MEDITAÇÃO III
Jesus, o homem das dores
“Varão das dores e experimentado nas enfermidades” (Is 53,3). Assim o profeta Isaías descreve nosso Redentor. Salviano,
considerando os padecimentos de Jesus Cristo, escreve: “Ó amor, não sei como hei de chamar-te, se doce, se cruel, pois pareces ser
ambas as coisas”. Ó amor de meu Jesus, não sei como hei de apelar-te:
mui doce vos mostrastes para conosco, ó Jesus, amando-nos tanto
depois de tantas ingratidões, e mui cruel para convosco mesmo,
sobrecarregando-vos com uma vida cheia de dores e uma morte amarga para pagar os nossos pecados. S. Tomás escreve que Jesus
para salvar-nos do inferno se submeteu à dor em grau máximo, ao
vitupério em grau supremo. Bastaria que ele sofresse qualquer dor para satisfazer por nós a justiça divina; quis, porém, sofrer as
injúrias mais vis e as dores mais agudas para nos fazer compreender a
malícia de nossas culpas e o amor que nutria por nós em seu coração.
Dor em sumo grau: para assim poder sofrer, foi-lhe dado um
corpo especial (Hb 10,5). Deus fez o corpo de Jesus Cristo
propositalmente para o sofrimento e por isso criou-lhe uma carne sumamente sensível e delicada; sensível, porque sentia mais vivamente
as dores; e delicada, porque era tão tenra, que qualquer golpe lhe
causava um ferimento: em suma, era seu corpo sacrossanto um corpo feito
de propósito para padecer. Todas as dores que sofreu Jesus
Cristo até expirar estavam-lhe presentes desde o primeiro instante de
sua encarnação: ele as viu todas e de boa vontade de Deus que o
queria sacrificado por nossa salvação. “Então ele disse: Eis que eu
venho, ó Deus, para fazer a vossa vontade” (Hb 10,9). Eis-me aqui, ó
meu Deus, eu me ofereço para tudo. E foi essa oferta que nos
obteve a divina graça, segundo o Apóstolo: “Por essa vontade é que
temos sido santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo,
feita uma vez”(Hb 10,16). O que, porém, vos levou a sacrificar, ó meu
Salvador, a vossa vida no meio de tantas dores por nossa salvação? S.
Paulo responde: a isso o induziu o afeto que nos tinha: “ele nos
amou e se entregou a si mesmo por nós”(Ef 5,2). Entregou-se: o amor o
induz a entregar seu corpo aos flagelos, sua cabeça aos espinhos,
sua face aos escarros e bofetadas, suas mãos e pés aos cravos e sua
vida à morte. Quem quiser ver um homem de dores, contemple Jesus
Cristo na cruz. Ei-lo aí, suspenso por esses três cravos, estando
seu corpo com todo o peso pendente das chagas das mãos e dos pés
atravessados; cada membro seu sofre sua dor própria e sem alívio. As três horas que Jesus passou na cruz são chamadas com razão as
três horas de agonia do Salvador; pois, durante essas três horas,
ele sofreu uma agonia contínua e uma dor que lhe arrancava aos poucos a vida, chegando finalmente a morrer de pura dor.
Que alma poderá ver-vos morto na cruz por ela, ó meu Jesus,
e viver sem vos amar? E como pude eu viver tantos anos
esquecido de vós, causando tantos desgostos a um Deus que tanto me amou?
Oh! tivesse eu antes morrido e nunca vos tivesse ofendido! Ó
amor de minha alma, ó meu Redentor, pudesse eu morrer por vós que morrestes por mim! Eu vos amo, ó meu Jesus, e não quero amar
a mais ninguém senão a vós.
Nenhum comentário:
Postar um comentário