14 de dezembro de 2013

O Diabo, Lutero e o Protestantismo - Pe. Júlio Maria - Capítulo 5

CAPÍTULO V

A CONDENAÇÃO DE LUTERO
Mesmo com todas as suas fanfarronadas e provocações, o “reformador” senti-se inquieto. Após se rebelar contra a Igreja, recorreu à ajuda dos grandes do seu tempo.
Em data de 23 de outubro de 1520 escreveu ao imperador Carlos V, dizendo-se desejoso de comparecer perante ele, COMO UMA PULGA perante o rei dos reis, soberano universal.
“Contra o meu querer, acentuou ele em sua carta, apresentei-me publicamente em cena; se cheguei a escrever algo, foi porque outros a isto me obrigaram pela força ou pelo embuste; jamais aspirei por outra coisa senão à solidão da minha cela... Mas há quase três anos estou exposto ao ódio dos outros, entregue a toda espécie de zombarias e perigos. Em vão imploro me perdoem; em vão prometo calar-me; em vão ofereço as condições de paz; em vão espero melhores instruções para mim.; lança-se todos sobre mim, com o fito de destruir o Evangelho inteiro”.
E, em situação tal, suplicava Lutero à autoridade civil “o defendesse, não a ele, desamparado e prostrado por terra, mas ao tesouro da verdade”...
Eis o pai dos protestantes, o “sublime Lutero” implorando, submisso e cheio de bajulação, a proteção dos potentados da terra. Em suas expressões sente-se a hipocrisia do herege, a obsessão do doente, e, sobretudo, o remorso duma consciência que não cala.
Em cartas subsequentes, segundo as circunstâncias, chegou ele a atacar o poder, abandonando a sua situação de POBRE PULGA, para se transformar num TIGRE FURIOSO, pretendendo assaltar a Igreja e a sociedade, e tudo destruir e esmagar. Percorramos a vida de Lutero, nesta nova fase.

1. O DESESPERADO
Sobre a sua cabeça em ebulição Lutero sentiu pesar a excomunhão da Igreja.
Como já ficou dito atrás, pressentiu ele, antes de tudo, ser-lhe urgente destruir na opinião pública o receio provocado por aquele castigo oficial e supremo da autoridade.
Para lograr o seu intento, começou, então, a pregar abertamente contra a mencionada pena, apresentando-a, não como temível, mas propalando-a desejável.
“Tal castigo”, exclamou ele, “não separa da comunhão dos cristãos; antes, é de grande mérito perante Deus que abençoa duplamente ao que vem a falecer nesta injusta maldição”.
No entanto, malgrado bravatas deste porte, Lutero padecia de terrível inquietação.
As universidade de Lovaina e Colônia se declararam contra ele, enquanto o processo correia. O Dr. Eck reunira os documentos da discussão de Leipzig, com outras provas de heresias, e levara tudo a Roma.
Exasperado, Lutero escreveu então um panfleto incendiário, dirigido à nobreza alemã, tratando dos melhoramentos do estado cristão.
Em termos furiosos ele expôs como, a seu ver, o papado pecou contra a nação germânica e contra a Igreja. Em 25 capítulos abordou ele o assunto dos abusos eclesiásticos, já por outros apontados com mais calma e ponderação (*).
Afinal, “era um simples plágio”.
Ao finalizá-lo, fervendo em ódio e sedento de vinganças, levantou os olhos ao céu, e exclamou: “Ó Cristo, meu Senhor, olhai para a terra, fazei raiar o último dia e destruí o ninho diabólico de Roma”. Estava lançada a declaração de guerra, com que pretendia lrevoltar o povo alemão em peso contra a Igreja de Cristo.
(*) - Gravamina: Onus Ecclesiae; Perstinger: De planctu Ecclesiae; De ruína Ecclesiae, etc...

