O Livro da Confiança
Pe. Thomas de Saint Laurent
Capítulo II - Natureza e qualidades da Confiança
IV - Não conta senão com Deus
Firmeza inabalável é, pois, a primeira característica da confiança.
A segunda qualidade dessa virtude é ainda mais perfeita. “Leva o homem a não contar com o auxílio das criaturas: quer seja auxílio tirado de si mesmo, do seu espírito, critério, ciência, jeito, riquezas, parentes, amigos e outros bens; quer sejam socorros que possa esperar de outrem: Reis, príncipes e, geralmente, de qualquer criatura; porque sente e conhece a fraqueza e inanidade de qualquer amparo humano. Considera-os o que são realmente, e como Santa Teresa tinha razão de chamá-los ramos secos de zimbro que se quebram ao serem transportados” (25).
Mas essa teoria, dirão, não procederá de um falso misticismo?... Não conduzirá ao fatalismo ou, pelo menos, a uma perigosa passividade? Para que multiplicar esforços no intuito de vencer dificuldades, se todos os apoios têm que se quebrar nas nossas mãos? Cruzemos os braços esperando a divina intervenção!...
Não, Deus não quer que adormeçamos na inércia; Ele exige que O imitemos. A sua perfeitíssima atividade não tem limites: Ele é o ato puro.
Devemos, pois, agir: mas só d'Ele devemos esperar a eficácia da nossa ação. “Ajuda-te, que o Céu te ajudará”.
Eis a economia do plano providencial.
A postos! Trabalhemos com afinco, mas espírito e coração voltados para o alto. “Em vão vos levantareis antes da aurora” (26), diz a Escritura, se o Senhor não vos ajudar, nada conseguireis.
Com efeito, a nossa impotência é radical. “Sem mim, nada podeis fazer” (27), diz o Salvador.
Na ordem sobrenatural, essa impotência é absoluta. Atendei bem ao ensino dos teólogos.
Sem a graça o homem não pode resistir a todos as tentações, por vezes tão violentas, que o assaltam.
Sem a graça o homem não pode observar por muito tempo, e na sua totalidade, os mandamentos de Deus.
Sem a graça não podemos ter um bom pensamento, fazer mesmo a mais curta oração; sem ela nem sequer poderemos invocar com piedade o nome de Jesus.
Tudo o que fizermos na ordem sobrenatural nos vem unicamente de Deus (28). Na ordem natural, mesmo, é ainda Deus que nos dá a vitória.
São Pedro havia trabalhado a noite toda; era resistente na labuta; conhecia a fundo os segredos do seu rude ofício. No entanto, em vão sulcara as ondas mansas do lago: nada havia pescado! Recebe, porém, o Mestre na barca; lança a rede em nome do Salvador: tem logo uma pesca miraculosa e as malhas da rede rompem-se, tal o número de peixes...
Seguindo o exemplo do Apóstolo, lancemos a rede, com paciência incansável; mas só de Nosso Senhor esperemos a pesca milagrosa.
“Em tudo o que fizerdes, dizia Santo Inácio de Loiola, eis a regra das regras a seguir: confiai em Deus, agindo, entretanto, como se o êxito de cada ação dependesse unicamente de vós e nada de Deus; contudo, empregando assim os vossos esforços para esse bom resultado, não conteis com eles, e procedei como se tudo fosse feito só por Deus e nada por vós” (29).
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26 ) “Em vão vos levantais antes do amanhecer” (Salmos, 126, 2).
27 ) Jo. 15, 5.
28 ) “A nossa capacidade vem de Deus” (2 Coríntios, 3, 5).
29 ) P. Xavier de Franciosi: L'Esprit de Saint Ignace, p. 5.
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