XXVIII. EXORTAÇÃO PARA OUVIR PIEDOSAMENTE
A SANTA MISSA
Quanto não se aflige a Igreja, por ver
tantos filhos assistirem, sem piedade, ao santo Sacrifício! Ocupam-se os fiéis,
não raras vezes, com o que se passa ao redor, porém, não do que se realiza no
altar; observam quem entra e quem sai; oram somente com os lábios, sem que o
coração tome parte. Eis seu proceder na presença de Deus três vezes santo!
Perguntamos se lhes existe ainda uma faísca de fé na alma e se merecem o nome
de católicos. Oh! quanto nos dói o coração à vista de tão culpada irreverência,
no momento em que tudo nos convida à mais ardente piedade.
A Igreja católica impõe o respeito para a
santa Missa, por estas palavras: "Reconhecer que os cristãos não podem
cumprir obra mais santa, mais divina que este assombroso mistério é também
reconhecer que não se pode pôr cuidados e diligência suficientes para
desempenhá-lo com pureza de coração, com piedade e edificação (Concílio de
Trento). Não é necessário, para isso, experimentar uma devoção sensível; basta
a vontade firme de assistir atenta e respeitosamente.
A verdadeira piedade, com efeito, não
consiste na doçura interior, mas no fiel serviço de Deus.
A piedade ou devoção consiste, segundo
todos os mestres da vida espiritual, numa vontade pronta e generosa de fazer
tudo quanto Deus quer, e sofrer corajosamente tudo quanto quer que soframos. As
doçuras e as consolações sensíveis não são, pois, a devoção, mais um estímulo
para a devoção que o Senhor concede conforme nossas necessidades e sua
sabedoria. O espírito de fé está sempre ao nosso dispor e podemos, agindo
segundo esta fé, servir a Deus com inteira fidelidade e ser do número dos
justos que vivem da fé.
Se não tivesses desejo algum e não
fizesses nenhum esforço para sair de tua indiferença, então somente, haveria
culpa e te privarias de muitos méritos. A este respeito lembrar-te-emos das
palavras de Nosso Senhor à Santa Gertrudes.
Esforçando-se, uma vez, em unir alguma
intenção particular a cada nota e cada palavra de seu canto, e, sentindo que se
achava, muitas vezes, impedida pela fraqueza de sua natureza, dizia no
interior, com muita tristeza: "Ah que fruto posso tirar deste exercício
visto que sou sujeita a tão grande mudança?". Nosso Senhor, porém,
apresentou-lhe nas mãos o Sagrado Coração sob o emblema duma lâmpada ardente,
dizendo: "Eis que exponho, aos olhos de tua alma, meu Coração caridoso que
é o órgão da Santíssima Trindade, a fim de que lhe peças, com confiança, que
faça em ti tudo o que não serias capaz de operar, e desta sorte, eu nada veja,
aí, que não seja extremamente perfeito; pois, da mesma maneira que um servo
está sempre prestes a executar as ordens de seu amo, assim meu Coração será
sempre disposto, em qualquer hora, a reparar os efeitos de tua negligência"
(Líber III, c. 25). Santa Gertrudes admirava, tremendo, o excesso da bondade do
divino Salvador, julgou, porém, que seria inconveniente que o Coração adorável
de seu Deus suprisse os defeitos de sua criatura. Mas o Senhor animou-a com
esta comparação: "Não é verdade que, se tivesses uma bela voz e achasses
extremo prazer em cantar, encontrando-te com uma pessoa que tivesse a voz tão
áspera, tão desagradável e desafinada que sentisse muita pena em pronunciar e
em formar os menores sons, acharias mal que, oferecendo-te para cantar, ela não
to quisesse permitir? Assim, meu Coração divino, reconhecendo a inconstância e
a fragilidade da natureza humana, deseja com ardor que o convides, senão por
palavras, pelo menos por outro sinal, a operar e cumprir em ti o que não és
capaz de operares e cumprires".
Oh que palavras de animação e conforto!
Estás distraído à santa Missa? Desprovido de piedade? Vai a Jesus, dizendo-lhe:
"Deploro amargamente estar tão distraído e rogo a vosso divino Coração que
se digne suprir a minha negligência".
