XXV. DA MANEIRA DE OFERECER A SANTA MISSA
E DO VALOR DA OBLAÇÃO
Caro leitor, lê neste capítulo com grande
atenção; grava-o, profundamente, em tua memória, segue os conselhos que encerra
e tirarás, do santo Sacrifício, imenso proveito.
Já ficou dito que a santa Missa, único
sacrifício do cristianismo, é um ato de adoração, uma oferta divina. O grande
Sacerdote, o verdadeiro Sacrificador, é Nosso Senhor Jesus Cristo. Depois dele
vem o celebrante, o instrumento que lhe empresta as mãos e a boca. Em terceiro
lugar, vêm os assistentes, que mandam celebrar a santa Missa, os que oferecem
os objetos necessários ao culto, enfim, todos os que, impedidos por ocupações
de assistir, se unem, espiritualmente, aos assistentes. Todos oferecem, em
certo sentido, a divina Vítima e participam dos frutos desta preciosa oferta.
Sem a oblação do divino Sacrifício nem mesmo ouvirias a santa Missa como deves:
porque ouvir a Missa não é somente assistí-la, é oferecer o Sacrifício em união
com o sacerdote e pelas mãos do sacerdote. Por conseguinte, os fiéis que, na
santa Missa, se entregam a toda sorte de devoções particulares, sem se ocuparem
da oblação do santo Sacrifício, privam-se de um número infinito de graças.
Não acharás, certamente, inútil que te
expliquemos, minuciosamente, a maneira de oferecer a Deus o santo Sacrifício.
Supõe que uma pessoa recite, devotamente,
muitos terços, oferecendo-os a Jesus Cristo e à sua Santíssima Mãe, enquanto
outra pessoa assiste a uma só Missa, oferecendo-a. Qual das duas, pensas, dará
mais e será, mais profusamente, recompensada? Sem dúvida, a segunda. Pois, que
oferece a primeira? Uma prece, muito santa, ensinada, na maior parte, por Jesus
Cristo e por seu Anjo, mas que tem todo o valor da piedade pessoal da pessoa
que reza, e fica, por conseguinte, muito imperfeita. Que se oferece, porém, na
santa Missa? Um dom absolutamente sobrenatural, perfeitíssimo, divino: o Corpo
e o Sangue de Jesus Cristo, suas lágrimas, sua morte, seus méritos.
Dir-me-ás, talvez: A pessoa que oferece os
terços oferece um dom que ela própria adquiriu, ao passo que, na santa Missa,
oferecem-se méritos que pertencem a Jesus Cristo. Afirmamos, porém, de novo:
Aquele que oferece a santa Missa, oferece um bem próprio, porque, pelo
Sacrifício não cruento da santa Missa, recebem os frutos do Sacrifício cruento
na Cruz.
Que imenso favor, pois, é aquele com que o
Senhor te enriquece, quando, na santa Missa, te constitui, espiritualmente, sacerdote
e te concede o poder de oferecer a Deus, seu Pai, segundo a maneira dos
sacerdotes, não só por ti, como pelos outros. É neste sentido que o celebrante
diz depois do "Sanctus": "Lembrai-vos, Senhor, dos vossos servos
e servas e de todos os circunstantes, pelos quais vos oferecemos, e eles mesmos
vos oferecem este sacrifício de louvor por si e por todos os seus amigos,
benfeitores, vivos e mortos".
Para esta cooperação, o sacerdote já
convidou os fiéis no "Orate fratres", dizendo: "Orai, meus
irmãos, para que meu sacrifício, que é também o vosso, seja agradável a Deus
Padre todo poderoso".
Em outras palavras: Este sacrifício vos
pertence tanto quanto a mim, é tanto obra vossa quanto minha; peço-vos que me
ajudeis a oferecê-lo.
Depois da "Elevação do cálice",
o sacerdote diz: "Portanto, Senhor, nós, teus servos e teu povo santo,
oferecemos à tua gloriosa Majestade, de teus mesmos dons e benefícios, esta
Hóstia pura, Hóstia santa, Hóstia imaculada. Pão santo da vida eterna, Cálice
da salvação perpétua".
Tua cooperação pela oblação é, pois, muito
real, o celebrante conta com ela. Se não lhe aceitares o convite e não unires a
voz e o coração à sua ação, engana-lo-ás em sua expectativa e a ti mesmo,
privando-te do benefício da oblação. "Aqueles, diz o bispo Fornero de
Hebron, que deixam de oferecer a santa Missa por si e pelos seus, privam-se dum
imenso benefício". É, pois, igualmente um ato de injustiça para contigo
mesmo faltar à Missa ou não oferecê-la quando a assistires. O oferecimento é a
melhor das práticas; quanto mais o renovares, mais alegrarás o céu, maior
número de dívidas pagarás, maior glória futura adquirirás. Dizer a Deus: Eu te
ofereço, significa na Missa: Eu te pago, com o ouro dos merecimentos de Jesus
Cristo, o resgate de meus pecados, os bens celestes, o livramento das almas do
purgatório.
É verdade que se pode dizer, fora da santa
Missa, a qualquer hora e com muita vantagem: "Senhor, eu te ofereço o caro
Filho, te ofereço sua dolorosa Paixão e Morte, seus méritos". Entretanto,
esta oblação não é senão espiritual, enquanto que, na santa Missa, é real. Aí
Jesus Cristo está, realmente, presente e com ele suas virtudes e seus méritos;
aí se imola de novo e renova sua Paixão e sua Morte, nos dá seus méritos, a fim
de que os ofereçamos a seu Pai celeste.
