10 de julho de 2014

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - 21ª Parte

21. “Eles o crucificaram e com ele dois outros, um de um lado e o outro de outro, ficando Jesus no meio” (Jo 19,18). A esposa sagrada chama o Verbo encarnado “todo desejável é o meu dileto” (Ct 5,16). Em qualquer estado de sua vida em que Jesus se nos apresente, sempre aparece todo desejável e todo amável, quer o contemplemos como um menino na gruta, quer como um operário na oficina de S. José, quer como um solitário em oração no deserto, quer como um pregador banhado em suor percorrendo a Judéia. Em nenhum passo, porém, se nos mostra mais amável que pregado na cruz, onde morre trucidado pelo amor imenso que nos dedica. S. Francisco de Sales dizia: “o monte Calvário é o monte dos que amam; o amor que não nasce da paixão do Salvador é fraco”. Desgraçada é a morte sem o amor do Redentor. Acostumem-nos, pois, a considerar este homem de dores pregado no lenho de opróbrios como nosso Deus, que aí está sofrendo e morrendo exclusivamente por nosso amor. Ó meu Jesus, se todos os homens se detivessem a contemplar-vos na cruz com fé viva, crendo que sois em verdade o seu Deus e morrestes por sua salvação, como poderiam viver longe de vós e privados de vosso amor? E eu, como pude dar-vos tantos desgostos, sabendo tudo isso? Os outros, se vos ofenderam, pecaram nas trevas; eu, porém, vos ofendi na luz. Mas essas mãos transpassadas, esse lado aberto, esse sangue, essas chagas que vejo em vós, fazem-me esperar o perdão e a vossa graça. Arrependo-me, ó meu amor, de vos ter desprezado por algum tempo. Agora, porém, amo-vos de todo o meu coração e não há coisa que mais me atormente do que a lembrança de vos haver desprezado. Esta dor que sinto é sinal de que já me perdoastes. Ó coração inflamado de Jesus, inflamai meu pobre coração. Ó meu Jesus, que morrestes consumido de dor por mim, fazei que eu morra consumido da dor de vos ter ofendido e do amor que vós mereceis. Eu me sacrifico todo a vós que vos sacrificastes todo por mim. Ó Mãe das dores, fazei-me fiel no amor a Jesus Cristo.

22. “E inclinando a cabeça, entregou o seu espírito” (Jo 19,30). Eis, ó meu Redentor, a que ponto vos levou o amor que tendes aos homens, a morrer de dores numa cruz, submergido num mar de penas e ignomínias, como já o previra Davi: “Cheguei ao alto mar e a tempestade me submergiu” (Sl 68,3). S. Francisco de Sales escreve: Consideremos este divino Salvador estendido na cruz, sobre um altar honorífico, no qual morre de amor pelos homens. Ah, por que não nos lançamos em espírito sobre essa cruz para morrer com ele, que quis morrer por amor de nós? Eu o prenderei, devemos dizer, e não o abandonarei jamais; morrerei com ele e me abrasarei nas chamas de seu amor. Um só e o mesmo fogo consumirá esse divino Criador e a sua miserável criatura. O meu Jesus é todo meu e eu sou todo dele. Eu viverei e morrerei sobre seu peito; nem a morte nem a vida me separarão mais de meu Jesus. Sim, meu caro Redentor, eu me abraço com a vossa cruz, beijo os vossos pés transpassados, enternecido e confuso, vendo o afeto com que morrestes por mim. Recebei-me e ligai-me a vossos pés, para que não me separe mais de vós e dora em diante só convosco me entretenha, a vós comunique todos os meus pensamentos, em vós concentre todos os meus afetos, de tal maneira que não busque outra coisa senão amar-vos e agradar-vos, suspirando sempre por sair deste vale de perigos e chegar a amar-vos face a face com todas as minhas forças no vosso reino, que é o reino do eterno amor. Fazei, entretanto, que eu viva sempre no arrependimento das ofensas que vos fiz e ardendo em amor por vós, que por amor de mim destes a vida. Eu vos amo, Jesus, morto por mim, eu vos amo, ó amor infinito, eu vos amo, ó bondade infinita. Ó Mãe do belo amor, Maria, rogai a Jesus por mim.

