20 de março de 2021

Histórias das Cruzadas - Livro Primeiro - Origem e Progresso do Espírito das Cruzadas 12

No entretanto, outros males aguardavam os cristãos na Palestina: todas as cerimônias da religião foram proibidas, a maior parte das igrejas, convertidas em estábulos; a do santo sepulcro foi destruída até os alicerces. Os cristãos, expulsos de Jerusalém, dispersaram-se por todas as partes do Oriente. Os antigos historiadores narram que o mundo partilhou do luto da cidade santa e que foi tomado de ânsias e de temores. O inverno, com todos os seus rigores apresentou-se em regiões onde ele era desconhecido. O Bósforo e o Nilo rolaram montes de gelo. Um tremor de terra foi notado na Síria, na Ásia Menor e seus abalos, que se repetiram durante dois meses, destruíram várias grandes cidades. A notícia da destruição dos santos lugares, chegando ao Ocidente, arrancou lágrimas de todos os cristãos. Lemos na crônica do Monge Glaber que a Europa vira também sinais precursores de uma grande calamidade; uma chuva de pedras caíra na Borgonha; um cometa e meteoros ameaçadores haviam aparecido no céu. A agitação foi extrema entre todos os povos cristãos; todavia, eles não tomaram ainda as armas contra os infiéis e sua vingança caiu sobre os judeus que a Europa inteira acusou de ter provocado o furor dos muçulmanos.

As calamidades da cidade santa tornaram-se ainda mais veneráveis aos olhos dos fiéis; a perseguição redobrou o piedoso desejo dos que iam à Ásia contemplar a cidade santa, coberta de ruínas. Era em Jerusalém, coberta de luto, que Deus distribuía mais particularmente suas graças, que ele se comprazia em manifestar sua vontade. Os impostores, aproveitando-se dessa opinião dos povos cristãos abusaram
muitas vezes da credulidade da multidão. A fim de fazer crer em suas palavras, era-lhes suficiente mostrar cartas que haviam caído dos céus de ]erusalém, diziam eles. Nessa época, uma predição que anunciava o fim do mundo e a próxima aparição de Jesus Cristo na Palestina, preocupava muito a Europa cristã e todas as mentes eram dirigidas a Jerusalém. O cronista Glaber nos diz que a afluência dos peregrinos nessa ocasião foi maior do que em qualquer outra época. Todos se dirigiam aos santos lugares para lá esperar a vinda do soberano juiz. Os pobres e os homens do povo encheram por primeiros as estradas de Jerusalém; depois, os barões, os condes e os príncipes acompanharam o movimento geral. As sombrias inquietações que agitavam os fiéis à peregrinação, levavam-no também a legados piedosos; os ricos, não se incomodando mais com os bens da terra, procuravam somente amontoar riquezas para o céu. Mais de um documento de doação começa com estas interessantes palavras: "Visto que está próximo o fim do mundo, temendo o dia do juízo, etc. Essa crença no último dia do mundo é um fato bem digno de nota; ela despertou nos povos da Europa, no século X, aquelas profundas inquietações, aquelas tristezas, que, ordinariamente se apoderam das gerações chamadas a produzir grandes coisas; todas as vezes que uma época é perturbada pelo vago pressentimento de algum fato novo, como o que deve vir lhe é desconhecido, ela começa por se perturbar e aterrorizar-se, e parece-lhe que o mundo vai acabar. O século X estava de algum modo, enfermo, pela revolução que trazia em seu flanco e que revolução como essas Cruzadas que iam se iniciar no século seguinte!

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