1 de novembro de 2016

Columba Marmion - Jesus Cristo nos seus mistérios.

III

Qual a atitude da nossa alma  em  face deste mistério fundamental do Homem - Deus?
A  primeira atitude que devemos ter  é  a da  fé. ­Já o disse, mas não receio repeti-lo, por ser esta  uma verdade capital.
No princípio do seu Evangelho, depois de ter cantado a glória do Verbo divino, S. João diz que  o  Verbo veio a este mundo, e o mundo, que Ele criara, que era Seu domínio, que era «Seu», não o recebeu. Mas, acrescenta, recebem-no todos aqueles que crêem em Seu nome:  Quotquot autem receperunt eum ... qui credunt in nomine ejus  . . .  É  pela fé que recebemos o Verbo lncarnado ; por ela, aceitamos a Divindade de Jesus: «Sois o Cristo, o Filho do Deus vivo».
É  esta a atitude que de nós reclama o Pai Eterno. «0 mandamento de Deus, diz o mesmo S. João, é que acreditemos em Seu Filho Jesus Cristo»: Et hoc est
MANDATUM  ejus : ut credamus in nomine Filii ejus Jesus Christi. Ele próprio no-lo disse: «Eis aqui o meu Filho muito amado ... ouvi . O». Esta palavra que soou no Tabor, quando o esplendor da Divindade iluminava com seus raios a santa Humanidade de Jesus, não é mais que o eco, no mundo criado, da palavra que o Pai pronuncia no santuário dos céus, in splendoribus
sanctorum : «Tu és o meu Filho : hoje te gerei».
Por este motivo, somos muito agradáveis ao nosso Pai celeste, quando, aceitando o Seu testemunho, pro­fessamos que Jesus é o  Seu  próprio Filho, co-eterno com Ele e com Ele participante da glória divina: Tu solus altissimus Jesu Christe ... in gloria Dei Patris.
É  a palavra de S. Paulo. O mistério dos aniquilamentos do Verbo feito carne deixa o Apóstolo abismado, em tal admiração, que não encontra palavras para proclamar a glória que, segundo o próprio pensamento de Deus, daí deve resultar para Jesus. Ouvi o que ele diz : «Cristo era Deus ; todavia, não guardou avaramente a Sua igualdade com Deus ; aniquilou-se a si mesmo, sujeitando-se  à  condição de natureza criada, tornando-se semelhante aos homens ; mostrando-se em tudo como homem, rebaixou-se, fazendo-se obediente até à morte, até à morte na Cruz. E por este motivo - propter quod - Deus O  exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todo o nome, a fim de que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho, no céu, na terra e nos infernos, e toda a língua confesse que Nosso Senhor Jesus Cristo está na glória de Deus Pai» :  Et omnis língua confiteatur quia Dominus  Jesus Christus  in gloria  est Dei  Patris.
Devemos unir-nos muitas vezes, em espírito e coração,  a este desejo do Pai Eterno de glorificar o Seu Filho:  Clarificavi  et  it erum clarificabo. Nunca deveríamos abrir o Evangelho nem dispor-nos para cele­brar os mistérios de Jesus, sem primeiro penetrarmos o pensamento de Deus, proclamando, por um ato de fé intensa, que este Cristo que vamos contemplar e implo­rar, a quem nos vamos unir, é Deus como o Pai e o Espírito Santo.
Esta atitude da alma é extremamente fecunda, pois nos eleva ao nível divino e nos torna agradáveis ao Pai:  Pater: amat vos ... quia credidistis quia ego a  Deo exivi.  «A fé, como muito bem diz S. Leão, a fé que justifica os ímpios aos olhos de Deus e torna santos os homens que eram pecadores, consiste em crer que no mesmo e único Jesus Cristo se encontra verdadeiramente a Humanidade e a Divindade.  A  Divindade, em virtude da qual, antes de todos os séculos, é igual ao Pai, tendo com Ele a mesma natureza eterna; a Humanidade, pela qual, nestes últimos tempos, se uniu a nós
revestindo a nossa condição de criatura». Este ato de fé na divindade de Jesus deve ser a fonte da nossa adoração. - Muitas vezes, no Evan­gelho, vemos um movimento de adoração acompanhar
o ato de fé: o gesto dos Magos, de Pedro depois da pesca milagrosa, dos discípulos quando viram
Jesus andar sobre as águas, do cego  de nascença depois de curado: Credo, Domine. Et procidens  adoravit eum .
Por este ato de adoração, a alma entrega-se inteiramente ao Verbo divino. Quando Nosso Senhor está dentro de nós, principalmente depois da sagrada  Comunhão, devemos, segundo o conselho de S. Francisco de Sales, levar todas as nossas faculdades a Seus pés, para que elas O ouçam, abracem os Seus interesses, partilhem dos Seus sentimentos, obedeçam aos Seus preceitos, trabalhem para a Sua glória.
É  isto imitar a santa Humanidade de Jesus : pertencia tão intimamente ao Verbo, que não tinha personalidade própria ; é este um dos principais aspectos do
mistério da lncarnação.
Salvas as proporções, o mesmo  se  deve dar conosco, pois Jesus Cristo  é  em tudo o nosso modelo. A  Sua Humanidade não agia nunca senão subordinada ao Verbo no qual subsistia e de quem recebia a exis­tência. Não haja em nós movimento que não venha de Deus, desejo que não seja do agrado divino, ação que não sirva de instrumento para a Sua glória. Uma alma que vive nesta dependência de amor, de vontade e de ação com respeito a Deus, pode com toda a verdade di­zer,  como dizia a santa Humanidade:  <<É  o Senhor quem me dirige»: Dominus  regit me.
E o escritor sagrado acrescenta: Et nihil mihi deerit - « por isso; nada me faltará  ».  Efetivamente, desde que esta alma está inteiramente entregue ao Verbo, o Verbo diz ao Pai; «Esta alma é minha,
portanto, também é tua, ó  Pai» :  Mea omnia tua sunt. O  Verbo entrega esta alma ao Pai, para que o Pai faça descer sobre ela, como sobre o Seu Filho Jesus, com as Suas complacências, os  Seus mais perfeitos dons.

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