2. NOVAS DOUTRINAS HERÉTICAS
Logo se pôs Lutero a fabricar um tratado DOUTRINAL da sua “reforma”, justificando que, assim como outrora haviam os judeus sido libertados da escravidão por Moisés, iria ele, então, livrar os povos cristãos da servidão babilônica.
O novo libelo foi intitulado: “Da escravidão babilônica”; nesta exposição Lutero liquidou completamente com o Papa, com a hierarquia e com a Igreja visível. Lutero reduziu a três os
sacramentos: batismo, confissão e ceia, considerando os dois últimos como uma coisa grotesca, sem caráter obrigatório.
Falando sobre a Eucaristia, ensinava que na Sagrada Hóstia não permaneciam apenas as aparências, mas até a própria substância do pão, de sorte que não há propriamente a TRANSUBSTANCIAÇÃO ou mudança da substância de pão na do corpo de Jesus Cristo, como o ensina a Igreja, mas se dá uma espécie de “empanação” em virtude da qual a substância do corpo de Nosso Senhor está presente na hóstia consagrada, conjuntamente com a substância do pão, o que se poderia chamar: consubstanciação ou duas substâncias sob uma só aparência.
Conforme a nova doutrina, a Santa Missa não é mais um sacrifício; o direito de impor mandamentos ou fazer votos opõe-se à liberdade eclesiástica; o celibato deve desaparecer e a Igreja, com suas prescrições a respeito do matrimônio torna-se culpada de adultério.
O conteúdo deste novo Evangelho pode resumir-se nestas palavras do reformador: “Nem o Papa, nem o Bispo, nem homem algum tem direito de impor a um cristão uma vígula sequer, sem que este o consinta”
Como é patente, tal modo de falar traz completa destruição de toda autoridade, a anarquia no governo e a rebelião no povo.
Lutero não raciocina mais. É um mísero possesso ou, melhor, um desequilibrado.

3. A BULA DE CONDENAÇÃO
Era tempo de agir, p0ois não havia mais esperança de pacificação. Lutero queria a guerra.
Em fins de abril de 1520 uma Comissão de Cardeais e teólogo, presidida pelo Papa Leão X, redigiu a Bula de condenação, publicada em 15 de junho do mesmo ano. É a Bula: EXURGE, DOMINE, composta de três partes; a primeira tratando dos ERROS; a segunda dos ESCRITOS e a terceira, da PESSOA do excomungado.
Em 41 asserções foram compreendidos os erros do herege, acerca da justificação e da autoridade da Igreja.
Sobre os escritos heréticos ficou declarado deverem ser queimados em toda a parte onde houvessem sido difundidos.
Quanto à pessoa de Lutero, a Santa Sé não promulgava ainda castigo algum, desejando deixar-lhe tempo e oportunidade de reconhecer os erros e poder retratá-los.
O aviso do Pontífice é paternal e conciliador; é sem razão que os protestantes reclamam contra a aspereza do tom desta Bula.
Eis o que disse Leão X neste documento: “Tomando como exemplo a vontade de Deus que não quer a morte do pecador, mas que se converta e viva, nós queremos esquecer todos os insultos lançados contra nós e contra a Sé Apostólica.
Estamos resolvidos a exercer a maior indulgência possível, e, enquanto depende de nós, levaremos a coisa de maneira tal que o culpado se levante, se converta de coração e retrate os erros indicados e que, voltando ao seio da Igreja, tal o pródigo do Evangelho, possamos recebê-lo com alegria.
Avisamos, pois, ao culpado e aos seus partidários de todo o coração, pelo amor e misericórdia de Nosso Senhor Deus e pelo sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, por quem foi resgatada a humanidade e confirmada a Igreja, e os conjuramos a desistirem de perturbar a paz, a unidade e a verdade da Igreja, pelos erros perversos que vão espalhando.
“Mostrando-se obedientes, eles encontrarão em nós copioso amor paternal, e braços abertos pela generosidade e a mansidão”.
Que distância não vai entre esta linguagem paternal, calma e ponderada do Chefe da Igreja, e os brados rancorosos, odientos e sanguinários do monge rebelde!
Algumas expressões extraídas da Sagrada Escritura e ainda outras em uso naquele tempo não apenas fórmulas comuns de casos semelhantes, sem serem a expressão dos sentimentos do Papa. A promulgação desta Bula foi confiada ao Dr. Eck, o conhecido adversário resoluto das inovações de Lutero. Tal escolha agradou aos católicos, mas irritou aos partidários do erro que viram nisto uma espécie de provocação.
O Dr. Eck encontrou sérias dificuldade para promulgá-la, devido ao estado de irritação entre o povo de seu país.
Várias universidades, como as de Leipzig, Wittemberg, Erfurt e Viena, promulgaram a Bula após longo demora. Vários bispos, receosos de oposição, não a publicaram logo.
Tal demora e este medo nos mostram que bom número de católicos e mesmo autoridades não compreendiam ainda o perigo representado pelos novos ensinos e pelas revoltas do frade apóstata. Julgando pacificar os ânimos pela paciência, deixaram o erro penetrar no espírito do povo que, sem dar ouvidos a vozes contrárias, abraçou o erro como se fosse a verdade, tornando-se, deste modo, protestante sem o perceber.

