18 de novembro de 2021

A Humilde Santa Bernadette - Colette Yver

O JUÍZO DE JESUS

Disse então Jesus: Eu vim a este mundo para um juízo, a fim de que os que não veem vejam, e os que veem fiquem cegos " (Jo. IX, 39) .
Não posso abster-me de relembrar aqui esta sentença do Salvador pronunciada após o caso do cego de nascença e cujo sentido enigmático é tão triste. Nele ressumbra o desalento ao realizar prodígios, ao dignar-se transtornar as leis eternas em prol do homem, ao dar-lhe provas com a igual, para, em troca, esbarrar nessa razão humana tergiversada, inimiga da evidência que a contraria, exigindo a apalpação do mistério para o crer, e, depois de o apalpar, dizendo displicente:  "Isso não é o mistério".
Repete-se a história perpetuamente.
Aquela, é em Jerusalém que sucedeu, no sábado após a festa dos Tabernáculos. Trouxeram a Jesus um cego de nascimento que esmolava pelas ruas. Cuspiu no chão o Salvador, fez: com a saliva lodo que pôs sobre os olhos do cego, dizendo-lhe: "Vai e lava-te na fonte de Siloé "- Obedeceu incontinente o cego, e ao voltar, enxergou muito bem.
Todos o conheciam em Jerusalém, por terem-no visto esmolar em seus bairros. Entretanto o povo, ao vê-lo não podia acreditar que fosse ele, diz S. João.
"É alguém parecido com ele ", comentavam. Mas ele acudia: "Não, sou eu mesmo". Então a curiosidade os assaltou. Quiseram saber como fora curado. Sem mais, ele dizia: "Um homem chamado Jesus fez lodo, botou-mo sobre os olhos e disse-me: Vai à fonte de Siloé e lava-te. Fui, lavei-me, recobrei a vista. - Onde está aquele homem? Perguntaram os circunstantes. - Não sei, respondeu ele". (S. João, Cap. IX, vs. 11-12).
Que juízo fazer deste caso extraordinário? Cumpria levá-lo ao conhecimento dos fariseus. Conduziram-lhes, pois, o bom homem. Eles, antes de tudo, repararam em que a cura fora feita num sábado, dia de descanso. Novo interrogatório do milagrado:
Como é que se deu aquilo? - Pôs-me lodo sobre os olhos, fui lavar-me e enxerguei". Nisto os fariseus entraram a deliberar (vs. 16-17). "Esse homem não é enviado de Deus, pois não guarda o descanso do sábado. - Sim, mas como é que um pecador poderia fazer semelhantes prodígios? " - E iam discutindo com aspereza. Quiseram fazer passar por novo interrogatório o que fora cego, saber que conceito, na sua simpleza, fazia do taumaturgo.
Lisonjeado sem dúvida por se ver feito árbitro, o mendigo afirmou: "É um profeta!"
Os judeus, prossegue S. João, não quiseram crer que aquele homem fora cego e que recuperara a vista. Por isso mandaram chamar o pai e a mãe dele. Perguntaram-lhes: "É este vosso filho que dizeis ter nascido cego? Como é que agora vê? "
Responderam os pais: "Nós sabemos que ele é realmente nosso filho e que nasceu cego; mas como é que agora enxerga, isso nós ignoramos; quem lhe abriu os olhos não o sabemos. Interrogai-o vós mesmos: Tem idade. Responda acerca do que lhe concerne".
Assim falaram os pais, acrescenta o Evangelista, porque tinham medo dos judeus.
Estes mandam outra vez procurar o mendigo, para dirigir-lhe novas perguntas. Mas ele responde sempre da mesma forma: "Só sei isto, que eu era cego e agora vejo. Já vo-lo disse. Por que quereis ouvi-lo mais vezes? Acaso quereis tornar-vos discípulos daquele homem? "Esta frase fez com que os fariseus o cobrissem de impropérios. Eles eram discípulos de Moisés. Esse aí não sabiam donde era. - "É estranho que não saibais donde ele é. Entretanto abriu-me os olhos. Nunca se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos de um cego de nascença".
Os fariseus mandaram-no calar.
- " Tu nasceste todo no pecado e nos queres ensinar?"
E expulsaram-no. (Idem, v. 34) .
. . ..
Não mudou a humanidade. Continua dizendo como os escribas e fariseus: "Mestre, queremos ver um prodígio vosso. (Mt. XII, 32). E quanto mais ela estremece de afã e curiosidade perante o sobrenatural, tanto menos este, quando lhe roça os sentidos, parece mover-lhe a alma. Dir-se-ia que o milagre é uma concessão feita a contragosto dos homens por Deus cansado da leviandade deles e muito inteirado de que esses negadores pertinazes sempre reclamarão a prova da prova.
Por isso é que Jesus dizia aos judeus: "Se fôsseis cegos, não terieis pecado; mas agora que dizeis: Nós vemos, vosso pecado fica". (João, IX, 42).

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