22 de maio de 2009

Símbolos da Fé - 6ª Parte

LIBÉRIO: 17 MAI. 353 – 24 SET. 366


Atas do Papa Libério na questão dos semi-arianos, ano 357

No exílio, o Papa Libério subscreveu o Símbolo composto pelo sínodo semi-ariano e excomungou Atanásio, o defensor da fé nicena. Disto dão testemunho cartas do mesmo Libério conservadas entre os fragmentos da obra histórica Adversus Valentem et Ursacium de Hilário de Poitiers, cuja autenticidade no passado foi impugnada sem razão. Coloca-se assim a questão da ortodoxia do Papa Libério. As fórmulas de fé por ele a aceitas evitam o conceito niceno de homoousios. Trata-se sobretudo da primeira fórmula sirmiense, definida no II Sínodo de Sírmio (Panônia Inferior), em 351, contra Paulo de Somosata e Fortino, fórmulas que Libério, no exílio em Beréia, em 357, teve de subscrever. Esta fórmula foi benignamente interpretada no sentido da ortodoxia por Hilário de Poitiers, servo crítico de Libério: De synodis, 39-62. Muito provavelmente, Libério, levado em 358 para Sírmio, subscreveu também a 3ª fórmula sirmiense, estabelecida no IV Sínodo (depois da Páscoa de 358). Esta é composta da supracitada 1ª fórmula sirmiense, estabelecida no IV Sínodo (depois da Páscoa de 358). Esta é composta da supracitada 1ª fórmula sirmiense, da 2ª fórmula do Sínodo – também semi-ariano – de Antioquia (no período da festa da Encênia de 341) e dos 12 anatematismos extraídos dos 19 artigos do Sínodo semi-ariano de Ancira (antes da Páscoa de 358) pelo IV Sínodo de Sírmio (omitidos os cânones 1-5, 18 e 19, particularmente suspeitos de heresia). Destas fórmulas apresentamos só a 1ª sirmiense.


Condenação de Atanásio e Símbolos de fé

a) Carta “Studens paci”, aos bispos orientais, primavera de 357

Empenhado na paz e concórdia das Igrejas, depois de ter recebido da Vossa Caridade a carta sobre a pessoa de Atanásio e dos outros, endereçada à pessoa do bispo Júlio, de feliz memória, eu, seguindo a tradição dos predecessores, enviei os meus assessores Lúcio, Paulo e Heliano, presbíteros da cidade de Roma, a Alexandria, ao sobredito Atanásio, para que viesse à cidade de Roma, a fim de que, na sua presença, fosse estabelecido a seu respeito o que consta da disciplina da Igreja. Mediante os supracitados presbíteros mandei-lhe também uma carta, comunicando que, se não viesse, soubesse que estava excluído da comunhão com a Igreja de Roma. Ora, ao retornarem, os presbíteros informaram que não queria vir. Segui então ao pé da letra a carta de vossa caridade, que nos enviaste a respeito do sobredito Atanásio, e saibais, mediante a presente carta, mandada no intuito da unanimidade convosco, que estamos em paz com todos vós e com todos os bispos da Igreja católica, enquanto o sobredito Atanásio é excluído da comunhão comigo, ou seja, com a Igreja de Roma, bem como da comunicação escrita e da incumbência eclesiástica.


b) 1ª Profissão de fé de Sírmio (351), subscrita pro Libério no ano 357

Cremos em um só Deus, Pai onipotente, o criador e artífice de todas as coisas, do qual deriva o nome de toda paternidade no céu e na terra [cf. Ef 3.15],
e no seu filho unigênito, nosso Senhor Jesus, o Cristo, gerado pelo Pai antes de todos os tempos: Deus de Deus, luz de luz, por meio de quem vieram a ser todas as coisas, tanto no céu como na terra, as visíveis e a invisíveis; sendo ele é (o) Verbo, (a) Sabedoria, (a) luz verdadeira e (a) Vida; o qual, nos últimos dias, por nós se en-humanou, nasceu da Santa Virgem, foi crucificado, morto e sepultado; e ressuscitou dentre os mortos, ao terceiro dia, e foi elevado aos céus, e está sentado à direita do Pai, e virá, no final do tempo, para julgar os vivos e os mortos e retribuir a cada um de acordo com suas obras; cujo reino, sendo infindável, permanecerá pelos tempos sem fim; pois ele estará sentado à direita do Pai só neste tempo, mas também vindouro;
e no Espírito Santo, isto é, o Paráclito, que, conforme prometera aos Apóstolos, depois de sua subida aos céus, enviou para ensinar e recordar a eles todas as coisas; e por meio dele são também santificadas as almas daqueles que sinceramente tem crido nele.


