Pensamentos Consoladores nas Doenças e Temor Excessivo da Morte.
1/14 - Consolações nas doenças.
Quando estiverdes doentes, oferecei as vossas dores, angústias e penas ao Senhor, suplicando-lhe que as una aos tormentos que Ele por nós sofreu. Obedecei ao médico; tomai os remédios e os alimentos por amor de Deus, lembrando-vos do fel que ele tomou por nosso amor; desejai sarar para o servir; não recuseis enfraquecer para lhe obedecer; disponde-vos de morrer, se Ele assim o quiser, para o louvar e gozar. Lembrai-vos que as abelhas, quando fabricam o mel, alimentam-se com uma comida amarga, e assim só não poderemos praticar atos de doçura e paciência, nem fabricar melhor o mel de excelentes virtudes, senão quando nos alimentamos com o pão amargo das tribulações; e vivemos entre angústias.
E assim como o mel fabricado com as flores do timo, erva pequena e amarga, é o melhor de todos, assim a virtude que se forma na amargura das humilhações e dos trabalhos, é mais excelentes de todas. As tribulações e doenças são muito próprias para nos aperfeiçoarem por meio das resignações sólidas que fizermos então na mão de Nosso Senhor Jesus Cristo.
O nosso corpo é fraco; mas a caridade, que é o vestido nupcial, tudo cobrirá. Uma pessoa fraca excita à compaixão os que as conhecem e dá uma ternura de amor particular, contanto que leve com devoção a sua cruz.
Convém sermos francos em pedir e aceitar os remédios como doces, e corajoso em sofrer o mal. O que pode conservar a doçura entre as dores e angústias, e a paz entre os enredos e multiplicidade de ocupações, é quase perfeito; e embora se encontrem poucas pessoas, mesmo religiosas, que tenham atingido esta grande perfeição convém, contudo, aspirar a ela.
A vida de uma pessoa que goza saúde é quase toda estéril, a de um doente é quase seara contínua; convém que nos sujeitemos à necessidade e tornemos tudo útil à nossa eterna felicidade. Ah! que tudo morra em nós, contanto que Deus aí viva e reine! Muitas vezes acontecem-nos estes males, para que, como não fazemos penitencias voluntárias pelos nossos pecados, façamos as obrigatórias. Apliquemos contudo as enfermidades os remédios convenientes, mas com uma tal resignação que, se a divina mão de Deus os vencer, nos resignemos, e se eles forem eficazes façamos o mesmo. Oh! bem pouco é que todas as horas da nossa vida sejam tristes e cheias de aflições contanto que a hora da morte seja feliz e nos traga a verdadeira consolação! Não convém que desejemos estar no Calvário, assim como desejamos estar no Tabor? É bom estar com Deus, seja na cruz, seja na glória. A mão de Deus é tão amável quando distribui tribulações, como quando dá consolações. Não vamos de encontro aos decretos da vontade celeste, que dispõe dos seus para sua maior glória. Não esta em nosso poder conservar as consolações que Deus nos envia, mas sim amá-lo sobretudo que é a benção que mais devemos desejar.
Oh! meu Deus! quanto é bom viver só para vós, não trabalhar senão para vós e não nos regozijarmos senão em vós!
É por isto que convém que tenhamos paciência, não só em estarmos doentes, mas padecer a doença que Deus quiser, no lugar em que quiser, entre as pessoas que quiser e com os incômodos que quiser, obedecendo em tudo ao médico (exceto nas orações jaculatórias que ele não pode, nem deve proibir, se não forem muito frequentes) tomando os medicamentos e alimentos por amor de Deus, lembrando-nos do fel que Nosso Senhor por nós tomou, desejando sarar para o servir, mas anhelando adoecer mais e morrer, se assim lhe agradar, para o louvar e gozar d'Ele. Devemos fazer o mesmo nas outras tribulações. Senhor Jesus! que felicidade tem uma alma dedicada a Deus em ser muito exercitada pela tribulação antes de morrer!
Como se pode reconhecer o amor franco e vivo senão entre os espinhos, as cruzes, a languidez, e sobretudo quando a languidez é demorada?
Nosso Senhor testemunhou o seu amor desmesurado pela medida dos seus trabalhos e paixão.
Testemunhai bem o vosso amor ao espeso do vosso coração no leito da dor. Este salvador contou todas as vossas dores e sofrimentos e pagou com o preço do seu sangue toda a paciência e amor de que precisais para aplicardes os vossos trabalhos à sua glória e à vossa salvação.
