14 de maio de 2017

Sermão para o 3º Domingo depois da Páscoa – Padre Daniel Pinheiro, IBP





[Sermão] História das heresias IV: iconoclastia e heresia de Berengário de Tours



Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Ave Maria…
Retomamos, caros católicos, a nossa breve consideração das heresias ao longo da história da Igreja. Isso nos serve como ocasião para afirmar a verdade católica em oposição a esses erros e serve para evitar os mesmos erros nos tempos atuais e futuros. As heresias, em geral, se repetem ao longo dos séculos, mudando um pouco a roupagem, mudando alguns fundamentos. É-nos bastante proveitoso, então, conhecer esses erros contra a fé.
Vamos hoje ao século VIII, quando surgiu a heresia iconoclasta, que é a oposição às imagens sagradas, proibindo o uso das imagens e o culto às imagens. Foi o imperador de Constantinopla, Leão III, Isáurico, que, em 730, publicou um edito geral proibindo o culto das imagens. Essa data marca o início oficial da heresia e da campanha contra as imagens. O decreto encontrou oposição firme em São Germano, patriarca de Constantinopla, em São João Damasceno, o grande defensor das imagens e também na piedade popular tradicional. Também o Papa Gregório II e seu sucessor, Gregório III, se opuseram à iconoclastia. O imperador, enfurecido, com a oposição ao seu decreto herético, começou a campanha de destruição de imagens de Nosso Senhor e dos santos. Passou a exilar, castigar e mesmo matar os opositores. O filho e sucessor do imperador Leão III, chamado Constantino V, Coprônimo, seguiu a mesma linha e intensificou a perseguição. Passou a destruir mesmo as relíquias dos santos, tão veneradas. Chegou a reunir um sínodo, no Palácio imperial de Hieria, a que 338 bispos assistiram. O imperador impôs a sua vontade, proibindo o culto das imagens e condenando os principais defensores desse culto: São João Damasceno e São Germano. Em Roma, o Papa Estevão III respondeu com um sínodo afirmando a doutrina católica constante do culto às imagens. Foi somente com a Imperatriz Irene, regente do Império, que a heresia foi condenada no II Concílio de Nicéia em 787. O Papa participou, por meio de seus legados, desse Concílio. Proclamou-se a bondade do culto às imagens, provada pelos documentos pontifícios e pelos escritos dos padres da Igreja.
Todavia, a heresia voltou a surgir na primeira metade do século IX e com violência sob o imperador Leão V. O que tinha escapado da perseguição anterior foi destruído nessa segunda. Inúmeros foram os martírios, os desterros e as prisões. Foi novamente uma Imperatriz regente, Teodora, que conseguiu pacificar as coisas, renovando as decisões do II Concílio de Niceia. Os monges tiveram durante toda a crise iconoclasta um papel determinante na defesa das imagens e da honra prestada a elas.
As imagens eram usadas pelos cristãos desde o início praticamente. Basta vermos as catacumbas. O culto às imagens dos santos vem do fato de o Verbo ter se Encarnado. O Concílio de Trento, reafirmando a doutrina católica do culto às imagens contra a heresia protestante, diz as imagens dos santos também podem e devem ser veneradas: “As imagens de Cristo, da Santíssima Virgem e de outros Santos, se devem ter e conservar especialmente nos templos e se lhes deve tributar a devida honra e veneração, não porque se creia que há nelas alguma divindade ou virtude pelas quais devam ser honradas, nem porque se lhes deva pedir alguma coisa ou depositar nelas alguma confiança, como outrora os gentios, que punham suas esperanças nos ídolos (cfr. Sl 134, 15 ss), mas porque a veneração tributada às Imagens se refere aos protótipos que elas representam, de sorte que nas Imagens que osculamos, e diante das quais nos descobrimos e ajoelhamos, adoramos a Cristo e veneremos os Santos, representados nas Imagens.” Assim ensina o Concílio de Trento. O culto prestado à imagem é um culto prestado não à imagem em si, mas àquele que a imagem representa.  A proibição de fazer imagens no Antigo Testamento não é mais válida, pois o risco de idolatria que existia para os judeus, rodeados de pagãos idólatras, adoradores de imagens, já não existe. E mesmo no Antigo Testamento, vemos Deus abrir algumas exceções para a proibição das imagens, pois ele ordena que se façam querubins na arca da aliança e manda que Moisés faça uma serpente de bronze – prefiguração de Cristo crucificado – para que os judeus não perecem pelas picadas das serpentes no deserto. Portanto o culto às imagens se dirige ao original.
