1 de dezembro de 2016

Columba Marmion - Jesus Cristo nos seus mistérios.

11 

Aqui temos, se assim me posso exprimir, um dos atos da permuta: Deus toma a nossa natureza para a unir a Si numa união pessoal.
 Qual é o outro ato? Que nos dará Deus em troca? Não que Ele nos deva coisa alguma - Bonorum meorum .non eges -, mas, como tudo faz com sabedoria, não se revestiu da nossa natureza sem um motivo plenamente digno d'Ele.
 O que o Verbo Incarnado dá em troca à humanidade é um dom incompreensível; é uma participação real e íntima da Sua natureza divina: Largitus est nobis suam deitatem. Em troca da humanidade que toma de nós, o Verbo Incarnado dá-nos a participação na Sua Divindade, torna-nos participantes da Sua natureza divina. E assim se efetua a mais admirável permuta que se pode dar.
 Esta participação, como sabeis, já fora, sem dúvida, oferecida e dada, desde a criação, a Adão, o primeiro homem; o dom da graça, com todo o esplêndido cortejo de privilégios, tornava Adão semelhante a Deus. Mas o pecado do primeiro homem, tronco do gênero humano destruiu e tornou impossível, do lado da criatura, esta participação inaudita. 
O Verbo incarnou para a restabelecer; para nos reabrir o caminho do céu e tornar-nos participantes da vida eterna, Deus fez-se homem. Este Menino, sendo o próprio Filho de Deus, possui a vida divina como o Pai, com o Pai; pois n'Ele «habita corporalmente a plenitude da Divindade»; n'Ele estão «acumulados os tesouros da Divindade». Mas não os tem só para Si: deseja infinitamente comunicar-nos a vida divina que é Ele próprio: Ego sum vita; foi para isso que veio: Ego veni ut vitam habeant. Foi por nós que nasceu; é a nós que é dado o Filho: Puer natus est nobis et Filius datus est nobis. Fazendo-nos participar da Sua qualidade de Filho, torna-nos filhos de Deus. <
 Tais são os dois atos da admirável permuta que Deus realiza entre nós e Ele; toma a nossa natureza para nos comunicar a Sua Divindade; toma uma vida humana para nos fazer participantes da Sua vida divina; faz-se homem para nos tornar deuses: Factus est Deus homo, ut homo fieret Deus. E o seu nascimento humano torna-se o meio do nosso nascimento para a vida divina. 
Em nós também haverá duas vidas. Uma natural, que recebemos pelo nosso nascimento segundo a carne, mas que, aos olhos de Deus, como consequência da culpa original, é não somente sem mérito, mas, antes do batismo, maculada em seu íntimo; que nos torna inimigos de Deus, dignos da Sua justiça; nascemos filii irae. Outra sobrenatural, infinitamente acima dos direitos e das exigências da nossa natureza. É esta que Deus nos comunica pela Sua graça, depois que o Verbo Incarnado no-la mereceu.
 Deus gera-nos para esta vida sobrenatural pelo Verbo e pela infusão do seu Espírito, na fonte batis-  mal: Genuit nos verbo veritatis. Per lavacrum regeneratoíns et renovatíonis Spirítus sancti; é uma vida nova que se acrescenta à nossa vida natural, ultrapassando-a e coroando-a: In Christo nova creatura. Torna-nos filhos de Deus, irmãos de Jesus Cristo, dignos de participar um dia da Sua bem aventurança e da Sua glória. 
Em nós, como em Jesus Cristo, é a vida divina que deve dominar, se bem que em Jesus Menino ainda não se manifeste e em nós permaneça sempre velada sob as grosseiras aparências da existência ordinária. É a vida divina da graça que deve, não só reger e governar, mas também tornar agradável ao Senhor toda a nossa atividade natural, assim divinizada pela sua raiz.
 Oh! se a contemplação do nascimento de Jesus e a participação deste mistério pela recepção do pão da vida nos levassem a acabar, de uma vez para sempre, com tudo o que destrói ou diminui a vida divina em nós; com o pecado de que Jesus Cristo nos vem libertar - Cujus nativitas humanam repulit vetustatem -, com toda a infidelidade,· com toda a imperfeição, com todo o apego à criatura, com a preocupação desregrada das coisas que passam - Abnegantes saecularia desideria -, com os mesquinhos cuidados do nosso vão amor próprio! .... 
Se nos levassem a dar-nos inteiramente a Deus, como prometemos no dia do batismo, quando nascemos para a vida divina; a entregar-nos ao cumprimento exato de todas as Suas vontades e do Seu beneplácito, como fazia o Verbo Incarnado quando entrou neste mundo - Ecce venio ... ut faciam Deus voluntatem tuam; a fazer-nos praticar as boas obras que nos tornam agradáveis a Deus - Pop-ulum acceptabilem, sectatorem bonorum operum.
 Então a vida divina, trazida por Jesus com o Seu nascimento, não encontraria obstáculos e desabrocharia livremente para a glória do nosso Pai dos céus; então «faríamos resplandecer na nossa vida os ensinamentos com que a nova luz do Verbo Incarnado inunda a nossa fé»; <

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.