Consolai-vos, pensando que é Deus que vos envia as cruzes; porque nada sai desta divina mão que não seja para utilidade das almas que o tomem ou para as purificar e firmá-las no seu santo amor.
As penas consideradas em si mesmas não podem amar-se; mas consideradas na sua origem, isto é, na providência e vontade divina que as ordena, são infinitamente amáveis. Vede a vara de Moisés, estendida, é uma serpente terrível, vede-á na mão de Moisés, é uma vara miraculosa. Considerai as tribulações em si mesma, são insuportáveis; considerai-ás na vontade de Deus, são amores e delicias.
Sereis felizes se receberdes com um coração filialmente amoroso o que Nosso Senhor vos enviar com um coração paternalmente cuidadoso da vossa perfeição.
Considerai muitas vezes a duração da eternidade e não vos inquietem os acidentes desta vida mortal. Se não tendes ouro nem incenso para oferecer a Nosso Senhor, tereis pelo menos mirra e creio que Ele aceita agradavelmente, e como se este fruto da vida quisesse ser fabricado com mirra, tanto no nascimento como na morte.
Jesus glorificado é belo; mas crucificado ainda parece melhor. No presente é vosso esposo; para o futuro estará revestido de glórias.
Em que ocasiões a não ser nestas, poderemos nós praticar grandes atos de união indissolúvel do nosso coração à vontade de Deus, de mortificação do nosso amor próprio, e do amor da nossa própria objeção? É Deus que assim quer exercitar o nosso coração. Não é pois um rigor; é uma doçura. Faça-se a sua vontade e não a nossa.
Animai-vos, porque considerando-se-lhe o nosso coração fiel, não nos carregará acima das nossas forças e suportará conosco o peso quando vir que nos submetemos a Ele com docilidade.
Eu amo o vosso progresso na piedade sólida, e este progresso tem suas dificuldades, para que vos exerciteis na escola da cruz, pois só nesta se podem aperfeiçoar as nossas almas. Crede que o meu coração espera o dia da vossa consolação com todo ardor como o vosso. Mas esperai, digo, esperando, para me servir das palavras da Escritura. Ora esperar esperando é não se inquietar com a demora; porque há muitos que esperando não têm paciência, mas perturbam-se e inquietam-se.
As roseiras espirituais não são como as corporais; nesta os espinhos ficam, as rosas caem; naquelas vão-se e ficam as rosas.
É um grande abuso em muitos crer que o serviço que fazemos à Deus sem gosto, sem ternura de coração e sem sentimento, lhe é menos agradável, pois que pelo contrário, as nossas ações são como as rosas, que quando estão frescas têm mais graça, mas quando estão secas têm mais aroma e força. E assim são as nossas ações, que, sendo feita com ternura do coração, são mais agradáveis para nós; mas sendo feitas com secura e aridez de coração, têm mais aroma e valor ante Deus.
Porque amar a Deus na doçura, isso também o fazem as crianças; mas amá-lo na amargura, isto é a sublimidade da fidelidade amorosa.
São Pedro, animou-se a dizer: "Viva Jesus no Tabor"; mas dizer: "Viva Jesus no Calvário", isso coube a sua Mãe Santíssima e ao discípulo amado que lhe deixou por filho.
Oh! como são bem aventurados os que se não escandalizam com os opróbrios e ignomínias de Nosso Senhor, e que nesta vida se crucificarem com Ele, meditando a sua paixão, mortificando-se, não se escandalizando em saber que Ele foi o escárnio e ignomínia do mundo!
Não padece dúvida que se nos quisermos salvar devemos unir-nos à cruz do nosso Salvador, mortificar-nos por ela; não há outro caminho para o céu, Nosso Senhor andou-o primeiro. Tantos êxtases, elevações de espírito e arrebatamentos quereríeis vós; elevai-vos se podeis ao terceiro céu com São Paulo; mas se contudo isto não vos unirdes à cruz de Nosso Senhor, e vos não exercitardes na mortificação de vós mesmo, digo-vos que tudo isso é vaidade, e ficareis privado de todo o bem, sem virtude, sujeito e disposto a escandalizar-vos com os judeus, da Paixão de Nosso Divino Salvador. Em suma, não há outra para entrarmos no céu senão a humilhação e a mortificação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário