IV
A Ascensão de Jesus faz nascer na alma fiel que a contempla com devoção múltiplos sentimentos. Se Cristo já não merece, contudo a Sua Ascensão tem a virtude de produzir eficazmente as graças que significa ou simboliza.
Fortalece a nossa fé na Divindade de Jesus; aumenta a nossa esperança pela visão da glória do nosso chefe; animando-nos à observância dos Seus mandamentos, que constitui o fundamento dos nossos méritos, principio da nossa beatitude futura, torna o nosso amor mais ardente.
Faz nascer em nós a admiração por tão maravilhoso triunfo, o reconhecimento pela participação que dela nos dá Jesus Cristo. Levantando as nossas almas para as realidades celestes, aviva nelas o desprendimento das coisas que passam; Quae sursum sunt quaerite, ubi Christus est in dextera Dei sedens, nom quae super terram. Dá-nos a paciência no meio das adversidades deste mundo, pois diz S. Paulo, «se participarmos dos sofrimentos de Cristo seremos associados à Sua glória»: Si tamen compatimur ut et conglorificemur.
Há todavia dois sentimentos em que quero demorar-me convosco alguns instantes, porque brotam com particular abundância da contemplação piedosa deste mistério e são singularmente fecundos para as nossas almas: a alegria e a confiança.
Em primeiro lugar, por que motivo nos havemos de alegrar?
Nosso Senhor dizia aos Apóstolos, antes de os deixar: Si diligeretis me, gauderetis utique quia vado ad Patrem. «Se me amásseis regozijar-vos-ieis por eu ir para o Pai». Também a nós repete Jesus Cristo estas palavras. Se O amamos, regozijar-nos-emos com a sua glorificação; regozijar-nos-emos por Ele, depois de terminada a sua carreira, subir para a direita do Pai, ser exaltado ao mais alto dos céus, para depois dos Seus trabalhos, dos Seus sofrimentos, da Sua morte, gozar um repouso eterno numa glória incomensurável. Inunda-O e penetra-O para sempre, no seio da Divindade, uma felicidade para nós incompreensível; supremo domínio Lhe é dado sobre toda a criatura.
Como não havemos de nos alegrar por ser assim feita a Jesus por Seu Pai inteira justiça?
Vede como a Igreja, na Sua Liturgia, nos convida a celebrar com alegria esta exaltação do seu Esposo, nosso Deus e nosso Redentor.
Ora convida todas as nações a manifestarem toda a sua alegria em hinos repetidos; Omnes gentes, plaudite manibus: " Nações inteiras, aplaudi! Exaltai a Deus com gritos de júbilo! » Jubilate Deo in voce exsultationis. « Porque o Senhor se eleva no meio das aclamações, e as trombetas celebram a Sua subida ao céu. Cantai ao nosso Deus! Cantai ao nosso Rei! Entoai harmoniosos cânticos! Pois o Senhor reina sobre as nações e está sentado no Seu santo trono»: Ascendit Deus in jubilo et Dominus
in voce tubae. «Exaltai o Rei dos reis, e cantai um hino a Deus!» Exaltate Regem regum, et hymnum
dicite Deo.
Ora se dirige às potências angélicas: «Abri as portas, príncipes dos céus, para que o Rei da glória possa entrar». Attolite portas, príncipes, vestras, et es introibit Rex gloriae, Admirados, os Anjos perguntam uns aos outros: «Quem é esse Rei da glória»? Quis est iste Rex gloriae? "É o Senhor, cheio de força e poder, o Senhor que faz brilhar o seu vigor nos combates»: Dominus fortis et potens, Dominus potens in praelio. E os espíritos celestes repetem: «Quem é esse Rei da glória»? «É o Senhor dos exércitos, é Ele o Rei da glória»: Ipse est Rex gloriae!
Ora, finalmente, numa linguagem cheia de poesia, tirada do salmista, se dirige ao próprio Jesus: «Elevai-Vos, Senhor, pela Vossa força divina, pois cantaremos e celebraremos os Vossos triunfos»: Exaltare, Domine, in virtute tua: contabimus et psallemus virtuites tuas.
«A Vossa glória resplandece nas alturas dos céus». « Fazeis das nuvens Vossa carruagem; caminhais sobre as asas dos ventos: revestistes-Vos de majestade e esplendor; envolvestes-Vos de luz como dum manto»: Confessionem et decorem induisti, amictus lumine sicut vestimento.
Sim, alegremo-nos! Aqueles que amam a Jesus sentem profunda e intensa alegria em O contemplar no mistério da Ascensão, em agradecer ao Pai o ter dado semelhante glória a Seu Filho, em felicitar a Jesus por ser o objeto dessa glória.
Regozijemo-nos ainda por esses triunfos e glorificação de Jesus serem também nossos.
Ascendo ad Patrem meum Patrem vestrum. Deum meum et Deum vestrum; «Volto para meu Pai que
é também vosso Pai, para meu Deus que é também vosso Deus». Jesus possui-nos; não se separa de nós, não nos separa d'Ele. Se entra no Seu reino glorioso, é « para aí nos preparar um lugar»: Vado parare vobis locum; promete «vir um dia buscar-nos» para lá nos sentarmos também, para que, diz, «estejamos onde Ele está». Assim, de direito, estamos já na glória e felicidade de Jesus Cristo: ali estaremos um dia na realidade. Não o pediu Ele ao Pai? Volo, Pater, ut ubi sum ego, et illi sint mecum. Que força nesta oração e que doçura nesta promessa!
Abandonemos, pois, os nossos corações a esta alegria íntima e toda espiritual. Nada « dilata» tanto as nossas almas como este sentimento, nada as faz correr com mais generosidade na vida dos preceitos do Senhor»: Viam mandatorum tuorum cucurri, cum dilatasti cor meum. Digamos muitas vezes a
Jesus Cristo, durante estes santos dias, as aspirações ardentes do hino da festa:
Tu esto nostrum gaudium
Qui es futurus praemium ;
Sít nostra in te gloria
Per cuncta sempre saecula.
«Sede a nossa alegria, Vós que sereis um dia a nossa recompensa, e que toda a nossa glória permaneça em Vós para sempre, por todos os séculos»!
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