8 de outubro de 2014

Páginas de Vida Cristã - Pe. Gaspar Bertoni.

XVII - A HUMILDADE 

1. - Bem-aventurados os pobres em espírito (Mt 5, 3; Lc 6, 20) ou seja os verdadeiros humildes
Entre os dois vícios opostos - a soberba, que eleva o homem acima dos limites da razão, e a desordenada abjeção que o deprime demais - está a humildade; a qual com o verdadeiro conhecimento de si mesmo modera o espírito para que não suba acima de si, e ainda o inclina a abaixar-se sustentando-o, porém, sempre a reta razão para que não caia no outro extremo, isto é a abjeção .
2. - A humildade é necessária:
a - porque Cristo a ordena
Esta virtude é tão necessária que Cristo disse: "Se não vos tornardes como crianças, não entrareis no reino dos Céus". E ainda: "Quem se humilhar como esta criança, este será o maior no reino dos céus" (Mt. 18, 3-4).
Nestas palavras, "se vos tornardes como crianças" onde se fala de humildade, observa S. Bernardo um tom de falar diverso daquele deste outro, "quem puder entender entenda" (Mt 19, 12) , onde se fala da virgindade; e conclui concorde com os outros Padres que "esta aconselha, aquela exige"; a virgindade é de conselho, mas a humildade é de preceito.
A humildade não é, pois, somente um conselho útil para a perfeição; mas um preceito necessário a todos para se salvar. Como não será pedida a vocês a humildade, quando a todos é ordenada a salvação? E sem humildade, sem se tornar como crianças, não se pode salvar.
b - porque Cristo a ensina
A você também são necessárias as lições de Cristo seu Mestre: "Aprendei de mim - diz Ele - que sou manso e humilde de coração" (Mt 11, 29). De mim, que sendo de natureza igual ao Pai, aniquilei-me tomando a natureza de servo, feito humilde não só como uma criança, mas nascido criança chorei sobre o feno, sujeito durante trinta anos àqueles que eu havia criado, para tornar-me obediente ao Pai
até a morte de Cruz (Fl 2, 6, 7, 8), onde saturado de opróbrio fui reputado entre os celerados como pecador (Mc 15, 28). Eu lhes dei exemplo de humildade, para que como eu fiz, assim vocês façam. Não é maior o discípulo que o mestre (Jo 13, 15).
Ah! Cristão! Cristo humilde; e você cristão soberbo? Não lhe cabe mais este nome de cristão; se você não resolver imediatamente abraçar a humildade, será conveniente que não só renuncie ao reino dos céus que é o reino dos humildes, mas que ainda mude de nome. Pensem um pouco. Debaixo de uma cabeça humilde não pode permanecer um membro soberbo.
c - porque é fundamento de toda virtude
Já vejo as pessoas que amam a virtude, todas ocupadas em plantar pedras e alicerces de firmíssima fé; elevar colunas e paredes de invicta esperança; espalhar arcos magníficos de caridade; colocar ornatos das mais belas virtudes; plantar jardins onde a virgindade mais pura ou o amor mais terno convidem o esposo ao prazer, e a repousar ao meio dia nos pacíficos silêncios das avenidas umbrosas.
Que belo edifício! Quanto é rico, quanto é ameno!
Mas já pensaram antes em cavar fundamentos profundos para esta construção tão alta, que possa resistir aos ventos furiosos aos quais ficará sujeita?
Já pensaram antes em escavar dos seus corações toda a terra movediça da soberba, para torná-lo aberto à graça? Como sábio arquiteto, que lança pedras firmes no fundo sólido da humildade, e suspende o edifício quanto mais gracioso, tanto mais firme. S. Bernardo lhes diz que se não puser bons fundamentos de humildade, o seu edifício rui por terra. E acrescenta S. Gregório que se os seus lírios não tiverem raízes de humildade, secarão. Porém deixemos de metáforas.
As próprias virtudes se tornaram em ruína, porque cuidando de vocês mesmos desprezam os outros com altíssima soberba. Assim enquanto vocês pensam conversar nos céus têm necessidade de uma graça extraordinária que os converta; sendo mais fácil que se converta ao bem um pecador conhecido, que a própria queda humilha, do que aquele pecador oculto, coberto com o manto de aparentes
virtudes.
