MEDITAÇÃO PARA A QUINTA-FEIRA
Da coroação de espinhos e das palavras “Ecce Homo”
1. Não contentes com a horrenda dilaceração feita no
sacrossanto corpo de Jesus com a flagelação, os carnífices, instigados
pelo demônio, e pelos judeus, querendo tratá-lo como rei de
teatro, cobrem-lhe os ombros com um trapo de cor vermelha, para simbolizar
o manto real, e colocam-lhe na cabeça um feixe de espinhos
trançados em forma de coroa e uma cana na mão para significar o cetro.
E para que essa coroa não servisse só para ludíbrio, mas também
para tormento, com a tal cana calcavam-lhe os espinhos na cabeça para que o ferissem e traspassassem. Assim, os espinhos chegaram a
penetrar até o cérebro, no dizer de S. Pedro Damião, e tanto era o
sangue que escorria das feridas, que ficaram repletos de sangue os
olhos, a barba, os cabelos de Jesus, como foi revelado a S. Brígida.
Esse tormento da coroação foi por si dolorisíssimo e foi também o
mais longo entre os sofrimentos que lhe infligiram até à sua
morte e cada vez que se tocava ou na coroa ou na cabeça se renovavam as
horrendas dores.
Ah, espinhos ingratos, que fazeis? assim atormentais o vosso Criador? Mas que espinhos? Minha alma, foste tu que com teus
maus pensamentos consentidos feriste a cabeça de teu Senhor. Meu
caro Jesus, vós sois o rei do céu, mas estais reduzido a rei de
opróbrios e de dores. Eis a que estado vos reduziu o amor por vossas
ovelhas. Ó meu Deus, eu vos amo, mas enquanto vivo estou em perigo de
abandonar-vos e negar-vos o meu amor, como fiz até agora. Meu Jesus, se sabeis que eu vos ofenderei de novo, fazei que morra
agora, que espero estar em vossa graça. Oh! não permitais que eu torne
a perder-vos: por minhas culpas bem mereceria essa desgraça, mas vós seguramente não merecereis que vos abandone novamente. Não, meu Jesus, não quero perder-vos de novo.
2. Aquela chusma indigna, não satisfeita com ter coroado tão
barbaramente a Jesus Cristo, quer motejar dele e multiplicar as afrontas e os ultrajes. Ajoelham-se por isso diante dele e, zombando,
saúdam-no: Ave, rei dos judeus; cospem-lhe na face, dão-lhe
bofetadas e o insultam com gritos e risadas de desprezo. (Mt 27,39; Jo
19,3). Ah, meu Senhor, a que estado estais reduzido? Se alguém passasse
por ali e visse esse homem assim deformado, coberto com esse
trapo de púrpura, com aquele cetro na mão, aquela coroa na cabeça e
tão escarnecido e maltratado por aquela gentalha, por quem o
tomaria senão pelo homem mais infame e celerado do mundo? Eis, pois,
o Filho de Deus feito o ludíbrio de Jerusalém. Ah, meu Jesus, se contemplo externamente o vosso corpo, nada mais vejo senão chagas e sangue. Se entro no vosso coração,
não encontro senão amarguras e angústias que vos fazem sofrer
agonias. Ah, meu Deus, quem poderia humilhar-se a sofrer tanto por
suas criaturas, senão vós, que sois uma bondade infinita? Mas,
porque sois Deus, amais como Deus. Essas chagas que em vós vejo são provas do amor que me tendes. Oh! se todos os homens vos
contemplassem no estado de dor e vitupério em que um dia fostes visto por toda a Jerusalém, quem poderia deixar de ser presa de vosso
amor? Senhor, eu vos amo e me dou todo a vós: eis aqui meu sangue,
minha vida, tudo eu vos ofereço: eis-me pronto a padecer e morrer
como vos aprouver. E como poderia negar-vos alguma coisa, se vós
me não negastes nem o vosso sangue nem vossa vida? Aceitai o
sacrifício que vos faz de si mesmo um mísero pecador, que agora vos ama de todo o seu coração.
3. Depois de reconduzido a Pilatos, Jesus foi mostrado por
este ao povo com as palavras: “Eis aqui o homem” (Jo 19,5).
Queria dizer: Eis o homem que trouxestes ao meu tribunal, acusando-o de
ter pretendido fazer-se rei; eis que esse temor desapareceu; pois, como
vedes, o reduzistes a tal estado que pouco poderá viver. Deixai-o,
portanto, morrer em sua casa, e não me obrigueis a condenar um
inocente. Os judeus, porém, mais enfurecidos, gritaram loucamente:
“Seu sangue caia sobre nós” (Mt 27,25) e depois: Que seja
crucificado. Tira-o, tira-o, crucifica-o! (Jo 19,25). Como Pilatos
mostrava do balcão Jesus ao povo, assim também o eterno Pai do céu apontava-nos seu Filho, dizendo-nos igualmente: Eis aí o homem que eu vos
prometi para vosso redentor e tão suspirado por vós: esse é o meu
único Filho, que eu amo como a mim mesmo. Ei-lo tornado por vosso
amor o homem mais cheio de dores e mais desprezado entre todos os homens. Contemplai-o e amai-o. Ah, meu Deus, eu contemplo esse vosso Filho e o amo, mas contemplai-o também e, pelo merecimento de suas dores e
desprezos, perdoai-me todas as ofensas que eu vos tenho feito. O sangue desse Deus, que é vosso Filho, caia sobre nossas almas e nos
obtenha a vossa misericórdia. Eu me arrependo, ó bondade infinita,
de vos ter ofendido e me arrependo de todo o coração.
Conheceis, porém, a minha fraqueza: ajudai-me, Senhor, tende piedade de mim. Maria, minha esperança, rogai a Jesus por mim.
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