1. Mas os que dizem que o Filho vem daquilo que não é, ou de uma outra hipóstase e não de Deus, e que houve um tempo ou um éon em que ele não era, a Igreja santa e católica os considera estranhos.
2. De novo, pois, dizemos: se alguém disser que o Pai e o Filho são dois deuses, seja anátema.
3. E se alguém chamar de Deus a Cristo, Filho de Deus antes dos séculos, mas não professar que ele adjuvou ao Pai na produção de todas as coisas, seja anátema.
4. Se alguém ousar dizer que o não-gerado ou parte dele nasceu de Maria, seja anátema.
5. Se alguém disser que o Filho existe antes de Maria segundo a presciência, e não que ele foi gerado pelo Pai antes dos séculos e que tudo veio a ser por meio dele, seja anátema.
6. Se alguém disser que a substância de Deus se dilata ou se contrai, seja anátema.
7. Se alguém disser que a substância dilatada de Deus constitui o Filho ou então chama o Filho a dilatação da sua substância, seja anátema.
8. Se alguém disser que o Filho de Deus é a palavra interior ou proferida, seja anátema.
9. Se alguém disser que o Filho de Maria é somente homem, seja anátema.
10. Se alguém, chamando o de Maria Deus e homem, com isso entende o Deus não gerado, seja anátema.
11. Se alguém entender a frase: “Eu Deus, o primeiro, e eu depois destas coisas, e fora de mim não há Deus” [Is 44,6], dita para destruição dos ídolos e dos que não são deuses, no sentido de excluir, à maneira dos judeus, o Unigênito de Deus antes dos séculos, seja anátema.
12. Se alguém, escutando a frase “O Verbo veio a ser carne” [Jô 1.14], entender que o Verbo tenha se transformado em carne ou diz que, ao assumir a carne, tenha sofrido mudança, seja anátema.
13. Se alguém, ouvindo que o Filho de Deus foi crucificado, disser que sua divindade sofreu corrupção, ou paixão, ou mudança, ou diminuição ou eliminação, seja anátema.
14. Se alguém disser que a frase: “Façamos o homem” [Gn 1,26], não a diz o Pai ao Filho, mas o próprio Deus a tenha dito a si mesmo, seja anátema.
15. Se alguém disser que não o Filho apareceu a Abraão [Gn 18,1-22], mas o Deus não-gerado, ou uma parte dele, seja anátema.
16. Se alguém disser que não o Filho como homem lutou com Jacó [Gn 32,25-31], mas o Deus não-gerado, ou parte dele, seja anátema.
17. Se alguém tomar a frase: “O Senhor fez chover fogo pela força do Senhor” [Gn 19,24], não como referida ao Pai e ao Filho , mas diz que ele mesmo tenha feito chover por si mesmo seja anátema; pois o Senhor o Filho fez chover da parte do Senhor o Pai;
18. Se alguém, ouvindo que o Pai é Senhor e que o Filho é Senhor, e que o Pai e o Filho são Senhor, porque o Senhor da parte do Senhor, diz haver dois deuses, seja anátema. Pois não o Filho coordenado ao Pai, mas subordinado ao Pai. De fato, não desceu a Sodoma sem a vontade do Pai, nem fez chover por si mesmo, mas da parte do Senhor, tendo portanto incumbência do Pai; nem está sentado à direita por si, mas ouve o Pai que diz: “Assenta-te à minha direita” [Sl 110,1].
19. Se alguém disser que o Pai e o Filho e o Espírito Santo são uma só pessoa, seja anátema.
20. Se alguém, chamando Paráclito ao Espírito Santo disser que ele é o Deus não-gerado, seja anátema.
21. Se alguém, como nos ensinou o Senhor, não disser que o Espírito Santo é outro, diferente do Filho, já que disse: “O Pai vos mandará um outro Paráclito, que eu pedirei” [Jô 14,16], seja anátema.
22. Se alguém disser que o Espírito Santo é parte do Pai ou do Filho, seja anátema.
23. Se alguém disser que o Pai e o Filho e o Espírito Santo são três deuses, seja anátema.
24. Se alguém disser que o Filho de Deus veio a ser, por vontade de Deus, como uma das coisas feitas, seja anátema.
25. Se alguém disser que o Filho foi gerado sem que o Pai o queria, seja anátema. De fato, o Pai não gerou o Filho sendo constrangido, movido por necessidade física, como se não o quisesse, mas, ao mesmo tempo o quis e o apresentou, tendo-o gerado por si mesmo fora do tempo e sem sofrimento.
26. Se alguém disser que o Filho é não-gerado e sem início, como para afirmar dois sem-início e dois não-gerados, e fazendo dois deuses, seja anátema. O Filho, de fato, é a cabeça que é o princípio de todas as coisas. Deus, por sua vez é a cabeça que é o princípio de Cristo. Assim reconduzimos, conforme a piedade, mediante o Filho, todas as coisas a um só princípio-sem-início de tudo.
27. E resumindo cuidadosamente o exame da compreensão do cristianismo, dizemos: Se alguém não disser que Cristo Deus, o Filho de Deus, existe antes dos tempos e adjuvou o Pai na criação de todas as coisas, mas que, desde que nasceu de Maria, então chamado e Cristo e Filho e recebeu o início do seu ser Deus, seja anátema.


c) Carta “Pro deifico”, aos bispos orientais, primavera 357

[Texto introdutório de Hilário de Poitiers:] Depois de tudo isso que tinha feito e prometido, Libério, mandado para o exílio, anulou tudo, escrevendo aos hereges arianos prevaricadores, que tinham emitido uma sentença injusta contra o santo bispo ortodoxo Atanásio (Post haec omnia, quae vel gesserat vel promiserat Liberius missus in exilium, universa in irritum deduxit scribens praevaricationibus Arianis haereticis, qui in sanctum Athanasium orthodoxum episcopum injuste tulere sententiam).

