4. A Igreja primitiva foi comunista?
As ordens religiosas são comunistas?
Amados Filhos, provavelmente já tereis
ouvido ou lido afirmarem que a Igreja primitiva foi comunista e que as atuais
Ordens Religiosas o são.
Depois do que dissemos a respeito do
marxismo, compreendereis que somente um ignorante ou uma pessoa de má fé pode
afirmar uma monstruosidade tal.
Mas, mesmo se abstrairmos do marxismo,
nem a Igreja primitiva praticou, nem as Ordens Religiosas praticam o comunismo.
Vede bem que o essencial do comunismo é a negação do direito de propriedade.
Ora, examinemos sob este aspecto a Igreja primitiva. Levadas da vontade de seguir de perto o exemplo do Divino Mestre e realizar os conselhos evangélicos, várias famílias cristãs de Jerusalém resolveram viver no voto de pobreza. Para isto venderam tudo o que tinham e entregaram o dinheiro aos Apóstolos para que com ele fosse mantida a comunidade. Notai bem: os indivíduos desta comunidade renunciavam a seus bens porque queriam. Quem não quisesse viver na pobreza, não precisava. Assim disse São Pedro a Ananias: "Conservando o campo, ele não ficava teu? E vendendo‑o, não dependia de ti o que farias com o dinheiro?" (At. 5, 4).
Ora, examinemos sob este aspecto a Igreja primitiva. Levadas da vontade de seguir de perto o exemplo do Divino Mestre e realizar os conselhos evangélicos, várias famílias cristãs de Jerusalém resolveram viver no voto de pobreza. Para isto venderam tudo o que tinham e entregaram o dinheiro aos Apóstolos para que com ele fosse mantida a comunidade. Notai bem: os indivíduos desta comunidade renunciavam a seus bens porque queriam. Quem não quisesse viver na pobreza, não precisava. Assim disse São Pedro a Ananias: "Conservando o campo, ele não ficava teu? E vendendo‑o, não dependia de ti o que farias com o dinheiro?" (At. 5, 4).
A Igreja permitia que os que quisessem
viver sem possuir nada pessoalmente, o fizessem. Mas, de um lado, isto era
livre; de outro, o imóvel ou o dinheiro apurado passava a ser propriedade da
comunidade. Ficava pois de pé o direito de propriedade da comunidade; não era
negado nem transferido ao Estado.
Para desiludir os comunistas utópicos,
devemos dizer que a primeira tentativa de realizar o ideal da pobreza não foi
bem sucedida. Consumidos os capitais apurados na venda dos imóveis, criou‑se em
Jerusalém uma situação difícil, e foi preciso as outras comunidades cristãs
enviarem periodicamente esmolas para Jerusalém a fim de sustentarem os irmãos
que tinham renunciado a seus bens. Verificou‑se que o voto de pobreza só é
possível junto do voto de castidade, e que o estado de pobreza evangélica não é
possível quando há família, mulher e filhos. Para pessoas casadas o caminho da
santidade está no trabalho e na reta administração das riquezas temporais. Mais
tarde a Igreja retomou a experiência, primeiro com indivíduos isolados, os
anacoretas, depois com pequenas comunidades de eremitas, os cenobitas; só
depois que raiou a liberdade para o Cristianismo é que dois grandes Santos
organizaram a vida de pobreza evangélica aliada à obediência e à castidade: no
Oriente, São Basílio; no Ocidente, São Bento. Mas, se o monge renuncia a toda
propriedade pessoal, o mosteiro passa a ser o proprietário. Verifica‑se o que
se dá muitas vezes na família: se os indivíduos não são donos, a família é a
proprietária.
Vejamos agora o valor que tem a
afirmação de que as Ordens Religiosas são comunistas ou socialistas.
Ninguém afirmará que as doutrinas
filosóficas, sociológicas, teológicas do comunismo se encontram realizadas nas
Ordens Religiosas. Tal afirmação é tão absurda, que ninguém a tomaria a sério.
Restaria então o tipo de vida econômica das Ordens Religiosas. Perguntamos: o
tipo de vida econômica que o comunismo pretende implantar é aquele que as
Ordens Religiosas realizam há tantos séculos? Para respondermos com clareza a
este absurdo, que no entanto se repete com enfadonha monotonia, vamos analisar
um pouco mais de perto o tipo de vida econômica das Ordens Mendicantes. É
sabido que são elas que realizam o ideal de pobreza evangélica mais absoluto
entre as comunidades religiosas. Verificado que nelas não há sombra do tipo econômico
comunista, fica provado que as outras Ordens e Congregações, em que o tipo de
pobreza é mais suave, a fortiori não podem ser
tachadas de comunistas.
Nas Ordens Mendicantes mais rigorosas,
não só os Religiosos individualmente nada possuem de próprio, mas nem mesmo a
Ordem, as Províncias ou conventos são os titulares das propriedades. Em lugar
deles a Santa Sé ou a Diocese são os proprietários formais. A administração dos
bens destinados à Ordem, à Província ou ao convento é realizada por pessoas
nomeadas pela Santa Sé ou pela Diocese. Mas, se a propriedade não é
nominalmente da Ordem, etc., os frutos do patrimônio que existir, ou as esmolas
dadas pelos fiéis, se aplicam formalmente à manutenção daquele convento e
daquela comunidade para que são destinados. Assim, os Religiosos não têm os
ônus da propriedade e de sua administração, caridosamente suportados pela
Autoridade Eclesiástica, mas têm as rendas necessárias para se manterem. É a
realização da pobreza de Cristo e da fé na Providência. É o "nihil habentes,
et omnia possidentes" de São Paulo (2 Cor. 6, 10) . Assim, as Ordens
Mendicantes são a mais formal refutação do comunismo. Porque:
a) A renúncia às propriedades é uma
afirmação clara da existência do direito de propriedade, pois ninguém renuncia
seriamente ao que não existe.
b) Cada comunidade e cada Religioso tem
o direito de viver dos frutos do patrimônio e das esmolas que tocam ao
convento, e que são administrados pela Autoridade Eclesiástica em favor da
comunidade, e não arbitrariamente.
c) O Religioso renuncia ao direito de
propriedade voluntariamente. O comunismo nega este direito e confisca as
propriedades violentamente.
d) O Religioso abraça a pobreza
voluntária para melhor seguir a Nosso Senhor Jesus Cristo e santificar melhor
sua alma na esperança da vida eterna. O comunismo diz que destrói a propriedade
particular para proporcionar a todos os homens a maior soma de prazeres nesta
terra, uma vez que não existe a vida eterna.
e) Na realidade, a pobreza voluntária
dos Religiosos os leva a maior liberdade no serviço de Deus. O comunismo,
prometendo a maior soma de prazeres, realmente tem por fim escravizar os
homens, e depois, por meio da fome, obrigá‑los à total apostasia de Deus.
f) A pobreza voluntária das Ordens
Religiosas serve a Deus. O comunismo serve a Satanás.
Concluindo, devemos pois dizer que a
afirmação de que as Ordens Religiosas realizam o tipo econômico do comunismo é
uma verdadeira blasfêmia.
Carta Pastoral Sobre a Seita Comunista – seus erros, sua ação
revolucionária e os deveres dos católicos na hora presente. D. Geraldo de
Proença Sigaud, S. V. D. Publicada em 6 de janeiro de 1962 na cidade de
Diamantina, MG. 2º. Edição, Editora Vera Cruz, São Paulo, 1963. Cap. IV, pp.
94-1014.
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