4. OS INSULTOS DE LUTERO
Não foi possível Lutero esperar proteção do imperador Carlos V, que era religioso demais para dar passaporte a um inimigo da Igreja, porém podia contar com o príncipe Frederico de Saxe para protegê-lo, caso o atingisse a excomunhão.
Primeiramente fingiu não acreditar na Bula e divulgou o boato de ser ela arranjo e obra do Dr. Eck; em conseqüência, pretendera insultar o Papa na pessoa de Eck, em fez de fazê-lo diretamente. “São Bulas e mentiras de Eck”, falava ele.
Era-lhe, porém inútil sustentar por longo tempo este fingimento, e, não podendo mais conter o seu ódio, externa-o em novo escrito: “Contra a Bula do Anticristo”(*) publicado em novembro de 1520. Neste novo pasquim diz o herege que a sua doutrina é a única verdadeira e, por isso, esta Bula pretende obrigá-lo a renegar a Deus e adorar o demônio.
“O Papa e os Cardeais, diz ele, devem provar as suas afirmações, senão serei coagido a considerar a Santa Sé como a sede do Anticristo, condenando-a e entregando-a a Satanás, com esta Bula e todas as suas decretais”.
O pseudo-reformador parece antes uma possesso do que um homem equilibrado.
Dirigindo-se ao Imperador, ele exclama: “Onde estás, grande imperador, onde estais vós, reis cristãos? Vós vos consagrastes pelo Batismo e podeis suportar estas vozes infernais do Anticristo?” Quanto à bula, escreve ele: “Todos os verdadeiros cristãos devem pisá-la aos pés e expulsar, pelo enxofre e o fogo, o Anticristo romano e o Dr. Eck. O seu apóstolo”
Neste mesmo ano reeditou outro pasquim: “Sobre a liberdade no cristianismo”, do qual enviou um exemplar ao Santo Padre Leão X, acompanhado de uma carta, na qual se lêem os seguintes insultos, mais dignos de um desequilibrado que de um reformador:
“A Igreja Romana é uma horrenda Sodoma e Babilônia; um covil de assassinos acima de todos os covis; uma casa de bandidos acima de todos os bandidos; um centro e uma terra de pecado e morte e de perdição, ao ponto de ser impossível pensar que pode subir em maldade, nem com a vinda do próprio Anticristo. ENTRETANTO, VÓS, Ó SANTO PADRE, ESTAIS ALI, COMO UM CORDEIRO NO MEIO DOS LOBOS”
O pobre herege procura encobrir a voz do Papa, por sua cólera, suas invectivas e seus insultos, aparecendo como um bêbado, gritando, gesticulando, sem saber de que lado virar, para encontrar um pouco de paz e de tranqüilidade. O demônio parecia ter entrado em seu corpo e em sua alma.
(*) - Esta palavra torna-se uma obsessão para Lutero, que com ela visa menos a pessoa de Leão X do que o poder papal em geral e toda a hierarquia.