3. - A humildade é útil:
a - aos pecadores
Ouçam as sentenças de S. João Crisóstomo; ouçam os que pensam estar em graça e procurem não cair; ouçam-nos os que caíram e se animem para levantar.
Dêem-me - diz ele - dois carros velozes. Emparelhai generosos cavalos.
Façam subir em um todas as virtudes, mas unidas à soberba; no outro todos os vícios acompanhados da humildade. Estalai o chicote, aguilhoai os ginetes para que se lancem na corrida. Verão o carro dos vícios sempre preceder o das virtudes, não por sua própria força, mas pela humildade que está sobre ele. Verão o outro ficar para trás vencido, não pela debilidade das virtudes, mas pelo grande peso da
soberba.
Querem ver uma prova? O fariseu ajunta ao mesmo tempo justiça e soberba.
"Não sou - diz - como o restante dos homens, ladrões, injustos, como aquele publicano". O publicano une os piores vícios e uma verdadeira humildade. E grita a Deus: "Tende piedade de mim que sou um pecador". Assim em comparação com o fariseu este sai justificado.
Existisse qualquer alma a mais pecadora; eu não desanimado nem pelo horror de suas culpas nem pelo peso de suas cadeias, eu quereria dizer suba, suba você também sobre este carro da humildade para provar da sua vantagem diante de qualquer fariseu que a rejeita. Deus acolhe a súplica dos humildes, e lhes dá a mão para subir; Deus saberá tirar bem acima da lama para colocá-los entre os príncipes do seu reino (Sl 112, 8).
b - Nos justos, exemplo de S. Luiz Gonzaga
Mas se a humildade unida ao pecado corre tão bem que ultrapassa a justiça unida com a soberba; se a unirmos com a justiça, onde não chegará? Ao próprio trono de Deus. Assim, por exemplo, a soube unir S. Luiz Gonzaga.
Não sei dizer se a bela humildade, qual veste preciosa, mais o cubra ou o adorne. Essa assenta sobre sua fronte que sempre afastou de si as guirlandas caducas do mundo admirador. Vela-lhe modestamente os olhos que jamais se alçaram para desprezar os defeitos alheios, sempre voltados para procurar em si mesmo manchas que não existem. A humildade lhe colore as faces à simples
suspeita de aplausos. Reduz sua língua a um rigoroso silêncio sobre os internos tesouros de que ele é também enriquecido, enquanto lhe empresta fórmulas desconhecidas para confundir-se, para censurar-se, quanto amargas em si mesmas, tanto doces ao seu gosto e alegres aos ouvidos de Deus. A humildade lhe sacode da mão os sinais do domínio já lhe concedido pela natureza; e se nos põe ela
mesma tão bem pintada naquele crucifixo que Luiz bem pode almejar e retratar em si mesmo. Ela lhes guia os pés para escolher andar abjetos nos átrios do seu Senhor, antes que pousar alto sobre o trono paterno, e ser reverenciados nos tabernáculos dos pecadores. Assim é que enquanto por dons de engenho e de graça Luiz não via ninguém acima de si, de boa vontade se colocava abaixo de
todos, até dos últimos coadjutores da religião; mas aquele Senhor que sempre exalta quem se humilha, o colocou, não direi acima dos homens, não direi só entre os Anjos, mas acima dos Anjos mesmos por aquele grande dom de virginal pureza, da qual a humildade sempre foi mãe e guarda. Assim o jardineiro para fazer subir a água mais alta a faz primeiro descer e a esconde sob a terra. Ó feliz descida para subir! Ó muito útil rebaixamento que nos eleva! Oh! humildade tanto mais a nós
necessária, quanto mais ainda vantajosa! Onde escondeste até agora os teus valores que nós não te conhecemos? Ah! se a tivéssemos conhecido antes, antes a teríamos também amado. Agora tarde, é verdade, te encontramos, mas não te perderemos jamais.
Irmãos, procurai esta esposa tão amável, estreitar no coração a humildade.
