulsando um demônio, e ele era mudo. E depois de ter expulsado o demônio, falou o mudo, e se admiraram as gentes.”
Caros católicos, temos insistido que a Quaresma é um tempo de conversão, de misericórdia, de busca da santidade. A verdadeira conversão nossa, a busca da santidade e a misericórdia divina se encontram de modo perfeito e pleno em um só ato: no sacramento da confissão, e na confissão bem feita.
Como sabemos, a confissão é o sacramento da nova lei no qual, pela absolvição do sacerdote, se confere ao pecador penitente a remissão dos pecados cometidos depois do batismo. Como cada um dos sete sacramentos, também o sacramento da penitência foi instituído por Cristo. A confissão foi instituída por Cristo no dia mesmo de sua ressurreição, ao dizer aos apóstolos: “recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos.” No sacramento da confissão, nós podemos ver a delicadeza da bondade e misericórdia divinas. Que meio sublime Deus nos deu para perdoar os nossos pecados, para purificar a nossa alma das quedas após o batismo. A confissão é a nossa segunda tábua de salvação, como nos diz o Concílio de Trento.
Nosso Senhor quis instituir o sacramento da penitência ou confissão para nos dar a certeza (na medida em que é possível) do perdão dos pecados confessados ao padre e absolvidos por ele, para que não tivéssemos angústias ou incertezas em campo tão importante. Nesse sacramento, Nosso Senhor nos diz como Ele disse ao Paralítico: “Tem confiança, filho, teus pecados estão perdoados.” Nosso Senhor quis também que os pecados fossem perdoados por meio da confissão ao sacerdote porque a sabedoria divina cura utilizando remédios contrários à doença. Todos os nossos pecados provêm, em certo grau, do orgulho, e a confissão é o contrário do orgulho, pois é certa humilhação para o pecador. Pecamos ao praticar a nossa própria vontade em detrimento da vontade divina. Na confissão, precisaremos exercer um grande desapego de nós mesmos, da nossa própria vontade e nos humilhar. A confissão diante do sacerdote foi o meio instituído pela sabedoria e misericórdia de Nosso Senhor Jesus Cristo para nos tirar do pecado.
A confissão, como nos diz o Padre Spirago (Catecismo Católico Popular, que recomendo), dá ao indivíduo muitas vantagens, além do essencial e mais importante que é o perdão dos pecados: a) ela dá o conhecimento de si mesmo ao nos confrontarmos com os mandamentos divinos; b) ela dá a delicadeza da consciência, que vai se formando com os bons exames de consciência e os bons conselhos recebidos; c) ela dá a firmeza de caráter, pois o sacramento nos dá a graça que ilumina a nossa inteligência e fortalece a vontade; d) ele dá a perfeição moral, pois a confissão exige humildade, como dissemos, e a humildade é a base de toda virtude. A confissão traz também vantagens para a sociedade civil: a) com ela, as inimizades acabam, b) se bens foram de alguma forma prejudicados pelo pecador, eles serão restituídos, c) muitos crimes são evitados; d) muitos vícios combatidos e etc.
Todavia, para obtermos o perdão dos nossos pecados e todos os outros benefícios que advêm da confissão, precisamos nos confessar bem. Para nos confessarmos bem, precisamos, antes de tudo, fazer um bom exame de consciência. Depois, precisamos nos arrepender dos pecados cometidos e ter o propósito de nos emendarmos. Em seguida, é preciso confessar os pecados, isto é, manifestá-los diante do sacerdote, com sinceridade. Finalmente, é preciso aceitar a penitência, receber a absolvição e cumprir a penitência recebida.
O exame de consciência é a consideração ou investigação séria e diligente dos pecados cometidos desde a última confissão válida. O exame de consciência é muito importante para nos formar bem a consciência, para nos dar o conhecimento de nós mesmos diante de Deus e para assegurar a integridade da confissão. O exame de consciência deve ser feito antes da confissão e não durante a confissão, o que certamente levaria ao esquecimento de algum pecado e tomaria mais tempo do que o realmente necessário. Convém começar esse diligente exame de consciência pela invocação do Espírito santo, para que Ele nos mostre os nossos pecados e nos dê o arrependimento. Se durante o exame de consciência surgem pecados mortais, é preciso considerar também a espécie e o número desses pecados, como falaremos mais adiante.
(Contrição) Feito o exame de consciência, é preciso se arrepender dos pecados cometidos: é o que chamamos de contrição. A contrição é a dor e detestação dos pecados cometidos enquanto são ofensa a Deus. Para que haja a contrição é preciso,primeiro, que reconheçamos que fizemos um mal, um pecado. Reconhecendo o mal que fizemos, devemos ter uma dor espiritual por ter cometido esse mal. Essa dor é espiritual, da vontade, que não afeta necessariamente a sensibilidade. Pode ocorrer e ocorre que um pecador esteja pesaroso de ter pecado sem que sinta sensivelmente dor alguma. Para ter essa dor, basta querer tê-la sinceramente e pedi-la a Deus, que ela surgirá. Tendo reconhecido o pecado cometido, tendo dor por tê-lo cometido, precisaremos, em segundo lugar, detestá-lo. A detestação surgirá quase naturalmente da dor, pois ao reconhecermos o mal que é o pecado, detestaremos esse mal, que ofende a Deus e nos separa dEle. A detestação acende em nossas almas o desejo de destruir o pecado, supõe a abominação ao pecado cometido.
