6 de junho de 2014

Pensamentos Consoladores de São Francisco de Sales.

26/26  -  Pensamentos consoladores contra as maledicências e calúnias.

"Bem aventurados os que sofrem a perseguição da justiça", porque a sua vida esta oculta com Jesus Cristo em Deus e conforme à sua imagem porque ele foi toda sua vida perseguido pela justiça, que todavia cumpria por toda a maneira. Estes estão ocultos no segredo da face de Deus e são injustamente perseguidos pelos homens e se os homens os detestam, Deus abençoa-os.
"Sereis muito felizes, diz Nosso Senhor, quando os homens disserem toda a qualidade de males contra vós por causa de mim".  "Se o mundo, diz São Paulo, nada tivesse de dizer contra nós, não seríamos verdadeiros servos de Deus". Não vos importeis com o juízo dos homens e tereis a paz interior. Não vos importeis com o que o mundo disser de vós; esperai o juízo de Deus, e julgareis então os que vos tiverem julgado. Pensai naquele por quem trabalhais e os que vos quiserem mortificar não vos inquietarão. É nos sítios escabrosos que os rios fazem ruídos e cachões.
Dizem que aqueles que tem o preservativo chamado pomada de São Paulo, não incham embora sejam picados e mordidos por uma víbora, contanto que a pomada seja boa; da mesma forma, quando a humildade e doçura forem boas e verdadeiras, protegem-nos contra a inchação e o ardor que as injúrias costumam produzir em nossos corações. Porque, se sendo mordidos por maldizentes e inimigos, nos tornamos altivos, inchados e despeitados, é sinal de que a nossa humildade e doçura não são verdadeiras e francas, mas artificiosas e aparentes.
Se o mundo nos despreza, regozijemo-nos, porque tem razão, visto sermos tão digno de desprezo. Se nos estima desprezemos a sua estima e juízo, porque é cego. Importai-vos pouco com o que o mundo pensa; não vos dê isso cuidado; desprezai o seu louvor e seu desprezo e deixai que ele diga o bem ou o mal que quiser. Em uma palavra, desprezai quase igualmente a opinião que o mundo de vós formar, e não lhe ligueis importância. Dizermos que não somos o que o mundo pensa quando nos louva, é bom; porque o mundo é um charlatão e diz sempre muito, seja bom ou mau. Não encontro remédio melhor nas contradições do que não fazer caso e termos uma grande doçura para o que no-la causa. Além disso, que ganhamos em nos opormos aos ventos e às ondas, senão espuma?
Não quero reputação senão a que for para serviço de Deus; porque sendo Deus servido, que importa que seja por boa ou má fama?
Deus meu! que é a reputação, visto que tantos se sacrificam a esse ídolo? Afinal de contas é um sonho, uma opinião, um fumo, um louvor onde a memória morre com o som, uma estima que é tão falsa que muitos se admiram que lhe louvem as virtudes, quando têm os vícios opostos, e que lhe censurem os vícios de que estão isentos. Os que se queixam quando dizem mal deles são muito delicados; é uma pequena cruz de palavras que o vento leva. Esta palavra: "Ele feriu-me", para dizer: "Fez-me uma injúria", desagrada-me, porque há muita diferença entre o zunir de uma abelha e a sua mordedura; é preciso ter os ouvidos e a pele muito delicada para não suportar o ruído de uma mosca.
Convém que estimemos ser censurados, porque se o não merecemos por uma forma, merecemo-lo por outra.
A vida das pessoas virtuosas esta cheia de discursos e amarguras, e os corações dos servos de Deus são como as bigornas destinadas a ser feridas e que vivem de golpes e ultrajes. 
Nunca deixarei sair do meu espírito, se Deus me ajudar, esta máxima: "que não devemos viver segundo a prudência humana, mas segundo a lei do Evangelho"; porque esta prudência humana é uma verdadeira ninharia. Oh! Livre-nos Nosso Senhor sempre disto e faça-nos constantemente dizer segundo o espírito do Evangelho, que é doce, simples e amável, dando sempre o bem pelo mal!
