19 de dezembro de 2013

NOVENA PARA A FESTA DO NATAL.

QUARTO DIA — DIA XIX DE DEZEMBRO.
A Paixão de Jesus Cristo durou todo o tempo da sua vida.

Dolor meus in conspectu meo semper — “A minha dor está sempre diante de mim” (Ps. 37, 18).

Sumário. Desde o instante em que foi criada a alma de Jesus Cristo e unida com seu pequenino corpo, viu diante de si todos os padecimentos que teria de sofrer para a redenção dos homens. Por isso Jesus começou desde o primeiro instante da sua vida a sofrer por nosso amor a tristeza mortal que depois padeceu no horto de Getsêmani. E como temos nós correspondido a tão grande amor? Talvez com frieza e ingratidão.

I. Considera como, no mesmo instante em que foi criada a alma de Jesus e unida com seu pequenino corpo no seio de Maria, o Pai Eterno manifestou a seu Filho a sua vontade que morresse para a redenção do mundo. No mesmo tempo pôs-lhe diante dos olhos a vista triste todos os sofrimentos que deveria sofrer até à morte a fim de remir o gênero humano. Mostrou-Lhe então todos os trabalhos, desprezos e pobreza que deveria suportar toda a sua vida, tanto em Belém como no Egito e em Nazaré. Mostrou-Lhe em seguida todas as dores e ignomínias de sua Paixão: os açoites, os espinhos, os cravos e a cruz; todos os desgostos, tristezas, agonias e abandono em que havia de terminar a sua vida no Calvário.

Quando Abraão levava seu filho à morte, não quis contristá-lo comunicando-lhe a sorte com antecedência, nem no pouco de tempo de que precisavam para chegarem ao monte. Mas o Pai Eterno quis que seu Filho encarnado, destinado a ser vítima da divina justiça pelos nossos pecados, sofresse já então todas as penas, às quais depois deveria submeter-se na vida e na morte. Por esta razão, desde o instante em que baixou ao seio de sua Mãe, Jesus sofreu sem interrupção a tristeza que o acabrunhou no horto, e que era suficiente para tirar-lhe a vida, assim como ele mesmo disse: Tristis est anima mea usque ad mortem (1) — “A minha alma está triste até à morte”. De sorte que desde então Ele sentiu vivamente e sofreu o peso todo de todos os tormentos e opróbrios que o esperavam.

Toda a vida, portanto, e todos os anos do Redentor foram vida e anos de dores e de lágrimas: Defecit in dolore vita mea, et anni mei in gemitibus (2) — “A minha vida tem desfalecido com a dor, e os meus anos com os gemidos”. O seu divino Coração não teve um instante livre de padecimento. Quer vigiasse, quer dormisse, sempre tinha diante dos olhos aquela triste representação que Lhe atormentou mais a santíssima alma do que os santos mártires foram atormentados por todos os seus suplícios. Os mártires padeceram, mas, ajudados com a graça, padeceram com alegria e ardor: Jesus, ao contrário, padeceu sempre com o Coração cheio de desgosto e tristeza e aceitou tudo por nosso amor.

II. Ó doce, ó amável, ó amante Coração de Jesus! é, pois, verdade que desde menino estivestes repleto de amargura, e que no seio de Maria padecestes uma agonia sem consolação, sem testemunha, sem ao menos ter quem Vos aliviasse e de Vós se compadecesse. Tudo isso, ó meu Jesus, sofrestes a fim de satisfazer pelas penas eternas e pela agonia sem fim que deviam ser a minha sorte no Inferno por causa dos meus pecados. Padecestes privado de todo alívio, a fim de me salvar a mim que tive a audácia de abandonar o meu Deus e de virar-lhe as costas para satisfazer a meus miseráveis apetites. Graças Vos dou, ó Coração aflito e amante de meu Senhor. Graças Vos dou e compadeço-me de Vós, mormente por ver que, ao passo que Vós padecestes tanto por amor dos homens, estes nem sequer de Vós se compadecem. Ó amor de Deus! Ó ingratidão dos homens! Ó homens, ó homens, vede esse Cordeirinho inocente que está em agonia por Vós, para dar à divina justiça satisfação pelas injúrias que vós Lhe tendes feito. Vêde como Ele está orando e intercedendo por Vós junto do Eterno Pai: contemplai-O e amai-O.

Ah, meu Redentor, quão poucos são os que pensam nas vossas dores e no vosso amor! Ó Deus! quão poucos são os que Vos amam! Mas ai de mim! Eu também tenho vivido muitos anos esquecido de Vós! Vós tanto padecestes para ser de mim amado, e não Vos amei. Perdoai-me, ó Jesus meu, perdoai-me; quero emendar-me e amar-Vos. Desgraçado de mim, Senhor, se ainda resistisse à vossa graça, e com a minha resistência me condenasse! As grandes misericórdias de que tendes usado comigo, especialmente a vossa doce voz que agora me chama ao vosso amor, seriam o meu maior castigo no inferno. Meu amado Jesus, tende piedade de mim, não permitais que para o futuro eu viva ingrato ao vosso amor. Dai-me luz e dai-me força para vencer tudo a fim de cumprir a vossa santa vontade. Atendei-me, Vô-lo peço, pelos merecimentos de vossa Paixão. É nesta que confio, bem como na vossa intercessão, ó Maria. Minha querida Mãe, socorrei-me; vós me impetrastes todas as graças que tenho recebido de Deus; eu vô-lo agradeço; mas se não continuardes a socorrer-me, eu continuarei a ser infiel, assim como o tenho sido nos anos passados.

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1. Matth. 26, 38.
2. Ps. 30, 11.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 63 - 66.)

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