Para ajudar a tua boa vontade,
indicar-te-emos também a maneira de te comportares na santa Missa. Primeiro,
indo à igreja, considera aonde vais e o que vais fazer. Não subas ao templo
como o fariseu e o publicano para orar somente, mas entras aí para
"oferecer", segundo a palavra de David: "Senhor, sou vosso
servo, oferecer-vos-ei uma hóstia de louvor e invocarei vosso santo nome"
(Sl. 115).
Entras aí para prestar a Deus o culto mais
perfeito, para apresentar a oferta que lhe é mais cara. "A audição da
santa Missa, diz um escritor eclesiástico, não é somente uma oração, é um ato
de adoração, é uma oferta, um sacrifício divino, visto que todos os assistentes
bem dispostos unem-se à ação e às intenções do sacerdote". O mesmo autor
explica então o sentido da palavra "sacrificar" e diz que a ação mais
excelente, é praticar a mais alta virtude, porque, sacrificando, atestamos a
soberania de Deus, seu direito de ser, infinitamente, honrado e glorificado;
confessarmos, ao mesmo tempo, nossa dependência absoluta como criaturas, das
quais pode dispor à vontade. É por isso que o Sacrifício é o ato de religião
mais agradável ao Senhor, e o mais útil aos homens.
Penetrado destas verdades, chega ao pé do
altar; formula aí a intenção de ouvir a santa Missa. Tens algumas orações
particulares que fazer? Faze-as até a consagração. A elevação, não te ocupes
senão com Nosso Senhor: adora-o, oferece-o a seu Pai eterno, expondo-lhe tuas
necessidades. Há pessoas que têm escrúpulo de renunciar a suas orações quotidianas
pelas da santa Missa. É um erro. Tuas orações quotidianas, comparadas com as da
santa Missa, são tão inferiores como o cobre é inferior ao ouro. Além disso,
estas orações podem fazer-se em outro tempo que não seja à hora da Missa, ao
passo que não podes dizer as da Missa, tão utilmente, em outro tempo como
quando o santo Sacrifício se efetua; e, se te acontecesse não achar um momento
para desempenhar estas devoções particulares, esta omissão seria menos
prejudicial que a primeira.
Logo que o sacerdote pronunciou, no
momento solene, as palavras da consagração, o pão tornou-se o Corpo de Nosso
Senhor. "O homem deve tremer, diz São Francisco de Sales, o mundo
estremecer, o céu inteiro ficar arrebatado, quando, sobre o altar, o Filho de
Deus se entrega nas mãos do sacerdote". Oh! admirável humildade, o Mestre
de todas as coisas abaixa-se, para a salvação do homem, até ocultar-se sob as
aparências do pão.
Mas, porque os nossos sentidos não
percebem a presença do Senhor, não lhe prestamos atenção, e, entretanto, os
demônios fogem espavoridos e os Anjos tremem diante de sua face. Assim disse
Jesus Cristo a Santa Brígida: "Do mesmo modo que à palavra 'Sou eu!' meus
inimigos caíram por terra, às palavras da consagração 'Isto é o meu Corpo!' os
demônios fogem".
A semelhança dos Anjos e dos Santos,
apliquemo-nos a glorificar o Senhor sobre o altar, e a participar de seu
adorável Sacrifício. É excusado dizer que, no momento da elevação, devemos
deixar toda outra oração, a fim de levantar os nossos olhos para o altar e adorar,
humildemente, o Cordeiro de Deus, oferecendo-o ao Pai celestial. Estes
exercícios de fé e caridade devem ocupar-nos todo o tempo, até que Jesus seja
consumido pela Comunhão do sacerdote.
Infelizmente, grande número de fiéis não
se conforma a nenhuma destas práticas. Continuam a receitar suas orações
costumeiras, dedicando-se a uma espécie de devoção rotineira, como se Nosso
Senhor não estivesse presente e não fosse preciso ocupar-se dEle. Caro leitor,
não procedas mais assim; no momento da consagração, cai de joelhos como o
sacerdote e, repleto de fé e amor, adora aquele que se mostra a teus olhos, sob
as espécies de pão e de vinho.
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