27 de março de 2021

Histórias das Cruzadas - Livro Primeiro - Origem e Progresso do Espírito das Cruzadas 18

As crônicas contemporâneas narram a fraude piedosa, com que Foulque enganou os sarracenos, para ser admitido à presença do Santo Sepulcro; mas a gravidade da história não nos permite repetir a relação muito singela das velhas crônicas. O conde de Anjou, voltando aos seus territórios, quis ter sob seus olhos uma imagem dos lugares que ele tinha visitado e mandou construir, perto do castelo de Loches, uma igreja, semelhante à do Santo Sepulcro. Lá ele implorava todos os dias a divina demência; nas suas orações não tinham ainda comovido ao Deus de misericórdia. Mui depressa ele sentiu renascer em seu coração a perturbação que por tanto tempo o havia afligido. Foulque se pôs a caminho, uma segunda vez para Jerusalém, onde edificou novamente os fiéis com as expressões do seu arrependimento e as austeridades de sua penitência. Voltando à Europa, pela Itália, ele livrou o soberano Pontífice de um inimigo terrível, que devastava o estado romano. O Papa recompensou seu zelo, elogiou sua devoção e deu- lhe a absolvição de todos os seus pecados. O nobre peregrino voltou por fim ao seu condado, trazendo muitas relíquias, com que adornou as Igrejas de Loche e de Angers.

Desde então, ocupou-se, no seio da paz, em construir mosteiros e cidades, o que lhe granjeou o apelido de Grão Edificador, como suas numerosas peregrinações o haviam feito apelidar de o Palmeiro. Seus serviços e benemerências mereceram-lhe as bênçãos da Igreja e as do seu povo, que agradecia ao céu por ter trazido seu príncipe à moderação e à virtude. Foulque parecia nada mais ter a temer da justiça divina, nem da dos homens, mas, tais eram os clamores de sua consciência e o tormento de sua alma agitada, que nada podia defende-lo contra o remorso e dar-Ihe a paz que ele tinha procurado por duas vezes junto do túmulo de Jesus Cristo. O infeliz príncipe resolveu fazer uma terceira peregrinação a Jerusalém. A Palestina viu-o de novo molhando com suas lágrimas o sepulcro de Cristo e enchendo os santos lugares com seus gemidos. Depois de ter visitado a terra e recomendado sua alma às orações dos anacoretas encarregados de receber e de consolar os peregrinos, ele deixou Jerusalém, para voltar à pátria, que ele não devia mais rever. Adoeceu e morreu em Metz, em 1.040. Seu corpo foi levado e sepultado no mosteiro do Santo Sepulcro, que ele tinha feito construir perto de Loches. Depositaram seu coração numa igreja de Metz, onde se via ainda, vários séculos depois de sua morte, um mausoléu que se chamava o túmulo de Foulque, Conde de Anjou.

Ao mesmo tempo, Roberto, duque da Normandia, pai de Guilherme o Conquistador, acusado de ter feito envenenar seu irmão Ricardo, partiu para a terra santa. Ele ia, diz a velha crônica da Normandia, descalço e com vestes humildes, acompanhado por uma grande multidão de cavaleiros de barões e de outras pessoas. Passando por Roma, Roberto mandou cobrir com uma rica veste a estátua eqüestre de Constantino, que era feita de bronze, dizendo que os romanos, prestavam pouca reverência ao seu senhor, pois que não lhe podiam dar um manto,em todo o ano. Chegando a Constantinopla, o duque de Normandia dispensou o luxo e os presentes do imperador e compareceu à corte como o mais simples dos peregrinos. Roberto, que, segundo as mesmas palavras, dava mais valor aos males que ele sofria por Jesus Cristo, do que à melhor cidade de seu ducado, suportou piedosamente as fadigas e as dificuldades da peregrinação. Caindo doente na Ásia Menor ele recusou os serviços dos cristãos do seu séquito, e se fez levar numa liteira pelos sarracenos. Um peregrino da Normandia tendo-o encontrado, perguntou-lhe se ele tinha ordens a lhe dar, para o seu país: Vai dizer ao meu povo, respondeu o duque, que se viu um príncipe cristão levado ao Paraíso por demônios."Roberto encontrou à porta de Jerusalém, uma multidão de peregrinos que não tinham com que pagar o tributo aos infiéis; os pobres peregrinos esperavam a chegada de algum cristão rico, que com suas esmolas, lhes abrisse as portas da Cidade Santa. Roberto pagou uma peça de ouro, por cada um deles. Durante sua estada em Jerusalém, ele se fez notar por sua devoção e sobretudo por sua caridade que se estendia mesmo aos infiéis. Voltando à Europa, ele morreu em Nice, ocupando-se somente com as relíquias que havia trazido da Palestina e lastimando somente não ter morrido na santa cidade.

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