Devemos notar que essa dor da alma, e essa detestação devem provir do fato de que o pecado é uma ofensa a Deus. No arrependimento, é preciso que esteja necessariamente presente, em maior ou menor grau, esse motivo de arrependimento: ofensa feita a Deus. A pessoa que se arrependesse unicamente por medo do inferno ou por amor à vida eterna, mas sem relação com a ofensa feita a Deus, não teria contrição suficiente para ser perdoado. Assim, por mais que o motivo principal seja o temor da condenação, por exemplo, é preciso que esteja presente, ao menos em parte, a rejeição da ofensa a Deus. O verdadeiro arrependimento, além disso, supõe que consideramos o pecado como o maior de todos os males possíveis e que estejamos dispostos a perder tudo, inclusive a vida, para não voltar a cometê-lo. E que o pecado é o maior mal que existe é claro, pois vai diretamente contra Deus e contra nossa felicidade eterna. A contrição deve ser também universal, isto é, ela deve englobar todos os pecados mortais. Se eu me arrependo de dez pecados mortais, mas não me arrependo de um, meu arrependimento não é verdadeiro porque se eu me arrependesse dos nove pelos bons motivos (ofensa a Deus e perda da vida eterna), me arrependeria necessariamente de todos. Assim, deixar de se arrepender de um pecado mortal significa que não se está arrependido verdadeiramente de nenhum.
(Propósito de emenda) Depois do arrependimento, dessa dor da alma e da detestação do pecado, vem o propósito de emenda. O propósito de emenda nada mais é do que a vontade deliberada e séria de não mais voltar a pecar. Esse propósito deve ser firme, isto é, devemos estar decididos a não pecar mais, ainda que tenhamos que perder todos os bens e suportar todo tipo de sofrimento, mesmo a perda da vida. Esse propósito de emenda deve ser universal, estendendo-se a todos os pecados mortais, que deverão, então, ser evitados no futuro, sem exclusão de nenhum. Não é preciso rechaçá-los todos individualmente nem é prudente, basta rechaçá-los em conjunto. Esse propósito de emenda significa também que o penitente quer, com vontade séria, empregar os meios necessários para evitar os pecados futuros: fugir das ocasiões de pecado, perdoar as injúrias, rejeitar o ódio, restituir o bem alheio, frequentar os sacramentos, rezar, etc… Quem quer evitar o pecado deve empregar os meios para isso, sob pena de contradição.
(Confissão dos pecados) Tendo feito o exame de consciência, tendo dor espiritual pelos pecados, detestando-os e tendo o propósito de não mais cometê-los, o penitente pode aproximar-se da confissão. A confissão é a acusação voluntária dos pecados cometidos depois do batismo feita ao sacerdote legítimo, a fim de obter o perdão dos pecados. A confissão dos pecados deve ser íntegra. Isso significa que o penitente deve obrigatoriamente confessar todos os pecados mortais cometidos desde a sua última confissão válida. Ele não pode omitir nenhum sequer. Se ele confessa dez pecados mortais, mas omite um, nenhum pecado é perdoado. Se ele tem um só pecado mortal e cinco veniais, mas confessa só os veniais, não há perdão de nenhum pecado. A confissão deve ser íntegra quanto aos pecados mortais. Aquele que omitisse voluntariamente um pecado mortal, além de não ter nenhum pecado mortal perdoado, cometeria um pecado grave de sacrilégio, por tornar inválida a confissão. Se por acaso alguém esqueceu um pecado mortal no momento da confissão, ele será perdoado, mas será preciso acusá-lo na próxima confissão. Além de confessar todos os pecados mortais, é preciso dizer a espécie deles, o número e as circunstâncias que podem mudar a espécie ou a gravidade. Assim, não bastaria dizer genericamente pequei gravemente contra o primeiro mandamento, mas é preciso dizer qual foi a espécie do pecado: negação da fé, participação em culto acatólico, etc… É preciso dizer o número: fiz isso uma, ou duas, ou três vezes. Se não se sabe ao certo o número, tentar estabelecer a frequência: por exemplo, cometi esse pecado em torno de uma vez por mês durante aproximadamente 5 anos, etc… É preciso também dizer as circunstâncias que podem realmente influenciar na espécie ou na gravidade. Por exemplo, roubei objeto de grande valor da Igreja. O “da Igreja” é importante porque, além de roubo, teremos o pecado de sacrilégio. É importante, muitas vezes, que a pessoa diga seu estado de vida: solteiro, casado, religioso, sacerdote… pois isso pode ter influência na gravidade ou na espécie do pecado. Como se sabe, não existe obrigação de confessar os pecados veniais, embora seja bom fazê-lo, por humildade, e, sobretudo, para receber as graças a fim de evitá-los no futuro. O pecado venial, embora não nos separe de Deus, é o segundo maior mal que existe, atrás apenas do pecado mortal.