5. A EXCOMUNHÃO DE LUTERO
Desejoso de manter-se na opinião pública e diminuir os efeitos do ato pontifício. Acém de lançar mão de escritos e palavras, resolveu Lutero recorrer a uma representação teatral.
Convidou a universidade de Wittemberg a um piedoso e edificante espetáculo em praça pública.
Na hora marcada, tendo feito acender uma fogueira, apareceu Lutero, vestido de monge agostiniano; tendo consigo a Bula de excomunhão, estendeu-a sobre o fogueira, exclamando em alta voz: “Porque atacaste a verdade do Senhor, eis que ele agora te ataca pelo fogo”.
Com a mão levantada fez um movimento circular e a Bula caiu no meio do fogo, sendo consumida pelas chamas.
“O piedoso e edificante espetáculo” estava terminado.
A mocidade luterana, fanatizada pelo seu professor herético, imitou-lhe o exemplo, e eis que desapareceu no braseiro crepitante tudo o que puderam encontra na igreja: livros de Direito, Constituições eclesiásticas, teologias, livros de orações, etc.
Esta cerimônia solene, dirá mais tarde o excomungado, foi feita por inspiração do Espírito Santo (Pastor IV. P. 384).
No dia seguinte, quando os estudantes lhe exaltaram a ação heróica, Lutero manifestou-se penalizado por não poder lançar no mesmo fogo o trono do Papa e ajuntou esta bela frase: “Quem não combate o papado, de todo o coração, não pode alcançar a salvação eterna”. (Ibid. p. 284).
Lutero estava condenado pela Santa Sé. Noutros tempos a sentença de Roma teria sido imediatamente acolhida pelo império, porém, nestes em que a revolta era como um fogo abafado, prestes a invadir o império germânico, era preciso calma e tempo.
O prazo passou, pois, e os 60 dias marcados para a retratação, ou para entrar em vigor a excomunhão, chegaram ao termo.
Em 3 de janeiro de 521, o Papa Leão X lançou uma nova Bula “Docet Romanum Pontificem” contra Lutero, declarando-o publicamente excomungado.
Ao mesmo tempo o Soberano Pontífice, em 18 de janeiro, dirigiu um Breve ao Imperador, pedindo fosse publicada em toda a Alemanha a Bula de excomunhão, para a revolta ser conhecida pelo povo, e para este último ficar prevenido contra os erros ensinados.
Lutero procurou proteção junto do seu benfeitor, príncipe Frederico de Saxe que intercedeu em seu favor perante o Imperador, pedindo para ser ouvido pela autoridade civil, antes da execução da sentença do Papa.
O imperador, mau grado seu, foi impelido pelos príncipes a atender ao pedido, ordenando o comparecimento de Lutero diante do Conselho geral de Worms.

