22 de novembro de 2009

Reflexão sobre o Evangelho Dominical - XXIV e Último Domingo depois de Pentecostes - Parte I

24º e Último Domingo depois de Pentecostes

De: "Pensamentos sôbre os Evangelhos e sôbre as festas do Senhor e dos Santos" - Pe. João Colombo. Nihil obstat: Pe. João Roalta Imprimatur: Mons. J. Lafayette

Título original: Pensieri sui Vangeli e sulle Feste del Signore e dei Santi" Milão, Itália.
Escrito entre 1927-1938. Primeira edição em 1939.

Evangelho: Mt. XXIV, 13-35.

1. A JUSTIÇA FINAL DE CRISTO
Três momentos podemos considerar na justiça final de Cristo, como a prediz o Evangelho.
Primeiramente, a crise suprema do mundo. As forças que regem a estrutura do universo dispersar-se-ão; os céus enrolar-se-ão como tendas, o sol e a lua se escurecerão, as estrelas cairão como folhas de outono.
Depois a súbita aparição do Juíz. No céu vazio, Jesus e a sua cruz fulgurante. Aos revérberos dessa luz ultramundana, toda alma tornar-se-á transparente mais do que o cristal batido pelo sol, de modo que todas as manchas da consciência, mesmo as mais pequenas serão visibilíssimas.
O terceiro momento é a confusão da alma culpada. Muda porque sem desculpas, sozinha porque sem nenhum protetor, ela chorará; e ao seu pranto fará coro o vasto soluçar das tribos dos pecadores.
A desilusão de um modo que desaparece.
O juízo exatíssimo do Juíz divino.
A confusão da alma sem desculpas e sem proteção.
São três pensamentos que valerá a pena meditar muito seriamente.



1- A desilusão de um mundo que desaparece.
“O céu e a terra passarão...”; desgraçados todos aqueles que colocaram no mundo o seu coração e o seu tesouro.
Servir-me-ei de alguns símiles de Santo Agostinho, adaptando-os um pouco.
a) Um arquiteto habilíssimo passou, um dia, por diante de uma suntuosa vivenda construída à margem de um riacho, e disse ao proprietário: “Olha que ela esta para ruir; corroídos pela água, os alicerces agora estão cedendo.” O inquilino meneou os ombros em face dele, à noite reuniu ainda os amigos para o costumeiro festim, e depois foi para a cama, dormir tranquilamente. Estava no primeiro e profundo sono, quando a casa ruiu, esmagando-o debaixo dela.
Pior para ele, direis, porque tinha sido avisado. Ora bem: também nós somos avisados. O construtor do mundo diz-nos que este mundo há-de ruir, e que o rio do tempo, correndo sem parar corrói-lhe os fundamentos. E não somos imensamente estultos se em vez de desentulharmos, de começarmos a pôr alhures as nossas esperanças, os nossos desejos, os nossos bens, os colocamos e fixamos neste mundo, como se ele devesse durar sempre, como se devêssemos ter nele uma morada perpétua?
Depois vem a morte, e tudo rui. Depois vem o fim do mundo, e tudo desaba. Que desilusão amaríssima!
b) Um camponês punha o trigo sobre a terra nua, num lugar úmido e sem ar. Veio um amigo, que conhecia bem a natureza do trigo e da terra, e fez-lhe ver a sua ignorância, dizendo-lhe: “Que fizeste? pôr o trigo sobre a terra nua, num lugar úmido? No inverno, quando as longas chuvas amolecem tudo, este grão apodrecerá, e o teu trabalho se irá em fumo.”
O camponês perguntou: “ Que devo fazer?”
O amigo respondeu-lhe: “ Antes que as chuvas comecem,transporta-o para cima.”
O outro pensou um pouco, e , depois, parecendo-lhe muito grande esse trabalho, não o fez. Vieram as chuvas: ele foi ver o trigo, e, em vez de trigo, viu um monte de matéria em fermentação.
Ah! - direis – nós não agiríamos assim! Dizeis bem, porque sois pessoas sensatas; mas sede-o em tudo, inclusive nas coisas mais importantes. Sois prontos em escutar o conselho de um amigo no negócio do trigo; e porque haveis de desprezar o conselho de Jesus, o amigo divino, acerca do negócio de vossa alma?
Ele conhece a natureza do vosso coração, que é feito para o céu; conhece a natureza da terra, que é feita para ser corrompida e destruída, e vos avisa: “Transporta ao alto o teu coração, porque tudo o que esta sobre a terra apodrecerá.”
Tendes receio de por sobre a terra nua um pouco de trigo, e, depois, sobre a terra nua deixareis apodrecer e destruir o vosso coração? Colocai no alto, nos bens invisíveis e eternos, o vosso coração, para não serdes iludidos por este mundo que desaparece.
c)Numa barca em que a água penetrava por todos os lados, um homem clamava por auxílio. Passou um navio, e do alto lhe deixaram cair uma corda de salvamento. O náufrago, que apertava cupidamente a caixinha dos seus tesouros, empenhava em agarrar a corda, mas não o conseguia, por ter as mãos impedidas. Do navio alguém lhe gritava: “Larga o que seguras, toma o que eu te dou. Se não abandonares uma coisa, não pode receber a outra.”
Segurar juntamente caixinha e corda ele não podia; abandonar a caixinha ele não queria; de repente a barca ficou cheia de água, e o homem afundou com a caixinha.
Nós, que vivemos neste mundo, estamos numa barca na qual penetra água por todos os lados e fatalmente vai a pique. Nosso Senhor acorreu para nos salvar, e deixa cair até nós a corda da sua redenção; mas, para pegá-la, é preciso desprendermos as nossas mãos e o nosso coração das coisas e dos prazeres sensuais e mundanos. A mão, se segura um objeto , não pode segurar outro. Quem ama o mundo não pode amar a Deus: tem a mão empenhada. E quanto, segurando cupidamente sobre o coração a sua avareza, ou seu orgulho, ou a sua paixão impura, irão a pique com este mundo!