Santa Mechtildes ouviu, uma vez, durante a
santa Missa, Nosso Senhor lhe falar desta forma: "Concedo-te meu amor
divino, minha oração e minha Paixão, a fim de que possas mas oferecer por tua
vez. Dai-mas, eu tas restituirei multiplicadas, e, toda vez que mas ofereceres,
novamente as duplicarei. É assim que o homem recebe o cêntuplo no tempo e uma
glória infinita na eternidade" (Lib. Revelation I, cap. 14).
Entre todas as orações da santa Missa, diz
Sanchez, nenhuma é mais consoladora do que a que se segue à elevação do cálice,
quando o sacerdote oferece ao Pai celeste o "Cordeiro" imaculado,
dizendo: "Senhor, nós, que somos vossos servos e vosso povo santo,
oferecemos à vossa sublime Majestade a Hóstia pura, a Hóstia santa, a Hóstia
imaculada, etc.". Chama o povo, isto é, os assistentes, santos, porque são
santificados pela santa Missa, conforme a palavra de Jesus Cristo: "Eu me
santifico por eles, a fim de que sejam santificados na verdade" (Jo. 22,
19).
Ele os santifica pela "aspersão do
sangue divino", como diz o Apóstolo São Paulo (Heb. 13, 12).
Quão preciosa é a Hóstia pura, santa, sem
mácula! É a carne puríssima, a alma santíssima, o sangue imaculado de Jesus! A
que pode se comparar esta oferta, se a terra inteira não é senão um grão de
poeira ao seu lado! Que dizemos? A imensidade do céu nada contém de mais
precioso. O que dás ao Deus onipotente, oferecendo esta Hóstia, é o dom
perfeitamente digno de sua Majestade infinita, é seu Filho com sua humanidade
santa, é o próprio Deus!
Se todos os súditos de um monarca poderoso
oferecessem a seu soberano, em testemunho de seu amor e fidelidade, por
embaixadores escolhidos, uma taça artística do ouro mais puro, ornada de pedras
preciosas de inestimável valor, a satisfação e o reconhecimento do príncipe seria,
sem dúvida, muito grande. Se porém, esta taça contivesse uma jóia do valor de
um reino, a admiração e alegria do rei seriam ainda mais profundas. Na santa
Missa, porém, oferecemos ao Altíssimo a humanidade de Jesus Cristo, isto é, o
que sua mão onipotente criou de mais excelente e mais sublime. Eis a taça
preciosa; a jóia de um valor incomparável que encerra, é a divindade do
Salvador; é nele que "reside a plenitude da divindade" (Col. 2, 9).
Propriamente falando, não é a divindade,
mas a humanidade de Nosso Senhor Jesus Cristo que oferecemos à adorável
Trindade; as duas naturezas, porém, são estreitamente unidas, e nunca realmente
separadas, de sorte que as oferecemos juntas. Que satisfação para o Pai eterno
quando recebe de tuas mãos este dom incomparável, aquele do qual disse: "É
meu Filho predileto em quem pus todas as minhas complacências!" (Mt. 3,
17). Avalia a recompensa que te espera em troca, e a soma de dívidas que pagas
por esta preciosa oferta.
Henrique I, rei da Inglaterra, ouvia,
todos os dias, três Missas, ajoelhado ao pé do altar. Chegado o momento da
consagração, aproximava-se do celebrante e sustentava-lhe os braços durante a
elevação do Corpo e Sangue de Nosso Senhor. Era a maior consolação do piedoso
monarca. Se houvesse ainda este piedoso costume, qual não seria a tua pressa em
tomar lugar junto ao sacerdote! Deus se contenta, porém, com teu desejo,
dize-lhe somente do íntimo do coração: "Senhor, ofereço-vos vosso caro
Filho pelas mãos do sacerdote". Deus muito bem saberá interpretar-te a
intenção.
A oferta da santa Hóstia é preciso unir a
do preciosíssimo Sangue. É um meio excelente de salvar as almas. Lê-se, na vida
de Santa Maria Madalena de Pazzi, que o próprio Senhor a instruíra neste
assunto, fazendo-lhe conhecer quanto a oferta de seu precioso Sangue é própria
para apaziguar a cólera de Deus. O divino Salvador se queixava do pequeno
número dos que trabalham para acalmar a Justiça de seu Pai celeste, e exortava
a santa a aplicar-se a isto. Desde então, ela oferecia o preciosíssimo Sangue
até cinqüenta vezes por dia, pelos vivos e pelos mortos; e seu celeste Esposo
lhe mostrou, muitas vezes, as almas que tirava do purgatório por este meio.
"Quando ofereces o precioso Sangue ao
Pai celeste, diz a mesma Santa, lhe ofereces um dom tão agradável, que ele se
reconhece teu devedor". Como efeito, que haverá, no céu e sobre a terra,
que iguale, em valor, o precioso Sangue, do que diz São Tomás de Aquino, uma só
gota vale mais que um mar de Sangue dos Mártires; do qual uma só gota seria
assas poderosa para purificar o mundo de todos os pecados. Por conseguinte, se,
em troca da oferta do precioso Sangue, Deus te concede o céu, não te retribui
um bem de igual valor.
Se tivesses presenciado a crucificação do
divino Salvador e recolhido o Sangue adorável que lhe corria das chagas
sagradas, e tivesses elevado este precioso Sangue ao céu, implorando
misericórdia para ti e para o gênero humano, o Pai celeste ter-se-ia
enternecido, sem dúvida; todos os teus pecados teriam sido perdoados. Ora, é
isto que fazes quando, durante a santa Missa, ofereces o precioso Sangue ao
Deus altíssimo.
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