6. PERANTE O CONSELHO DE WORMS
Fato curioso, que se poderia qualificar como o da obsessão do apóstatas, é o pensamento de Satanás, a persegui-lo, e a quem atribui todos os seus reveses: ele vê demônios em toda parte: - um ruído nas galerias da igreja de Erfurt, durante o seu sermão; a quês de umas pedras, em Gotha, durante a sua palestra; um incômodo, que o impediu de continuar viagem, tudo isso ele considerou produzido pela ação dos poderes infernais.
Escrevendo a seu amigo Spalatino, antes de ir as Worms, Lutero disse: “Iremos a Worms e os poderes do inferno e do ar não poderão impedir esta viagem”.
Ei-lo, pois, a caminho de Worms.
Dizem os historiadores que tal trajeto foi um triunfo. Os partidários o acompanharam e, por onde passava, todos queriam ver o homem extraordinário e alvo de tantas contradições.
Em 16 de abril de 1521 chegou à cidade, onde já se achavam reunidas as autoridades eclesiásticas com os príncipes e o Imperador.
Os ânimos estavam exaltados, e receava-se até um levante popular, fomentado pelos amigos de Lutero. No dia seguinte, 17, o herege foi citado perante o conselho (Ryksdag) , para ser ouvido.
Esperava-se uma exposição brilhante da parte de Lutero, pois havia declarado publicamente estar resolvido a “amedrontar e esmagar o próprio Satanás”, porém aconteceu o contrário.
Às duas perguntas que lhe forma dirigidas ele respondeu com voz tão sumida, tanto que só foi ouvido por aqueles que estavam mais próximos, como estivesse com medo ou indisposto.
Perguntaram-lhe se era de fato o autor dos escritos aí expostos.
Lutero respondeu afirmativamente.
Convidaram-no depois a condenar os erros neles contidos.
A este convite respondeu Lutero, pedindo reflexão e tempo, porque, disse, assim de repente, não podia dar uma solução.
Concederam-lhe vinte e quatro horas para pensar.
No dia seguinte Lutero compareceu em seu estado natural de insolência e orgulho; procurou defender os seus erros, atacou a autoridade da Ighreja e declarou em nada poder voltar atrás.
Os seus amigos o haviam animado e excitado neste intervalo, instigando-o a sustentar suas opiniões. Vendo a teimosia e o fanatismo cego do monge, o Imperador deu ordem a Lutero que se retratasse no dia seguinte dando-lhe salvo-conduto e garantia durante 20 dias, sob condição de não pregar nem espalhar os seus escritos.
À noite deste mesmo dia reuniram-se os protetores de Lutero: Frederico de Saxe, Spalatino e outros, e resolveram esconder o revoltoso para subtraí-lo a qualquer eventualidade do poder civil ou a qualquer perseguição dos seus adversários.
O mensageiro imperial, Gaspar Sturm, devia acompanhar Lutero, levando uma pequena tropa de soldados. Querendo o reformador fazer a viagem, com uns amigos, despediu o mensageiro, conservando apenas uns guardas desarmados; a razão desta despedida era a seguinte: tudo estava cuidadosamente preparado para uma fingida cilada, que devia salvar Lutero, excitar a animosidade dos seus adeptos e envergonhar os seus inimigos.
Passando, à noite, pelas florestas de Turíngia, perto de Altestein, em 44 de maio de 1521, Lutero foi subitamente assaltado por uns cavaleiros, retirado do carro e conduzido a cavalo para o Castelo de Wartburg, perto de Eisenach.
No dia seguinte espalhou-se logo o boato de que o passaporte do Imperador havia sido violado e que Lutero estava preso, tendo sido horrivelmente maltratado; propalavam alguns ter visto o seu cadáver, jogado na cavidade de um rochedo.
As más línguas seguiram naturalmente as más cabeças, e mil legendas impressionantes corriam no meio da populaça exaltada.
Neste tempo o apóstata excomungado estava sossegado ao abrigo de qualquer violência e levando vidas principesca, escondido no velho castelo de Wartburg, sob o pseudônimo de “Cavalheiro Jorge”.