A confissão precisa ser, então, íntegra quanto aos pecados mortais. Ela precisa sem íntegra porque o sacerdote atua na confissão como juiz, como médico, como mestre. Como juiz, é preciso que ele conheça inteiramente a causa, para poder julgá-la corretamente e poder dar uma sentença justa. Como médico, o sacerdote precisa conhecer as doenças graves do penitente para poder prescrever os remédios adequados. Como mestre, o sacerdote precisa conhecer a consciência do penitente, para poder corrigi-la. Além disso, o sacerdote é também pai na confissão, recendo o penitente benignamente, a exemplo de Cristo e pronto a ajudá-lo ao máximo. A confissão é um tribunal e o padre é um juiz. Mas as pessoas não devem ter medo desse tribunal. É um tribunal muito peculiar, pois basta admitir a culpa com verdadeiro arrependimento para ser perdoado. E o padre, ademais de juiz, é também médico, mestre e pai.
A confissão deve ser também humilde, com a pessoa realmente se reconhecendo pecadora e sem buscar desculpas vãs para os seus pecados. A confissão deve ser clara, com a pessoa dizendo de modo transparente a sua falta para que o confessor possa conhecer com exatidão o verdadeiro pecado cometido. Uma linguagem imprecisa e obscura com o fim de que o confessor não se dê conta do que está sendo confessado é profanar o sacramento. A confissão deve ser discreta, isto é, não se deve revelar os pecados alheios, e com relação ao sexto mandamento a clareza e a integridade são necessárias, mas sem o emprego de termos grosseiros ou expressões desnecessárias. A pessoa não deve contar toda a sua vida, mas somente o que diz respeito aos pecados confessados. A confissão deve ser secreta, ou seja, ela deve ser feita unicamente ao confessor, para evitar escândalos.
(Penitência) Feita a confissão, o sacerdote dá os conselhos, prescreve os remédios, e impõe a penitência proporcional ao pecado. O penitente deve, então, aceitar a penitência, a não ser que esteja impossibilitado de cumpri-la, caso em que o confessor dá outra penitência. O penitente deve buscar cumprir a penitência o quanto antes, a fim de não esquecer qual foi a penitência imposta. A verdadeira e sincera aceitação da penitência é indispensável para a validade da confissão. Se depois, apesar de ter aceitado a penitência sinceramente, não a cumpre, a confissão foi válida, mas se comete um pecado pela omissão voluntária da penitência (grave ou leve dependendo da gravidade da penitência e da gravidade do pecado em função do qual ela foi imposta). A penitência sacramental é importantíssima, pois tem eficácia particular para satisfazer pela pena temporal dos pecados. Ela é muito mais eficaz do que mortificações e penitências pessoais. Destaque-se que a pessoa já está em estado de graça após receber a absolvição, mesmo se ainda não cumpriu a penitência. Assim, se ela se confessou antes da Missa, pode comungar ainda que não tenha feito a penitência imposta.
(Absolvição) Imposta a penitência pelo confessor e tendo sido aceita pelo penitente, o sacerdote dá a absolvição.
Uma confissão relativa a pecados mortais que foi mal feita por falta de arrependimento, por falta de propósito de emenda ou por omissão voluntária de um pecado, é inválida e sacrílega. E são sacrílegas também todas as comunhões subsequentes e todas as confissões subsequentes. O único meio de remediar essa situação é fazer uma confissão que envolva todos os pecados dessa primeira confissão ruim e todos os pecados subsequentes, incluindo as comunhões e confissões sacrílegas.
Vemos hoje no Evangelho, caros católicos, Nosso Senhor expulsar um demônio mudo. Infelizmente, o demônio mudo age na confissão, ao nos afastar dela incutindo em nós uma falsa vergonha ou nos fazendo omitir voluntariamente um pecado mortal. É preciso afastar esse demônio mudo e recorrer a tão belo sacramento. Uma certa vergonha e uma certa humilhação existem na confissão e são um bem, porque são já uma pena pelo pecado e nos permite satisfazer por ele. Mas essa vergonha e essa humilhação devem nos levar justamente à confissão e não a nos afastar dela. O sacerdote, caros católicos, é obrigado ao segredo de confissão, sob a pena das mais duras sanções canônicas. O padre que revela diretamente o segredo de confissão incorre em excomunhão, que somete a Santa Sé pode tirar. O que o padre conhece no confessionário, ele conhece, em certo sentido, por ciência divina, que ele não pode comunicar a ninguém. O sacerdote deve morrer para guardar o segredo de confissão e muitos, de fato, morreram por causa disso. Portanto, não deixemos agir esse demônio mudo. Confessemo-nos. E depois que o mudo falou, as pessoas se admiraram, nos diz o Evangelho. Do mesmo modo, depois que um penitente faz uma boa confissão, o sacerdote se admira, junto com a corte celeste, que se alegra pela conversão de uma alma.
Portanto, caros católicos, aproveitemos esse tempo da quaresma para recorrermos à misericórdia divina, que tão sabiamente instituiu o sacramento da confissão.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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