Ela, qual mãe fecunda, lhes gera todos os dons de Deus, lhes conquista todas as virtudes; não só, mas as educa e as conserva, conservadas as aperfeiçoa, perfeitas as coroa; porque o Senhor dá a graça aos humildes; "felizes os pobres em espírito, ou seja os humildes, que deles é o reino dos Céus" (Mt 5, 3). Mas o prêmio é também aqui na terra; porque se aprenderem a ser humildes de coração, encontrareis a paz e o repouso para vossas almas" (Mt 11, 29).
4. - A humildade é de fácil aquisição quando o homem conhece a si mesmo
Eis, pois, um meio que lhes torna a humildade facílima; conhecer a si mesmos. Toda a dificuldade que um homem pode ter para humilhar-se nasce justamente do não conhecimento de si mesmo, e, estimando-se mais do que é, acredita-se superior a todos; mas façam que um homem conheça a si mesmo, ser pó e cinza, nada ter de si, mas tudo de Deus; como não será fácil a ele render o tributo de obsequiosa reverência e de todo louvor que é devido a Deus?
Reconhecerá ser pecador digno do Inferno, não certo do perdão, de ser capaz das piores iniqüidade, incerto na perseverança; que repugnância poderá ter seu coração em manter-se baixo com seus irmãos?
Mas recomeçai: toda dificuldade consiste em conhecer-se bem.
Porém é fácil conhecer-se a si mesmo. Ouvi-me bem. Para que um objeto se possa dizer fácil de ser conhecido a todos, preciso é que esteja perto. Mas isto não basta; se não ainda sensível. Nem isto ainda é suficiente, se não salta por assim dizer aos olhos até de quem observa.
Ora que coisa é mais próxima de nós que nós mesmos para poder conhecermo-nos facilmente? Que tocar, pois, com mão o nosso nada? "Tua humilhação está dentro de ti (Mq 6, 14). Que coisa mais sensível e mais óbvia até aos olhares mais grosseiros, que os pecados, os defeitos, as tentações? Os
pecados, que mesmo querendo você distrair o pensamento a própria consciência lhes atira na face? Os defeitos que nos vem a todo momento desaprovados por todos aqueles com quem conversamos? As tentações, que nos são molestas até tornar-nos amarga a própria paz? É fácil, pois, conhecermo-nos a nós mesmos. Fácil é pois a humildade na sua prática.
5 - Filhos dos homens , até quando tereis o coração endurecido?
Mas se é assim: qual será para nós a desculpa que nos possa cobrir se não nos resolvemos de verdade aqui, agora, a praticar a humildade? Parece-nos ainda difícil ou impossível? Não sabemos humilhar-nos?
Pois bem, ouçamos o Profeta nos sacudir com seu grito: "Filhos dos homens até quando tereis o coração endurecido? (Sl 4, 3). Corações humanos criados para dominar nesta terra, nascidos para o céu, como vos condenais a não olhar, a não amar sendo a lama? Vocês sabem se aviltar; não sabem humilhar-se? Sabem humilhar-se atrás de apetites nefandos, ao aceno tirânico de uma paixão; não
saberão humilhar-se pelos exemplos de Cristo, ao comando de um Deus? Sabem humilhar-se para não cair; não sabem humilhar-se para se levantar? Não sabem humilhar-se para se tornarem adornados de dons sobrenaturais, e queridos a um céu inteiro? Sabem colocar-se debaixo dos pés dos próprios jumentos; não sabem ser humildes com seu próximo, com seus semelhantes? Oh! cegueira! Oh! soberba!Oh! Loucura!
6 - Invocação a S. Luiz
A vós, nosso protetor S. Luiz, é reservado o triunfo destes corações. Não me admiro, ó pecadores meus irmãos, nem da vossa, nem da minha culpa. Sei bem que a nossa terra é muito apta para receber a verdadeira humildade, mas não é capaz de produzi-la. Esta é um dom perfeito que desce do Céu.
Ó S. Luiz, obtende-a vós; e vós mesmo, do bem-aventurado terreno onde medra esta planta celeste, transplantai-a com vossa mão ao nosso coração; fortificai-a com vosso exemplo; cercai-a com a vossa proteção; para que ela cresça e se mantenha, e nós possamos cheirar as flores de suave alegria, de paz nesta terra; para saborearmos em seguida os frutos da vida eterna juntamente convosco no céu.
Referências Bibliográficas:

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