7. DECISÕES DE WORMS
Enquanto isto ocorria, estava em andamento a sessão do Conselho de Estado, em Worms.
A teimosia de Lutero, em não se querer convencer dos seus erros, deu ao imperador pleno direito de lançar um edito contra o herege, em defesa de doutrina católica.
Este ato foi redigido, assinado pela autoridade civil e confiado ao representante do Papa, para ser levado a Roma.
O protetor de Lutero, Frederico de Saxe, vendo frustrados os seus esforços, para não assistir à condenação de seu pupilo, retirou-se das reunião e escreveu a uma amigo: “Não somente Anás e Caifás são contra Lutero, mas também Pilatos e Herodes, isto é, a autoridade religiosa a civil (Janssen-Pastor: II. 184).
Este edito de Worms não produziu o efeito que os homens sinceros dele esperavam.
Muitos acharam o texto um tanto áspero, incisivo, de modo que causou entre os católicos uma certa inquietação, e entre os sectários de Lutero um ódio maior contra a autoridade.
Nele se proclamava a excomunhão de Lutero, ordenando-se fosse ele considerado herege, não podendo mais ser acolhido, favorecido ou protegido por ninguém. Qualquer um estava obrigado a prendê-lo e entregá-lo ao Imperador. Seus livros deviam ser destruídos e punidos de excomunhão.
Ficou encarregado o Conselho municipal de Neuremberg de providenciar a execução da sentença.
São notáveis as acusações contra Lutero, expostas neste documento:
“Pelos seus escritos”, diz o edito, “Lutero espalha práticas corruptoras: muda o número dos Sacramentos, altera a lei da indissolubilidade do matrimônio, insulta o Papa com palavras grosseiras e blasfematórias, despreza o Sacerdócio e procura excitar os leitos a lavarem as mãos no sangue dos Sacerdotes. Ensina a falta de liberdade da vontade humana e exorta a uma vida sem freio e sem autoridade. Chegou ao ponto de não recuar diante das barreiras mais sagradas, fazendo queimar, em público, livros canônicos. Despreza os Concílios e apelida o Concílio de Constança: uma sinagoga de demônios e os seus participantes: anticristos e assassinos. É um inimigo em trajes de monge, acumulando antigas e novas heresias; pretende pregar o Evangelho e
destrói a fé sincera, sob o pretexto de restabelecer o verdadeiro Evangelho” (Janssen. P. II. 299). Como se vê, o Conselho imperial estava bem informado dos manejos de Lutero, e este documento resume, em poucas palavras, as principais heresias do pretenso reformador.
Se o Edito houvesse sido bem executado, talvez o mundo não teria assistido às tristes e horrendas cenas que seguiram à protestantização da Alemanha.
Infelizmente as ordens imperiais não produziram o efeito desejado.
A fraqueza e a desunião do próprio governo, o dinheiro, o medo, o comodismo e a simpatia pela reforma de vários chefes, atrasaram e em muitos lugares inutilizaram as medidas ordenadas.

8. CONCLUSÃO
Tal era a situação do reformador, antes e após ser condenado.
Pode-se ajuizar que o pobre herege é um anormal de uma teimosia e orgulho sem iguais.
Nada era capaz de fazê-lo raciocinar. Vivia obcecado pela idéia fixa do ódio à Roma, que pretendia exterminar e pela idéia da Bíblia só, para cada um poder fabricar-se um religião individual, independente de Deus e dos seus representantes na terra.
Nota-se em todos os passos do heresiarca uma pronunciada má fé e o desejo de ser aplaudido pela multidão.
Juntando-se a estas disposições pessoais de Lutero a decadência da época, as hesitações da fé e a exaltação dos espíritos em procura de mudanças, compreende-se o futuro que esperava o reformador, o qual, de fato, coroou os seus esforços.
Os grandes homens, os reformadores ou os deformadores, não brilham tanto pelo valor pessoa, quanto pelo desvalor dos que os cercam.
É o que o provérbio pessoal expressa muito bem: no reino dos cegos quem tem um olho é rei.
Assim, numa época de decadência, quando há falta de vigor, de energias, de entusiasmo, ao aparecer um indivíduo mais decidido e valoroso que os demais torna-se imediatamente o centro de uma nova constelação, em redor da qual gravitam os olhares e as simpatias.
Assim aconteceu com Lutero, um pobre orgulhoso que, sentindo a sua inferioridade em tudo, quis aproveitar a decadência que o cercava, para se elevar. Não encontrando em si um meio de efetuar este seu desejo, utilizou-se da insurreição, da palavra e da penas revolucionária, para se manifestar em pública e ganhar celebridade.
Tal é o super-homem protestante que temos pela frente. Simplesmente um super-revolucionário.

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