4 de abril de 2017

Dom Columba Marmion - Jesus Cristo nos seus mistérios.

III 

O sacrifício de Jesus Cristo, iniciado na Incarnação, está consumado. Do lado de Jesus, trespassado pela lança, saem as fontes de água viva que vão purificar e  "santificar a Igreja»; Ut sanctificaret Ecclesiam... Ut sit sancta et immaculata. Tal é o fruto perfeito dessa perfeita imolação. «Por uma oblação única, Cristo levou para sempre à perfeição aqueles que no decorrer dos tempos são santificados»: Una enim oblatione, consummavit in sempiternum sanctificatos.
 De que modo santificou Jesus a Igreja pela Sua oblação?
 Como sabeis, a nossa santificação consiste essencialmente numa participação da natureza divina pela graça santificante. Esta graça torna-nos filhos de Deus, Seus amigos, justos aos Seus olhos, herdeiros da Sua graça.

 Pelo pecado, estavamos privados da graça, eramo inimigos de Deus, excluídos da beatitude do céu. 
Pelo Seu sacrifício, Jesus Cristo destruiu o pecado e restituiu-nos a graça. Segundo a expressão de S. Paulo, «Cristo, deixando-se pregar na cruz, rasgou a sentença de condenação e morte lavrada contra nós»; «reconciliou-nos para sempre com o Pai».


 Não devemos esquecer que Jesus Cristo representava toda a humanidade. Uniu-se a uma raça pecadora, embora o pecado O não tenha atingido pessoalmente: Absque peccato; mas «toma sobre Si os pecados de todos os homens»: Posuit in eo iniquítatem omnium nostrum. Representa-nos a todos, e, por isso mesmo, satisfaz por todos nós. Jesus Cristo tornou-se, por amor, solidário dos nossos pecados; nós, pela graça, tornamo-nos solidários das Suas satisfações.
Além disso, Jesus Cristo mereceu para a Sua Igreja todas as graças de que ela necessitava para formar a. sociedade que Ele quer «sem mancha nem ruga, mas santa e imaculada». Efetivamente, o valor desses merecimentos é infinito. Porquê? Porventura os Seus sofrimentos, por mais extensos e profundos que tenham sido, não tiveram limites? Claro que sim; mas Aquele que por eles mereceu para nós é um Deus; e, posto que tenha padecido apenas em Sua natureza humana, essas dores e o mérito que importa são dum Deus; eis por que o seu valor é sem limites.

 Nosso Senhor Jesus Cristo mereceu, portanto, para nós, todas as graças e todas as luzes; a Sua morte abriu-nos, de novo, as portas da vida, «transportou-nos das trevas à luz»; é «a causa da nossa salvação e da nossa santidade»: Et consummatus, factus est omnibus obtemperantibus sibi, causa salutis aeternae. Os sacramentos, que são os canais pelos quais a graça e a vida divina chegam às nossas almas, não têm valor senão pelo sacrifício de Jesus. Se estamos hoje em estado de graça, a que o devemos? Ao Batismo. E quem nos mereceu os frutos do Batismo? A morte de Jesus Cristo. Do mesmo modo no sacramento da Penitência, somos lavados no sangue do Salvador. A virtude dos sacramentos vem-lhes da cruz; só têm eficácia em continuidade com a sagrada Paixão de Jesus Cristo.
 Chefe e cabeça da Igreja, Jesus Cristo mereceu para ela a abundância das graças que a tornam «bela e gloriosa». O zelo dos Apóstolos, a força dos Mártires, a constância dos Confessores, a pureza das Virgens alimenta-se no sangue de Jesus. Todos os favores, todos os dons que alegram as almas, os próprios privilégios únicos com que foi favorecida a Virgem Maria têm por preço esse sangue precioso. E como este é dum valor infinito, não há graça que não possamos esperar, valendo-nos do nosso Pontífice e Mediador.
 De modo que em Jesus Cristo tudo possuímos; nada n'Ele falta do que precisamos para a nossa santificação: Et copiosa apud eum redemptio; o Seu sacrifício, oferecido por todos, deu-Lhe o direito de nos comunicar tudo quanto mereceu.

 Oh! Se compreendêssemos que n'Ele tudo temos! Que os Seus meritos infinitos nos pertencem! Se tivéssemos absoluta confiança nestes meritos! Durante a Sua vida mortal, dizia Jesus aos judeus (e repete-o agora a todos nós): Ego si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum. «Quando for levantado na cruz, será tão grande o meu pode, que atrairei a mim todos aqueles que em mim tiverem fê». Aqueles que, outrora, no deserto, contemplavam a serpente de bronze levantada por Moisés, ficavam curados das mordeduras com que tinham sido feridos por causa dos seus pecados; assim
também todos aqueles que me contemplam com fé e amor merecem que os atraia e os leve até ao céu. Eu, que sou Deus, consenti, por amor de vós, ser pregado na cruz,"como um maldito";  em paga desta humilhação, tenho o poder de vos atrair a mim, purificar, exornar com a minha graça e de vos elevar ao céu, onde estou presentemente. Desci do céu e para lá voltei, depois de ter oferecido o meu sacrifício; tenho o poder de vos fazer lá entrar comigo, pois nisto sou o vosso precursor; tenho o poder de vos unir a mim, de modo tão íntimo, que «pessoa alguma pode arrancar-me das mãos aqueles que meu Pai me deu» e que resgatei com o meu precioso sangue; Et ego vitam aeternam do eis; et non peribunt in aeternum, et non rapiet eas quisquam de manu mea.

"Levantado acima da terra, tudo atrairei a mim». Quando fitamos o Crucifixo, pensemos nesta promessa infalível do nosso Pontífice supremo; ela é a fonte da mais absoluta confiança. «Se morreu por nós, sendo, como éramos, Seus inimigos», que graça de perdão, de santificação, poderá recusar-nos, agora que detestamos o pecado, que procuramos desapegar-nos das criaturas e de nós mesmos para só a Ele agradar?
 Pai, atrai-me para o Filho! ... Jesus Cristo, Filho de Deus, atraí-me todo para Vós! ... 


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