AOS DESCONTENTES
A muitos, que se lamentam de sua sorte e invejam a dos mais favorecidos, poder-se-ia repetir esta parábola:
A fortuna tinha muitos queixosos e nenhum agradecido. Chegou o descontentamento até aos animais; e o burro, o mais queixoso de todos, foi ter com Júpiter, e disse-lhe: — Integérrimo deus, como podes consentir esta impiedade da Fortuna contra mim? Ela persegue a inocência e favorece a malicia: o orgulhoso leão triunfa; o tigre cruel engorda; a astuta raposa, que a todos engana, ri-se de todos; o voraz lobo anda à solta; e só eu, que a ninguém faço mal algum, de todos sou desprezado e maltratado, como pouco e trabalho muito, nada de pão e tudo de paus e pauladas... Júpiter, assaz comovido, ordenou que a Fortuna viesse á sua presença. Saíram soldados a procurá-la. Buscaram-na em casa do rico, do poderoso, do belo, do vaidoso, e não a encontraram. .. Por fim deram com ela na casa da virtude.
Levaram-na a presença de Júpiter, que lhe repetiu todas as queixas do burro. A Fortuna, depois de ouvir tudo em silencio, com um lindo sorriso respondeu:
— Grande Júpiter, permiti-me dizer apenas uma palavra em minha defesa; somente esta: — Se ele é um burro, de que se queixa?
Júpiter, virando-se para o asno, disse-lhe:
— Vai, e de hoje em diante procura ser esperto como o leão, corajoso como o tigre, astuto como a raposa, cauteloso como o lobo. Ordena bem os meios para conseguires teus intentos, e não terás queixas da Fortuna.
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