23. “Ele foi sacrificado porque ele mesmo o quis” (Is 53,7). O Verbo encarnado, no instante de sua conceição, viu diante de si todas as almas que ele deveria remir. Foste também tu, minha alma, apresentada então como ré de todos os pecados que haverias de cometer, e Jesus Cristo aceitou todas as penas que por ti deveria suportar na vida e na morte. Dessa maneira, obteve-te, o perdão e todas as graças que haverias de receber de Deus, as luzes, os convites de seu amor, os auxílios para venceres as tentações, as consolações espirituais, as lágrimas, as doces emoções na consideração do amor que te consagrou e os sentimentos de dor ao te recordares das ofensas que lhe fizeste. Ó meu Jesus, desde, pois, o começo de vossa vida vos sobrecarregastes de todos os meus pecados e vos oferecestes a satisfazer por eles com vossas dores. Com vossa morte me livrastes da morte eterna.“Vós, porém, livrastes a minha alma, para ela não perecer; lançastes para trás de vossas costas todos os meus pecados” (Is 38,17). Vós, meu amor, em vez de castigos pelas injúrias que vos irroguei, me cumulastes de favores e misericórdias, a fim de conquistardes um dia o meu coração. Meu Jesus, esse dia já chegou, eu vos amo com toda a minha alma. E se eu não vos amar, quem vos há de amar? É este, ó meu Jesus, o primeiro pecado que haveis de perdoar-me: o de ter vivido tantos anos no mundo e não vos ter amado. Para o futuro quero fazer o quanto posso para vos agradar.Vossa graça desperta em mim um grande desejo de viver só para vós e desprender-me de todas as coisas criadas. Sinto igualmente um grande desgosto das contrariedades que vos causei. Este desejo e este desgosto são dons vossos, ó meu Jesus. Continuai, pois, ó meu amor, a proteger-me para que eu continue fiel a vosso amor, pois conheceis a minha fraqueza. Fazei-me todo vosso, como vos fizestes todo meu. Eu vos amo, meu único bem, meu único tesouro, meu tudo. Ó meu Jesus, eu vos amo, eu vos amo, eu vos amo. Ó Mãe de Deus, ajudaime.

24. “Deus, enviando seu Filho na semelhança da carne do pecado, também por causa do pecado condenou o pecado da carne” (Rm 8,3). Deus, pois, enviou seu Filho para remir-nos, revestido da carne humana semelhante à carne pecadora dos outros homens. “Cristo nos remiu da maldição da lei, tornando-se por nosso amor maldito, porque está escrito: Maldito todo aquele que é suspenso no lenho” (Gl 3,3). Assim, Jesus Cristo quer aparecer ao mundo como réu amaldiçoado, pendente da cruz, para nos livrar da maldição eterna. Ó Padre eterno, por amor deste Filho que vos é tão caro, tende piedade de mim. E vós, Jesus, meu Redentor, que com a vossa morte me livrastes da escravidão do pecado com que nasci e dos pecados que cometi depois do batismo, transformai as cadeias que me faziam escravo de Lúcifer em cadeias de ouro que me liguem a vós pelo santo amor. Demonstrai em mim a eficácia de vossa graça e merecimentos, transformando-me de pecador em santo. Eu deveria há muitos anos arder no inferno, mas espero arder em vosso amor e ser todo vosso por vossa infinita misericórdia e para glória de vossa morte. Não quero que meu coração ame outra coisa além de vós.“A nós venha o vosso reino”. Reinai, ó meu Jesus, reinai sobre minha alma inteira. Fazei que ela obedeça tão somente a vós, sós a vós busque e só por vós suspire. Retirai-vos de meu coração, afetos terrenos, e vinde vós, chamas do amor divino, e possuí-me todo e consumi-me em amor por aquele Deus de amor que quis morrer consumido por mim. Eu vos amo, ó meu Jesus, eu vos amo, ó amabilidade infinita e meu verdadeiro amigo. Jamais alguém me amou mais do que a vós e por isso todo a vós me dou e me consagro, meu tesouro, meu tudo.

25. “Ele nos amou e nos lavou de nossos pecados em seu sangue” (Ap 1,5). Assim, ó meu Jesus, para salvar a minha alma, quisestes preparar-lhe um banho com vosso próprio sangue e lavá-la das manchas de seus pecados. Se, pois, nossas almas foram compradas com o vosso sangue (fostes comprados por um grande preço — 1Cor 6,20) é sinal de que vós muito as amais e por isso deixai-me rezar: Pedimos, pois, que socorrais aos vossos servos que remistes com vosso sangue precioso. É certo que com meus pecados tentei separar-me de vós e de livre vontade vos quis perder, mas recordai-vos, ó Jesus, que me comprastes com vosso sangue: não se perca por minha causa este sangue derramado com tanta dor e com tanto amor. Eu com os meus pecados vos expulsei de minha alma, ó meu Deus, e mereci a vossa ira; vós, porém, dissestes que estais pronto a vos esquecer das culpas de um pecador que se arrepende: “Se alguém fizer penitência... não me recordarei de todas as suas iniqüidades” (Ez 18,22). Além disso, afirmastes que amais aquele que vos ama: “Eu amo os que me amam” (Pr 8,17). Esquecei-vos, portanto, ó meu Jesus, de todos os desgostos que vos causei e amai-me; pois eu agora vos amo mais do que a mim mesmo e me arrependo sobre todas as coisas de vos haver ofendido. Eia, pois, meu amado Salvador, por amor daquele sangue que derramastes por meu amor, não me odieis e amai-me. Não me contento se só me perdoardes o castigo que mereci; eu quero amar e ser amado por vós. Ó Deus todo amor, todo bondade, uni-me e ligai-me todo a vós e não permitais que de vós jamais me separe, para nunca mais me tornar merecedor de vosso ódio. Não, meu Jesus, meu amor, não o permitais: quero ser todo vosso e quero que vós sejais todo meu.

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