[Carta de Libério:] Pelo deífico temor, vossa santa fé é conhecida por Deus e pelos homens de boa vontade [Lc 2.14]. Como diz a Lei: Julgai retamente, ó filhos dos homens [Sl 58,2], eu não defendi Atanásio, mas desde que o meu predecessor, o bispo Júlio, de santa memória, o acolhera, eu temia em algum aspecto ser julgado prevaricador. Logo, porém, que reconheci, no momento em que a Deus aprouve, que vós o tínheis condenado justamente, sem demora procurei conformar minha opinião ao vosso julgamento. Bem mais, mandei ao nosso irmão Fortunaciano uma carta a respeito da sua pessoa, mas exatamente, acerca de sua condenação, para ser entregue ao imperador Constâncio. Removido, pois, Atanásio da comunhão com todos nós – e dele nem vou querer receber as cartas -, digo ter paz e unanimidade com todos vós e com todos os bispos orientais, ou seja, em todas as províncias.
Desejo, pois, que saibais ainda mais exatamente que, por meio desta minha carta, eu exprimo a verdadeira fé. Já que o meu senhor e irmão comum Demófilo, na sua benevolência, se dignou expor-me a vossa fé católica, que em Sírmio por muitos nossos irmãos e bispos foi tratada, exposta e aceita (- este é o erro ariano, isto o anotei eu, não o apóstata, Libério; o seguinte: -) por todos aqueles que estavam presentes, eu com ânimo disposto a acolhi (- Santo Hilário pronuncia sobre ele o anátema: O anátema expresso por mim esteja sobre ti, Libério, e sobre os teus companheiros -), não (a) contradisse em nenhum ponto e dei o meu consenso; esta (fé) eu sigo, esta vem sendo mantida por mim. (- Outra vez anátema a ti, e também uma terceira vez, prevaricador Libério -). Assim pensei em pedir à Vossa Santidade, já que agora claramente vedes que estou de acordo convosco em tudo, que vos digneis providenciar, com comum procedimento e empenho, que eu volte do exílio e reassuma a sé que me foi confiada por Deus.


d) Carta “Quia scio”, a Ursácio, Valente e Germínio, ano 357

Já que eu sei que vós sois filhos da paz e que igualmente amais a concórdia e a unanimidade da Igreja católica, por este motivo, não impelido por nenhum constrangimento – Deus é testemunha -, mas para o bem da paz e da concórdia, que tem precedência sobre o martírio, me dirijo a vós, caríssimos irmãos do Senhor, com esta carta. A Vossa Prudência saiba que Atanásio, que foi bispo da Igreja de Alexandria, [foi por mim condenado] antes [que eu escrevesse], de acordo com a carta dos bispos do Oriente à corte do santo imperador, [que ele] é separado também da comunhão com a Igreja de Roma, como disso é testemunha o corpo de presbíteros da Igreja romana. Este foi o único motivo pelo qual eu pareci mandar, tarde demais, aos nossos irmãos e coepíscopos orientais, uma carta relativa à pessoa dele, para conseguir que os legados que tinha enviado da cidade de Roma à corte, e igualmente os bispos que tinham sido exilados, e nós mesmos juntamente com eles, fôssemos revogados do exílio.
Mas desejo também que saibais que pedi ao irmão Fortunaciano, que [fizesse chegar] ao clementíssimo Imperador a minha carta, [que escrevi aos bispos orientais, para que eles também soubessem que eu, junto com eles, me separei da comunhão com Atanásio. Creio que sua piedade a receberá com alegria, por amor da paz. ...Reconheça a Vossa Caridade que fiz isto com ânimo benévolo e inocente. Por isso me dirijo a vós com a presente carta e vos conjuro por Deus onipotente e por Jesus Cristo, seu Filho, nosso Deus e Senhor, que vos digneis solicitar e requerer junto ao clementíssimo imperador] Constâncio Augusto que ele, belo bem da paz e da concórdia, em que sua piedade sempre se alegra, me faça retornar à Igreja a mim confiada por Deus, para que a Igreja de Roma não tenha de sofrer tribulação alguma durante o seu governo. ...


e) Carta “Non doceo”, a Vicêncio, ano 357

Acreditei dever comunicar à Tua Santidade que me retirei da discussão acerca da pessoa de Atanásio e que mandei uma carta relativa à sua pessoa aos nossos irmãos e coepíscopos orientais. Por isso, já que pela vontade de Deus nos foi dada por toda parte a paz, te dignarás visitar todos os bispos da Campânia e lhes dar a saber estas coisas. Juntamente com uma carta vossa, fazei chegar ao clementíssimo Imperador algum escrito por parte de alguns deles acerca da unanimidade e da paz conosco, para obter que também eu possa ser livrado da tristeza. ... Pois temos paz com todos os bispos orientais e convosco. ...

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