Estavam bem adiantados na prudência humana os que inventaram este provérbio: "Vale mais a honra do que a riqueza", preferindo a reputação às riquezas, isto é, a vaidade à avareza. Oh! Deus! como isto se afasta do espírito da fé! Há por ventura reputação manchada como a de Jesus Cristo? Com que injúrias não foi ele atacado? De que calúnias não foi vitima? Contudo o eterno Padre deu-lhe um nome superior a todos os nomes e exaltou-o tanto quanto Ele se tinha humilhado. E os Apóstolos não saiam mais alegres  das assembleias, onde tinham recebido afrontas pelo nome de Jesus?
Oh! sim é glorioso sofrer por tal causa. Eu bem o entendo; não queremos senão perseguições ilustres, para que a nossa luz resplandeça nas trevas e a nossa vaidade brilhe entre os sofrimentos; quereríamos ser crucificados gloriosamente. Mas quando os mártires sofriam cruéis suplícios, eram louvados pelos seus algozes? Não eram, pelo contrário, amaldiçoados e execrados? Ah! existem bem poucas pessoas que queiram desprezar a sua reputação para procurar a glória daquele que morreu ignominiosamente na cruz, afim de nos conduzir à glória que não terá fim! Se a graça de Deus se justificasse em mim, desejaria que no dia do juízo, quando se manifestarem os segredos dos corações, só Deus soubesse da minha justiça, e as minhas injustiças fossem conhecidas de todos.
Em que queremos nós testemunhar o nosso amor para com Aquele que tanto sofreu por nós, se não for pelas incomodidades, contrariedades e repugnâncias? Ah! deixemos trespassar o nosso coração com a lança da contradição; alimentemo-nos com o absinto; bebamos o fel e vinagre das amarguras temporais, visto Nosso Senhor assim o querer.
Deus, eis o espelho da nossa alma, e o polo imóvel no qual giram os nossos desejos e movimentos. Depois disto, arme-se o céu, amotine-se a terra e os elementos, guerreiem-se todas as criaturas, que eu confio em Deus; basta-me estar com Ele e que Ele esteja comigo, para eu estar em paz.
Tenhamos os olhos sempre fixos em Jesus Cristo crucificado; caminhemos em seu serviço com confiança e simplicidade, mas sábia e discretamente; Ele será o protetor da nossa fama, e se permite que no-la roubem será para nos dar uma melhor, ou para aproveitarmos na santa humildade, uma onça que vale  mais do que mil de honra. Se nos caluniam, oponhamos com doçura a verdade à calúnia; se a pessoa continua, continuemos nós a humilhar-nos. Entregando assim a nossa reputação com a nossa alma nas mãos de Deus, não a poderemos guardar melhor. Sirvamos a Deus na fama boa e má a exemplo de São Paulo, para que possamos dizer: "Oh! meu Deus, por vós é que eu suportei este opróbrio e que a confusão cobriu a minha face".
Uma porção desta virtude adquirida entre as contradições, os opróbrios, as censuras e as repreensões, vale mais do que muitas adquiridas de outra forma. Oh! quão felizes somos em ter jurado uma fidelidade eterna ao nosso Mestre! Para lhe agradar, basta ter paciência e viver virtuosamente, porque teremos muitas ocasiões de sofrer.
Amai-o bem, nos retiros que fazeis para orar e adorar; amai-o quando o receberdes na santa comunhão; amai-o quando o vosso coração estiver consolado; mas amai-o sobretudo quando ele estiver mergulhado na tribulação e aridez; porque assim vos amou Ele no paraíso, e depois entre os açoites, cravos, espinhos e trevas no Calvário.
Considerando isto, deveis receber com paciência e doçura as tribulações que tiverdes por amor d'Aquele que as permite unicamente para vosso bem.
Elevai pois o coração a Deus; pedi-lhe auxílio e fundai a consolação na felicidade de lhe pertencerdes. Poucas serão para vós as ocasiões de desgostos se tiverdes um tal amigo, auxílio e refúgio.

      

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