2 de novembro de 2016

Sermão para o 22º Domingo depois de Pentecostes – Padre Daniel Pinheiro IBP

[Sermão] César deve dar a Deus o que é de Deus


Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amem.
Ave Maria…
 “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”
O episódio narrado hoje no Santo Evangelho ocorreu na terça-feira que antecede a paixão e morte de NSJC. Os fariseus buscam um meio para matar o Salvador. Eles se aproximam, então, de Cristo com uma aparente humildade e com um aparente desejo de aprender, fazendo grandes elogios a Cristo e a sua doutrina. Todavia, há algo de surpreendente nesse Evangelho: a aliança entre fariseus e os herodianos ou saduceus. Esses dois grupos eram, a princípio, inimigos jurados. Os herodianos ou saduceus eram materialistas. Os fariseus tinham uma tradição própria, alheia à revelação feita por Deus aos patriarcas e profetas. Aqui, como sempre ao longo da história, direita e esquerda se unem contra Nosso Senhor Jesus Cristo. Eles estão aliados. Aliados na rebeldia ao ensinamento de Cristo, aliados na cegueira de não querer ver em Cristo o Homem-Deus que revela a verdadeira religião – a católica -, confirmada por inúmeros milagres e inúmeras profecias. Milagres e profecias que são o atestado de que tal revelação é divina.
Estão aliados porque, dependendo da resposta de Nosso Senhor, Ele iria ou contra os fariseus ou contra os saduceus. Se Cristo tivesse respondido: “não se deve pagar o imposto a César”, os herodianos, aliados de Roma, o entregariam à autoridade romana. Se, por outro lado, Cristo tivesse respondido simplesmente “deve-se pagar o imposto a César”, sem nenhuma outra distinção, os fariseus, nacionalistas, o condenariam à morte. Nosso Senhor responde, então, perguntando de quem é a imagem e a inscrição na moeda, pois, segundo a doutrina dos rabinos, o uso de uma moeda estrangeira no país significava a aceitação daquela autoridade estrangeira. Os inimigos de Cristo respondem que a imagem é de César. Ora, como os fariseus usavam a moeda romana, eles aceitavam, pelo menos implicitamente, a dominação romana. E se eles aceitam a autoridade romana como legítima, eles devem exercer as obrigações que todo cidadão tem para com essa mesma autoridade legítima. E por isso Nosso Senhor completa com o famoso mandamento: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”
Todavia, caros católicos, devemos saber qual é o verdadeiro sentido dessa frase. Ela é utilizada hoje para afirmar que Nosso Senhor Jesus Cristo teria ensinado a separação da Igreja e do Estado, que ele teria ensinado que o Estado deve ser laico, excluindo a Igreja Católica, sua doutrina e seus ministros da vida pública, de seu ordenamento jurídico, e reduzindo a religião às sacristias ou igualando-a às outras religiões. Como dizia a Sagrada Congregação dos Seminários em Carta dirigia ao Episcopado brasileiro em 1950: entre os mais graves erros modernos deve ser enumerado o laicismo que tem o objetivo de excluir a Igreja e seus mais altos representantes da vida pública e social.
Tal interpretação da resposta de Cristo como se ela favorecesse o laicismo (ou laicidade) pode vir somente da malícia do homem moderno, que, como os fariseus e saduceus da época de Nosso Senhor, não quer se submeter à verdadeira religião, buscando meios de sufocá-la e destruí-la. “Dai a César o que é de César”, diz Nosso Senhor Jesus Cristo. Tal mandamento significa simplesmente que nós devemos cumprir nossos deveres para com o Estado, obedecendo às leis justas, isto é, aquelas que não se opõem à lei de Deus, pagando os impostos justos, rezando pelas autoridades e respeitando-as. Cristo não diz, porém, que César não deve dar a Deus o que é de Deus. Ao contrário. Também César é de Deus. Quer dizer, também os Estados, os governos, as autoridades devem dar a Deus o que é de Deus. Elas devem então reconhecer a verdadeira religião e devem favorecê-la, e devem se conformar ao ensinamento da verdadeira religião, que é a Católica.
O Estado é uma criatura de Deus, porque o Estado decorre da natureza social do homem, criado diretamente por Deus. E como toda criatura, o Estado deve prestar a devida homenagem ao seu criador. O Estado deve ser, então, necessariamente religioso. Não simplesmente favorecendo a religiosidade do povo em geral, mas favorecendo a religião revelada por Deus – a católica – e observando sua lei moral e dogmática. Isso é evidente, pois o Estado deve, da mesma forma que o indivíduo, reconhecer a sua completa dependência em relação a Deus. Ele tem então a obrigação de aderir à verdade conhecida, pedir a Deus os bens necessários e agradecer pelos bens recebidos. O Estado tem também a obrigação de prestar um culto público a Deus e um culto em conformidade com a revelação divina.
Além disso, o Estado tem por finalidade buscar o bem temporal de seus cidadãos. A adesão à verdadeira religião favorece a concórdia em uma nação e a paz entre as nações, e favorece a obediência às autoridades legítimas e às leis justas; Essa adesão merece as bênçãos celestes. Assim, mesmo para assegurar a felicidade terrena de seus cidadãos o Estado deve estar unido à Igreja Católica.
César é de Deus e deve dar a Deus o que é de Deus. O Estado deve, então, reconhecer a realeza de Cristo, que, sendo Rei, detém o poder executivo, legislativo e judicial em grau supremo. Cristo é Rei porque é Deus, mas ele é Rei também por conquista, pois nos redimiu no madeiro da Cruz. Nosso Senhor Jesus Cristo reina a partir da Cruz, do Madeiro (regnavit a ligno Deus). O Estado deve reconhecer que todo o seu poder deriva de Nosso Senhor Jesus Cristo e que, assim sendo, não pode jamais contrapor-se a Ele. O Estado não pode adotar leis que contradigam as leis dadas por Cristo, que, sendo Rei, é o legislador supremo. Nas questões do direito misto (que dizem respeito à Igreja e ao Estado), como diz Leão XIII, é plenamente conforme à natureza, bem como aos desígnios de Deus, não separar um poder do outro, e ainda menos pô-los em luta, mas sim estabelecer entre eles a concórdia. O Estado não tem, portanto, o direito de aprovar o aborto, as uniões contra-natureza, ou o divórcio, para citar alguns dos mais graves erros de nosso tempo. O Estado não tem o direito de ser indiferente em matéria religiosa, dando os mesmos direitos ao erro e à verdade. Como criatura de Deus, ele deve reconhecer a soberania divina, aderindo integralmente à verdadeira religião, à religião católica.  O Estado não tem, portanto, o direito de ser laico. Laicismo (e também laicidade) que é uma peste que tem feito tanto mal à Igreja e ao Estado, mas, sobretudo, ao Estado, que, separado da Igreja, se corrompe como o corpo separado da alma se corrompe. César deve dar a Deus o que é de Deus. O Estado não deve ser separado da Igreja nem confundido com ela. Estado e Igreja devem estar unidos. E se em determinado Estado a religião católica é minoritária, o Estado deve pelo menos garantir a preservação e observação da lei natural e dar total liberdade à Igreja, porque ela foi fundada por Cristo, e para que ela possa cumprir o mandamento de seu divino fundador: pregar o Evangelho a toda criatura.
Todavia, caros católicos, não basta conhecermos de maneira puramente teórica tal doutrina. É preciso colocá-la em prática, para que possa se formar novamente uma sociedade baseada nos princípios de Cristo, sociedade em que todas as esferas da vida humana são permeadas pela doutrina da Igreja, quer dizer, pela doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo.  Sociedade em que os Estados reconhecem a realeza de Cristo e agem em consequência disso. Para que Cristo possa reinar nas nações é preciso, antes de tudo, que ele reine em nossas almas. Devemos aderir profundamente a Cristo e a sua Igreja em tudo e sempre. É preciso começar pelos indivíduos, a fim de que Cristo reine nas sociedades. Precisamos nós mesmos dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus, para que César possa dar a Deus o que é Deus, para que César possa reconhecer que ele também é de Deus.  Precisamos, em segundo lugar, nos aplicar ao apostolado segundo nosso estado e nossas possibilidades, para que Cristo possa reinar na alma de nosso próximo. Precisamos também rezar pelas autoridades e pelos Estados. Precisamos rezar antes de tudo ao Imaculado Coração de Maria. Assim, poderemos ter a verdadeira paz que é justamente a tranqüilidade na ordem. E a verdadeira ordem só existe quando tudo está ordenado e submetido a Cristo. Quando os indivíduos estão submetidos a Cristo. Quando os estados e nações estão submetidos a Ele. Submeter-se a Deus e servi-lo é reinar junto com Ele (Cui servire regnare est). Negar-se a reconhecê-lo e servi-lo é tornar-se escravo do pecado.
Devemos dar, caros católicos, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. E César deve dar a Deus o que é de Deus, porque César é de Deus. As nações são de Deus.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

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