2- O juízo exatíssimo do Juíz.
Desaparecido o mundo e as suas irrisadas ilusões, não mais restará senão o bem e o mal espalhado em todos os dias da nossa vida, do primeiro alvorecer da razão e da responsabilidade até o momento extremo da morte. Disto seremos julgados.

a) Seremos julgados do mal:
-do mal que fizemos, com as obras, com as palavras, com as ações;
-do mal que fizemos os outros fazerem; e, aqui, pensem nisso os que, sem necessidade, fazem os outros trabalhar em dia de festa, fazem os outros comer carne nos dias proibidos, impedem de qualquer modo os seus dependentes de cumprir os seus deveres religiosos; pensem nisso também os que fazem blasfemar, os que, pela sua conduta, fazem falar mal da religião, os que, com seu modo de vestir e de se comportar, induzem os que os veem a pensamentos e desejos impuros; pensem nisso todos aqueles que tem dado escândalo;
-do mal que deixamos os outros fazerem, quando podíamos impedi-lo: portanto, o mal que muitos pais, com maior vigilância, poderiam impedir em seus filhos; que os irmãos, com maior caridade, poderiam impedir em seus irmãos; que tantos cristãos, com um pouco de ação católica, poderiam impedir em seu próximo; que eu, pobre padre e pastor de almas, poderia impedir na minha paróquia se tivesse mais zelo. Senhor nosso e nosso Juíz Jesus, tende misericórdia!

b) Seremos julgados também do bem:
- do bem que não fizemos e que podíamos fazer: por exemplo, do rosário ou terço que todos podem rezar toda noite em família, e que não rezam; das Missas que se podiam ouvir, das esmolas que se podiam fazer, dos auxílios às boas obras e ao próximo necessitado que se podiam prestar!
- Do bem que fizemos mal: todas as vezes que na igreja, durante os sagrados ritos, estivemos com os olhares vagando sobre as pessoas, com a mente anuviada de pensamentos inúteis e quiçá pecaminosos; todas as vezes que demos esmola ou trabalhamos para ser vistos, estimados, recompensados pelos homens;
- finalmente, do bem que fizemos bem: este é o ouro puro, só com o qual se pode comprar a vida eterna.

3- A confusão da alma culpada.
a) “Quid sum miser tunc dicturus?” Que poderá dizer, que desculpas poderá apresentar a alma culpada?
Talvez diga; “A tua lei,ó Senhor, era muito difícil, não se podia observá-la.” Não, ela não poderá dize-lo, do contrário em torno de Cristo se levantaria para protestar uma turba infinita de homens, de mulheres, de jovens e de meninas. Eles souberam praticá-la, e, praticando-a, sentiram que o jugo do Senhor é leve e suave.
Talvez ela diga: “A tua lei, ó Senhor, requeria muito tempo, e eu tinha afazeres, transações, negócios desde o amanhecer até alta noite.” Não, não poderá dize-lo, do contrário em torno de Cristo se levantaria outra turba de almas que trabalharam ainda mais do que ela, sem descurarem a salvação eterna; e,depois, a razão requeria que se abandonasse mesmo algum negócio material, para não perder o único negócio necessário, que é o da alma.
Talvez ela diga: “Eu tinha pouca saúde, tinha muitas preocupações financeiras, a casa pequena, não tinha lugar para outra caminha...” Não, não o dirá. Sentirá dentro de si que tudo isso eram desculpas para esconder o medo dos sacrifícios, o amor das comodidades, o desejo de ter liberdade para gozar a vida; sentirá dentro de si que, se tivesse amado o Senhor, teria achado a coragem e a força necessária para vencer todas as dificuldades.

b) “Quem patronus rogaturus?” A quem chamará ela em socorro?
Porventura o anjo da guarda? Não; a alma, nos dias da vida terrena, nunca lhe quis escutar o pranto silencioso; e agora ele não pode, nem lhe quer ouvir a sua angústia desesperada.
Acaso algum santo protetor? Os santos, quem não os invoca quando vivo ignora-lhes os nomes quando morto. Quem não os imita na mortificação nunca será companheiro deles na alegria.
Acaso acudirá Nossa Senhora? Não; essa é a mãe dos pecadores, mas não mãe dos condenados. Depois de pronunciada a condenação por seu Divino Filho, ela se conforma com a justa sentença. E, se Nossa Senhora não vem, ela que é mãe de misericórdia e de esperança, é sinal de que toda misericórdia e toda esperança morreu.

Conclusão.
No Horto das Oliveiras, quando Jesus foi ao encontro do bando que vinha para o prender, disse simplesmente: “Aqui estou, sou eu!”
Eles recuaram, e caíram como desmaiados de susto.
Todavia, aqueles eram os dias da sua mansidão, os dias do cordeiro que emudece enquanto o tosquiam, que não solta um balido enquanto o conduzem ao matadouro. Que será então no dia da sua justiça, no dia do leão que ruge e agarra?
“Aqui estou, sou eu.”
Sou esse Jesus a quem blasfemaste, a quem beijaste como traidor, a quem ultrajaste com os escarros e as pancadas, a quem puseste na cruz com os cravos dos teus pecados.

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