O culto às imagens é bom pela nossa natureza, somos corpo e alma. Nós precisamos de coisas sensíveis que ajudem a nossa inteligência e a nossa vontade a se elevarem às coisas espirituais. Assim, os sacramentos são sinais sensíveis da graça, as cerimônias da Igreja são sensíveis, a Igreja é uma sociedade visível com um chefe visível, etc. As imagens e relíquias nos ajudam muitíssimo a manter a nossa concentração, a considerar o exemplo e as virtudes de Cristo, de Nossa Senhora, dos Santos. Dão-nos também esperança de alcançar o céu ao nos fazer lembrar daqueles que lá já estão. Tirar as imagens das igrejas prejudica a vida de oração, diminui o apelo aos santos, nos privando de muitas graças. Prejudica a vida espiritual. Hoje, infelizmente, existe em muitos espíritos, uma mentalidade de tendência iconoclasta, querendo esvaziar as igrejas católicas das imagens sagradas, como se isso atrapalhasse a devoção, sendo que é precisamente o contrário. Na França, por exemplo, vemos uma vaga iconoclasta na época em que os protestantes tentaram tomar o poder, vemos uma vaga iconoclasta na Revolução Francesa e vemos uma vaga iconoclasta atual em virtude de princípios litúrgicos e teológicos errôneos.
Interessante notar as causas da heresia iconoclasta. Não é um erro isolado, mas que deriva das heresias precedentes que já vimos. O nestorianismo separava a natureza divina e a natureza humana de Cristo, o monofisismo negava a humanidade de Cristo. Tudo isso vai contra a representação de Cristo como homem. E a imagem de Cristo expressa a sua humanidade, claro. Essas heresias se opunham, então, às imagens de Cristo e, consequentemente, às outras imagens. É preciso ver também na heresia iconoclasta a influência do judaísmo e principalmente do islamismo. O islamismo, recém-fundado por Maomé, se expandia violentamente, como sempre, e muitos viviam no império romano do oriente e combatiam no exército. Judeus e maometanos se opõem às imagens.
A heresia iconoclasta terá como consequência estremecer as relações entre cristãos do ocidente e do oriente, preparando o terreno para o cisma do oriente em 1054. As mentalidades começarão a se separar. O imperador romano do oriente começará cada vez mais a querer governar a igreja, naquilo que é conhecido como cesaropapismo – o imperador usurpando o poder que pertence ao Papa. É pouco depois da heresia iconoclasta que surgirá a figura de Fócio, na segunda metade do século IX, colocando os fundamentos para que a maior parte dos cristãos do oriente se separem da verdadeira Igreja de Cristo em 1054. As consequências da crise iconoclasta foram terríveis.
Já no século XI, surge a heresia eucarística de Berengário de Tours. Ele afirmava, em seus ensinamentos na escola da catedral de Tours, que na eucaristia não estava o verdadeiro corpo e sangue de Cristo, mas somente uma imagem ou figura. Como Berengário era muito ativo e hábil, suas idéias atraíram muitos adeptos e logo se difundiram. A doutrina chegou ao Papa Leão IX que condenou a heresia de Berengário. Habilidoso, o herege conseguiu, porém, o apoio de dois bispos e do rei da França, Henrique II. Foi condenado, porém, em 1051 no sínodo em Paris. Berengário chegou a jurar a doutrina católica sobre a eucaristia, mas mantendo a heresia interiormente. Fez a mesma coisa anos mais tarde em Roma. Professou a boa doutrina diante do Papa para logo depois voltar a professar a heresia. Quantos, hoje, fazem uma profissão externa de catolicidade, mas professam erros e heresias de modo velado, para enganar os desatentos. Condenado ainda outras vezes, parece que, finalmente, se arrependeu de seus erros e morreu penitente, retirado em uma ilha. Essa heresia eucarística de Berengário foi a ocasião para se introduzir na Santa Missa a elevação da hóstia no momento da consagração, a fim de que todos pudessem logo adorar a Nosso Senhor Jesus Cristo real e substancialmente presente em corpo, sangue, alma e divindade sob as aparências do pão e do vinho.
Como dissemos no início, as heresias tendem a se repetir. Os protestantes todos retomarão depois a heresia eucarística e quase todos retomarão a heresia iconoclasta. A Igreja, porém, apesar das tempestades, permanece sempre firme na sua doutrina. Sempre com prudência, com paciência e firmeza. Ao fim, a verdade triunfa. Mais uma vez, caros, católicos, permaneçamos firmes na doutrina católica íntegra, sem nos deixar levar por qualquer sopro de doutrina, pelas vãs filosofias, ou pelos pensamentos da moda. Só Nosso Senhor e sua Igreja têm palavras de vida eterna.
Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

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